A FORMAÇÃO DOCENTE DO ENGENHEIRO-PROFESSOR NO ENSINO SUPERIOR

 

Pricila dos Santos *

 Oneida Cristina Gomes Barcelos Irigon **

 

 

 

RESUMO

O presente artigo visa demonstrar a compreensão na formação docente do engenheiro-professor no Ensino Superior, procurando entender a construção da prática pedagógica e a relação da prática profissional com a docência e as dificuldades vivenciadas pelo mesmo. A pesquisa foi baseada em referenciais teóricos, cujo engenheiro-professor é o viés que se depara com muitas dificuldades ao ingressar na carreira acadêmica, tendo que adquirir práticas que não fazem parte de seu perfil e formação, na qual métodos pedagógicos são fatores essenciais para o engenheiro-professor que, no entanto, estão associadas à experiência profissional, o que seria o perfil desejado. A experiência profissional ajuda a aproximar mais o egresso de sua real formação, de forma a fazê-lo adquirir parâmetros positivos para uma atuação profissional futura.

 

Palavras-chave: Formação Docente, Prática Pedagógica, Engenheiro-Professor.

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* Graduada em Engenharia de Alimentos. Pontífice Universidade Católica de Goiás – Pós-graduanda em Docência do Ensino Superior.  Universidade Estadual de Goiás.  E-mail: [email protected]

**Oneida Cristina Gomes Barcelos Irigon é Mestre em Educação. Universidade Federal de

Goiás- Doutorando em Educação. Universidade de Brasília. E-mail:[email protected]

1  INTRODUÇÃO

A formação docente do engenheiro-professor no campo da educação em engenharia implica uma compreensão, antes, da docência no Ensino Superior de uma forma mais geral e dos aspectos e contextos atuais em que se desenvolve a atividade do professor universitário.

O interesse pelo tema justifica-se, entre outros fatores, pela expansão do ensino superior nos dias atuais e, consequentemente, pelo aumento significativo do contingente de profissionais de áreas diversas que ingressaram no magistério superior.

Estamos em uma época onde podemos verificar intensas transformações de ordem política, social e econômica. Vários aspectos estão mudados e se faz necessário adaptar-se a eles para permanecer competitivo no mundo contemporâneo.

Está sendo exigida cada vez mais uma capacitação diferenciada para atender a demanda atual, e esta capacitação está diretamente ligada com a formação do aluno e a estrutura docente de uma universidade. Relacionando-a com a engenharia, é preciso uma formação que atenda a todas estas mudanças que vêm acontecendo ao passar dos tempos.

Dentre estas, podemos exemplificar a competitividade profissional, onde o mais apto prevalece, sendo que para que isto ocorra, este futuro-engenheiro deve estar devidamente preparado para suprir a demanda atual.

Os atributos necessários ao novo profissional de engenharia exigem um novo docente cuja ação pedagógica deve estar orientada para a construção do conhecimento e não para a sua reprodução, como tem acontecido na maioria das escolas. O professor de engenharia deve ser um agente motivador para o desenvolvimento do aluno em relação à autonomia para o aprendizado, sendo mais que um mero transmissor do conhecimento e, sim, um facilitador da aprendizagem.

Esta pesquisa tem como objetivo analisar o perfil da formação docente do engenheiro-professor no Ensino Superior, relacionando-o com suas atividades profissionais, a fim de obter possíveis soluções para a problemática em questão.

2  A DOCÊNCIA PARA ENGENHEIROS PROFESSORES NO ENSINO SUPERIOR

Para os engenheiros-professores no Ensino Superior, a autorização para ensinar está regulamentada, implícita à profissão do engenheiro. O ensino é uma das atribuições que o engenheiro pode desempenhar ao longo de sua vida profissional, dependendo de inúmeras questões de ordem pessoal, de seus interesses e perspectivas que o ingresso na docência pode sinalizar como contingências econômicas as quais favorecem ou não o mercado da engenharia, visto que são condições ao ingresso na docência pelos sujeitos desta pesquisa, evidenciadas nos resultados apresentados.

Segundo Longo (2004), o avanço tecnológico nas últimas décadas afetou diretamente o profissional de engenharia que deve ser preparado para, durante toda a sua vida profissional, gerar, aperfeiçoar, dominar e empregar tecnologias, com o objetivo de produzir bens e serviços que atendam, oportunamente, às necessidades da sociedade, com qualidade e custos apropriados. Esse autor sugeriu uma urgente e completa revisão metodológica e de conteúdo nos cursos de Engenharia, visando a contribuição de tais profissionais para a busca de maior autonomia científico-tecnológica do país.

