A IMPORTÂNCIA DA ADOÇÃO DA TEORIA CONCRETISTA INDIVIDUAL INTERMEDIÁRIA PELO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL NA DECISÃO DE MANDADO DE INJUNÇÃO 

KARLA LUDYANNE GONÇALVES BALIEIRO*

RESUMO

O trabalho em questão versa sobre a eficácia da decisão proferida em sede Mandado de Injunção, instrumento constitucional instituído na Carta Política de 1988, que pode ser impetrado sempre que a falta de norma regulamentadora torne inviável o exercício de direitos e liberdades constitucionais e das prerrogativas inerentes à nacionalidade, à soberania e à cidadania. Apesar de a Constituição Federal tratar de forma exaustiva algumas situações, noutros casos, relegou ao legislador infraconstitucional a regulamentação de direitos. Entretanto, por vezes, os órgãos responsáveis pela elaboração da norma, acabam recaindo em mora, permitindo que certos casos careçam de normatização. Para tanto, deve-se manejar o Mandado de Injunção.

 

Palavras-chave: Man

ABSTRACT 

The study in question concerns the effectiveness of the judgment seat in a Writ of Injunction, the constitutional instrument established by the Charter Policy 1988, which may be filed where the lack of regulations makes it impossible to exercise constitutional rights and liberties and the prerogatives inherent to nationality, sovereignty and citizenship. Although the Federal Constitution comprehensively address some situations, in other cases, relegated to the legislative regulation of infra rights. However, sometimes the entities responsible for drafting the standard, eventually falling in arrears, allowing some cases lack of standardization. To do so, you must manage the Writ of Injunction. 

Keys-Words: Writ of Injunction. Federal Constitution. Regulation.

INTRODUÇÃO

A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, elaborada pelo Poder Constituinte Originário (ou de primeiro grau), emergiu em um contexto marcado por profundas e aceleradas transformações sociais, econômicas, políticas e jurídicas por que passava a sociedade brasileira, sobretudo quando da derrocada do Período Ditatorial e retorno da República.

No período em relevo, houve a consagração do Estado Democrático de Direito, no qual estamos inseridos até os dias atuais e, por ser cláusula pétrea, não pode ser alvo de reforma à luz da vigência da Constituição, que por sua vez, abarca direitos capazes de tutelar o indivíduo contra as arbitrariedades do Poder Estatal.

Neste giro, com o advento da Carta Política de 1988, ampliou-se o rol de direitos e garantias fundamentais, tais como o direito à liberdade, em que se verifica, como dito alhures, a proteção do indivíduo em face do Estado. O Legislador Constituinte atentou-se a efetivação de tais direitos ao adotar medidas capazes de assegurá-los, a saber: Ação Popular, Habeas Corpus, Habeas Data, Mandado de Injunção.

Tais medidas são denominadas por garantias ou remédios constitucionais, sendo que, o objeto para a propositura de cada um dos instrumentos encontra-se disciplinado no bojo da própria Constituição.

Particularmente ao Mandado de Injunção, faz-se necessário discorrer, ainda que brevemente, sobre sua aplicabilidade no caso concreto. Isso porque, apesar das inovações advindas da Carta de 1988, diversas matérias por ela fixadas ficaram a cargo do Legislador Infraconstitucional as pertinentes complementações, são as chamadas normas de eficácia limitada.

Ocorre que, a mora legislativa para elaboração das normas acaba, muitas vezes, ocasionando prejuízos aos titulares dos direitos não disciplinados de forma plena. Não obstante, por cautela, criou-se a figura do Mandado de Injunção, remédio constitucional capaz de garantir o exercício de direitos em que opera o silêncio e a mora legislativa.

1 Conceito

O Mandado de Injunção foi criado como forma de remediar a mora legislativa quanto à elaboração de leis que versem sobre direitos consagrados por normas constitucionais de eficácia limitada ou não autoaplicáveis.

 As normas constitucionais de eficácia limitada, na visão de VICENTE PAULO e MARCELO ALEXANDRINO:

 

São aquelas que não produzem, com a simples entrada em vigor, os seus efeitos essenciais, porque o legislador constituinte, por qualquer motivo, não estabeleceu, sobre a matéria, uma normatividade para isso bastante, deixando essa tarefa ao legislador ordinário ou a outro órgão do Estado (2008, p. 64).

