A Educação de Jovens e Adultos e o tempo de aprender.

Sebastião Maciel Costa*

            A Educação de Jovens e Adultos (EJA) é um segmento destinado aos jovens e adultos que não tiveram a oportunidade de completar os estudos da Educação Básica na idade correta, desenvolvendo habilidades para uma melhor interação com as novas ferramentas disponibilizadas pelos avanços tecnológicos e com a vida que exige, a cada dia, novas posturas. Enquanto mecanismo de equiparação e regulação das propostas educacionais, o a EJA é um parâmetro de ajuste e instrumento de mediação entre o ensino regular e uma realidade sócio-política que identifica-se como sendo uma espécie de desencontro entre os deveres de uma criança que vai à escola e aquela a quem foi negado esse direito “inalienável”.

            Com o tempo, políticas públicas educacionais e apelos de pensadores trazem uma nova chance: educar jovens e adultos –fora do tempo – mas não fora de propósito; com um novo enfoque e discurso, mas não com um currículo diferente; um currículo que qualifica mas não engessa, exatamente por respirar o conhecimento prévio, socializar experiências interagir por ser este o eixo da produção da aprendizagem. “Diz-me, e eu esquecerei; ensina-me, e eu lembrar-me-me; envolve-me e eu aprenderei” (provérbio chinês). Nesse contexto de envolvimento, a EJA traz uma luz para o grande entrave que compromete a efetivação da a aprendizagem que é a valorização do aluno enquanto agent4 de sua própria história e condição de vida.

No Brasil, pelas próprias condições sócio-culturais em que vive grande pare da população nas periferias metropolitanas, pequenas cidades e, principalmente, na zona rural predominante na Região Nordeste, discutir Educação termina por se resvalar pelas entranhas de um povo que luta a cada dia, para, pelo menos sobreviver. Com modelo de economia e estruturação social, a distribuição de renda representa um vácuo entre as camadas sociais que constituem a pirâmide da sociedade, em todos os tempos. É preciso trabalhar para garantir o sustento da grande prole. É preciso puxar “terra para os pés” durante o dia, caminhar muito de retorno a casa para repousar o mínimo que o corpo pede, para que no outro dia seja  possível produzir o necessário ao sustento, submetendo-se às intempéries que sempre vêm de encontro ao que se idealiza como meta na rotina do trabalhador brasileiro. Tem sido assim por  diversas gerações: estudar é privilégio das classes favorecidas, uma elite dominante que traz consigo a marca do poder pelo saber.

 Essa realidade obriga muitas pessoas a não  frequentarem a escola. Somam-se a esses problemas econômicos a falta de incentivo governamental, as precárias condições de vida e moradia e por que não dizer a falta de incentivo da família obrigada a trabalhar muito cedo e sempre. Nas grande cidades, esses elementos também se submetem a esforços sub humanos, ocupando lugar em empregos informais e pior, em subempregos muitas vezes insalubres para sua tenra idade ou, simplesmente para cuidarem de seus irmãos mais novos para assim liberarem os adultos a sair para ganhar o pão e assim por diante.

Para alguns os estudos são  interrompidos na adolescência. Analisando os efeitos dessa interrupção abrupta e, por que não dizer, criminosa,  emocionalmente os prejuízos são mais graves. Ter consciência da “luz do conhecimento” e não poder continuar compromete  ainda mais  a vontade de querer voltar à escola. As crianças que hoje não vão à escola, serão os futuros jovens e senhores semianalfabetos que não tiveram a oportunidade de passar pelas cadeiras da Educação Infantil, do Ensino Fundamental e tão pouco do Ensino Médio. É um ciclo sem fim, uma vida de sub reconhecimento.

Entender esse processo requer iniciar pela compreensão da estrutura biológica e social que sustenta a aprendizagem dos alunos dessa modalidade de ensino, em especial, os adultos. Nesse sentido, há uma gama de estudos sobre o desenvolvimento psicológico e a aprendizagem da criança, que tem contribuído para as transformações no campo da educação e avanços no entendimento da adolescência. Entretanto, com relação ao adulto verificamos uma carência de investigações sobre sua aprendizagem, pois por muito tempo acreditou-se no estereótipo de que pessoas adultas e idosas não teriam mais capacidade para aprender ou que apresentariam muita dificuldade.