          De acordo com Agopyan, o Projeto POLI 2015 define a Visão do Futuro na formação do Novo Engenheiro:

O engenheiro terá formação abrangente, tanto sistêmica quanto analítica fundamentada em sólidos conhecimentos das ciências básicas para a Engenharia, com atitude de sempre aprender. Será competente no relacionamento humano e na comunicação. Terá postura ética e comprometimento cultural e social com o Brasil. (AGOPYAN, 2004, p. ).

Perante os atributos necessários ao engenheiro do novo século, pode ser concluído que a ação pedagógica do docente de engenharia deve estar orientada para a construção do conhecimento e não para a sua reprodução. Correlata à sociedade do conhecimento é preciso construir a sociedade “aprendente”, segundo Assmann (1998), “reencantando” a educação. Assim, a orientação da aprendizagem deve ser o enfoque privilegiado do processo de ensino-aprendizagem dos cursos de engenharia.

Cabe aqui citar uma verdade insofismável: “o aluno somente aprende bem com um professor que sabe aprender bem” (DEMO, 1999, p. 37). No entanto, o que vemos hoje nas nossas escolas de engenharia? Nelas, encontra-se a dominação do “instrucionismo”, uma vez que os professores concedem uma aula atrás da outra, com conteúdo excessivo, de segunda mão, e subtraem-lhes a motivação de reconstruir o conhecimento, por iniciativa própria, sob a orientação do docente. Realmente, à semelhança do que ocorre na generalidade dos cursos universitários, o que mais predomina nos cursos de engenharia é uma didática derivada de modelos e/ou esquemas de ação docente que se conservaram e/ou se fixaram (ANASTASIOU, 1998, p. ).

Esta constatação é mais pertinente no caso de engenheiros-docentes, que não receberam formação didático-pedagógica específica e vão construindo a sua prática de ensino a partir de conclusões subjetivas sobre a sua história acadêmica pregressa, experiência profissional, referências positivas e negativas dos seus ex-professores, vivência do cotidiano da sala de aula, relação de troca com os colegas docentes e investimento na titulação docente. Neste ponto, não podemos olvidar que “o conjunto de valores e crenças que dão origem à performance dos docentes são frutos de sua história e suas experiências de vida dão contorno ao seu desempenho”.(CUNHA, 1998, p. 53).

Nenhum sujeito é único, uma fonte ímpar de originalidade de escolha e racionalidade (BOURDIEU, 1998, p. ). As demandas da sociedade exigem um novo professor de engenharia que seja, em primeiro lugar, um agente motivador para o aprendizado e, em seguida, um agente facilitador da aprendizagem. Como destaca Prata:

O aluno aprenderá por si próprio se enxergar no professor um profissional competente que, ao invés de lhe impor uma visão preestabelecida dos fatos, lhe encorajará a refletir e a perseguir o seu próprio caminho. Caberá ao bom professor criar através das suas ações e exemplo esta atmosfera adequada para o estudante. (PRATA, 1999, p.175).

A perspectiva de Tardif dirige-se ao cerne da profissionalização do ofício de professor, caracterizada por “uma tentativa de reformular e renovar os fundamentos epistemológicos do ofício de professor e de educador, assim como da formação para o magistério” (TARDIF, 2000, p. 8).

A “epistemologia da prática profissional” define-se pelo estudo do conjunto dos saberes utilizado realmente pelos profissionais em seu espaço de trabalho cotidiano. Consiste em revelar e compreender a natureza desses saberes, como são integrados concretamente nas tarefas dos profissionais e como estes os incorporam, produzem, utilizam, aplicam e transformam em função dos limites e dos recursos inerentes às suas atividades de trabalho.

Ainda de acordo com Tardif, os saberes docentes são temporais, provenientes da história de vida e escolar dos professores; da estruturação da prática profissional nos anos iniciais da docência que ocasiona o saber experiencial e desenvolvido ao longo de um processo de vida profissional de longa duração, considerando as dimensões identitárias e de socialização profissional.

