Artigo para conclusão de pós-graduação em 2012.  Confira no arquivo PDF na íntegra e me envie e-mail se quiser falar sobre o assunto ou quando for utilizar o material, pelo menos para que eu saiba que minha produção veiculará pelo mundo!  Ficarei feliz em contribuir!

Um abraço!

Bruno Marini

MBA GESTÃO E GOVERNANÇA DE TECNOLOGIA DA INFORMAÇÃO

A IMPORTÂNCIA DA CONFIANÇA PARA O SUCESSO DA GOVERNANÇA DE TI: UM ESTUDO SOBRE AS COMPETÊNCIAS COMPORTAMENTAIS

Bruno Luis Marini, RM 41694

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Orientador: Prof. Marco Antonio Vasquez Lovizzaro

RESUMO

Metodologias, processos baseados em melhores práticas e ferramental tecnológico para alinhar a máquina de Tecnologia da Informação às Estratégias Corporativas demonstram falhas, mesmo quando são seguidos de acordo com o que pede o “livro de receitas” das metodologias, e criam ambientes de verdadeira frustração nas empresas, sem distinção de porte e segmento de mercado – exemplos desses casos são vistos aqui e acolá.  Apoiados em estudos sobre Governança de TI e com vistas ao sucesso na implementação de estratégias de TI que impulsionem o Negócio, nosso estudo aborda as competências comportamentais e, sobretudo, a confiança como fator-chave para alcance de satisfação no alinhamento TI-Negócios, apontando que, em tempos de transparência e objetivando perenidade, atuar no sentido de construir pontes de confiança nas relações profissionais e corporativas pode significar a diferença entre o erro e o acerto no que tange à implementação das estratégias de TI. Espera-se que não só a Governança de TI, mas também que os valores e a cultura organizacional das companhias criem ambientes favoráveis à formação da confiança, para que TI desempenhe seu papel com veracidade, autoridade, preparo e solidez de juízos e promessas.  Havendo certos valores que permeiem a cultura organizacional, igual esforço será colocado, em uma relação direta, de seus empregados para materializar aqueles valores no seu dia-a-dia e nas suas relações profissionais, o que demonstra que a confiança em TI não nascerá por decorrência de processos, metodologias ou melhores práticas, mas deve haver uma esfera maior, uma cultura organizacional sustentável que viabilize a construção de laços de confiança.

Palavras-chave: Governança de TI, Estratégia de TI, Cultura Organizacional, Confiança.

ABSTRACT

Methodologies, processes based on best practices and technological tools to align Information Technology structure and processes to corporate strategies demonstrate weakness, even when they are followed according to the “methodologies’ cookbook”, and create environments of frustration in the companies, regardless the size and the market’s segment – examples of such cases can be seen here and there.  Supported by studies on IT governance and aiming for success on the implementation of IT strategies that drive the business, our study addresses the behavioral skills and, above all, trust and confidence as key factors for achieving satisfaction in IT-Business alignment, pointing that in times of transparency and sustainability, to work towards building bridges of trust and confidence in professional and corporate relationships can mean the difference between error and accuracy regarding the implementation of IT strategies.  Not only the IT Governance, but also the organizational culture and values of companies must create favorable environments to the formation of confidence, so that IT can play its role with veracity, authority, preparation and soundness of judgment and promises.  If there are certain values that permeate the organizational culture in a company, equal effort will be placed, in a direct relation, by its employees to realize those values in their day-by-day lives and in their professional relationships, which demonstrates that confidence and trust will not be born as a result of an IT process, methodology or best practice, but there must be a larger sphere, a sustainable organizational culture which facilitates the building of trust and confidence.

Keywords: IT Governance, IT Strategy, Organizational Culture, Trust, Confidence

INTRODUÇÃO

Somos um mundo conectado numa velocidade nunca antes experimentada. Cada vez maior é a importância da Tecnologia da Informação para atar os nós dessa conexão e, mesmo havendo múltiplas evidências da dependência que o mundo atualmente tem de TI, é frustrante que as organizações precisem lidar com o fato de não conseguirem utilizar o poder transformador de sua máquina tecnológica em seu benefício.

