A Era da Sociedade Sustentável ? E.S.S.


Não está ocioso apenas aquele que não faz nada, mas também aquele que poderia fazer algo melhor (Sócrates).



Vive-se um momento de transição ímpar na história, quando as mudanças ocorrem de forma inimaginável e em todos os campos sociais. O ser humano não consegue detectar com clareza e real importância e o que de fato está ocorrendo.

A revolução tecnológica recente nivelou o campo de atuação das economias globais, possibilitando que muitos por todo o mundo pudessem competir, conectar-se e usufruir em tempo real das benesses do processo fantástico de globalização. Ao mesmo tempo criou-se a economia do descarte, onde o consumo desenfreado escasseia os recursos naturais sem permitir que o planeta se recomponha a seu tempo.

Em 1798 o eminente economista inglês Thomaz Malthus profetizou que o mundo iria caminhar para uma tragédia em face do aumento geométrico da população e aumento aritmético da produção de alimentos. Mas a Revolução Verde dos anos 1940 a 1970 mudou esse cenário catastrófico: o ser humano com sua inteligência e inventividade, diante de um enorme desafio, desenvolveu tecnologias que propiciaram ganhos fantásticos de produtividade e desarmou a bomba demográfica prevista na teoria malthusiana do caos.


O início de uma nova era

Em 01/01/2000, começo do terceiro milênio, iniciou-se o processo lento gradual e irreversível do término da civilização dos combustíveis fósseis e início da Era da Sociedade Sustentável ? E. S. S. Vive-se üma transição para a ecologia da prosperidade, com uso de redes inteligentes de fontes de energias renováveis e limpas, sob a égide de sistemas sustentáveis voltados a perseguir sem tréguas o equilíbrio climático. Projeções dão conta de que até 2050 as energias renováveis representarão 50 % das matrizes energéticas mundiais - talvez o maior evento contributivo dos humanos para esse equilíbrio.

Essa nova época, que alguns cientistas denominam de antropoceno face às interferências radicais do ser humano nos recursos naturais, iniciou-se com a Revolução Industrial, com o uso de máquinas a vapor e desembocou no petróleo como principal propulsor energético mundial.

A história é construída por uma série de eventos e não por forças ou ideias de trajetória previsível. Galileu em 1609 fez uso científico do telescópio para apontar o heliocentrismo em contra ponto ao geocentrismo. Esse evento mudou os rumos do planeta. Quais serão os atores que identificarão os eventos desse momento especial e irão liderar o processo de grandes inovações e soluções de uma nova época? Quais serão os alijados que estarão à margem desse processo?

A construção de uma sociedade sustentável, entre muitos outros eventos, demanda a criação em escala global de um "Código Verde", para implantar uma nova revolução tecnológica, social e ambiental. Todos os preceitos desse código devem estar voltados a combater a maior crise coletiva mundial, o aquecimento global provocado por mudanças climáticas. Demanda a adoção de novas posturas comportamentais, com mudanças nos atuais padrões de consumismo e produção. Este processo requer muito tempo e mudanças culturais em todas as correntes sociais, lastreadas em questões de ética e justiça social, principalmente na reeducação do consumismo devorador de recursos naturais do sistema capitalista.

A cada período de 15 anos, 1 bilhão de pessoas sedentas de consumo e novidades ingressam no planeta. As preocupações com o futuro não estão centradas somente no incremento populacional e na possível escassez de recursos naturais para abastecer todas as espécies que causam preocupações, mas também as mudanças climáticas e os enormes conflitos sociais advindos dos desequilíbrios estruturais que tais mudanças acarretam.

Desafios e oportunidades

Nos últimos cem anos o ser humano emporcalhou de tal forma o meio ambiente que as temperaturas médias globais subiram cerca de 1º. C, com maior intensidade a partir dos anos 1970. A distância entre o desequilíbrio climático de um mundo gélido e em equilíbrio é de apenas 5 a 6º. C, e já se comprometeu até o final do século XXI um acréscimo de ao menos 2º. C em face dos gases de efeito estufa já expelidos na atmosfera desde a Revolução Industrial. Portanto, ou entramos numa nova era de sustentabilidade social, econômica e ambiental ou seremos mais uma das 99 % de espécies que por aqui estiveram e se foram para sempre.

Um pesado imposto será cobrado das futuras gerações, caso não haja deslocamentos abruptos da atual zona de conforto, por iniciativa daqueles que têm que fazer a diferença. Há quatro fatores principais que caracterizam a insustentabilidade da atual civilização, a médio e longo prazo:

1 - crescimento populacional exponencial;
2 - destruição da base de recursos naturais (água, solo, ar, biodiversidade);
3 - sistemas produtivos usuários de energia poluente e de baixa eficácia energética;
4 - expansão ilimitada de consumo.

No ano de 2010 o mundo tornou-se urbano, quando mais de 50 % da população mundial passou a viver em cidades. Apesar de possuírem somente 2 % da área do planeta, as cidades abrigam mais de 50 % da população mundial. Esse é mais um fator de pressão contra os já escassos recursos naturais do planeta.

