A dor e a delicia da interdisciplinaridade- Aspectos de um trabalho em conjunto.

 

Samara Santos Souza[1]

 

Resumo

O presente artigo se propõe a realizar uma reflexão acerca da importância do trabalho interdisciplinar, bem como as conquistas e dificuldades encontradas na execução do mesmo. As conquistas para os usuários dos serviços, acompanhados pela equipe interdisciplinar, e as dificuldades encontradas pelo Assistente Social, inserido em um contexto que, muitas vezes apresenta equívocos do que realmente se constitui um trabalho interdisciplinar, bem como a hierarquização ocorre entre as diversas áreas do conhecimento.

Palavras chave: reflexão, trabalho interdisciplinar, conquistas, dificuldades, hierarquização.

 

“Sozinhos, pouco podemos fazer, juntos, podemos fazer muito”

Hellen Keller

A questão social é ocasionada por um modelo de produção e acumulação de capital, que visa o lucro em detrimento ao social. Trata-se de um fenômeno multifacetado que apresenta diversas expressões e vitima a classe trabalhadora das mais diversas maneiras.

Mediante a complexidade que está atrelada á este tema, diversas áreas do conhecimento isoladas passaram a não conseguir atender os problemas ocasionados pelas expressões da questão social, assim, desde a década de 1960 o debate em torno da formação e intervenção interdisciplinar vem crescendo. ELY (2003, pag. 114).

A interdisciplinaridade propriamente dita é algo diferente, que reúne estudos complementares de diversos especialistas em um contexto de estudo de âmbito mais coletivo. A interdisciplinaridade implica numa vontade e compromisso de elaborar um contexto mais geral, na qual, cada uma das disciplinas em contato são por sua vez modificadas e passam a depender claramente uma das outras. Aqui, se estabelece uma inteiração entre uma ou mais disciplinas, o que resultará em intercomunicação e enriquecimento recíproco e, consequentemente, em uma transformação de suas metodologias de pesquisa, em uma modificação de conceitos, de terminologias fundamentais etc. Entre as diferentes matérias ocorrem intercâmbios mútuos e recíprocas inteirações; existe um equilíbrio de forças nas relações estabelecidas. (OLIVEIRA E SOUZA apud SANTOMÉ, 1996, pag. 73).

Desta maneira, identifica-se que a interdisciplinaridade é um regime de co-dependencia entre uma ou mais disciplinas, com o intuito de desfragmentar os sujeitos vitimados pelas expressões da questão social. Este regime de cooperação é essencial para a efetivação da interdisciplinaridade, bem como entender que as disciplinas não estão isoladas de outras profissões, além de ter plena consciência de que em um trabalho interdisciplinar é necessário que todos os profissionais saibam definir e sejam competentes em suas respectivas áreas de conhecimento. CARVALHO (2012, pag. 12).

IAMAMOTO (2001) apud CARVALHO nos lembra que a questão social está expressa nas dessemelhanças econômicas, políticas e culturais das classes, mediatizadas por relações e disparidades ocasionadas por questões de gênero, raciais e regionais. Desta forma é sabido que, o sujeito usuário dos Serviços se constitui em uma totalidade, que possui especificidades e não deve ser fragmentado pelos profissionais que o atendem.

Conquanto, apesar da importância do trabalho interdisciplinar no enfrentamento das expressões da questão social, ainda existem diversas dificuldades de abordagem e entendimento, tanto no âmbito da práxis profissional, quanto na produção teórica acerca do tema.

ELY (2003, pag. 114) afirma que “apesar de a discussão ter evoluído, esta tendência não é acompanhada no mesmo patamar de intensidade pelas produções bibliográficas publicadas. Outra observação pertinente é o fato de que as discussões teóricas contidas nestas, ainda não deram conta de esgotar as implicações da interdisciplinaridade, uma vez que se percebe uma não- unanimidade, de quanto um método ideal e adequado, para a prática interdisciplinar”. Neste caso, percebe-se uma disparidade entre a importância de abordar o tema, a evolução das discussões a as publicações teóricas acerca do mesmo.

Atrelada á deficiência de publicações referente á esta temática, e as discordâncias acerca do método ideal para a prática interdisciplinar estão algumas armadilhas. Uma delas é a questão do relacionamento entre os membros da equipe interdisciplinar. Ocorre que, muitas vezes a relação entre os componentes que constituem a equipe interdisciplinar ocorre de forma hierarquizada entre uma e outra área do conhecimento o que prejudica o acompanhamento do sujeito que busca atendimento para auxilio das demandas apresentadas por este.

