A escola sem educação

 

O universo da educação, de tão amplo que é, produz as mais diferentes situações que vão desde a possibilidade de realização pessoal e profissional até os dramas que perpassam o dia-a-dia de muita gente.

Quando falamos em educação, a maioria de nós pensa naquilo que ocorre nas escolas. Mas precisamos distinguir entre educação e o processo de ensino que ocorre na escola.

Na escola se dá o processo de ensino por meio do qual as gerações mais novas e/ou com menos experiência em algum setor, são instruídas pelos mais experientes a respeito de diferentes situações e atividades que devem ser desenvolvidas, mas que, para tanto, demandam certo treinamento. Aqui, o motor do processo da educação escolar deveria ser as exigências e necessidades do mercado de trabalho. Entretanto, de modo geral, entre o que oferece a escola e o que necessita o mercado há um grande descompasso.

Mas é pensando na qualificação que as pessoas vão à escola, querendo treinamento: treinar para desenvolver a capacidade da escrita; a capacidade da leitura; a capacidade de administrar empreendimentos; a capacidade de defender os interesses de quem se sente lesado; a capacidade de curar pessoas, curar animais, planejar residências... e até desenvolver a capacidade de ensinar outras pessoas.

A escola também serve para isso: ensina a ser professor!!!

Para isso existem as escolas: para desenvolver a capacidade de aprender e dominar conhecimentos os quais podem produzir novas tecnologias. Aprendizado que ocorrerá a partir da experiência acumulada, com as pesquisas realizadas, com os fracassos assimilados (os quais viram lições)...

Educação também se ensina. Mas se trata de algo que se aprende antes da escola. Onde ocorre a educação: em casa, na rua, com os amigos, no ambiente de trabalho... nessas relações se aprende a cultivar os valores consagrados: respeito ao mais velho, calar-se quando outro está falando, apagar a luz ao sair de um ambiente, jogar lixo na lixeira, detestar a corrupção, ser honesto... ajudar quem está em dificuldade... No processo educacional aprende-se os valores que se aprende (ou dever-se-ia aprender) antes da escola. Os valores deveriam ser plantados, feito semente, no caráter fértil das crianças ainda no circulo doméstico. Os pais e mães deveriam ser os promotores desse processo, apoiando os avanços e aplicando sanções para as transgressões.

O problema da conjugação destes dois universos ocorre no momento em que os pais – e a sociedade – começam a transferir para a escola (que tem a função de ensinar as letras e as ciências) a responsabilidade pela educação (promoção dos valores socialmente aceitos).

Como consequencia disso, principalmente por causa da sobrecarga de funções, a escola acaba não dando conta nem de uma nem de outra. Os estudantes que deveriam chegar à escola já educados, chegam xucros, animaizinhos atirados numa jaula. E o tempo que deveria ser aplicado ao ensino, perde-se na tentativa da educação que não acontece porque a escola não nasceu para isso. Pior ainda, pois dos professores – e da escola – foi retirada a prerrogativa de fazer observar os valores que são necessários para o aprendizado das letras e das ciências.

A educação se faz na medida em que se estabelece valores e se condena os anti-valores para a sociedade em que se está inserido. Na medida em que se incentivam os direitos cobrando o cumprimento dos deveres....

E os pais – e a sociedade – querem que a escola ensine as ciências, ao mesmo tempo transmita os primeiros passos da sociabilidade. Mas, como disse, a capacidade de viver em grupo, respeitando direitos e assumindo deveres, deveria ser desenvolvida ainda no ambiente familiar.

Nestas alturas você deve estar se perguntando: o que é que estou querendo dizer com todas essas considerações? Quem está interessado nessa conversa de professor?

Respondo: educação não ocorre sem um caminho traçado inicialmente pela família e a sociedade e complementada pela escola. Ocorre que estamos perdendo esse rumo...

De um lado a família cada vez mais desestruturada... uma instituição quase falida, pois ainda não se encontrou nem encontrou valores para se nortear nos dias atuais; do outro lado a sociedade que produziu valores (consumo, moda, estilo, isolamento...) com os quais não está se adequando, o que produz um esvaziamento da humanização pois os valores atuais se contrapõem aos valores tradicionais.

No meio disso a escola, atropelada pelas novas exigências tanto das famílias como da sociedade e do mercado de trabalho, mas sem critérios para responder aos novos desafios do mundo atual! Os critérios antigos – regras, limites e sanções quando estes eram transgredidos – já não cabem mais. Em lugar disso, ocorre o “liberou geral” em que a balburdia das crianças e adolescentes têm mais peso do que a voz do professor.

Nesse ambiente toda tentativa de estabelecimento de regras e limites é vista como abuso de poder, ditadura ou autoritarismo. E assim, a sociedade em crise, sem rumo, produz a atual escola sem educação!!!

 

Neri de Paula Carneiro – Mestre em Educação, Filósofo, Teólogo, Historiador.
Rolim de Moura - ro