A EDUCAÇÃO AMBIENTAL NO COTIDIANO ESCOLAR DE UMA ESCOLA DE ENSINO FUNDAMENTAL: UM ESTUDO DE CASO.

LUANA FRIGULHA GUISSO*, DOUGLAS CERQUEIRA GONÇALVES
Mestrado em Tecnologia Ambiental/FAACZ, email do autor: [email protected]

RESUMO: Esta pesquisa trata de perceber como a Educação Ambiental está inserida no processo de ensino e aprendizagem escolar e identifica como a ação pedagógica escolar e a Educação Ambiental fazem parte das práticas cotidianas do ensinar-aprender, sendo assim assimilada, apreendida e percebida por professores, alunos e comunidade. Concluiu-se que, apesar da pouca capacitação dos professores sobre o tema, muitas atividades ambientais são desenvolvidas durante todo o ano letivo e tanto os alunos quanto a comunidade respondem com grande interesse, criatividade e apreço ao trabalho desenvolvido pela escola.

PALAVRAS-CHAVES: educação ambiental, escola, cotidiano.

ABSTRACT: This research proposes to understand how environmental education is embedded in the teaching and school learning and identify as the pedagogical education and environmental education are part of the everyday practices of teaching-learning, so treated, perceived and understood by teachers, students and community. It was concluded that, despite the few experience of the teachers about the subject, many environmental activities are the undertaken throughout the school year and both, students and community, respond with great creativity, interest and appreciation of the work undertaken by the school.

KEYWORDS: environmental education, school, everyday.


INTRODUÇÃO
A Educação Ambiental (EA) foi instituída como obrigatória com a implantação da Política Nacional de Educação Ambiental, mas, o que se sabe sobre EA, atualmente, ainda é pouco, incipiente e os educadores se esforçam para trabalhar o tema de forma transversal.
Será que todos consideram que a EA é transformadora, em nível de mudança da realidade vivida pelos alunos, e que toda a ação ambiental realizada em benefício da comunidade beneficia o próprio meio ambiente?
Constata-se que ainda hoje, existem profissionais da educação que confundem EA com uma simples aula de Ecologia, não se preocupando com a qualidade de vida e muito menos com o bem estar social da comunidade em que sua escola está inserida.
O objetivo principal deste estudo é identificar, através da análise e da ação pedagógica da Escola de Ensino Fundamental Abílio Costa, se a EA faz parte das práticas cotidianas do ensinar-aprender, sendo assim assumida sub liminarmente por todos os atores, professores, alunos e comunidade.
A trajetória da EA no Brasil (MC,2010) iniciou na década de 1970, quando a Secretaria Especial do Meio Ambiente (SEMA), órgão do governo federal, formalizou um documento sobre Educação Ambiental com a definição de seu papel no contexto educacional. Em 1988 inclui-se a EA na Constituição Federal, através do artigo 225 e, juntamente com a Chamada ECO-92, surge o Tratado de EA. Mas a introdução da EA para todos os brasileiros, de todos os níveis, somente se deu através da Lei Federal nº. 9.795/99 com a Política Nacional de EA (PNEA) e o Programa Nacional de EA (ProNEA).
MATERIAIS E MÉTODOS
Pesquisar o cotidiano escolar é algo motiva-dor, pois vai além da simples participação de pesquisador. Conforme Ferraço (2008, p. 103), a pesquisa com o cotidiano escolar é " Um espaço/ tempo de ações diversas no qual nós, pesquisadores, estabelecemos redes de relações com os que lá estão. Queiramos ou não, fazemos parte do cotidiano pesquisado e por mais alheios e neutros que desejamos ser, sempre acabamos por alterá-lo".
A EA no cotidiano escolar se faz com o planejamento participativo de todos os envolvidos no processo educacional, se faz com os relatos de experiências de alunos e professores envolvidos no processo e ainda com atividades pedagógicas interdisciplinares.
Para Guimarães (1995, p.37), "a EA se realizará de forma diferenciada em cada meio para que se adapte às respectivas realidades, trabalhando com seus problemas específicos e soluções próprias em respeito à cultura, aos hábitos, aos aspectos psicológicos, as características biofísicas e socioeconômicas de cada localidade".
A Escola (Figura 1) onde se realizou a pesquisa, situa-se no bairro São Marcos, fundada em 2001 e localizada no limite norte da cidade de Aracruz, cercado por uma extensa área rural, com pequenos e médios proprietários de terra. A grande maioria dos alunos são crianças carentes, com pais trabalhadores braçais, que militam na colheita do café ou outro serviço no campo. Alguns estão desempregados, e as mães, maioria delas, trabalham em casas de família como empregadas domésticas.
Sua clientela é de 316 alunos matriculados, sendo 150 no turno matutino e 166 no turno vespertino.