 

O conhecimento interdisciplinar deve ser a lógica da descoberta, uma abertura recíproca, uma comunicação entre os domínios do Saber, deveria ser uma atitude, que levaria ao perito a reconhecer os limites de seu saber para receber contribuições de outras disciplinas. Toda ciência seria complementada por outra e a separação entre as ciências seria substituída por objetivos mútuos. Cada disciplina dá sua contribuição, preservando a integridade de seus métodos e seus conceitos. SAMPAIO apud ELY (2003 pag. 115).

Assim, é sabido que em uma equipe interdisciplinar todos os membros possuem o mesmo objetivo, solucionar ou contribuir para a resolução das situações apresentadas pelos usuários dos serviços, desta forma o relacionamento deve ocorrer de forma horizontal, onde as disciplinas possam trocar seus saberes, de maneira que uma possa complementar a outra, sem fragmentar o sujeito, que será atendido em sua totalidade.

Outro ponto a ser abordado é a questão da ética profissional. No caso especifico do Assistente Social em seu Parágrafo Único- Capitulo V- Do sigilo profissional, o código de ética do Assistente Social assegura que,

Em um trabalho multidisciplinar só poderão ser prestadas informações dentro dos limites do estritamente necessário.

Acerca disto, SAMPAIO & RODRIGUES (2014, pag. 87), afirmam que “o Assistente Social trabalha com profissionais de outras áreas que ainda que tenham o sigilo profissional circunscrito em seus códigos, não estão sujeitos ás mesmas obrigações, apresentam objetivos diferentes e, ainda, lógicas e prioridades distintas das do Serviço Social. O Assistente Social atua em circuitos em que as informações devem ser partilhadas e, ao mesmo tempo, em que a confidencialidade é legalmente autorizada”

Desta maneira, o ato de partilhar algumas informações necessárias, e manter outras em sigilo pode se tornar um desafio posto na atuação profissional interdisciplinar. Outro ponto a ser analisado é a questão da postura profissional que deve ser adotada pelo Assistente Social em uma equipe interdisciplinar. SAMPAIO & RODRIGUES (2014, pag. 87) observam que o segmento social se tornou menos digno de importância, o que acarretou em uma hierarquia diante de outras profissões como, por exemplo, advogados e médicos, como se o “cliente” destas profissões fosse mais digno que o usuário do Serviço Social.

É notório que as condições sociais, ambientais e socioeconômicas em que os sujeitos estão inseridos refletem diretamente em sua saúde física, mental e psicológica. Daí, a importância do Assistente Social em uma equipe interdisciplinar. Não há como cuidar da saúde, sem dar atenção as condições sociais em que os indivíduos estão inseridos, pois, tratando da saúde e retornando para um ambiente social doente o sujeito tende a desenvolver novamente outras patologias. Entre posto, em uma equipe interdisciplinar o Assistente Social dever ter ciência da importância de seu trabalho dentro da equipe, bem como ter amplo conhecimento de seu papel e de suas competências.

Considerações finais

Embora seja uma tendência indispensável para um trabalho efetivo, a interdisciplinaridade está atrelada á diversas dificuldades, que devem ser enfrentadas pelo profissional de Serviço Social todos os dias.

O ato de se impor dentro da equipe, de deixar claro seu papel, e efetivar os direitos violados dos sujeitos atendidos são posturas cruciais para garantir a qualidade dos serviços prestados á população.

A interdisciplinaridade deve ser acompanhada de um regime de cooperação e troca entre as disciplinas, para tanto, é necessário desmistificar a cultura de hierarquização existente entre uma disciplina e outra.

Referencias

Código de Ética do Assistente Social. Disponível em: http://www.cfess.org.br/arquivos/CEP_CFESS-SITE.pdf Acesso em: 13/03/2015.

OLIVEIRA, S. H. A. C.; SOUZA, C. M. T. Formação Profissional do Assistente Social na Contemporaneidade: Aspectos da interdisciplinaridade.

SAMPAIO, Sobral, Simone, RODRIGUES, Wingeter, Filipe. Ética e Sigilo Profissional. Revista Serviço Social & Sociedade, São Paulo, nº 17, janeiro/março de 2014.

CARVALHO, Aparecida de, Fabiana. O Serviço Social e a Interdisciplinaridade. Revista Diálogos, Brasília, nº 01, dezembro de 2012.

ELY, Regina, Fabiana. Serviço Social e interdisciplinaridade. Revista Katalysis, Florianópolis, nº 06, janeiro/junho de 2003.



[1] Assistente Social, especialista em Política Social Na área da família com ênfase nas violências pela Universidade de Guarulhos- UNG.