A ESCOLARIZAÇÃO NO ENSINO FUNDAMENTAL: O TRABALHO DESENVOLVIDO POR CICLOS NA REDE MUNICIPAL DE ENSINO DE NOVA IGUAÇU

Albertina Campos Pinho

Graduanda em Pedagogia pela UNIG

1. COMPREENDENDO OS CICLOS DE FORMAÇÃO PARA UMA MELHOR APRENDIZAGEM

A questão dos Ciclos de Formação levou-me a desenvolver este artigo com o objetivo de fazer um aprofundamento teórico sobre o trabalho pedagógico nas escolas desenvolvido por Ciclos, abordando os pontos positivos e negativos desta proposta, haja visto que a Secretaria Municipal de Nova Iguaçu, já implantou esta proposta, inicialmente do primeiro ao terceiro ano de escolaridade, "pecando" porém, por não tê-la discutido com os educadores. Pretende-se aqui, discutirmos sobre a realidade das escolas municipais e reavaliarmos a prática do trabalho por Ciclos de Formação no cotidiano escolar, enfatizando os benefícios dos mesmos e malefícios, quando implantados de qualquer forma e sem preparo satisfatório dos professores. Segundo alguns teóricos da educação, a proposta é boa, porém não é o que temos visto nas escolas deste Município, de que seja tão boa quanto se espera, pois ainda surgem muitas dúvidas por parte do pessoal envolvido com o magistério sobre este trabalho. Daí a nossa preocupação em demonstrar os limites e possibilidades do trabalho por Ciclos – ranços e avanços – na aprendizagem dos alunos; a garantia do sucesso e/ou insucesso da aprendizagem dos alunos e o que é válido e não válido ao se adotar esse sistema. Segundo Lima (2002, p. 9), "seria um equívoco considerar o Ciclo como uma proposta voltada àqueles que não aprendem ou que fracassam. Não se trata de inventar algo para acabar com a repetência", sendo que nas escolas seriadas os alunos sofrem uma pressão no decorrer do ano letivo para absorção dos conteúdos e se não adquirir os conhecimentos propostos pelos currículos há uma retenção deste aluno para série posterior, assim os Ciclos de Formação foram implantados como uma proposta renovadora e que tem como função a humanização, portanto, contrária a perspectiva homogeneizadora, que classifica e exclui a minoria, confirmando as diferenças sociais, transformando em individual o fracasso e conservando as novas gerações na desigualdade. A humanização está comprometida com a sobrevivência e o enriquecimento da condição humana. Com isso, no decorrer deste apresentaremos questões que norteiam os Ciclos de Formação e a teoria aplicada já com sucesso, em escolas de Porto Alegre.

2. CICLOS DE FORMAÇÃO: MITO OU REALIDADE

  • A Origem

A proposta dos Ciclos de Formação concreta e consistente foi realizada por Langevin – Wallon, que tinha como objetivo a reconstrução democrática da França, após a II Grande Guerra Mundial. Herdamos então o modelo europeu de educação pública, notadamente o francês o qual, até muito recentemente, foi fortemente marcado pela estruturação temporal da escola do século XIX. Desde então segue-se a proposta de inserção dos Ciclos, obtendo outra nomenclatura, os quais não são uma novidade pedagógica, mas uma estruturação da escola.

  • Organização

Partindo da Lei de Diretrizes e Bases, percebe-se a flexibilização da organização do ensino que dá margens a esta nova proposta, conforme citado no artigo 23 da referida LDB, parágrafo único:

A educação básica poderá organizar-se em séries anuais, períodos semestrais, ciclos, alternância regular de períodos de estudo, grupos não-seriados, com base na idade, na competência e em outros critérios, ou por forma diversa de organização, sempre que o interesse do processo de aprendizagem assim o recomendar.(BRASIL, 1996).

Assim, os Ciclos propõe a formação de turmas com referência na idade e não somente no conhecimento anterior adquirido, pois firmando a teoria de Piaget que as crianças têm fases de desenvolvimento, as caracterizações cognitivas se dão naturalmente e não são construídas a partir de atividades oportunizadas pela escola. Exemplificando, ao se alfabetizar uma criança e um adulto a escola necessitará de situações educativas diferenciadas, cada idade responderá de forma diferente a mesma situação vivenciada e observada.