Entre outros fatores, significativa parcela dessa frustração decorre das falhas de alinhamento de TI com as áreas de maneira estratégica.

Entendendo o papel da Governança de TI como eixo fundamental e agente transformador da cultura, a partir da seção 3 contextualizamos os papéis e as diferentes competências que se fazem necessárias à Governança de TI na contemporaneidade, objetivando o entendimento de mecanismos relacionais que são pedra angular para a diferenciação da Governança de TI nas companhias.

Motivados pela dificuldade de alinhamento estratégico TI-Negócio, nosso estudo também aborda de maneira prática – e através de vieses não convencionais – aquilo que pode determinar o sucesso para que as diferentes áreas de Negócio de uma companhia atinjam o alinhamento com a área de Tecnologia da Informação, investigando os papéis de competências conversacionais como a confiança no sucesso do relacionamento, estreitando o caminho com vistas à perenidade das relações das áreas por intermédio dessas competências-chave, o que passa a ser melhor explorado na seção 4.

Se os tempos são outros, são outras também as regras do jogo, sendo tempos estes de luzes acesas: é preciso agir com cada vez mais clareza no dia-a-dia, o que é certa novidade para TI, que vem de um mundo de bits e bytes. Veremos na seção 4 também como ocorre a construção da confiança.

Na seção 5 são feitas considerações finais que apontam eventuais novos estudos e ressalta-se o cumprimento dos objetivos.

  1. 1.   Caracterização do problema


Muito se discute atualmente sobre as questões fundamentais que tangem ao alinhamento estratégico entre a área de Tecnologia da Informação e as áreas de Negócio, tanto na comunidade acadêmica quanto em fóruns e conferências e ainda nas próprias empresas.  A questão é profunda e envolve cultura empresarial, histórico de relacionamento das áreas, relacionamentos e valores pessoais.  Sabe-se, no entanto, que essa dificuldade de alinhamento é real e, se não lhe for dada a atenção necessária no sentido de encontrar caminhos para o equilíbrio, é possível que os insucessos de TI e Negócios cooperem para a derrocada de toda uma companhia. 

Segundo Overby e Rubin (2005, p. 1) a opinião do Negócio sobre TI está muito aquém da ideal.  Mesmo em companhias com reputação de intrínseco relacionamento entre Negócios e TI, a percepção de valor de TI era inexpressiva: seis pontos, numa escala de zero a dez, onde zero era extremamente negativa e dez era extremamente positiva.  Claramente, nota-se falta de alinhamento, desde perspectivas, passando por expectativas e, finalmente, atingindo a falta de alinhamento às estratégias.  Num cenário ainda pior, a pesquisa revelou que o Negócio perdeu a confiança em TI, encontrando-a em um ambiente hóstil, inacessível e relutante em colaborar. 

Para reverter essa situação viu-se, nos últimos vinte anos, o surgimento de ferramentas, metodologias, frameworks, manuais de melhores práticas, tudo para controlar TI, numa tentativa frustrada – e cada vez mais frustrante – de encontrar equilíbrio para mundos compostos de linguagens, valores, pessoas e expectativas distintas; exemplo disso pode ser apurado em Saito (2007, p. 1), apontando que enquanto o executivo de Negócios entende que uma forma de melhorar TI é a rápida entrega de projetos, o executivo de TI entende que sua qualidade está relacionada à disponibilidade dos sistemas atuais.  Metodologias e ferramentas encapsulam e fracionam processos de controle e guias – métodos – na tentativa de eliminar o excesso de linguagem técnica e a intolerância com a falta de alinhamento com questões do negócio, entretanto os métodos aplicados não resolvem, na prática, os problemas de comunicação, confiança e divergências de opiniões quando o assunto é alinhamento.  Samorano (2008, p. 18), em estudo sobre as relações dos valores no contexto empresarial, ressalta que “o distanciamento entre os profissionais de TI e os profissionais das demais áreas das organizações não está sendo reduzido com o uso desses recursos [metodologias]”.

