1. AS TUTELAS DIFERENCIADAS:

É da Constituição Federal, nomeadamente do artigo 5º, XXXV, que decorre a garantia inafastável do acesso, tanto preventiva, quanto repressiva, a uma tutela jurisdicional. Evidentemente, contudo, não quis a Carta Magna garantir qualquer tutela jurisdicional, mas sim uma tutela, construída dentro de uma ordem jurídica justa, dotada de efetividade para outorgar à parte justamente aquilo que ela obteria caso o direito material fosse voluntariamente cumprido.
O processo, para além do conceito de relação jurídica, afigura-se como um instrumento legítimo posto à disposição da efetiva realização do direito material. Daí por que deve, sempre e sempre, afeiçoar-se aos avanços e anseios da sociedade, sob pena de transformar-se em uma técnica jurídica estéril, só preocupada com a proteção meramente formal dos direitos.
A multiplicidade das relações intersubjetivas e a dinâmica imanente às atividades negociais permitem concluir que cada conflito estabelecido no cumprimento dos direitos materiais possuem as suas especificidades, de modo a impossibilitar que sejam protegidos por uma única espécie de técnica processual.
Noutros termos, não se pode conceber, diante das particularidades de cada relação estabelecida no âmbito do direito substantivo, haja apenas uma modalidade
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procedimental para assegurar a tutela jurisdicional. O direito processual, em que pese a sua autonomia científica, não pode se manter indiferente, neutro, às diversas situações do direito material.
Como pondera Kazuo Watanabe:
“por mais que se consiga reduzir à expressão mínima as formalidades do procedimento comum e por melhor que seja a organização judiciária, sempre haverá direitos, pretensões materiais e interesses legítimos que, pela sua natureza, sua simplicidade ou pela urgência da tutela em razão da iminência de dano irreparável, exigirão processos diferenciados, seja em termos de procedimentos de cognição plena e exauriente ajustados às peculiaridades das situações substanciais controvertidas, seja em forma de procedimentos de cognição sumária, que atendam aos reclamos de extrema rapidez na concessão do provimento jurisdicional.”1
Nesse exato contexto plural, em contraposição as chamadas tutelas comuns, obtidas mediante um procedimento ordinário, surgem as tutelas diferenciadas, obtidas mediante um procedimento especial, com a promessa de garantirem ao jurisdicionados um iter procedimental adequado à especificidade do direito material, como corolário do direito fundamental assegurado no artigo 5º, XXXV da CF, tal seja, da tutela jurisdicional efetiva.
Com efeito, o acesso à justiça garantido no referido enunciado constitucional abrange o procedimento e as técnicas processuais adequadas à consecução de um provimento capaz de transformar a realidade dos litigantes.
Dentro das nominadas tutelas diferenciadas, situam-se as tutelas sumárias, marcadas, sobretudo, por uma cognição não exauriente e por um contraditório,
1 Da cognição no processo civil. 2ª ed. Campinas: Bookseller. 2000, pp. 144/45.
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quando não diferido, ao menos eventual2. A grande discussão que se trava, nesse específico ponto, que constitui o objeto do presente artigo, diz respeito à possibilidade de os provimentos sumários assumirem foros de definitividade (=estabilização), dispensando-se a instauração de um procedimento ordinário.