A escolha do professor alfabetizador
 
 O professor alfabetizador é o profissional que atua no contexto de um projeto pedagógico, um programa curricular, uma área de conhecimento e um período muito específico do nível fundamental de ensino. Os indicadores de êxito de seu trabalho pressupõem : a consolidação do ensino e da aprendizagem da língua escrita e a realização de uma prática diversificada, flexível e sensível ás características culturais, sociais e de aprendizagem dos alunos dos três primeiros anos do Ensino Fundamental.
A escola precisa se organizar para escolher os professores alfabetizadores e os responsáveis pela coordenação pedagógica. O professor alfabetizador trabalha em um momento especial e definidor da trajetória de seus alunos. Embora a alfabetização e o letramento devam ser preocupações de todos os profissionais da educação, por suas implicações em todos os segmentos de ensino, tais processos exigem o reconhecimento de uma identidade profissional, associada á valorização de um conjunto de saberes: aqueles sistematizados pelas diferenças áreas de conhecimento que estudam a língua escrita, sua aquisição e seu ensino, e que dependem de formação acadêmicas, seja ela adquirida em cursos de formação inicial ou de formação continuada; aqueles saberes ditos “práticos” ou “da experiência”, que envolvem conhecimentos e habilidades adquiridos pelo professor ao longo do exercício de sua atividade.
Essa segunda dimensão representa um grande diferencial no perfil dos professores alfabetizadores de sucesso, que acumulam um “saber fazer” que atua de modo decisivo na ação e na reflexão docentes.
Segundo Freire outro saber fundamental á experiência educativa é o que diz respeito a sua natureza com professor preciso me mover com clareza na minha prática. Preciso conhecer as diferenças dimensões que caracterizam a essência da prática o que me pode tornar mais seguro no meu próprio desempenho.
O professor alfabetizador conhece as diferentes dimensões de seu trabalho. É necessário conhecer os pressupostos e as implicações político-pedagógicas dos processos de alfabetização e letramento, bem como as características de seus alunos, suas capacidades em relação á língua oral e escrita e os valores que atribuem á escrita, a sua aprendizagem e á própria escolarização. Um bom alfabetizador sabe quais são os conteúdos e conhecimentos lingüísticos que devem ser enfatizados nos primeiros anos de escolarização; conhece também quais as possibilidades metodológicas adequadas aos objetivos do ensino (a didática da alfabetização), assim como quais são os instrumentos de avaliação adequados ao processo (diagnóstico e intervenções).
Segundo Freire o professor que não leve a sério sua formação, que não estuda que não se esforce para estar a altura de sua tarefa não tem força moral para coordenar as atividades de sua classe. Isto não significa, porém, que a opção e a prática democrática do professor ou da professora sejam determinadas por sua competência cientifica. Ha professores e professoras cientificamente preparados mais autoritários a toda prova. O que quero dizer é que a incompetência profissional desqualifica a autoridade do professor.
O professor alfabetizador se identifica com os alunos com quem trabalha, com seu processo de aprendizagem, com os desafios que encontra ao viver os momentos iniciais de seu processo de socialização na escola. È também sensível ás experiências extra-escolares que trazem para a sala de aula, ao seu processo de pensamento e a sua descoberta.
Segundo Emília Ferreiro quanto mais materiais de leitura for oferecida aos alunos, maiores experiências eles terão com os textos escritos, antes mesmos de combinarem letras e sílabas. Portanto, o repertório variado de gênero textuais que oferecemos neste livro de alfabetização pode ser ainda enriquecido por portadores de textos diversificados, como as revistas, as histórias em quadrinhos, os cartazes de rua, as listas de compra, as placas de nomes de ruas, os cartões-postais, os jornais, os livros de literatura infantil. Ao manusear textos de uso social, o alfabetizando percebe mais claramente a própria função social da escrita. Entenderá que ler não é só uma ação que se realiza na sala de aula, mas que as palavras estão no mundo, em todas as coisas. Dessa forma, formaremos leitores que conhecem mais claramente para que servem a leitura e a escrita.
Ensinar a ler e escrever é trabalhar com diferentes atitudes e disposições em relação á escrita. Isso significa que um desafio a ser enfrentado pelo professor é tanto aceitar lidar com essas diferenças (compreendendo-as e as valorizando), quanto promover, entre alunos, essa aceitação. Assim para trabalhar nesse contexto de diferenças, é importante que o alfabetizador seja capaz de criar um ambiente de parceria e de troca, de modo a favorecer que cada aluno avance em relação ao ponto em que se encontra, ampliando seu universo de referencias não só com a ajuda do professor, mas também dos colegas que possuem distintas experiências.
O professor alfabetizador acredita na capacidade de aprendizagem de todos os seus alunos, independentemente se sua origem social, cultural, ou de outras diferenças apontadas no tópico anterior. O aluno constrói a crença de que vai fracassar quando se sente desestimulado e rejeitado no seu processo de aprendizagem e nas interações em sala de aula. Dependendo de como o professor se manifesta ao avaliar os alunos, estes podem acreditar que não são capazes. Assim, a motivação para estudar e a disponibilidade para aprende são em grande parte resultante da valorização que a criança recebe quando está aprendendo a ler e a escrever, das expectativas afirmativas em relação a suas possibilidades e da auto-estima positiva que poderá se consolidar nesse processo.