A área de Negócio, em não confiando em TI, gerará um relacionamento desgastante com aquela área, não deixando claro seus objetivos e expectativas e não criando pontos de convergência com TI ou mecanismos de flexibilização.  Por outro lado, se a área de TI não buscar novas formas de interagir com seus clientes internos, capturando suas expectativas e superando-as, estará criando uma barreira intransponível insalubre para um empreendimento, qualquer que seja, de qualquer segmento.

Neste contexto, onde percebe-se uma evidente lacuna de relacionamento que vai além das estratégias, quer seja no que tange às relações TI-Negócios, quer seja nos modelos de aproximação propostos por frameworks como ITIL[1], sob custódia da OGC[2], ou COBIT[3], mantido pela ISACA[4], nosso estudo considera que o alinhamento entre as áreas é fator-chave para todo negócio que busque efetividade na Governança de TI, assumindo a premissa que antes de alinhar estratégias, é preciso haver valores que possam permear os relacionamentos entre as áreas, tendo a confiança como fundamento para o sucesso (SAMORANO, 2008).

No que se segue, exploramos ainda mais a importância dos valores para a determinância do sucesso da estratégia de TI.

 

  1. 2.   Governança de TI

 

De acordo com o ITGI (2011), o principal objetivo da Governança de TI é alinhar os processos de TI aos requisitos do Negócio.  Para tanto, diversos frameworks têm sido utilizados.  Com foco específico no COBIT, podemos observar a importância dada, do ponto de vista daquele conjunto de processos, ao entrosamento entre gerentes de TI e de Negócios; se olharmos para o ITIL, biblioteca de boas práticas, pede-se que os objetivos estratégicos do Negócio sejam desdobrados, cascateados para TI e, ao nosso ver, isso não é possível sem pleno entendimento e entrosamento entre as áreas.

Governança de TI, como proposto por Weill e Ross (2004) apud De Haes e Van Grembergen (2008, p. 1), pode ser desenvolvida com uma mistura de estruturas, processos e mecanismos relacionais.  Mendes (2009, p. 7) aponta que estruturas e processos servem, no âmbito da Governança de TI, para formalizar, institucionalizar e monitorar decisões estratégicas e procedimentos de TI, enquanto que os mecanismos relacionais falam sobre relacionamento colaborativo e participação ativa dos executivos de uma corporação, gerência de TI e gerência de Negócios – são esses mecanismos cruciais para atar e sustentar o alinhamento TI-Negócio, ainda que processos e estruturas adequados estejam adaptados, sobretudo na fase inicial de implatanção dos processos de Governança de TI, diminuindo-se essa importância dos mecanismos relacionais ao longo do tempo, onde vai aumentando a maturidade da Governança de TI até que essa torne-se parte da operação cotidiana (DE HAES e VAN GREMBERGEN, 2008).

  1. 1.         
  2. 2.         

2.1.        Os mecanismos relacionais

 

Mecanismos relacionais podem ter características muito informais e, por essa razão, aparecem em De Haes e Van Grembergen (2008, p. 16) como “fáceis de implementar” frente aos processos e estruturas e, de fato, talvez o sejam.  Um dos exemplos de mecanismos relacionais são reuniões informais entre executivos de TI e de Negócios.  Entretanto, percebe-se dificuldade na manutenção desses sistemas e, por consequência, debilidade no processo como um todo denominado, conforme supracitado, crucial.  Até mesmo na literatura, percebe-se pouco material para descrever de maneira objetiva os mecanismos relacionais, dada sua natureza intangível e informal.  Outros exemplos de mecanismos relacionais menos intangíveis são “Gerenciamento da Contabilidade TI/Negócios” e “Gerente Sênior dando o Bom Exemplo”.  Esses mecanismos relacionais são chamados de linha de base mínima para aqueles que querem implementar com sucesso uma estrutura perene de Governança de TI, com relativa facilidade de implementação e efetividade superior, quando comparados aos resultados de companhias que não os praticaram.