Fazer com que toda a humanidade tenha um padrão de vida digno, com acesso a alimentação adequada, saúde, educação, energia e oportunidades de trabalho é um enorme desafio, mas possível de realizar-se. Proteger o meio ambiente não deve impedir o desenvolvimento das nações, principalmente das nações menos favorecidas, como os países africano. Em relação à pobreza, alguns números assustam:

- pobreza de renda: 2 bilhões vivem com menos de US$ 2 por dia e a cada oito segundos morre uma criança por desnutrição;

- pobreza de acesso a energia: 1,6 bilhões de pessoas sem eletricidade;

- pobreza de falta de água: 1,8 milhões de mortes/ano por ausência de saneamento, higiene e água potável.

Em contrapartida a esses números negativos, nunca antes na história da humanidade, tantos vivem com tanta fartura, longevidade, conforto e inúmeras e modernas opções de consumo.

Como se pode medir o meio ambiente e criar parâmetros de controle? A economia de um país é mensurada por seu PIB (Produto Interno Bruto), e sua qualidade de vida e bem estar por seu IDH (Índice de Desenvolvimento Humano), índices já consagrados mundialmente.

Há muitos indicadores de mensuração do status ambiental, como quantidade de emissão de carbono; nível de tratamento de água e esgoto; áreas de proteção permanente; nível de biodiversidade; composição de matrizes energéticas - mas ainda não existe um índicador ambiental global de domínio público.

A Noruega recentemente juntou mais de 300 indicadores internos de status ambiental e transformou-os num único índice. O difícil é tornar esse ou qualquer outro processo de mensuração ecológica universal e consistente.

Remodelar e reinventar o futuro

A construção de uma nova forma de viver exige deslocar o eixo do crescimento e do desenvolvimento econômico para o eixo da construção de uma sociedade sustentável. Frei Betto retrata essa nova forma de vida em uma frase simples e brilhante: "...vivemos uma mudança de época e não uma época de mudanças...". Essa época é a sociedade sustentável.

Sustentabilidade significa criar alicerces econômicos, sociais e ambientais duradouros, que possam ser usufruídos de forma justa e igualitária por todas as gerações atuais e futuras, de qualquer classe social, credo ou cultura. Já a sociedade sustentável é aquela que é autônoma e democrática na busca por um futuro comum que garanta qualidade de vida e bem estar a todas as formas de vida, sem diminuir as possibilidades de usufruto das gerações vindouras.

Para ser sustentável, qualquer empreendimento humano deve ser ecologicamente correto; economicamente viável; socialmente justo; e culturalmente aceito. Para ocorrer a sustentabilidade plena, faz-se necessário o alinhamento dos três setores da economia:

- primeiro setor, o poder público (Governos), detém o poder, mas com pouca eficácia;

- o segundo setor, o poder privado (Empresas), possui o capital, mas falta-lhe, por vezes, a credibilidade;

- o terceiro setor (ONGs, Fundações), tem idéias e credibilidade, mas escassos recursos financeiros.

Além de alinhar os três setores de uma economia, há que se conciliar também visões antagônicas. Ecologistas trabalham ora sobre uns poucos metros quadrados de um pasto, ora sobre a biosfera e economistas têm uma visão fechada e autorreferencial das variáveis mercadológicas, dando pouca importância às demandas ambientais. A busca pelo equilíbrio em prol da sobrevivência das espécies é um desafio que exige sacrifícios e altruísmo e sua obtenção virá pelo amor ou pela dor.

Acelerar a transição para um futuro sustentável significa superar a inércia das pessoas e instituições. O ataque japonês em Pearl Harbor em setembro de 1941 uniu os EUA por uma causa: cruzou-se um limiar rapidamente. Haverá tempo suficiente para uma união global que permita a construção de um novo paradigma, uma economia de baixo carbono na sociedade sustentável? As convenções das Nações Unidas esforçam-se para isso, mas consenso global em área tão complexa demanda líderes visionários diferenciados. Onde estão?

O importante é entender que a natureza se auto-regula, tem capacidade de se restabelecer mesmo após uma guerra nuclear generalizada. A espécie humana desapareceria, mas a natureza continua a existir e por alguns mecanismos, recompor-se-ia, por suas próprias forças. Este processo pode levar milhares de anos e esta é a escala de tempo da natureza, ao passo que a evolução da humanidade se mede em décadas ou séculos. Dessa forma, não é o ser humano que protege a natureza, mas sim a natureza, em equilíbrio, que proporciona a preservação da vida.

A humanidade tem tomado grandes decisões por prazos curtos e não em níveis globais. Agora a decisão tem que ser global, democrática e em horizontes de vinte, cinquenta, cem anos, para povos de todas as raças, credos e culturas em relação a como se produz energia e como se trata o meio ambiente. O planeta já está impondo seus limites e cabe à inteligência humana interpretá-los e instituir um novo protocolo sustentável de vida: o código verde. Mais que nunca a vontade de o ser humano se preparar para seu maior desafio, o aquecimento global, tem que ser maior que a vontade de vencê-lo.