A Guerra Fria do século XXI :

As manifestações de 15 de março de 2015

 

Por Daniel Bruno Vasconcelos[1]

A partir de uma análise global dos protestos, vale ressaltar que alguns países da América do Sul se mostraram com um passo à esquerda (que fique bem claro, apenas um passo) neste século XXI, dentre eles, os participantes do Mercosul: Argentina, Venezuela, Brasil, Uruguai e Paraguai (esse país merece uma observação importantíssima que faremos mais adiante).  

No ano de 2008 a maior economia mundial, EUA, mostrou que a livre circulação do mercado não funciona tão bem como os neoliberais pensavam, precisando de um ajuda financeira estatal para controlar e não afundar os grandes detentores do capital, em principal os bancos e especuladores do mercado. Neste século XXI, os EUA perdeu boa parte do seu mercado para a China, na qual, na última década veio crescendo economicamente a um nível superior as demais potências.

A aliança econômica entre China e Mercosul no século XXI trouxe muitos benefícios para a sociedade sul-americana, principalmente na área do mercado das tecnologias, foi um avanço muito representativo nesses territórios. Desde então, o mercado consumidor da América do Sul passou a direcionar boa parte do seu capital para Ásia, através dos acordos diplomáticos econômicos. O Mercosul, majoritariamente no século XXI se mostrou politicamente em um viés de políticas mais sociais de esquerda e com menos políticas neoliberais. Em relação anos de 1990, período auge do neoliberalismo na América do Sul controlado geopoliticamente pelos EUA.

Após o fim das ditaduras militares nos países da América Sul (que foi a mando dos EUA durante o século XX), os partidos que “redemocratizaram” em seguida todos esses países foram extremamente neoliberais, com políticas econômicas externas voltadas majoritariamente para os EUA. Como esses partidos chegaram ao poder? Pela manipulação dos veículos de comunicação de massa. No Brasil, isso ficou muito claro nas eleições de 1989 quando a Rede Globo manipulou o último debate entre Lula e Collor. Nesse momento da história fica claro o poder político que os grandes veículos de comunicação possuem diante a sociedade.

Em meio a tanta miséria e milhares de pessoas morrendo de fome até o final do século XX, o Brasil respondeu nas eleições de 2002, já não aguentava mais esse modelo neoliberal de políticas sociais e econômicas. Foi quando elegeu um ex-metalúrgico (Lula) e líder do movimento sindical para a Presidência da República. As políticas sociais do Governo Federal mudaram seu trajeto desde então, as minorias que nunca foram ouvidas, passaram a ter o mínimo de representação, houve conquistas trabalhistas (vide a lei das empregadas) e sociais das classes menos favorecidas historicamente (as cotas nas universidades, o bolsa família, dentre outras). Sabemos que ainda há muito que se fazer para os que sempre foram excluídos, e também na reforma da estrutura política e econômica do Brasil (que foi consolidado no século XX). Nessa estrutura, a classe trabalhadora sempre foi e continua sendo a grande prejudicada desse sistema, tanto no campo quanto na cidade.

  O mesmo processo aconteceu de forma semelhante nos nossos países vizinhos ao Brasil, na Argentina com os Kirchner, no Uruguai com o Tabaré e posteriormente com o Mujica, na Venezuela com o Chaves e recentemente com Maduro, no Paraguai com Lugo (destituído em um golpe de Estado). Esse processo mostra o quanto os países da América do Sul sofreram com a geopolítica dos EUA no século XX, desde o controle da economia e da política sul-americana através do viés ditatorial, e posteriormente através dos partidos neoliberais (na qual os representam nesse continente através da via “democrática” até hoje).

Como não há um clima político mundial para uma nova intervenção militar nos países sul-americanos, tanto do lado da direita, quanto do lado da esquerda (que ambos não querem perder os seus postos econômicos e políticos), os grandes detentores do capital dos EUA (os mesmo que financiam as campanhas dos partidos neoliberais) tentam através dos grandes veículos de comunicação manipular a grande massa populacional contra os partidos que hoje estão no poder (partidos populares de tendências de esquerda). Essa conjuntura nos mostra um verdadeiro golpe de Estado através da mídia, isso aconteceu na Argentina (puxada pelo Grupo Clarín), na Venezuela e agora no Brasil (puxada pelos grupos e partidos de direita, igrejas evangélicas, veículos de comunicação impresso, digital e televisivo). A Rede Globo, maior veículo de comunicação do Brasil, foi o principal agente manipulador das massas desse movimento populacional contra a Presidenta Dilma Rousseff, incitando em muitos o ódio.

O dia 15 de março de 2015, não foi escolhido por acaso para acontecer uma manifestação contra a Presidenta Dilma, nessa mesma data no ano de 1967 tomava posse da Presidência da República o Marechal Costa e Silva, no ano de 1974 tomava posse o General Ernesto Geisel, no ano de 1979 tomava posse o General Figueiredo, todos no período da Ditadura Militar no Brasil. Essa data mostra através da história um marco representativo de golpe contra o Estado Democrático.