Ciente da dificuldade frente aos mecanismos relacionais e na sua determinância para o sucesso e continuidade da Governança de TI, Cherobino (2007, p. 1), deixa claro a importância da criação de funções ou papéis como “gerente de relacionamento de TI”, com um escopo dedicado à sinergia e melhoria de relacionamento, tratando desse recurso como o “dono” de processos de planejamento de TI, representado as áreas de Negócio internamente.  Entre outras abordagens, conforme divulga o relatório “Next-Generation IT Workforce: Focus on Synergies” de Berry (2006, p. 1), é escopo de TI designar um contato primordial – uma pessoa – para a área de Negócio, apontando também que o CIO de uma grande organização tem muito a ganhar quando há alguém em sua estrutura (TI) preocupado em defendê-lo frente à área de Negócio.

Também explorado o tema de comunicação por Morgado (2012), vê-se que “os estudos de competitividade empresarial valorizam o uso de recursos mais complexos de produção e de gestão dos negócios, fato esse que levou as empresas a se alinharem com novos paradigmas. Entretanto não se percebe ainda, com a profundidade necessária, a preocupação com a comunicação organizacional e seu planejamento de forma integrada para otimizar as possibilidades de alcance dos objetivos estratégicos. (...) É através da administração da comunicação que se torna possível posicionar, estabelecer e manter uma relação de confiança e diferenciação da concorrência do mercado, especialmente com os clientes.”

Caracterizada, portanto, a dificuldade com a comunicação e relacionamento entre TI-Negócio e ainda, com vistas à Governança de TI, ao nosso ver há relação entre a debilidade de comunicação entre TI-Negócio e a precariedade da confiança da área de Negócio em TI, entre outros muitos explorados assuntos.  Entendemos que é a confiança, baseada nas conversas, na comunicação verbal, o principal meio (mais que um mecanismo) de gestão na realização de um trabalho gerencial (ECHEVERRIA, 2001 apud MENDES, 2009, p.8).

  1. 3.  As competências conversacionais

 

Humanos que somos, todos temos origens diferentes, muitas vezes com linguagens diferentes, histórias diferentes e, por consequência, maneiras diferentes de enxergarmos a realidade.  Para Kofman (2006, p. 294), todas as pessoas funcionam a partir de seu modelo mental que é um conjunto de sentidos, regras de raciocínio e inferências permanente e que ocorre de maneira subconsciente, condicionando as interpretações para definir a forma como percebemos, interagimos, pensamos, sentimos e que nos leva a determinada interpretação.  Muito embora seja esse o grande motivador das buscas pelo entendimento da mente humana, os problemas interpessoais têm também aí sua origem porque a realidade que um constrói pode ser antiética à realidade construída pelo outro, sendo que nem uma realidade nem a outra são absolutas e verdadeiras num terceiro ponto de vista.

Contextualizando o exposto à TI, é fácil compreender que as realidades criadas por TI e Negócios apresentam grandes diferenças.  Conforme apurado em De Haes e Van Grembergen (2008, p. 2) enquanto TI apresenta-se com um linguajar que demonstra quase exclusivo interesse em questões pertinentes à sua área de atuação (rede, segurança, infraestrutura, dados, sistemas), Negócios apresenta-se com distinções mais relacionadas a vendas, resultados e clientes.  Vê-se aí a origem da incoerência: enquanto TI não entende o ponto de vista do Negócio este, por sua vez, não conhece as distinções de TI.   O que tipifica bem esse cenário, já era dito pelo famoso escritor irlandês Oscar Wilde (2006, p.89): “Hoje, cada qual sabe o preço de tudo e ninguém sabe o valor de coisa alguma” – parece ser essa a frase que melhor define a percepção das áreas de Negócio sobre TI.

Kofman (2006, p. 296) afirma que é preciso que sejam criadas pontes entre os contextos de sentidos, para que seja alcançada efetividade de comunicação e isso não se trata de instrumental metodológico ou ferramental.  É preciso compartilhar valores, entendimentos, visões de mundo e encontrar equilíbrio em mundos distintos (LUCENA E MORALES, 2009 apud MENDES, 2009). 

Em uma grande instituição financeira brasileira, o diretor vice-presidente, que já ocupou posições no departamento de Tecnologia daquela corporação, propôs a criação de um comitê que ocorre semanalmente com diretores de outras áreas, membros do conselho e alta cúpula da instituição para discutir processos de TI e de adoção/implementação de novas tecnologias, melhorando o entendimento dos membros do comitê (executivos de Negócio) sobre os processos de TI e da área técnica de TI sobre o que esperavam aquelas áreas de Negócio.  Naquela instituição houve significativa melhora no alinhamento de TI à estratégia do Negócio quando TI parou de falar em “bits e bytes” e desmistificou, sem medo de perder poder, a tecnologia ao usuário (OVERBY e RUBYN, 2005).