As dificuldades são inúmeras para os que abandonam a escola, passando por momentos que, para nós leitores, são desconhecidos tais como: pegar ônibus sozinho, fazer uma compra seguindo uma lista, anotar um recado importante após uma ligação, perder uma vaga de emprego por não saber ler ou não ter a qualificação desejada no perfil, sem possibilidades de crescer na carreira e tantas outras situações.

A Educação de Jovens e Adultos na perspectiva da recuperação do tempo perdido reveste-se de um sadia oportunidade para  resgate da dignidade humana daqueles que dotados de incentivos e vontade retornam aos bancos escolares para trilhar novos desafios e melhorar as condições de vida e quebrar a hegemonia histórica de pessoas sub informadas que deveriam permanecer na informalidade sócio-econômica. Entender o percurso dessa modalidade de educação no Brasil e traçar um perfil desses sujeitos. Nessa etapa da vida também há espaço para grandes aprendizagens e conquistas, e os profissionais da educação já entendem essas mudanças para ajudar a romper com o estereótipo de que as pessoas em processo de envelhecimento não têm mais idade para aprender.

Na prática, observa-se que o processo  ensino-aprendizagem do aluno a Educação de Jovens e Adultos, via de regra tem registrado ganhos muito mais significativo do que o que se registra na escola da criança com série-idade compatíveis com o seu tempo. Isso procede pelo fato de que o sistema escolar ainda traz os ranços de uma prática pedagógica calcada no saber do professor, no universo representado pelo espaço escolar. Nesse viés retrógrado o saber do aluno não é reconhecido, à criança não cabe pensar. Para o aluno da escola de adulto, a escola é lugar de sistematização de saberes, onde sua história de vida, seus anseios, sonhos e perspectivas se transformam em objeto de estudos, análises e cristalização de experiências que se aglutinam para formar um currículo dinâmico que por meio da interação reveste-se da aprendizagem necessária à mudança de olhares e posturas, para melhoria da qualidade de vida. O aluno de EJA tem uma história, um saber vivenciado que jamais poderá ser deixado em segundo plano quando alcança a escola. Essa se torna apenas no fórum da discussão, no espaço para a troca de experiências e interação e ideais.

Hoje é notável a expansão da educação básica, e há um quantitativo de vagas cada vez mais crescente a fim de fazer jus ao princípio da obrigatoriedade "toda criança na escola". A Educação e Jovens e Adultos em muitos casos se constitui na única alternativa de inclusão social para os alunos que já estão fora do sistema de ensino. Diante desta realidade novos métodos de ensino precisam ser experimentados, novos conteúdos, novas estratégias. Precisam ser oferecidas condições para que os alunos possam construir suas ideias a partir de suas experiências, tornando-se sujeitos sócio-culturais aptos a conhecer diferentes épocas e lugares, e poder compará-los com sua própria história de vida. (LDB Apud –ANJOS)

Ao pensarmos na EJA, verificamos a necessidade de compreender as complexidades do ser humano, jovem e adulto, pois sabemos que esses sujeitos são diferentes e apresentam estruturas biológicas e experiências sociais que requer pensá-los em suas individualidades, principalmente no processo de aprender. Há uma redução natural dos recursos perceptivos com o aumento da idade que afeta o desenvolvimento cognitivo e a maneira como o indivíduo interpreta os fatos. Com isso, apontamos que o público da EJA, merece uma atenção especial, pois engloba educandos em diversas fases da vida, que apresentam mudanças diferentes e em tempos diferentes.

