Resumo:

O presente trabalho traz uma discussão sobre as representações que são instituídas ou reforçadas em programas que suscitam a rotina de pessoas “comuns” ou artistas nacionais, que trazem em seu bojo um arcabouço rico de emblemas relativos ao gênero e sexualidade, impetrado de valores sociais/morais e de entretenimento não reflexivo das atitudes apresentadas na programação, que culminam na premiação milionária em contratos de trabalho, dinheiro, prestígio social e valores comportamentais.

Palavras-chave: Educação; Gênero; Implicações Sociais

Reality Show – o show da vida na TV

Quando propagandas anunciam o início de uma temporada dos programas A Fazenda ou Big Brother Brasil, da Rede Record e Rede Globo de Televisão, respectivamente, prontamente remetem a ideia de bisbilhotagem da vida alheia, de corpos desnudos e cenas que provocam discussões sobre valores e comportamentos sociais “tradicionais” de proteção da sexualidade e da privacidade.

Comumente nesses reconhecidos reality show brasileiros, o foco na vida privada dos participantes é mais específico no que diz respeito à afetividade. Os relacionamentos que surgem, os confrontos de ideias aliados ao confinamento espacial e temporal em conjunto com atividades que requeiram força física e controle emocional corroboram para o sucesso de tais programas.

Sejam artistas da mídia, completos “desconhecidos” ou estrangeiros os espetáculos da bisbilhotagem agregam valores sociais que se segmentam e reproduzem através da telinha. As roupas justas típicas dos grupos femininos intitulados de piriguetes (mulheres que abusam do erotismo na vestimenta e linguagem), a divisão de tarefas pautadas nas habilidades naturais (naturalmente introjetadas e massificadas pelo machismo sociocultural) – onde as mulheres se dedicam mais às atividades domésticas e às lágrimas de saudade da família são recorrentes nos programas.

Quem fica com quem, quem come quem (no vocabulário popular) é o cerne do programa, “o fato é que as comidas se associam à sexualidade, de tal modo que o ato sexual pode ser traduzido como um ato de “comer”, abarcar, englobar, ingerir ou circunscrever totalmente aquilo que é (ou foi) comido.” (DAMATTA, 1997, p. 60). Fischer (2002, p. 09), afirma que a mídia nos convida diariamente a falar sobre a sexualidade e isto é forte nos programas que sugerem transmissão da vida real.

Pensar a questão de gênero em programas que transformam a vida cotidiana em espetáculo desprovido de censuras valorativas “convencionais” é prestigiar o desatamento de práticas sexistas coloniais. Porém, o que se constata é a falta de reflexão, de exploração do movimento contrário ao machismo declarado – onde a mulher não pode explorar sua sexualidade livremente e expor a vida privada, por um movimento mascarado de liberdade de expressão verbal e sexual. Porque as mulheres continuam a ter sua sexualidade e imagem explorada, secundarizada, recheada de um ranço machista de subordinação à vontade do homem. Pois os programas divertem a sociedade brasileira por seus conflitos supostamente reais, onde mulheres que se permitem namorar vários homens ou que se vestem e se comportam de forma mais provocativa são fúteis, vulgares e não merecedoras de respeito, ou seja, os programas que imitam a vida real colaboram para a efetivação e disseminação de preconceitos já conhecidos, de depreciação da mulher que se distancia do modelo tradicional de mãe/esposa, embora sirvam de deleite noturno na sala de estar dos lares brasileiros.

As relações de gênero são determinadas pela cultura e pela história. Compreendê-las em suas representações e práticas femininas e masculinas, exige certa comparação entre os modos como as pessoas enunciam e definem certas práticas sociais. (PIRES, 2008, p. 01).

Logo, os programas supracitados pouco colaboram para promoção de equiparidade de gênero e reflexão sobre os papéis de homens e mulheres frente aos tempos atuais. Clichês deterministas ainda continuam sendo veiculados, do que é ser mulher e do que é ser homem e suas atribuições no lar e na mídia.

Considerações Finais

Os reality show, como são referenciados os programas que transformam a vida real em espetáculo, muito têm a contribuir no cotidiano do tevente, pois trazem em sua programação representações e ideologias sobre o tratamento do corpo e da sexualidade em um caráter lúdico e incitativo, o que promove uma aproximação e aprisionamento do interesse do espectador pela programação.

De um modo geral, esses espetáculos massificam ideais sem um aparato reflexivo ideal, sendo rebuscado através das imagens e pequenos flashes permitidos para ir ao ar, esquivando-se de promover uma discussão mais real, interativa e significativa, do ponto de vista da eloquência humana, e das relações inclusivas e livres de postulações preconceituosas e reducionistas de gênero e sexualidade. Não gerando, portanto, muitos ganhos pedagógicos à sociedade brasileira, apesar de ser apresentado em um formato de grande aceitação e acessibilidade massiva – a televisão.

Referências

DAMATTA, Roberto. O que faz o brasil, Brasil? 8ª edição. Rio de Janeiro: Rocco, 1997.

FISCHER, Rosa Maria Bueno. O dispositivo pedagógico da mídia: modos de educar na (e pela) TV. Revista Educação e Pesquisa. São Paulo,  vol. 28,  nº 1, 2002.  Disponível em: http://www.scielo.br/scielo. Acesso em: 19 de Março de 2012.

PIRES, Vera Lúcia. A representação discursiva das subjetividades de gênero na mídia publicitária. In. Fazendo Gênero 8 - Corpo, Violência e Poder. Florianópolis, de 25 a 28 de agosto de 2008. Disponível em: www.fazendogenero.ufsc.br. Acesso em 02 de Setembro de 2012.