Entrosamento e entendimento não acontecem automaticamente, não são seguidos passo a passo, conforme esperam os modelos como COBIT e ITIL.  Tão pouco ocorrem porque são determinados por qualquer processo: exigem equilíbrio de visões sobre uma mesma área de atuação.  São, conforme apurado em De Haes e Van Grembergen (2008, p. 1-9), as competências conversacionais que facilitam o equilíbrio.

Competências conversacionais são grupos de habilidades que podem ser desenvolvidos num profissional que deseje atuar com efetividade, a despeito de sua área de atuação.  São essas competências que conferem plenitude ao relacionamento humano e, mais especificamente, plenitude para os relacionamentos da área de TI com Negócios.  As competências conversacionais são várias, mas podem ser separadas em quatro áreas distintas: as de habilidades, as de conhecimento, as competências de atitudes e, finalmente, os valores (KOFMAN, 2002, p. 89-114).

 

3.1.        A confiança e a cultura organizacional

 

Dentre as várias competências conversacionais que facilitam esse equilíbrio, destaca-se a confiança e a reconstrução da mesma, no campo dos valores, como a maior provedora de benefícios frente à Governança de TI e alinhamento estratégico.

 Se a área de Negócio não pode confiar em TI, de nada adianta método, certificação, melhor prática e bons processos.  Em artigo ao sítio de tecnologia 4HD, Robert Cohen (2012, p. 1-5) dá bom exemplo sobre como o fator “confiança” permeia uma relação com um prestador de serviço: “(...) se eu ligo para algum lugar no qual não confio muito, já digo que preciso do serviço para ontem. Se não disser nada, aguardarei o serviço numa boa (sic), sei que minha requisição congelará na fila de atendimento”. Cohen – que é profisional de TI – vai mais longe numa história que gira em torno da desconfiança sobre um prestador de serviço que deverá consertar seu aspirador de pó, com vistas à realidade de Tecnologia da Informação, enquanto prestadora de serviços.

De acordo com Walter (2007) citando o Moderno Dicionário da Língua Portuguesa Michaelis, confiança pode ser definida como “(...)(3)Crédito, fé, (4) boa fama, (5) segurança e bom conceito, (6) esperança firme, (7) familiaridade (...)”. Já Kofman (2006, p. 221-222) define confiança como uma opinião gerada através de atos realizados com integridade, competência e exatidão da noção de recursos e limites existentes. Também é possível dizermos que a existência de um conjunto de normas conhecidas, transparentes e respeitadas, atrelado aos valores que determinam as ações das pessoas e às informações, formando uma espécie de “tripé informação-normas-valores”, formam um ambiente propício à confiança, benéfico tanto à área de TI quanto à área de Negócio: os profissionais de TI precisam, por exemplo, ter visibilidade do que ocorre na área de Negócio para que o processo de alinhamento TI-Negócio seja efetivo. 

Para formar a confiança, além do ambiente, é preciso haver apoio de outras competências como a sinceridade, que é um juízo do domínio da ética.  A sinceridade só ocorre quando as ações refletem as crenças.  É esperado da Governança de TI que o alinhamento estratégico crie condições para que TI, enquanto reponsável pelo resultado, acredite nas ações dela mesma.  Sem essa sinceridade, dificilmente se dará o alinhamento.  Também é preciso ser bastante criterioso no ato de escutar, pois num processo de alinhamento e de definição de estratégias há muitos interessados, como o mercado, os parceiros, os clientes (internos, em primeiro plano); automatizar interpretações pode ser perigoso, levando à falsos juízos sobre determinado assunto: um ponto de vista nada mais é do que a visão de algo de um único ponto, há mais pontos de onde é possível observar o mesmo cenário.  Echeverria (2001), citado por Mendes (2009, p. 17-18), descreve outras competências de conversações que são determinantes para a reconstrução da confiança como a veracidade na manipulação das informações, a autoridade que é necessária à TI para que esta consiga tomar decisões naquilo que é pertinente à sua área estando preparada para isso, solidez de juízos e promessas - fazê-las e cumprí-las - com responsabilidade.