Os Parâmetros Curriculares Nacionais estão organizados em Ciclos de dois em dois anos, mais pela limitação conjuntural em que estão inseridos do que por justificativas pedagógicas. Da forma como estão aqui organizados, os Ciclos não trazem incompatibilidade com a atual estrutura do ensino Fundamental. Assim, o primeiro Ciclo se refere às primeira e segunda séries; o segundo Ciclo, à terceira e quarta séries.(PCN's, Volume 1, p. 62).

2.1. O Trabalho por Ciclos

A Progressão tem sido alvo de dúvidas e até de descaso por parte dos educadores e até mesmo da família dos alunos. Segundo o Ciclo de Formação, a Aprovação Automática de alunos se dá de três maneiras: a Progressão Simples – em que o aluno avança para o ano seguinte sem apresentar dificuldades na aprendizagem durante o ano que se encerra; a Progressão com Plano Didático de Apoio, onde o aluno avança para o ano seguinte, obtendo dificuldades de aprendizagem sendo que haverão atividades extras para o aluno no próximo ano; Progressão com Avaliação Especializada, na qual inclui atendimentos especializados inclusive fora da escola para que sejam sanadas as dificuldades de ensino-aprendizagem. Nestas três formas de "Progressão" citadas, o aluno avança para o ano seguinte, sendo que aqueles que precisarão de um acompanhamento, devido às suas dificuldades, precisarão de um comprometimento maior da família e professores. Existem também as Turmas de Progressão que possuem um menor número de alunos, geralmente não mais que vinte, obtendo um planejamento diferenciado e que ajude a inserir o aluno com diversas repetências, devido ao sistema seriado, ao Ciclo adequado a idade.

As Turmas de Progressão se darão da seguinte forma:

Organizar-se-ão, em cada Ciclo, Turmas de Progressão, visando atender os educandos com defasagem entre sua faixa etária e a escolaridade, realizando aí um trabalho direcionado para a superação das dificuldades e lacunas apresentadas por cada um dos educandos que estiverem nesta condição.(Smed, 1996: 12).

As Turmas de Progressão farão com que os alunos sejam enturmados nos anos de Ciclo o mais rápido possível, por isso é uma turma menor e que tende a se extinguir a medida que os alunos vão alcançando os anos de Ciclo correspondentes a sua idade.

Os conteúdos das escolas com Ciclos devem ser direcionadas pela necessidade de transformação da percepção do mundo das crianças e adolescentes. É necessário estar conforme a visão de mundo da comunidade escolar e seus problemas mais significativos, as fases de desenvolvimento da criança, as relações coletivas na construção do conhecimento e a perspectiva de uma escola prazerosa, organizada para o sucesso dos estudantes e não para o seu fracasso. Os Parâmetros curriculares adotam:

A proposta de estruturação por Ciclos, pelo reconhecimento de que tal proposta permite compensar a pressão do tempo que é inerente `a instituição escolar, tornando possível distribuir os conteúdos de forma mais adequada à natureza do processo de aprendizagem. Além disso, favorece uma apresentação menos parcelada do conhecimento e possibilita as aproximações sucessivas necessárias para que os alunos se apropriem dos complexos saberes que se intenciona transmitir. Sabe-se que, fora da escola, os alunos não têm as mesmas oportunidades de acesso a certos objetos de conhecimento que fazem parte do repertório escolar. Sabe-se também que isso influencia o modo e o processo como atribuirão significados aos objetos de conhecimento na situação escolar: alguns alunos poderão estar mais avançados na reconstrução de significados do que outros.(PCN's, Volume 1, p.59)

Krug (2002) entende que, os conteúdos aplicados aos alunos durante sua permanência no Ciclo, deveria ser organizado a partir de pesquisas realizadas na comunidade para detectar questões – problemas da realidade vivida e a realidade percebida pela comunidade. E após essa pesquisa discutir com docentes, discentes e representantes da comunidade o eixo central dos conhecimentos a serem trabalhados na escola.

Os Ciclos de Formação são uma nova forma de rever e estrutura o tempo escolar e uma melhor adequação a compreensão as formas de desenvolvimento de cada indivíduo.

O ensino fundamental terá duração de nove anos de escolaridade, o primeiro Ciclo será de três anos, e os demais de dois anos até a conclusão do ensino fundamental, haja visto que cada Município optará para forma de organização que lhe for cabível ou conforme o MEC propor.