Figura 1 Escola Abílio Correia de Amorim
Em relação ao trabalho diário, todo o processo de acompanhamento se deu no turno vespertino com a turma do 4º ano e inicialmente com todos os professores durante o planejamento semanal. Durante o período de juho/2008 a setembro/2009 estava presente à Escola participando como expectadora, 3 vezes por semana em tardes alternadas e, em algumas vezes como facilitadora do processo de ensino-aprendizagem.
RESULTADOS
Percebe-se que os professores tem boa vontade e empenham-se em trabalhar a EA não somente da forma como trazem os livros, mas também como a entendem, mas, todavia sentem-se engessadas, tanto pela grande carga do conteúdo "principal" da disciplina à qual estão ministrando, quanto pela falta de conhecimento e capacitação própria na área. Neste sentido, Higuchi (2004, p. 64) destaca que, " no caso da Educação Ambiental, é importante compreender como as pessoas pensam, aprendem e agem no meio em que vivem. Um dos pontos principais é ter conhecimento sobre a percepção que as pessoas têm do mundo, das coisas e das outras pessoas". A seguir, são apresentados os projetos e atividades ambientais trabalhados na mesma.
Projeto Ambiental "Educar para Preservar"
Este projeto foi idealizado e desenvolvido por professores, direção, pedagogo e executado com alunos "multiplicadores", que desenvolvem, durante o ano letivo, atividades de sensibilização/ação junto à comunidade buscando a melhoria da qualidade de vida e desde seu início em 2006 e até agora 2009, sofreu poucas modificações e tem como objetivo a conservação e preservação do meio ambiente, a contribuição da melhoria da qualidade de vida e a sustentabilidade da comunidade do bairro.
Deste projeto, o que se pode destacar que deu certo e está em funcionamento até hoje é a horta escolar, que surgiu apenas como parte e hoje ganhou proporções bem maiores que se imaginava, pois, muitas famílias decidiram cultivar sua própria horta em casa.
O cuidado com a horta é uma grande rotina da escola. Cada aluno tem sua responsabilidade seja cuidando ou observando, tudo no intuito de não haver desperdício das hortaliças e leguminosas plantadas. A idéia da horta surgiu, inicialmente em 2006, durante as aulas de ciências, com o objetivo de enriquecer a merenda escolar como também para incentivar as crianças a comerem mais verduras e legumes. Daí, inicialmente, após um primeiro planejamento, foi realizada uma campanha na Escola para arrecadação de garrafas plásticas descartáveis do tipo pet para cercar os canteiros, e cada aluno deveria ajudar trazendo um exemplar.
As Figuras 2 e 3 ilustram a horta, com alunos e professores trabalhando na mesma.

Figura 2 ? Implantação da Horta da Escola.


Figura 3 ? Horta da Escola já produzindo.

Em 2007 e 2008 o Projeto foi além da idéia, pois buscou também a sustentabilidade das comunidades dos bairros São Marcos e Cupido, com a promoção de eventos como palestras ensinando o preparo e o cultivo da horta escolar e doméstica e, em parceria com a Prefeitura, ofereceu à comunidade do bairro Cupido as devidas orientações para que fosse criada a sua própria horta, intitulada "Horta do Cupido", destinada aos moradores locais e de responsabilidade dos próprios e, também, os alunos também foram motivados a fazerem suas próprias hortas em suas casas, através da palestra de um Engenheiro Agrônomo (Figura 4) com o tema: Horta Doméstica, o qual viria mais vezes à comunidade, ensinar como fazer
manutenção da Horta do Cupido (Figura 5).

Figura 4 Horta do Bairro Cupido.


Figura 5 Técnico e Representante da Comunidade
do Bairro Cupido cuidando da horta comunitária.

Como se pode perceber, houve interesse da comunidade em cultivar algo que pudesse ajudar no próprio sustento da família.
Além deste projeto, existem várias outras atividades que são desenvolvidas durante o ano letivo, na área ambiental. Os temas são abordados transversalmente perpassando as diversas atividades escolares, procurando trabalhar a partir das ações humanas cotidianas.
Atividades e Práticas Ambientais
Algumas atividades escolares tem nítido objetivo pedagógico ambiental, ou seja, são atividades verdadeiramente educacionais ambientais que não ultrapassam a barreira do senso comum mas, o que isso importa? Uma vez que existem poucas capacitações para os professores, o importante é que os mesmos estejam interessados em desenvolver atividades que visem a sensibilização ambiental do aluno mesmo que de forma pouco enriquecida mas, o maior interesse é conseguir fazer com que o aluno tenha a oportunidade de construir ao longo dos anos uma consciência ambiental mais crítica através do que foi ensinado. Assim, a Higiene e Conservação do Ambiente é focada durante as atividades realizadas com os alunos. As Figuras 6 e 7 ilustram algumas destas atividades realizadas com os alunos do 2ºano.