Esses saberes são também plurais e heterogêneos, ecléticos, sincréticos e possuem uma unidade pragmática, estando a serviço da ação onde assumem o seu significado e utilidade; são personalizados e situados, carregam as marcas do contexto nos quais se inserem, sendo apropriados, incorporados, subjetivados, indissociável das pessoas, de sua experiência e situação de trabalho. Os saberes dos professores carregam a marca do ser humano, enquanto seu objeto de trabalho, criando uma disposição para conhecer e para compreender os alunos em suas particularidades individuais e situacionais, exigindo do professor um investimento contínuo e a longo prazo, bem como revisão do repertório de saberes adquiridos pela experiência. O saber profissional comporta um componente ético e emocional.

2.1 O ENGENHEIRO-PROFESSOR OU PROFESSOR-ENGENHEIRO. AS INTER-RELAÇÕES ENTRE A PRÁTICA PROFISSIONAL E A DOCÊNCIA

 

Nesta seção, procura-se identificar as inter-relações entre a prática profissional e a docência do engenheiro-professor ou professor-engenheiro, uma vez que todos exerceram ou ainda exercem atividades específicas de engenharia concomitantemente à atividade docente. De acordo com as percepções identificadas, procuramos refletir, a partir da teoria de Bourdieu, como os engenheiros-professores, ao transitarem por campos distintos, o da engenharia e o acadêmico, cada um com sua estrutura e lógica próprias, integram os diferentes valores, saberes e experiências advindas dos dois campos, e os incorporam no seu capital cultural, seu habitus que, consequentemente, reflete na sua prática pedagógica.

Bordieu (ano) afirma que os campos não são estanques e o indivíduo tem mobilidade para transitar entre os vários campos do espaço social. Cada campo tem características peculiares e o nível de reconhecimento de sua autonomia determina o tipo de jogo e as condições de luta que serão apresentadas aos agentes. Desta forma, o capital cultural é valorizado tanto pela autonomia quanto pela dinâmica do campo.

Os engenheiros-professores, ao refletir sobre as questões relacionadas entre o campo acadêmico e o campo da engenharia, procuram encontrar estas inter-relações na sua formação acadêmica, na atuação dos seus engenheiros-professores, nas atividades que exerceram como estudantes e como engenheiros e nas atividades exercidas em apresso.

2.2 QUAIS AS DIFICULDADES QUE OS ENGENHEIROS-PROFESSORES ENFRENTAM NO SEU COTIDIANO PARA DESENVOLVER SUA PRÁTICA NO ENSINO SUPERIOR?

 

A fundamentação teórica desta pesquisa, nos mostra que o rol das dificuldades é grande e que os professores têm plena consciência de que elas devem ser eliminadas. Muitas são de caráter mais genérico e somente poderão ser eliminadas a partir de uma ação coletiva que envolva a participação de toda a comunidade acadêmica. Vale ressaltar que, quando se menciona comunidade acadêmica, quer se reforçar a ideia de que dela fazem parte o corpo docente em geral, o corpo discente e a instituição, representada pelos seus dirigentes responsáveis pelo administrativo e pelo acadêmico do curso. Outras ações de caráter individual, para serem eliminadas, dependem exclusivamente da vontade e da ação de cada professor.

Os professores encontram dificuldades relacionadas ao currículo, pois consideram que é desatualizado, desorganizado, falta integração entre disciplinas e entre a teoria e a prática. Sobre este aspecto acredita-se que uma simples mudança curricular não irá resolver o problema. Por mais que se tenha uma orientação fundamentada nas diretrizes curriculares e um grupo de bons profissionais envolvidos na elaboração de um novo currículo, questões como integração, atualização, organização e outras que possam surgir dependerão de um projeto pedagógico dinâmico, flexível, que acompanhe passo a passo não só a implantação do currículo, mas o pós-implantação, que consideramos mais importante.

O mercado de trabalho também aparece como dificultador, na medida em que estabelece regras de funcionamento para a universidade, influencia na relação candidato/vaga, refletindo no nível do aluno da graduação e interfere na motivação dos alunos. O mercado é importante, pois ele é que vai absorver o profissional formado na universidade, mas ele é amplo, diversificado, tem suas exigências próprias, que muitas vezes não dizem respeito à formação acadêmica e o papel da universidade vai além da formação profissional, pois ela também tem a sua contribuição na formação do homem para a vida.