Já era de se esperar da sociedade paulista uma grande manifestação contra o Governo Federal, o Estado de São Paulo tem o maior campo eleitoral do PSDB (principal partido de oposição ao PT), porém o que mais chamou à atenção nessa manifestação não foi à indignação contra toda a corrupção no país, uma das principais pautas da manifestação, e sim, o ódio criado nas pessoas contra a Presidenta Dilma e contra o PT. Em meio a tantos xingamentos à Presidenta, mostrando o ódio que foi criado no coração das pessoas, um grupo considerável gritava na Av. Paulista: “Dilma desgraçada, por sua causa eu não tenho mais empregada”. Percebe-se claramente que esse campo político virou uma briga de classes sociais, não é apenas uma luta para tirar o PT do poder e colocar um partido neoliberal (até porque o PT também tem políticas neoliberais), e sim, uma luta para que os ricos continuem tendo mais privilégios que os pobres, deixando assim, apenas as migalhas e o trabalho escravo para os excluídos desse sistema capitalista.

O ódio contra os nordestinos foi mostrado sem nenhum pudor nas vozes dos manifestantes, o pedido da volta da Ditadura Militar, os gritos de Fora Paulo Freire da educação, dentre outras atrocidades. Tudo isso deve ser muito considerado como a voz do povo, porque assim podemos saber que tipo de povo está nas ruas lutando pelos ideias, e contudo, podemos fazer uma análise do porquê desses pensamentos preconceituosos e fascistas. Será apenas uma luta de classes?  Onde o ódio da classe média/alta está a flor da pele por ter que ocupar os mesmos espaços que os pobres, vide isso nos aeroportos, universidades, restaurantes, dentre outros lugares. Pode ser que sim.

Muitas pessoas não sabiam nem o motivo de porquê estar nessa manifestação, o único discurso que prevalecia era “Fora Dilma! Fora PT! Chega de Corrupção!”. Ao refletir sobre isso, pensamos, será que as pessoas acreditam que a corrupção no Brasil chegou no século XXI e só existe no Governo do PT? Sabemos claramente pelos fatos históricos que não! A estrutura política criada antes mesmo do PT entrar no poder do Governo Federal, fez que o PT “dançasse conforme a música, beijando a mão do Capital antes de chama-lo para dançar”. O PT entrou no circuito capitalista abraçado com o Capital, mas não dançou da mesma forma que os outros, que ao invés do samba (carioca e paulista), preferiu o forró (de origem nordestina). Transformando o Nordeste, espacialmente e socioespacialmente em uma Macrorregião potencializadora, tanto na economia quanto na política. Isso também foi motivo da raiva dos paulistas e cariocas nas manifestações do dia 15 de março de 2015.

Temos que ficar de olhos bem abertos sobre todas as informações que nos chegam. Nestas manifestações chamadas pelos grandes veículos de comunicação, teve como grande participante dos atos a Polícia Militar. Na qual em São Paulo, ela representa um Governo fascista e neoliberal do PSDB. Essa mesma PM que tirava fotos com manifestantes na Av. Paulista, é a mesma PM que mata pobres e negros nas periferias das cidades. Não podemos confundir as coisas, existe sim, uma tentativa de golpe pelos partidos neoliberais, apoiado pelo aparato de segurança pública dos Estados. A informação que a mídia circula de que a PM está tirando fotos com os manifestantes não é porque a PM é boazinha e está do lado do povo, muito pelo contrário, ela estava ali representando o Capital e para legitimar as manifestações da classe média/alta que à defende. Exaltando o “poder popular” e elevando-o em uma contagem absurda o número de participantes dessas manifestações. Ou seja, uma verdadeira manipulação das informações.

 Voltando para a escala global, ao fazer uma análise desse sistema econômico e político vigente, percebe-se claramente que existe sim, a ideia de acabar e destituir os partidos que governam os países do Mercosul[2]. Essa ideia parte dos grandes detentores do Capital dos EUA e da EU (União Europeia). Eles estão buscando isso através da manipulação das massas pelos grandes veículos de comunicação. A razão disso (e não apenas isso) está na aliança política do Mercosul com os BRICS (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul), em principal a China. Os detentores do Capital dos EUA não querem perder o mercado consumidor e de circulação econômica nos países sul-americanos. Por isso, a ideia de implantação da ALCA (Área de Livre Comércio das Américas) pelos EUA não acabou, pois ele necessita de um mercado consumidor e de exploração do trabalho para sair dessa crise mundial, e que fique claro, ele está buscando isso na América Latina, e consequentemente no Mercosul. 

O Paraguai foi o exemplo claro de golpe de Estado, no ano de 2012 o Presidente da República do Paraguai, Fernando Lugo, sofreu um impeachment que deu origem a um processo no parlamento que durou um pouco mais de 24 horas, a pedido do partido de direita representado pelo Partido Colorado. Esse impeachment foi considerado ilegal e ilegítimo pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos, gerando uma crise diplomática do Paraguai com o Mercosul e na Unasul. Esse é o exemplo precedente que temos de golpe de Estado no continente sul-americano, impulsionado pelos interesses do Grande Capital.

