A GRAMÁTICA E SUAS IMPLICATURAS¹


Vamilson Souza D`Espindola²



RESUMO: Ensinar a ler e a escrever implica na autonomia que o cidadão terá quando compreender os significados que se escreve ou se lê e ainda na comunicação que irá interagir. Isto implica também no aspecto social, no meio em que está inserido, a sociolingüística é o ramo que se aprofunda nestas relações. A função do professor e da escola na sociedade é determinante neste processo, mas também se faz importante família do indivíduo, a qual é o primeiro contato lingüístico de um futuro cidadão. Os estudos aprofundados da linguagem implicam em conhecimentos de códigos, signos, símbolos e da escrita, porém a necessidade de compreensão destes é fundamental para que a competência da comunicação seja atingida. A relação da lingüística, da semiótica e da língua materna gramatical é importante para que haja um real ensinar e aprender não apenas na escola, mas na sociedade que o individuo se insere no decorrer de sua vida e que os significados sejam concretos a fim de praticá-los na escola, no trabalho, na vida familiar e no meio social quando adulto.

Palavras-chave: Comunicação; Significados; Sociedade.



INTRODUÇÃO

Sabe-se que é impossível discursar de Língua Portuguesa sem a relacionar com a Lingüística e suas vertentes. Outro fato é que a linguagem possibilita o pensamento e a capacidade de comunicação por meio dos signos para todo o ser humano. A Língua e a Fala são os componentes da linguagem, e ainda pode-se dizer que esta se divide em linguagem verbal: oral ou escrita, e não verbal: símbolos e signos.
A comunicação é algo fundamental numa sociedade, e segundo Lübke (2007) os "Gêneros textuais dizem respeito aos textos que circulam socialmente, encontrados em nossa vida diária, tais como: panfleto, cartaz, receita, culinária, bula, etiqueta, crônica, lista de compras etc." Desta forma pode-se dizer que todo falante de sua língua conhece sua gramática, no conceito considerado a gramática como saber internalizado com sistema de regras para se falar e escrever.
O enfoque desta pesquisa é aperfeiçoar os conhecimentos sobre a gramática relacionando-a com a lingüística e a semiótica trazendo as visibilidades que geram suas implicações no cotidiano do ser humano.

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1 - Trabalho apresentado ao Curso de Pedagogia na disciplina de Metodologia e Conteúdos Básicos de Língua Portuguesa no ano de 2009.
2- Graduado em Educação Física pela Universidade do Sul de Santa Catarina no ano de 2008.
A LINGUISTICA E O ENSINO DA LÍNGUA PORTUGUESA

A sociolingüística é um ramo da Lingüística que estuda as correlações comportamentais e educacionais no processo de ensino e aprendizagem da linguagem. No Brasil é visada ao ensino da Língua Portuguesa no Ensino Fundamental no que se refere aos vários fenômenos da variação lingüística.
Esta corrente pode possibilitar a melhoria e a qualidade da Língua Portuguesa trabalhando com a realidade dos sujeitos desta língua, procurando levar em conta os fatores internos à língua, como: a morfologia, a fonologia, a semântica, entre outros; assim como os fatores externos como, por exemplo: a etnia, a faixa etária, a cultura, a escolaridade, o sexo, a história, a origem geográfica, a situação econômica e social.
Segundo a biblioteca virtual Cavalcanti (2009) relata que as práticas educativas de linguagem devem ser significativas, incluir os alunos das classes sociais desfavorecidas, para que os mesmos possam se sentir menos estrangeiros em relação à língua utilizada pela escola e que possam participar das atividades sociais que demandam conhecimentos lingüísticos variados. Entretanto, no Brasil existem muitas variações em diversos níveis de estrutura lingüística, tanto na pronúncia quanto na morfologia e ainda nas construções semânticas. Neste contexto, pode-se concluir que não existem variedades fixas no que se referem a padrões.

Cavalcante (2009) cita que:

[...] No Brasil uma aparente unidade lingüística e apenas uma língua nacional, é possível observar variações em diversos níveis da estrutura lingüística como ilustram os exemplos a seguir: na pronúncia (tia/tchia (3), [...] no emprego de palavras (macaxeira/aipim/mandioca), [...] na morfologia e nas construções sintáticas (eles falam/ eles fala), [...]

O professor ao trabalhar a variação lingüística deve respeitar e aceitar os vários "falares" dos alunos, numa prática de ensino e aprendizagem que possibilite o estudo dos textos dos próprios alunos. Contudo, não deve abdicar do ensino da língua culta, tanto falada, quanto escrita, no ensino em sala de aula; sendo importante tornar os alunos usuários muito mais competentes aos diversos usos da língua.