A confiança tem um papel determinante para o alinhamento TI-Negócios, pois abre caminhos.  Fukuyama (1997) apud Solomon e Flores (2002, p. 59-60) afirma que “uma sociedade de baixa confiança se torna incapaz das mais elementares formas de cooperação comunitária” e o que é uma companhia se não uma sociedade que precisa cooperar entre si para atingir resultados esperadamente satisfatórios?  A confiança tem a capacidade de criar um olhar mais otimista, impulsionando ações necessárias para um ambiente em transformação.  “Somente através da confiança é possível alcançar as metas para que as empresas estejam conectadas com as transformações e consigam sobreviver” (MENDES, 2009). 

De acordo com o exposto, fica evidente a determinância da confiança para o sucesso do alinhamento TI-Negócios, mas confiança não é feita somente de boas intenções, devendo estar ligada aos valores culturais e organizacionais das sociedades.  Seria extremamente custoso e difícil para uma organização exercer controle direto sobre todos e cada um dos seus membros, daí é possível ter dimensão da força que é preciso para planejar bem os valores de cada organização: não fazê-lo é uma negligência sem precedentes.  É importante que os valores de uma empresa – a cultura organizacional – possam refletir e dêem sustentação para as relações de confiança entre seus colaboradores e, mais especificamente, com foco na área de Tecnologia.

Segundo Tamayo (1998, p. 2) “a importância atribuída por uma organização a certos valores pode determinar a quantidade de esforço investida por seus membros na emissão de certos comportamentos, bem como a sua persistência na execução dos mesmos”.  Também Mussak (2012, p. 134), numa explanação prática sobre cultura organizacional, dá um exemplo bastante próximo da atualidade sobre a força que os valores comuns podem exercer numa empresa, quando esses valores são claros e praticados pelos funcionários, determinando que a inexistência de princípios orientados para a eficiência e perenidade mostram fraqueza em sistemas de gestão; citando a Apple, empresa de tecnologia norte-americana, Mussak (2012, p. 134) descreve quatro pilares fundamentais que Steve Jobs, falecido Chief Executive Officer da companhia, determinou e assegurou que conferissem perenidade à Apple: o foco, a excelência, a paixão e – nosso objeto de exploração – a confiança.  “Naquela empresa, cada pessoa está preocupada em fazer apenas seu trabalho porque tem certeza de que cada colega está fazendo seu trabalho da melhor maneira”, diz Mussak (2012, p.134), finalizando que a confiança é o atributo mais poderoso na construção de uma equipe.

A confiança não vai existir numa organização e, principalmente, não vai permear as relações de Negócios e TI por determinação de uma diretoria ou por exigência de metodologias, quaisquer que sejam.  É a cultura da organização que deve cuidar para que esse importante atributo seja uma constante – e não uma incógnita – nas relações daquela organização.  É esse conjunto de crenças e princípios que definirão, em última instância, como as pessoas se comportarão; é o recurso psicológico, tão ou mais importante que os recursos materiais, que determinará o sucesso na implantação das estratégias de Governança de TI para dar-se, finalmente, o alinhamento TI-Negócios, com vistas, portanto, ao benefício das organizações.

 

 

CONCLUSÃO

 

O sucesso da Governança de TI e do alinhamento de TI ao negócio não está fundamentado em processos, metodologias e frameworks.  Antes, o fator humano tem de ser considerado, entendido e intensamente planejado, mesmo havendo certa intangibilidade.  Diminuir a importância da comunicação e dos relacionamentos de confiança entre as partes e, sobretudo, com as pessoas pode levar todos os planos à derrocada, o que significa perda em vários aspectos: financeiro, cronológico, pessoal e corporativo.