2.3 COMO OS ENGENHEIROS-PROFESSORES ENFRENTAM ESTAS DIFICULDADES?

Segundo Bordieu (1998), os engenheiros-professores a seu modo, procuram eliminar as dificuldades buscando alternativas e criando possibilidades para desenvolver sua prática pedagógica. Para eles, melhorar a didática é fundamental e isso alguns fazem utilizando uma metodologia adequada, planejando a disciplina no início do semestre, planejando cada aula, pesquisando novas referências bibliográficas, utilizando recursos de informática e até mesmo recursos audiovisuais. Outras questões colocadas se referem ao controle da cola e da disciplina. A questão da cola sempre foi mencionada por professores como um problema para o aprendizado, mas, na realidade, percebemos que poucos são aqueles que estão dispostos a discutir o assunto. Na maioria das vezes, o que ocorre é que cada professor procura, na medida do possível, encontrar uma forma de policiar os alunos durante a realização das provas.

Entendemos que controlar a disciplina não é tarefa fácil. Muitas vezes há necessidade de uma imposição de normas mais rígidas, que nem sempre funcionam, mas acreditamos que o ideal é o professor ter “jogo de cintura” e canalizar toda a energia dos alunos para atividades que levem ao aprendizado.

Outro ponto levantado pelos professores como forma de vencer as dificuldades e melhorar a prática pedagógica é a questão da motivação dos alunos, que deve começar a ser trabalhada desde as disciplinas do ciclo básico. Eles indicam várias estratégias como: utilizar técnicas de motivação, diversificando as informações, despertando o interesse pela disciplina, incentivando a presença do aluno na universidade, proporcionando um ambiente agradável na sala de aula, entendendo as diferenças, melhorando o relacionamento, despertando o interesse pela área de humanas e introduzindo a pesquisa na graduação.

Porém, percebe-se que, para eles, o maior resultado se dá quando o aluno consegue estabelecer a relação do que ele está aprendendo com a prática da engenharia, e isso eles procuram fazer trazendo exemplos de engenharia para a sala de aula, conversando sobre engenharia e fazendo visitas técnicas. Tendo em vista que todos têm experiência em atividades de engenharia, motivar os alunos relacionando teoria e prática não é tarefa difícil. Quanto às outras formas de motivação, percebemos que, para uns, elas acontecem com mais facilidade, mas outros, talvez pela sua natureza pessoal, têm certa dificuldade, principalmente no que se refere à relação professor/aluno.

Os professores também apresentaram sugestões para que a instituição possa ajudá-los a melhorar a sua prática pedagógica. Essa ajuda pode vir por meio de cursos de aperfeiçoamento para professores, adoção de normas mais claras e criteriosas, adoção de um currículo mais voltado para a indústria e melhoria nos recursos de laboratório. Vale ressaltar que alguns professores consideram importante que a instituição deve estar atenta e mais envolvida e com isso, garantirá mais apoio na preparação dos alunos para o exame nacional dos cursos, mais conhecido como provão.

2.4 A EXPERIÊNCIA PROFISSIONAL ADQUIRIDA EM ATIVIDADES DE ENGENHARIA E O INVESTIMENTO NA FORMAÇÃO ACADÊMICA DETERMINAM DIFERENÇAS SIGNIFICATIVAS NAS PRÁTICAS PEDAGÓGICAS DOS ENGENHEIROS-PROFESSORES?

 

A análise da questão em que procuramos estabelecer uma inter-relação entre a experiência em atividades de engenharia e a formação acadêmica mostram que, para os professores, a integração do habitus profissional do engenheiro com o habitus acadêmico do professor traz várias consequências que interferem positivamente nas suas práticas pedagógicas e nas atividades de engenharia. O curso ganha a medida que os professores têm melhor capacidade de desenvolver pesquisas aplicadas na indústria, desenvolver atividades integradas, podendo estar assim mais próximos da realidade da engenharia e ser mais capazes de relacionar teoria e prática e receber o reconhecimento dos alunos.

Uma abordagem interessante, que se gostaria de ressaltar, é que os professores entendem que as atividades na indústria os tornam mais seguros, mais dinâmicos, mais atualizados, com maior capacidade de decisão e, consequentemente, melhoram sua prática pedagógica. O desempenho na indústria também melhora, porque eles passam a ser mais respeitados, têm maior capacidade de comunicação e possuem maior embasamento teórico.

Realmente, a colocação feita por professores é bastante válida desde que seja possível conciliar bem as duas atividades.  No caso de uma instituição particular, onde a maioria dos professores é contratada como horista e tem uma atividade intensa e muitas vezes desgastante na indústria, sabemos que nem sempre o bom engenheiro consegue ser bom professor.