A implantação dos Ciclos se deu para melhoria no processo de aprendizagem, há muitas críticas existentes a respeito desta proposta e por um outro lado existe o sistema seriado. Entres os defensores das séries, muitos tratam os Ciclos como uma farsa, referem-se a aprovação automática como algo que retira a autoridade do professor. Diz-se que os Ciclos são um pretexto para encobrir o mau desempenho escolar e diplomar analfabetos. Os que optam para os Ciclos, as séries são como uma opção conservadora e autoritária, pois encaram a reprovação ao fim de cada ano como uma punição aos alunos pela má educação de que são vítimas. Quando o aluno é retido no sistema de seriação, a tendência é que haja desmotivação desses alunos e assim o leve ao fracasso e a evasão escolar. Contudo, não se deve mascarar a situação das escolas seriadas, os alunos que estão nos Ciclos são os mesmos das séries, a mudança ocorreu no sistema e não com os alunos.

A reprovação escolar prejudica os alunos provocando nos "reprovados" um aumento na dificuldade de aprender, o reforço de suas dificuldades, além de desconhecer aspectos quanto ao desenvolvimento da memória, da consciência e da emoção sempre irreversíveis sobre as aprendizagens realizadas e que influem fortemente na relação com o conhecimento.(Krug, 2002, p. 49).

Deve-se então repensar de como se tem feito o trabalho nas salas de aula, independente, do sistema proposto e encontrar meios para que o aluno chegue ao sucesso e não achar que somente os Ciclos de Formação são uma forma de "salvar" esses alunos. Em qualquer um dos regimes, contudo, a chave é a avaliação do aprendizado, pois é essencial não para "definir quem passa", mas para adequar o ensino, todos podem aprender, mesmo crianças em condições sociais difíceis ou com limitações pessoais severas. Segundo Krug (2202, p. 53), "no sistema seriado que compõe a tradição de um conjunto de geração de professores, há alunos que chegam ao vestibular sem saber escrever, obtendo nota zero nas redações". Nos Ciclos não há reprovação de uma série para outra, mas há entre um Ciclo e outro, portanto, de duas em duas séries. Como criticar a seriação se o Ciclo adota esta prática, de dois em dois anos. O primeiro Ciclo é a base da criança, por ser o início da vida escolar do aluno, onde necessariamente ele deveria ser alfabetizado, mas a realidade difere-se quando se analisa que os alunos que chegam a terceira série no município de Nova Iguaçu, não conseguem ler e escrever, já que a "reprovação" é proibida nos Ciclos, ao menos que o percentual de freqüência seja inferior a setenta e cinco por cento.

2.2. Os Ciclos no Município de Nova Iguaçu

Desde o ano 2000 o Ensino Fundamental da rede pública municipal iniciou com o Sistema de Progressão (Ciclos) com duração de nove anos letivos, divididos em dois segmentos, descrito no artigo 2 da Resolução SEMED número 007/99, no ano 2000 houve uma alteração neste artigo, tornando-se parágrafo único, passando a ter a seguinte redação, "O primeiro segmento terá a duração de cinco anos (classe de alfabetização até quarta série) e o segundo segmento, de quatro anos (quinta série até oitava série)", (Portaria número 001/GS/2000). Existe apenas o primeiro Ciclo e os demais anos são conforme o sistema de seriação. Acontecendo da seguinte forma, no primeiro Ciclo os alunos têm aprovação automática, porém é preciso que haja setenta e cinco por cento de freqüência, caso contrário o aluno é retido e permanecerá no mesmo ano do Ciclo ao qual não houve freqüência suficiente, também podendo ser retido, apenas uma vez, no final do primeiro Ciclo caso não atinjam os objetivos propostos conforme a Resolução número 007/99. Este Ciclo será dividido por Etapas: primeira etapa, segunda etapa e terceira etapa, respectivamente, classe de alfabetização, primeira série e segunda série, conforme o sistema seriado, e da terceira série até ao final do ensino fundamental terão o sistema seriado cujo os alunos não serão promovidos caso haja freqüência inferior a setenta e cinco por cento e por não alcançarem a meta proposta pelos professores no decorrer do ano letivo. Seguindo a Portaria número 001/GS/2000 no artigo 3, inciso III, haverá um relatório conclusivo no qual o professor irá redigir o aproveitamento escolar do aluno, cuja avaliação será diagnóstica e continuada, sem caráter reprobatório e este relatório deverá ser feito ao final de cada semestre.