No contexto da confiança, recomendamos ainda que maior aporfundamento seja dado não apenas aos aspectos de construção de confiança e de ambientes propícios à mesma, conforme abordamos na seção 3.1, mas também de reconstrução da confiança perdida, que é uma situação conhecida enfrentada pelas partes centrais de nosso estudo, TI e Negócio.  Além disso, outras competências devem ser consideradas quando o objetivo é o sucesso da companhia como ponto central, tais como o otimismo nas relações, já que são esses os tempos vermos os “copos meio cheios”, o lado bom: olhar para a vida – ainda que num aspecto profissional – com um olhar crítico porém otimista torna as críticas construtivas

Ao mesmo tempo, a partir de nosso estudo abrem-se novas portas para a elaboração de estudos mais aprofundados sobre questões que permeiam o tema central de nosso estudo, como a compreensão dos modelos mentais de profissionais da área de TI e de Negócio, com vistas ao acerto na definição de metas, objetivos, responsabilidades, entre outros aspectos, onde a compreensão dos modelos pode ser determinante.

Nosso estudo, também apoiado na bibliografia utilizada, demonstra que o trabalho de TI é altamente especializado e tem relação íntima e permanente com o futuro, concluindo que a perenidade das relações é fundamental para a manutenção do sucesso de TI, o que apoia-se na confiança e nas conversas e, portanto, nas competências conversacionais.

Se o mundo está cada vez mais conectado, é preciso que os nós que atam essas conexões sejam cada vez mais firmes, pois quanto maior for a altura tanto maior será a queda.  Entendemos que a confiança é, entre as várias competências conversacionais, a ligação necessária à continuidade e ao sucesso.  Sem ela também não haverá ambiente propício ao alinhamento estratégico real, que gera benefício para a organização.

Entendemos também que a comunicação, sem subterfúgios, meandros e opacidades é a principal coadjuvante da confiança para o processo de alinhamento TI-Negócio.  Não apenas a comunicação de alto nível, entre Executivos de TI e das outras áreas que deve ser feita periodicamente, mas a comunicação que deve ocorrer entre os profissionais das áreas: as pessoas fazem seus trabalhos conversando! São as conversas o modo pelo qual os trabalhadores descobrem o que sabem, compartilham com seus colegas e, nesse processo, criam conhecimento para a organização.  Sem modéstias, são as conversas os propulsores de nossa economia. O ambiente da companhia deve ser aderente a esse formato, o que deve ficar claro na cultura organizacional e refletido em seus valores.  Não há mais espaço, atualmente, para que TI seja visto como uma pequena empresa isolada do meio comum dentro de uma organização.  Essa visão de “TI na bolha” ficou no passado: o Negócio depende de TI, mas TI precisa muito mais do Negócio – sobretudo no contexto das organizações que não praticam o outsourcing de tecnologia.

Finalizamos este artigo com a satisfação de termos contribuído para a sensibilização para esta área de gestão, logrando êxito no objetivo principal e com vistas ao desenvolvimento de trabalhos futuros e mais profundos sobre o tema.

REFERÊNCIAS

 

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COHEN, Roberto. Tudo é Urgente no Suporte Técnico: 4 razões. Disponível em: <http://www.4hd.com.br/blog/2012/04/03/tudo-e-urgente-no-suporte-tecnico-4-razoes/>. Acesso em: 12 jul. 2012.

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KOFMAN, Fredy. Metamanagement: la nueva con-ciencia de los negocios. Buenos Aires: Ediciones Granica S.A, 2006.

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MORGADO, Rogério. Competitividade através da Administração da Comunicação. Disponível em: <http://www.hsm.com.br/artigos/competitividade-atraves-da-administracao-da-comunicacao>. Acesso em: 12 jul. 2012.

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OVERBY, Stephanie; RUBIN, Rachel. Converta descrentes de TI em entusiastas. Disponível em: <http://cio.uol.com.br/gestao/2005/08/24/idgnoticia.2005-08-24.3343203810/>. Acesso em: 12 jul. 2012.

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WILDE, Oscar. O retrato de Dorian Grey. São Paulo: Hedra, 2006.



[1] ITIL - Information Technology Infraestructure Library

[2] OGC - Office of Government Commerce

[3] COBIT – Control Objectives for Information and Related Technology

[4] ISACA – Information System Audit and Control Association