2.5 ATÉ QUE PONTO SÓ O AUMENTO DE PROFESSORES TITULADOS MELHORA O ENSINO DE GRADUAÇÃO EM ENGENHARIA?

 

Para buscar respostas para essa indagação, procurei levantar, ao longo do trabalho, várias questões relacionadas à titulação dos professores e à experiência profissional na engenharia, fundamentadas em referenciais teóricos. A intenção não foi encontrar uma resposta clara e objetiva para a pergunta, pois acredita-se que o assunto é bastante polêmico, principalmente no contexto atual, em que a avaliação dos cursos feita pelo MEC, conforme estabelece a LDB (Leis de Diretrizes e Bases), está vinculada à titulação dos professores. Foram levantadas várias hipóteses, muitas das quais não são totalmente novas. Várias delas já são abordadas em conversas de corredor, em reuniões acadêmicas ou eventos que envolvem o ensino da engenharia, mas, na maioria das vezes, por falta de maiores esclarecimentos ou por falta de envolvimento dos interessados, não há um posicionamento ou uma definição clara diante delas. Torna-se mais um parecer ou um comentário em cima de um “achismo” do que propriamente uma definição objetiva de ações que tragam contribuições positivas para o desenvolvimento do curso.

Entende-se que seria importante apresentar aqui, as diversas questões que deveriam ser apontadas, não só com o objetivo de evidenciá-las, mas também de sugerir que elas sejam trabalhadas nos encontros nos quais se discutem os rumos da engenharia:

· o título agrega conhecimentos que enriquecem a prática;

· o investimento na formação acadêmica melhora a capacidade de escrever;

· a falta de experiência pode ser compensada pela boa didática;

· a qualidade da aula não está relacionada à titulação dos professores;

· o habitus científico não é considerado requisito básico para um bom professor;

· o investimento para a obtenção do título é muito pesado e compromete a qualidade de vida;

· os doutores são muito “estrelas”;                          

· o conhecimento adquirido no mestrado e doutorado é muito específico e não interfere na prática pedagógica, pois o nível do aluno da graduação não muda;

· a falta de experiência na engenharia torna os professores muito teóricos;

· não é importante o título, mas a didática e o relacionamento;

· a instituição supervaloriza a titulação e não valoriza a experiência profissional, facilitando a formação de grupos não integrados;

· a experiência profissional deve ser mais valorizada;

· o professor não titulado é discriminado;

· o MEC deve repensar a supervalorização da titulação;

· o curso não pode possuir um corpo docente só titulado;

· o mercado ainda não valoriza o título;

· para a empresa o que importa são os resultados;

· o engenheiro que tem mais atividades na indústria não incorpora o habitus acadêmico e não se envolve no curso.

Percebemos que algumas questões levantadas são de ordem pessoal, outras de ordem profissional, mas a maioria delas é de ordem institucional, e é por esse motivo que se entende que elas não podem mais ser ignoradas.

2.6 QUAL É O PROFISSIONAL DE ENGENHARIA EXIGIDO PARA OS TEMPOS ATUAIS, NA PERCEPÇÃO DOS PROFESSORES? A MUDANÇA NO PERFIL DO CORPO DOCENTE, COM A SUPERVALORIZAÇÃO DA TITULAÇÃO EM DETRIMENTO DA EXPERIÊNCIA PROFISSIONAL IMPLICA UMA MELHOR FORMAÇÃO DO ENGENHEIRO?

Para encontrar indicações para a resposta a estas indagações, procura-se, inicialmente, identificar qual o referencial que os professores têm sobre o profissional que eles estão formando, se estes apresentam características do perfil do profissional que o mercado espera receber. A intenção era saber o quanto o professor, ao definir as características do profissional, estava sintonizado com o mercado.

O elenco das características apresentadas pelos professores é bastante vasto. O que se pode concluir é que, a medida que o professor tem a clareza do perfil do engenheiro que o mercado espera receber, ele tem consciência da sua responsabilidade no processo e, consequentemente, a sua prática pedagógica deverá estar voltada para desenvolver as características atribuídas à formação desse profissional.

