Dos professores, da greve e da sua ilegalidade

 

Leonardo Boff fiz que “Cada um lê com os olhos que tem e interpreta a  partir de onde os pés pisam”. A greve dos professores do Estado da Bahia completa hoje 64 dias. Fato histórico! Do governo ouvem-se as declarações de que a greve é ilegal e que a classe tem sido resistente às propostas feitas. Há os que, inclusive, afirmam que o movimento, além de ilegal, é irresponsável e imoral. Se as pessoas voltassem ao estado de lucidez política saberiam onde achar essas manifestações desrespeitosas. Não na classe docente, com toda certeza!

A condução do sistema de Educação em todo o território nacional é uma demonstração clara do descaso que se dá ao processo formativo na sua esfera sistemática. Das condições físicas dos espaços escolares ao salário dos professores, o que se vê é uma forma irresponsável de administração do dinheiro público, fruto dos impostos de cada cidadão. A classe docente, vista como irresponsável pelos desavisados sempre foi a palmatória do mundo. Sobre ela está a responsabilidade de conduzir o processo ensino-aprendizagem em condições degradantes: salas destruídas, sem iluminação ou ventilação adequadas, com ausência de recursos básicos para o fazer pedagógico; estudantes desrespeitosos, que enfrentam e derrubam a autoridade docente, inclusive com ameaças e agressões físicas e verbais; salários baixíssimos, o que a obriga a uma jornada dupla e, em muitos casos, tripla de trabalho; descaso das famílias e incompetência de grande parte dos gestores para lidar com as questões de ordem comportamental, psicopedagógica e psicológica dos discentes, além das questões de ordem da saúde laboral. É muito fácil, sobretudo para os que jamais tiveram o desafio de entrar numa sala de aula com situações semelhantes às que foram apresentadas, criticar o movimento. Não conhecem a causa, não sofrem as angústias, não cultivam o sonho de uma educação que respeite seus atores e os promova ao status de protagonistas.

É muito cômodo para o Governador afirmar seu pensamento do lugar onde repousa em berço esplêndido. É bom trazer à memória o que ele, então Deputado Federal, disse sobre a greve dos professores em 2000, quando saiu em defesa da classe. Na época foi firme em dizer que os docentes estavam sendo “massacrados pelo governo de Fernando Henrique Cardoso”. “O governador [César Borges] e o seu secretário da Educação recusam-se a dialogar com os representantes do movimento, que têm buscado negociação, e agora decidiram cortar o pagamento, condenando milhares de famílias a enfrentar o fantasma da fome”. Vale uma reflexão!!

Em 2010, os deputados homologaram o reajuste dos seus salários, que de R$16.512,00 foi para R$ 26.723,13, num aumento de 61,83%, enquanto que a determinação para o piso dos professores foi de 22,22%. Considere-se, ainda, que com apenas dois mandatos (oito anos de um pseudo trabalho) um político pode desfrutar de sua gorda aposentadoria, enquanto que o profissional do magistério tem que trabalhar, nas condições já apresentadas, por, no mínimo, 25 anos. Cada um, cônscio de sua responsabilidade política e social, é convidado a analisar quem é imoral e onde está a imoralidade.

O aumento que o Governador se recusa a dar é uma determinação do Artigo 5º da Lei 11.738, de 16 de junho de 2008. Entende-se que aquilo que fere a Lei é ilegal. O cidadão consciente há de discernir quem está na ilegalidade, os professores ou o Governo do Estado da Bahia.

O convite é para que o olhar seja ampliado para que se possa ler além do que foi escrito e que os pés pisem em outros lugares para que sensações outras sejam experimentadas. Parabéns aos professores, guerreiros, sempre. Os 64 dias de greve são uma prova da resistência contra a tirania disfarçada e a demonstração que o homem é mais forte quando sabe se unir. Fica a ordem, na voz de Lecy Brandão: “Na sala de aula é que se forma o cidadão. Na sala de aula é que se forma uma nação. Na sala de aula não há idade nem cor. Por isso, aceite e respeite o meu professor” e mais um convite: “Batam palmas pra ele, batam palmas pra ele, batam palmas pra ele que ele merece”.