Figura 6 Lay-out de uma Atividade sobre
o tema Higiene do Ambiente




Figura 7 Livreto sobre Meio Ambiente, editado
por alunos.
Outra atividade ambiental são os Passeios Pedagógicos, realizados durante o ano letivo, onde cada turma tem direito de realizar um passeio, num lugar diferente, respeitando a idade e a maturidade de cada turma. Assim, algumas turmas vão ao Manguezal, outras ao Parque Pedra da Cebola e à feira do Verde, em Vitória, outras ao Projeto Tamar em Regência (Linhares), outras ainda vão às Aldeias Indígenas conhecer os costumes das tribos existentes hoje no município, conforme ilustar as Figuras 8 a 12., a seguir.

Figura 8 Passeio Ecológico ao Manguezal


Figura 9 Passeio Ecológico à Pedra da Cebola


Figura 10 Passeio Ecológico ao Projeto Tamar


Figura 11 Passeio Ecológico à Feira do Verde

Figura 12 Passeio Ecológico à Aldeia Indígena

No sentido de cada vez mais incorporar à comunidade uma boa e saudável prática social e estreitamento de relacionamento, a Escola promove momentos sociais importantes, que proporcionam aos alunos, o prazer de convidar suas famílias para apreciar um gostoso café da manhã ou chá da tarde, durante datas comemorativas especiais, tal como o dia das mães, como também teatrais (Figura 13) para apresentação às famílias e comunidade local, com o simples objetivo de convidar as famílias e comunidade escolar a participar do cotidiano da escola e, mostrar às mesmas que os alunos que lá estão desenvolvendo habilidades que vão além da sala de aula. Os temas das peças são sempre ambientais, destinados à introdução de regras de higiene e conservação do meio ambiente local.

Figura 13 Peça teatral destinada às famílias
dos alunos
CONCLUSÃO
A questão ambiental abordada na escola, na sua grande maioria, tem seu foco extremamente voltado para a preservação do meio ambiente.
Analisando de uma forma global os trabalhos desenvolvidos sobre EA, percebe-se que existe uma preocupação em utilizar a transversalidade e a interdisciplinaridade. Nota-se também a busca elevada pela autoestima dos alunos, a amizade entre os profissionais da escola, as boas maneiras entre todos, o respeito e a dedicação dos profissionais e o investimento em projetos que visam o desenvolvimento da educação e do saber. Especificamente sobre a horta escolar, ela se tornou grandiosa sem que a escola percebesse que atingia a comunidade local. O sucesso da horta só foi percebido quando a comunidade, incentivada pelos alunos/filhos, mostrou, interesse de cultivar suas próprias hortaliças em casa e numa horta comunitária.
Foi também percebido que a convivência com outras pessoas desperta a curiosidade e a cumplicidade em produzir e fazer parte de uma EA que dê resultado, mesmo porque como a escola e os professores são obrigados a dar conta de todo o conteúdo programático dos (4) bimestres, em algumas situações a educação ambiental passa despercebida ou pouco aprofundada.
Nos encontros, conversas, observações e entrevistas realizadas com alunos e professores, percebe-se o compromisso de fundo estrutural e filosófico de cada educador com sua prática.
Durante a pesquisa, notou-se que os professores começaram a perceber e assimilar os valores que a EA traz para cada indivíduo envolvido no processo. O que antes era tido como algo "errado" hoje não é mais.
Mesmo sabendo que existe muito a conhecer sobre a EA, o que já se sabe é que os sujeitos do processo estão percorrendo o caminho correto da complexidade vivida para muitas questões que ainda estão por vir e surgir. Cabe a todos acolher e participar do processo.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília: 1988.
BRASIL, Lei Federal nº. 9.795/99. Política Nacional de Educação Ambiental (PNEA) - Programa Nacional de Educação Ambiental (ProNEA), artigos 1º a 5º Brasilia.Disponívelem:http://www.ima.al.gov.br/legislacao/leis-federais/Lei%20nb0% 209.795 _99.pdf. Acesso: 10 de outubro de 2009.
FERRAÇO, C. E. Ensaio de uma Metodologia efêmera ou sobre as várias maneiras de sentir e inventar o cotidiano escolar. In. OLIVEIRA Inês Barbosa. e ALVES, Nilda. (org.) Pesquisa nos/dos/com os cotidianos das escolas: sobre redes de saberes. Petrópolis, RJ: DP et Alli, 2008.
GUIMARÃES, M. A dimensão ambiental na educação. Campinas, SP: Papirus, 1995.
HIGUCHI, M. I. G., e AZEVEDO, G. C. Educação como processo da cidadania ambiental. Revista Brasileira de educação ambiental. nº zero. Brasília, 2004.
MEC, Ministério da Educação. Um pouco da História da Educação Ambiental, Disponível em: http://portal.mec.gov.br/secad/arquivos/pdf/ educacaoambiental/ historia.pdf. Acesso: 18 de novembro de 2010.