O PAPEL DA SEMIÓTICA

Ao falar sobre semiótica é necessário dizer que os fenômenos estão abertos a observações. Segundo Peirce, a "fenomenologia" seria a descrição e a análise das experiências que estão em aberto para todo homem a cada dia e hora, em cada canto e esquina de nosso cotidiano. Fenômeno é tudo que vem a nossa mente, seja real ou fantasia. A fenomenologia é o estudo pela observação direta dos fenômenos, esta discrimina diferenças nestes fenômenos e generaliza as observações, sinalizando classes de caracteres muito vastas.
São desenvolvidas três faculdades nesse processo: a contemplativa onde se vê o que está diante dos olhos humanos; a distinção e discriminação das diferenças nas observações; e, a capacidade de generalizar as observações em categorias abrangentes. Peirce chegou as suas categorias analisando e examinando como as coisas aparecem à consciência. Considerou experiência tudo aquilo que se força sobre o ser humano, impondo-se ao seu conhecimento, e não confundindo com o pensamento racional. Ele chegou então a três categorias, que as denominou de Primeiridade, Secundidade e Terceiridade.
A Primeiridade é a qualidade de sentimento ? é a 1ª apreensão das coisas que aparecem para o homem, e já é tradução; ocorre a mediação entre o ser humano e os fenômenos. O sentimento é quase signo, é a primeira forma de predicação das coisas, mesmo que seja imprecisa ao olhar humano. A Secundidade está na ação de um sentimento sobre o homem e sua reação específica. A sensação tem duas partes: o sentimento e a força inerente desse sentimento num sujeito. Essa relação que pode ocorrer entre os dois termos é uma relação didática, isto é chamada secundidade, segundo Peirce. A Terceiridade é corresponde no pensamento dos signos, para a interpretação do mundo. Por exemplo: ψ = psicologia - o signo (ψ) foi estabelecido para que a palavra Psicologia, assim se traduzisse quando o sujeito olha, logo ele pensa na sua tradução.Por esta razão, é que se diz que o significado é aquilo que se desloca.
O signo não necessariamente pode ser uma representação mental, como acima colocada. Pode ser uma ação, uma experiência ou uma qualidade de impressão, ou algo que representa outro, seu objeto. Tem o poder de representar, ou "substituir uma outra coisa diferente dele". O signo deve estar no lugar do objeto. Voltando ao exemplo:
A ψ é a ciência que estuda...
A psicologia é a ciência que estuda...

Da semiótica Peirceana derivou outras semióticas especiais: a da linguagem sonora, da arquitetura, linguagem visual, dança, artes plásticas, literatura, teatro, jornal, gestos, jogos, comunicação, linguagens da natureza, entre tantas outras.
Segundo Santaella, a Semiótica "tem por objetivo o exame dos modos de constituição de todo e qualquer fenômeno como fenômeno de produção de significação, de sentido". Para tanto se necessita conhecer sobre os fenômenos.
A poesia de Chico Buarque de Holanda, que se transforma em canção, está ligada ao período da ditadura brasileira. Ele expressa sua revolta, angústia, enfim, seus sentimentos na sua maneira de escrever. No período, jamais poderia ter sido escrita, mas parece que as pessoas, as quais censuravam as letras e as músicas desta época, não tinham cultura, nem conhecimento necessário para tal tarefa. Algumas canções passaram na chamada "censura", venderam milhares de compact disc na época, e o povo cantou e ouviu, tanto em casa, como nas rádios as tais músicas. Muitos talvez sem entender o que ou a quem as músicas se referiam, outros, entretanto, talvez soubessem do que se tratava. Quando o governo enfim, pensou e realmente viu o que se passava, mandou retirar das lojas, das rádios e de outros locais de venda, o famoso compact disc. Esse relato foi pensado porque ao escrever sobre os conceitos de primeiridade, secundidade e terceiridade, estão associados a esta questão e relacionados ao conteúdo de Santaella no que se refere a semiótica.


A LINGUA E A GRAMÁTICA

Gramática tem um sentido mais amplo, e a definição no dicionário Aurélio (1985 p.90) relata que "gramática: (do grego grammatiké, arte da gramática, pelo latim grammatica), substantivo feminino; estudo ou tratado dos fatos da linguagem falada e escrita, das leis naturais que a regulam".
É importante ao lecionar a Língua Materna saber dos conceitos diversos da gramática e suas relações, como por exemplo, a gramática normativa que diz haver apenas uma forma certa de se utilizar a língua, enquanto que a gramática descritiva tem a preocupação de descrever a estrutura e o funcionamento da língua a fim de mostrar aos falantes como ela é utilizada, sem discutir a questão de certo ou errado, apenas analisando os fenômenos lingüísticos. A gramática internalizada é aquela que os falantes dominam intuitivamente.
A criança entre quatro e seis anos de idade é um "adulto lingüístico", pois ela domina o sistema fonológico da língua que fala, maneja o essencial da gramática e ainda conhece bem e emprega o vocabulário básico da língua.
Entretanto, a língua escrita exige treinamento, memorização, exercício e obediência às regras fixas, de tendências conservadoras e na sua maioria das vezes não representam a íngua falada. Portanto, o que não representa, não é compreendido e não tem significação, logo não implicará na vida do indivíduo e não exercerá a competência da comunicação.
Segundo Reiter (2006) a aquisição da escrita não está restrita a escola, é de natureza conceitual, embora ensinar a ler e a escrever é a responsabilidade da escola. A autora diz que:

A mão que escreve e o olho que lê estão sob o comando do cérebro que pensa sobre a escrita, que existe em seu meio social, e com a qual toma contato através da sua própria participação em atos que envolvem o ler e escrever, em práticas sociais mediadas pela escrita. Embora a invenção da escrita tenha sido um processo histórico de construção de um sistema de representação, não se trata de que as crianças reinventem as letras nem os números, mas que, para poderem se servir desses elementos como elementos de um sistema, devem compreender seu processo de construção e suas regras de produção.

Mais importante que decodificar os símbolos (letras e palavras) é compreender a função da língua escrita, pois somente dessa maneira que o cidadão torna-se mais atuante, participativo e autônomo na sociedade em que vive. Mas, o avanço das novas tecnologias e as interações entre diferentes suportes como, por exemplo, papel, tela; e as linguagens, sejam elas verbal ou não verbal, têm permitido, inclusive, o aparecimento de formas coletivas de construção de textos, como é exemplo a própria Wikipédia.
Segundo Reiter (2006) a palavra, o discurso e a frase são níveis sucessivos de organização verbal que visam possibilidades crescentes de interpretação. Reiter diz que:

Para compreender um conjunto de frases ou discurso não bastam níveis léxico-semântico, sintático e pragmático. É preciso estabelecer laços que unem ou diferenciam as idéias ou proposições e, assim, fazer inferências, comparar, sintetizar, em suma, interpretar no sentido próprio do tema. [...] O domínio da linguagem, da leitura e da escrita é um instrumento de interação com o mundo e com o conhecimento.

Assim a escrita e a leitura podem ser os instrumentos, os suportes e os meios de comunicação para as sociedades obterem a autonomia e compreensão, mesmo que a produção de textos sejam ainda alvos da atividade de leitura e da escrita, elas exercem o papel da comunicação.

CONCLUSÃO

A linguagem é uma função biológica, mas quando em contato social é aperfeiçoada e compreendida através das relações familiar, escolar e em sociedade. Basicamente existem três tipos de linguagem: por expressão do pensamento, por instrumento de comunicação e como forma de interação. Compreender as teorias de aquisição da linguagem é uma maneira de conhecer melhor o processo de comunicação e conseqüentemente de aprendizagem, que pode ser reconhecida pela gramática seja ela: normativa, descritiva, e internalizada. A língua, por sua vez, é um instrumento de comunicação. Saber uma língua significa é compreender a si mesmo, suas relações sociais, o mundo que essa língua significa, numa abordagem de signos e códigos.
Conclui-se de forma objetiva que saber uma língua significa mais do que dominar regras gramáticas, pois dominar uma língua é saber mais de si mesmo, do mundo que esta língua simboliza, é a prática social mais importante, principalmente por se um mecanismo que pode produzir relações entre grupos sociais diferentes que utilizam esta linguagem de forma diferente.
A escola é parte integral deste processo, a reflexão e a consciência docente são fatores para uma mudança do uso da Língua Portuguesa dentro e fora da sala de aula aconteça no que se refere ao ensino e aprendizagem da mesma, no contínuo processo de trabalho e reflexão sobre os aspectos formais da língua, seus gêneros, seus usos, contexto, história e seus falantes.
Este talvez seja um discurso utilizado somente no aspecto conceitual, intelectual e ideológico, quando não se está num processo de regência em sala de aula ou de vivência escolar atuante. A pergunta não é que gramática esta se ensinado nas escolas e sim, como e para que se está ensinando a gramática nas escolas? E ainda, por que ensinar a refletir, a utilizar uma linguagem para comunicar e compreender uma sociedade onde nem todos são reais cidadãos, a buscar significados?
Será que realmente entendemos tudo isto que a lingüística nos propõe como cidadãos? Será que queremos ser cidadãos pensantes e atuantes nesta sociedade que estamos inseridos? Será que queremos agir para mudar os paradigmas pré concebidos?
Fica aqui uma reflexão a todos nós, acadêmicos ou não, que nos julgamos fazer parte deste processo educacional brasileiro.




REFERÊNCIAS

CAVALCANTE, Maira Auxiliadora da Silva. Contribuições da sociolingüística educacional para o processo ensino e aprendizagem da linguagem. Disponível em <http://www.cedu.ufal.br/posgraduação/ppge/arquivos> Acesso em 07 Abr 2009.

PEIRCE, Charles S. Semiótica. São Paulo: Perspectiva, 1987.

REITER, Aírton Júlio. Fundamentos de Lingüística. Centro Universitário Leonardo da Vinci. Indaial: ASSELVI, 2006.

SANTAELLA, Lúcia. O que é Semiótica? São Paulo: Brasiliense, 1983.