 

 

O artigo 5º, inciso LXXI, da CRFB/88, assim dispõe:

 

Conceder-se-á mandado de injunção sempre que a falta de norma regulamentadora torne inviável o exercício de direitos e liberdades constitucionais e das prerrogativas inerentes à nacionalidade, à soberania e à cidadania.

 

 

Vê-se que, com a leitura do dispositivo legal retro, que a Constituição não conceitua o instituto em apreço, apenas esclarece as circunstâncias de sua propositura. Assim, o mandado de injunção é cabível quando o indivíduo encontrar-se ameaçado de lesão a um direito que deveria estar regulamentado pela norma infraconstitucional.

Há controvérsias doutrinárias quanto aos direitos abarcados pelo instituto, vez que se questiona se são apenas os que tornem inviável o exercício dos direitos e liberdades constitucionais e das prerrogativas inerentes à nacionalidade, à soberania e à cidadania.

Segundo KILDARE GONÇALVES CARVALHO (2001, p. 307):

 

Pela leitura do texto constitucional, parece-nos que a garantia alcança direitos liberdades constitucionais (individuais, coletivos e sociais) e as prerrogativas inerentes à nacionalidade, cidadania (direitos políticos) e soberania (entendida como soberania popular-artigo 14).

 

 

De acordo com o administrativista HELY LOPES MEIRELES só caberá Mandado de Injunção seguindo fielmente o estatuído na norma constitucional, ou seja, quando versar sobre liberdades fundamentais inerentes à nacionalidade, à soberania e à cidadania, e não em quaisquer omissões legislativas.

 

 

2 Legitimidade Ativa e Passiva

 

 

É dotado de Legitimidade Ativa, ou seja, pode ser impetrante de Mandado de Injunção a pessoa física ou jurídica que venha a sofrer lesão diante da mora normativa em relação a direitos e liberdades constitucionais e das prerrogativas inerentes à nacionalidade, à soberania e à cidadania.

No polo passivo da demanda é parte legítima a autoridade competente para editar a norma regulamentadora, mas que, por inércia, não o fez.

 

 

3 Procedimento

 

 

Não há, no ordenamento pátrio, instrumento regulamentador do Mandado de Injunção, por isso, seu processamento segue as normas atinentes ao Mandado de Segurança (Lei nº 12.016/2009).

 

 

4 Competência

 

 

Relativamente à competência, para processar e julgar Mandado de Injunção deve-se primariamente observar a natureza do provimento normativo em que se verifica a mora.

Assim, compete ao Supremo Tribunal Federal quando se tratar de norma regulamentadora em que sua edição couber ao Presidente da República, ao Congresso Nacional, à Câmara dos Deputados, ao Senado Federal, às Mesas destas Casas Legislativas, ao Tribunal de Contas e ao próprio Supremo.

Por outro lado, se for de incumbência de órgão, entidade ou autoridade federal, da administração pública direta ou indireta, a competência recai no Superior Tribunal de Justiça.

Nos termos do artigo 121, §4º, inciso V, CFRB/88, compete ao Tribunal Superior Eleitoral julgar mandado de injunção em grau de recurso, tendo sido denegado pelo Tribunal Regional Eleitoral.

 

 

4 Natureza Jurídica da Decisão Judicial

 

 

Uma das questões de debate doutrinário e jurisprudencial refere-se à natureza da decisão em sede de Mandado de Injunção, visto que, como dito anteriormente, cabe aos correspondentes Tribunais processá-lo e julgá-lo, contudo, há que se verificar que o motivo ensejador de sua impetração é a ocorrência de uma lesão a direito não regulamentado, ante a inércia do órgão competente para a sua elaboração.

Mas, frente à decisão judicial, deve ou não o órgão legislativo elaborar a norma sobre a matéria questionada? Como deve atuar Poder Judiciário diante da decisão final em Mandado de Injunção?