Na rede municipal de educação de Nova Iguaçu a proposta tem sido aplicada, mas não absorvida com satisfação, pois a realidade tem sido uma proposta que traz desconforto para muitos docentes e discentes no âmbito educacional, devido o grande índice de alunos que ao saírem do primeiro Ciclo ainda não sabem ler e escrever, enquanto que há outros pontos de vista que beneficiam como o baixo índice de evasão escolar. Na fala de alguns professores percebe-se que independente dos Ciclos é necessário o comprometimento dos profissionais, sendo Ciclo ou Série o conteúdo deve ser aplicado, a vivência do aluno deve ser respeitada, para que a avaliação seja prazerosa e dê bons resultados. Ocorre que desde que foi implantado pelo governo do prefeito Nelson Bornier até a posse do atual governo a proposta continua, devido uma perspectiva educacional a proposta tem dado certo e vem avançando cada dia.

2.3. As Políticas Públicas

A substituição do sistema de seriação pelo sistema de Ciclos não só uma mudança nos parâmetros de avaliação no interior da escola, implica numa mudança de cultura da escola. Os Ciclos mais do que um fim são um meio para propiciar uma reflexão sobre a cultura da escola e, eventualmente, sua modificação segundo uma lógica de inclusão, que lhe é estranha. Isso significa que há uma batalha cultural e ideológica a ser travada na escola quando se adota uma política de Ciclos em substituição à seriação. Podemos observar que, desde que foi detectado o grave problema da reprovação nas escolas públicas, têm se estabelecido e implementado políticas públicas de educação que levaram à instituição de programas de promoção automática, avaliação continuada, progressão continuada e Ciclos básicos para as duas primeiras séries do Ensino Fundamental. Tais políticas vêm crescendo e populariza-se a idéia da organização da escolaridade em Ciclos e da não interrupção da mesma nos anos iniciais de escolarização. O objetivo é identificar em quais redes de ensino do estado do Rio de Janeiro vem sendo implementadas políticas de Ciclos e, trabalhar junto a professores de diferentes redes municipais, suas concepções acerca dos Ciclos e da práticas avaliativas de tal organização, promovendo uma maior reflexão e que esta possa gerar mudanças em suas práticas.

O que temos visto são governantes adotarem esse tipo de política, mas se absterem de enfrentar a disputa na escola. Dessa forma, transformam essa medida que poderia ter um imenso potencial de transformação em uma reforma sistemática, visando apenas melhorar índices de conclusão e permanência no sistema. A definição do que vai ser o instrumento de avaliação, tem um poder diretivo e não pode ser subestimado. Neste momento, o poder do Ministério da Educação tem de moldar comportamentos, mesmo sem ter responsabilidade direta pela gestão, talvez seja maior do que em outras mudanças aplicadas na área educacional. É preciso recolocar em discussão a necessidade de se democratizar esse poder de definir o que deve ser avaliado e como se deve avaliar. O discurso original era de buscar uma escola inclusiva. Entretanto, não se observaram, até o momento, políticas que buscassem atacar as dificuldades e desigualdades no interior do sistema, ao contrário o que tem se visto é apenas um estímulo de competição entre o sistema de seriação e os Ciclos de Formação.

3. Considerações Finais

O sistema de "progressão continuada – promoção consciente" é uma proposta que necessariamente está embasada em fundamentos pedagógicos, para fazer com que o aluno aprenda, independentemente, de ter prova ou não. È necessário que o professor tenha incentivos, uma formação continuada, há uma série de requisitos que são absolutamente indispensáveis. Não se pode estabelecer uma regra que diga, aprendizagem de um alado, repetência do outro, o aluno só aprende se repetir, não dá mais para encarar esse tipo de argumento. Não se pode ignorar o projeto educativo, desmoralizar as avaliações, esconder as deficiências do ensino ou defender a exclusão por repetência usando como pretexto a disputa entre Ciclos e Séries.

4. Bibliografia:

BRASIL,Parâmetros Curriculares Nacionais. 3. ed. Brasília, 2001.

KRUG,A. Ciclos de Formação: Uma proposta transformadora. 2. ed. Porto Alegre: Mediação, 2002.

NOVA IGUAÇU, Resolução SEMED, número 007/99.