Erros e dificuldades de ensino não são obstáculos intransponíveis, mas uma fonte para o aprimoramento e o sucesso. Isso ocorre quando o alfabetizador tem uma atitude investigativa em relação aos problemas que encontra em seu trabalho. Essa atitude está baseada na crença em que todos podem aprender e que as limitações encontradas precisam, portanto, ser compreendidas e interpretadas para que as melhores soluções sejam encontradas. Uma atitude investigativa assume que o processo de ensino-aprendizagem possui uma natureza complexa e que os problemas que nesse processo ocorram precisam de respostas complexas e, quase sempre, pouco generalizáveis. Assim, um alfabetizador não se contenta com respostas “prontas” e superficiais, mas, sensível aos alunos, a suas características, a sua história e a seus estilos de aprendizado, busca compreender seus esforços e resistências na apropriação da língua escrita.
 A criação de um ambiente alfabetizador
A escola pode apresentar situações, contextos e materiais capazes de estimular o interesse e a atenção dos alunos para o mundo da escrita. A escola pode assim, criar um ambiente alfabetizador. Um primeiro aspecto a ser considerado para a criação de um contexto propício á alfabetização diz respeito á circulação, na escola e na sala de aula, dos mais variados gêneros e portadores (ou suportes) de textos. Isto que quer dizer que o aluno deve encontrar oportunidade para se familiarizar com textos diversificados.
Criamos, assim um ambiente alfabetizador quando, para organizar materiais em sala de aula, classificamos os diferentes materiais a serem guardados, os colocados em caixas e discutimos, com os alunos, como identificar essas caixas (escrevendo o nome dos materiais, usando cores, inventado um “código”). Criamos um ambiente alfabetizador quando, para organizar o caderno, precisamos identificá-lo com o nome de seu proprietário e com o nome da disciplina.
Para que, porém, esse ambiente seja uma rica fonte de experiência para os alunos, outra dimensão precisa ser considerada. É preciso, como vimos, que haja textos e usos diversificados e significativos. Mas é preciso, também, que o professor seja uma espécie de “guia” dos alunos do mundo da escrita, não apenas propondo a utilização desse artefato que os seres humanos inventaram, mas também levando os alunos a refletir sobre esses textos e usos, lendo e explicando os livros, jornais e revistas para as crianças, mostrando as razões de organizarmos os textos de formas diferentes, evidenciando as necessidades que nos levam a registrar coisas por escrito, demonstrando como, em certas situações, a fala não é suficiente para fazermos o que temos de fazer.
Segundo Freire a leitura do mundo percebe a leitura da palavra, daí que a posterior leitura desta não prescindir da leitura daquele (...) De alguma maneira, porém, podemos ir mais longe e dizer que a leitura da palavra não é apenas precedida pela leitura do mundo mas por uma certa forma de “escrevê-lo” ou de “re-escrevê-lo”, quer dizer, de transformá-lo, através de nossa prática consciente. Esse movimento dinâmico é um dos aspectos centrais, para mim, do processo de alfabetização.
Pesquisas realizadas visando estudos sobre o fracasso na alfabetização
Os principais dados recentes sobre rendimento dos alunos da escola brasileira resultam de duas avaliações das habilidades de leitura de crianças e jovens. A primeira é aquela realizada pelo Sistema de Avaliação da Educação Básica, o SAEB, desenvolvida pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas da Educacionais Anísio Teixeira (INEP). A segunda é aquela promovida pelo Programa Internacional de Avaliação de Estudantes (PISA), desenvolvida pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) e envolvendo diferentes países.
Os resultados dessas avaliações mostram um quadro alarmante. De acordo com os dados do PISA, no Brasil, a proficiência de estudante de 15 anos em leitura é, significativa, inferior á de todos os outros países participantes da avaliação.
De acordo com os dados do SAEB, na avaliação realizada em 2001 (divulgada em 2003), desde 1995, o rendimento dos alunos se encontra em queda (embora no SAEB 2003 se observe um melhoria no rendimento). Segundo os dados de 2001, apenas 4,48% dos alunos de 4ª série possuiriam um nível de leitura adequado ou superior ao exigido para a continuação de seus estudos no segundo segmento do Ensino Fundamental.
Uma comparação, feita por pesquisadores, entre os resultados no SAEB de alunos da 4ª, da 8ª e do 3º ano de ensino médio, é também desalentadora: o aumento da proficiência em leitura de uma parte para outra série “é bastante modesto, o que significa uma aquisição ainda muita restrita de novas habilidades e competências em língua portuguesa ao longo da escolaridade básica”, a conclusão é uma só e assustadora: um número expressivo de estudantes não aprende a  ler na escola brasileira; essa escola produz um grande contingente de analfabetos ou de analfabetos funcionais. Quer dizer, pessoas que, embora dominem as habilidades básicas do ler e do escrever, não são capazes de utilizar a escrita na leitura e na produção de textos na vida cotidiana ou na escola, para satisfazer ás exigências do aprendizado.

Bibliografias
________________.  Planejamento de alfabetização. Belo Horizonte: Ceale/FaE/UFMG, 2005. (Coleção Instrumento da Alfabetização; 4) ISBN: 85-99372-20-3
 
FERREIRO, Emília. Reflexões sobre Alfabetização. São Paulo: Cortez, 1995.
 
FONSECA, Vitor. Dificuldade de Aprendizagem. Porto Alegre: Artes Médicas, 1998.

FREIRE, Paulo. Pedagogia da Autonomia - Saberes necessários à prática educativa. 29ª ed. São Paulo: Paz e Terra, 2004.