Por haver tais questionamentos, surgiram três correntes com objetivo de estruturar a almejada a resposta. Tais posições emaram de dois grandes grupos: Concretistas e Não concretistas. Segue análise de cada um.

De acordo com a corrente concretista, o Mandado de Injunção seria apreciado pelo Poder Judiciário, o qual declararia, de forma constitutiva, ao órgão competente para legislar sobre determinada matéria e, diante da omissão, até que se verifique a emanação da norma, o direito é implementado e aplicado ao impetrante, a fim de salvaguardar seus interesses.

A corrente suprarreferida ramifica-se em duas vertentes: geral e individual.

Nos termos da doutrina concretista geral, a decisão proferida judicialmente teria efeito erga omnes, ou seja, contra todos, o que implicaria sua aplicação até ulterior manifestação legislativa.

Consoante a posição concretista individual, o efeito emanado pelo Judiciário seria apenas para o autor do remédio constitucional. Entre os membros do Supremo Tribunal Federal, é esta corrente subdividida em direta e intermediária. Esta elucida que, após o julgamento de Mandado de Injunção, deve o Judiciário fixar prazos para a elaboração da norma requerida e, caso não atendida, o órgão julgador cuidará de garantir os meios de efetivar o exercício dos direitos. Aderindo a esta posição, tem-se o Ministro NÉRI SILVEIRA:

 

Partilho do entendimento de que o Congresso Nacional é que deve elaborar a lei, mas tenho presente que a Constituição, por via do Mandado de Injunção, quer assegurar aos cidadãos o exercício de direitos e liberdades, contemplados na Carta Política, mas dependentes de regulamentação. Adoto posição que considero intermediária. Entendo que se deva, também em primeiro lugar, ao Congresso Nacional a omissão inconstitucional, para que ele, exercitando sua competência, faça a lei indispensável ao exercício do direito constitucionalmente assegurado aos cidadãos. Compreendo, entretanto, que, se o Congresso Nacional não o fizer até em certo prazo que se estabeleceria na decisão, o Supremo Tribunal Federal pode tomar conhecimento de reclamação de parte, quanto ao prosseguimento da omissão, e, a seguir, a respeito do direito in concreto (MORAES, 2001, p. 170).

 

 

De outro modo, a posição concretista individual direta afirma não ser necessário nem sequer a fixação de prazos, pois, garantir-se-ia de imediato o exercício dos direitos.

Existe, ainda, a corrente não concretista, que é filiada pelo Supremo Tribunal Federal e adotada nas decisões por este órgão proferidas. Segundo tal posicionamento, ao Judiciário cabe reconhecer formalmente a inércia do Poder Público e reclamar à autoridade legiferante, com o intuito de que este cumpra seu papel, elaborando a norma, como deveria ter agido anteriormente.

Nesse passo, o Poder Judiciário não estabeleceria prazos, seria possível, no entanto, a fixação de uma indenização ao titular prejudicado pela ausência da norma.

A previsão de indenização teve ocorrência no julgamento do MI nº 283-5, cujo relator foi o Ministro Sepúlveda Pertence. Na oportunidade, reconheceu-se a mora legislativa do Congresso Nacional quanto à regulamentação do artigo 8º, § 3º, do ADCT. Definiu-se o prazo de 60 (sessenta) dias para a eliminação da mora e previu, ainda, que se prevalecesse a falta, ao titular seria conferida uma sentença ilíquida indenizatória por perdas e danos.

Críticas são legadas a referida corrente, vez que, ao ser adotada, aparenta conferir ao mandado de injunção o status de ação direta de inconstitucionalidade por omissão. Entretanto, deve-se fazer a correta distinção entre um instituto e outro, tendo em vista que atuam em situações distintas.

5 Mandado de Injunção x Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão

O Mandado de Injunção e a Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão são instrumentos novos que a Constituição Federal celebrou para garantir a proteção de direitos consagrados em seu bojo, mas, ainda não regulamentadas, devido à inércia de quem lhes compete elaborar. Contudo, há que serem feitas algumas diferenciações.

O Mandado de Injunção tem por finalidade proteger direito subjetivo do autor, que não pode exercê-lo em decorrência da falta de norma regulamentadora. É, portanto, uma situação concreta de lesão a direito.