            Orientar adultos a aprender é andragógico já que conceitua o ensino amplo de educação do ser humano, em qualquer idade. (KNOWLES) -1990). Desta forma, a educação dirigida pelo professor precisa reconhecer em cada aprendiz todo o sistema educacional, incluindo a educação de alto nível, ficou congelada dentro do modelo pedagógico. Segundo a análise de Knowles, o modelo pedagógico preconiza total responsabilidade do professor para as decisões sobre o que será ensinado, como será ensinado e se foi aprendido. A educação dirigida pelo professor credita ao aluno o papel de interagir conteúdos já que suas premissas,resumem-se na necessidade de conhecer, no autoconceito do aprendiz, no papel da experiência, na prontidão para aprender, na orientação para aprendizagem e na motivação.

            Diante disso, é preciso adotar estratégias pedagógicas e metodológicas orientadas para a otimização da formação específica de professores e gestores responsáveis por esse modo de fazer educação, bem como construir uma nova institucionalidade nos sistemas de ensino. Nesse contexto, os educadores precisam estar atentos para as demandas e potencialidades dos sujeitos da EJA, considerando-os sujeitos em todas as propostas e projetos pedagógicos.

Salienta-se que a aprendizagem continua ocorrendo em diferentes períodos do ciclo vital, porém, de forma peculiar, sendo que com as pessoas mais velhas, com um tempo e ritmo diferente e isso requer metodologias de trabalho e políticas educacionais focadas para suas necessidades e interesses. "Não há seres educados e não educados. Estamos todos nos educando. Existem graus de educação, mas estes não são absolutos"(FREIRE, 1979).

A escola tem papel fundamental nesse meio, pois faz parte do contexto social desse aluno e, em razão disso, precisa conhecer a trajetória desse sujeito para tentar compreendê-lo nos seus aspectos biológicos e sociais, podendo, assim, propiciar uma educação de qualidade que priorize as individualidades. Ao realizarmos essa revisão teórica, percebemos a necessidade de mais investimentos que aliem os conhecimentos da educação com as Neurociências, visto que os educadores também precisam conhecer e compreender a influência dos aspectos biológicos e sociais que repercutem na aprendizagem dos seus educandos.

Conclusão:

Quebram-se tabus que envolvem o preconceito de que o jovem ou adulto que frequenta a escola para seus primeiros passos ou retomada de uma caminha interrompida. Confirmam-se prognósticos de que nunca é tarde para aprender e refutam-se possibilidades de defasagens cognitivas. Pelo contrário, o estudante que decide enfrentar o “banco da escola” em vida adulta vem com vontade, propósito e determinação o que não acontece com  criança que no seu lúdico mundo e forma de brincar de viver, termina por se envolver com outros elementos que povoam o seu universo, em detrimento daquilo que para a escola, é fundamental. A EJA é o limite entre o ensinar e o aprender, desde que haja o envolvimento do aluno, da escola, dos sistemas, das tecnologias e vontades públicas.

Cada sujeito possui sua história e cultura. Cada um possui um motivo para continuar estudando ou parar. Cada um tempo para aprender alguma coisa. Saber o que é e  como se dá esse tempo de aprendizagem dos sujeitos-alunos da educação de jovens e adultos é  um permanente desafio. Fazendo uma menção ao histórico e definição da EJA, seus alunos e o que é o tempo de aprendizagem desses alunos..(BALSANELLI).

Como um olhar capaz de cristalizar uma prática de ensino, que no Brasil tem feito história e servirá de inspiração para outras práticas embrionárias que levam, muitas vezes, alunos egressos da Educação de Jovens e Adultos aos anais da Educação Superior adentrando em especializações, mestrados, doutorados e uma infinidades de estudos, pesquisas e mergulhos na história da Educação Brasileira. 

Referências:

ANJOS, André Gustavo Cosme dos. Educação de Jovens e Adultos: a formação de processo Prático-educativo e sua importância no ensino-aprendizagem.

COSTA, Antônio Claudio de Moreira. Educação de Jovens e Adultos no Brasil: novos programas, velhos problemas.

FREIRE, Paulo. Pedagogia da Autonomia: saberes necessários à prática educativa. São Paulo: Paz e Terra, 1996

SOUZA, Maria Antônia de. Educação de Jovens e Adultos / Maria Antônia de Souza –Curitiba: Ibpex, 2011.

(*) Mestrando em Ciências da Educação