Ao pensar em um contexto geopolítico mundial, colocamos aqui com ênfase que o Grande Capital é o usurpador dos direitos humanos e da economia Latino Americana. Ele está sendo representado hoje pelos grandes veículos de comunicação, a fins de manipular a grande massa semianalfabeta ou analfabetos funcionais, que os Estados formaram nas últimas décadas com a progressão continuada. Tudo isso para uma retomada do poder, controle da economia e dos direitos humanos, por isso, a população deve ficar muito atenta! Não é apenas a manipulação das informações que a grande mídia repercute em seu discurso, e sim, a omissão das informações que estão por trás de todo esse sistema político e econômico. Dessa forma, deve-se tomar muito cuidado e ter um pensamento muito crítico sobre o que repercute de informação nos grandes veículos de comunicação, pois eles representam interesses de uma pequena elite que tem muito capital e poder político.

A Guerra Fria do século XXI chega através do discurso dos grandes veículos de comunicação na América Latina e em outras partes do mundo, com o objetivo de manipulação das massas populacionais e, de levantar o ódio nas pessoas contra os representantes de esquerda. O intuito dessa organização midiática é garantir a produção e reprodução do capital para os agentes que as financiam, dando o poder e voz sobre as massas para implantar o discurso de defesa do patrão, do livre mercado, das privatizações, Estado mínimo, dentre outros fatores que o neoliberalismo prega na sua base teórica.

Deste modo, é preciso ter um pensamento muito crítico sobre as informações que nos chegam, em primeiro lugar é necessário pensar, quem está sendo beneficiado com determinada informação? Vide o caso dos escândalos de corrupção da Petrobrás, os mesmos agentes que denunciaram os escândalos de corrupção na empresa, foram os que mais compraram ações da empresa quando elas despencaram. Quem desdenha quer comprar! É necessário termos um Estado rígido e forte que lute pelos menos favorecidos no sistema capitalista, pois só assim teremos uma maior igualdade social nesse século XXI.

A aliança econômica do Mercosul com os países dos BRICS, fazem hoje os EUA perderem o mercado consumidor dos seus produtos, consequentemente perdendo capital. Na junção das políticas externas dos países do Mercosul, vem o câmbio desvalorizado das moedas locais, uma forma de controle das economias nacionais. A valorização das moedas locais permite maior importação de produtos, porém atingem diretamente as indústrias nacionais, por isso existe um controle do câmbio hoje para cada situação econômica. Cada país no Mercosul tem uma realidade econômica e estrutural (indústria e campo) diferente do outro, e com isso a realidade cambial de cada país é diferente uma da outra, dependendo de cada período.

Deixamos claro que a Guerra Fria do XXI que falamos neste texto diz respeito aos Grandes Agentes do Capital dos EUA, ao Mercosul e aos BRICS. O circuito de produção e reprodução do capital que ferem esses blocos econômicos e políticos é de uma representatividade muito grande na nossa realidade. Podendo mudar o contexto atual de uma hora para outra. Não podemos tapar o Sol com a peneira e sermos manipulados pelos grandes veículos de comunicação, pois eles representam hoje o Capital usurpador dos direitos trabalhistas e humanos, o discurso manipulado e a omissão das informações fazem parte do seu jogo. Por isso, é necessária uma reforma em todos os veículos de comunicação, onde haja a participação de todos os segmentos da sociedade e não apenas de um grupo elitista. O Equador é um exemplo mais claro que temos a se seguir para regulação dos veículos de comunicação, na qual existe uma participação tanto Estatal, quanto da sociedade civil organizada. 

Os sul-americanos precisam ficar de olhos bem atentos para não serem manipulados pelo discurso predominante da elite, porque fomos historicamente usurpados pelos Grandes Agentes do Capital dos EUA e não podemos deixar que o modelo neoliberal dos norte-americanos se apliquem de  fato aos nossos territórios novamente ( mesmo sabendo que parte dele já é impossível de se ver distante, pela atual conjuntura econômica, técnica, científica  e informacional).

Para concluir, deixamos claro que é necessário termos uma visão crítica sobre tudo que repercute nos grandes veículos de comunicação, na televisão, nos jornais, nas revistas, no rádio, na internet, dentre outros. Pois essas informações sempre representam algum grupo elitista que está financiando esses conteúdos, os principais são neoliberais norte-americanos e alguns países da EU, que usurpam a mão-de-obra dos trabalhadores com baixa escolaridade e extermina a população que vai contra seus princípios. Por isso temos que dar um NÃO para o neoliberalismo representado pela grande mídia, para ficarmos bem longe da ALCA e consequentemente da extrema pobreza.

São Paulo, 16 de março de 2015.



[1] Licenciado em Geografia pela Universidade Estadual Paulista, Campus de Ourinhos. Mestre em Geografia pela Universidade de São Paulo, Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas. Contato: [email protected].

[2] Isso fica claro no depoimento do Senador de São Paulo e ex-candidato a vice Presidente pelo PSDB, Aluysio Nunes Ferreira, quando ele fala em um evento realizado pelo Instituto FHC no dia 09/março/2015, que quer sangrar a Presidenta Dilma nos próximos 4 anos. Incitando o ódio na população contra a Presidenta.