Não nos causou surpresa perceber que das características apresentadas pelos professores para definir o perfil do engenheiro, muitas não são específicas ao profissional da engenharia, porque podem ser atribuídas também a outros profissionais. São características mais relacionadas à globalização ou mesmo à modernidade, como: domínio de outros idiomas, capacidade de aprender sozinho, capacidade de trabalhar com dados internacionalizados, saber trabalhar em equipe, ser criativo, humilde, comunicativo, ético, disponível, líder e saber transitar em diversas áreas. Muitas dessas características não estão contempladas explicitamente nos currículos dos cursos; podem até ser trabalhadas pelos professores no cotidiano da sala de aula, mas, na maioria das vezes, dependem mais do esforço de cada aluno.

Identificamos, também, aquelas características mais específicas ao profissional de engenharia que estão mais relacionadas à sua formação acadêmica, como: possuir um bom embasamento teórico, conhecer novas tecnologias, possuir uma formação mais generalista, conhecer técnicas de gerenciamento, possuir uma visão do futuro da engenharia, ser prestador de serviços e saber avaliar a melhor relação custo/benefício.   

Sabemos que, por mais que o currículo seja dinâmico, ele não consegue acompanhar a evolução do mercado, pois a implantação de um novo currículo de engenharia leva no mínimo cinco anos para ser totalmente efetivada.

            Para o mercado, principalmente o da engenharia, que está diretamente ligado à evolução tecnológica, este tempo é muito longo e nele as coisas mudam da noite para o dia. Entendemos que as escolas não precisam alterar os currículos constantemente, mesmo porque nem sempre estas mudanças são significativas, mas devem encontrar meios para que os profissionais por elas formados, a qualquer tempo, estejam aptos a enfrentar o dinamismo que o mercado apresenta.

3 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Sabe-se que é de suma importância a atuação do docente em qualquer ramo que ele esteja. No campo da engenharia não seria diferente. Questiona-se cada vez mais este perfil de profissional e é colocada em questão a influência desta experiência profissional para o docente.

O mercado de trabalho exige cada vez mais uma maior capacitação do egresso, e isto está diretamente ligado com a construção pedagógica do docente e a sua atuação como engenheiro-professor no ensino superior. Faz-se necessário uma reformulação do perfil do docente, onde esta didática seja cada vez mais aperfeiçoada e traga para os alunos um maior aproveitamento e a capacitação exigida pelo mercado de trabalho.

É de grande influência ressaltar que os graus de titulação deste profissional não lhe garantem uma boa didática, pois nem sempre o poder de adquirir conhecimento corresponde ao de transmiti-lo. Em uma universidade pode haver excelentes pesquisadores, mas não linearmente bons professores. É procurado, atualmente, um corpo docente que aproxime os acadêmicos das suas profissões, que lhe mostrem de forma real os problemas e desafios aos quais se depararão após sua formação.

Com base nos referenciais teóricos obtidos, inferiu-se que, para aproximar o egresso de sua profissão e prepará-lo para que não tenha dificuldade ao exercê-la, é preciso que o corpo docente esteja inteiramente apto a trazer esta realidade profissional para dentro da sala de aula. Esta realidade pode ser obtida por meio do próprio conhecimento empírico ou senão o possuir, buscar como, por exemplo, em forma de estágio para professores. E, além disso, este professor seja possuidor de uma formação extra e específica para passar este conhecimento em sala.

No que se refere à produção sobre a docência no ensino superior, percebe-se que o foco recai sobre o professor, aos aspectos da trajetória docente, as representações, crenças, concepções, saberes e experiências que referenciam a construção da prática pedagógica. Sugere-se que tal perspectiva para o desenvolvimento de estudos sobre o professor de engenharia seja contemplada por meio de propostas de formação docente, com vistas a uma construção compartilhada da docência e a consolidação de uma identidade profissional docente desses engenheiros-professores.

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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BOURDIEU, P. Escritos de educação. Petrópolis: Editora Vozes,1998.

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CUNHA, M. I. O professor universitário na transição de paradigmas. São Paulo: JM Editora Ltda, 1998.

LONGO, W. P. A engenharia e o desenvolvimento tecnológico. Disponível em:<http://www.waldimir.longo.nom.br/artigos/T12.doc> Acesso em 20/11/12

PRATA, A. T. Comentários sobre a atuação do engenheiro professor. In: LISINGEN, Irlan Von et al. Formação do engenheiro. Florianópolis: Editora da UFSC, 1999. P. 159-178.

TARDIF, M. Saberes profissionais dos professores e conhecimentos universitários. Revista Brasileira de Educação, Rio de Janeiro, n.13, pp5-24, 2000.