A ADIN por omissão é uma espécie de controle de constitucionalidade de forma abstrata, sendo assim, não há concretamente uma lesão a direito. Por ser um processo objetivo, a norma é analisada em tese, sem existir, repita-se, uma situação in concreto.

Os legitimados para a propositura daquele são as pessoas que tenham necessidade de exercer direito subjetivo não regulamentado por norma infraconstitucional. Quanto a este, os legitimados limitam-se aos arrolados no artigo 103, incisos I a IX, CFRB/88, a saber:

 

Art. 103. Podem propor a ação direta de inconstitucionalidade e a ação declaratória de constitucionalidade:

I - o Presidente da República;

II - a Mesa do Senado Federal;

III - a Mesa da Câmara dos Deputados;

IV - a Mesa de Assembleia Legislativa;

V - o Governador de Estado;

IV - a Mesa de Assembleia Legislativa ou da Câmara Legislativa do Distrito Federal;

V - o Governador de Estado ou do Distrito Federal;

VI - o Procurador-Geral da República;

VII - o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil;

VIII - partido político com representação no Congresso Nacional;

IX - confederação sindical ou entidade de classe de âmbito nacional.

 

Ademais, além do Supremo Tribunal Federal, outros órgão do Poder Judiciário podem apreciar o Mandado de Injunção, ao contrário da ADIN por omissão, que só cabe ao Supremo.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Ante o exposto, reportando-se às teorias existentes para explicar a natureza jurídica da decisão final proferida em sede do Mandado de Injunção, contesta-se a eficácia deste remédio constitucional, que teve origem no ordenamento pátrio, quando da promulgação da Constituição Federal de 1988, uma importante inovação, mas que pode ser tornar letra morta, caso não operar, de forma efetiva e, no caso concreto, o direito reclamado pelo impetrante.

Se a Carta Política definiu este instrumento como meio de possibilitar o exercício de direitos e liberdades constitucionais e de prerrogativas inerentes à cidadania, à nacionalidade e à soberania, pela ausência de norma regulamentadora ante a excessiva demora do poder competente para editá-la, é fundamental que haja meios eficazes para garanti-los, de modo que seu titular os exerça normalmente, tendo em vista que a propositura de Mandado de Injunção é feita em virtude de lesão ou ameaça de lesão a direito reclamado.

A Corrente concretista individual intermediária, filiada pelo Ministro Néri da Silveira, deveria ser a adotada pelos julgadores, a fim de se aplicar a norma no caso concreto e não somente concedendo uma indenização ao autor do direito pleiteado, na hipótese de inobservância do prazo fixado para edição regulamentadora, uma vez que o impetrante de Mandado de Injunção deve ter seu direito válido e, ao se editar a norma, outros possíveis titulares podem ter supridos seus interesses.

Destarte, conseguir-se-ia, gradativamente, promover a real intenção do Legislador Constituinte, que por não ter disciplinado, de forma plena, certos direitos, preferiu incumbir ao legislador infraconstitucional. Já prevendo, também, suposta mora, achou por bem criar a figura do Mandado de Injunção que, diga-se de passagem, até hoje, não é regulamentado, carecendo tramitar através da lei que rege o Mandado de Segurança.

REFERÊNCIAS

ALEXANDRINO, Marcelo; PAULO, Vicente. Direito constitucional descomplicado. 2 ed. Niterói: Impetus, 2008.

BARBOSA, Júlia de Castro. Disponível em: www.juspodivm.com.br/i/a. Acesso em: 25 de junho de 2008. 

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_______. Lei 12.016, de 07 de agosto de 2009. Disponível em: www.senado.gov.br, acesso em 18 de janeiro de 2012, às 19h13min. 

CARVALHO, Kildare Gonçalves. Direito Constitucional Didático. 7 ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2001. 

CASTRO, Dayse Starling Lima. Direito Público: coletânea de artigos. Belo Horizonte: Castro Assessoria e Consultoria, 2003. 

MAGALHÃES FILHO, Glauco Ferreira. A essência do Direito. São Paulo: Rideel, 2003. 

MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 9 ed. São Paulo: Atlas: 2001.