A DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DO MARANHÃO E OS REAIS EMPECILHOS E “OBSTÁCULOS” PARA O EFETIVO CUMPRIMENTO DOS MANDAMENTOS CONSTITUCIONAIS E LEGAIS PRESCRITOS NOS ARTIGOS 5º, LXXIV E 134 DA CF/88, LEI Nº 1060/50 E LEIS ESPECÍFICAS DA DEFENSORIA

 

Ilane Jucá Foncêca

Jusélia Quadros de Abreu ***

 

 

 

Sumário: Introdução; 1 Defensoria Pública Estadual: Acesso à justiça e o pleno exercício da cidadania; 2 Defensoria Pública do Estado do Maranhão: estrutura, organização e atuação na defesa dos direitos dos necessitados. 3 A função da Defensoria Pública definida na CF/88 e os reais “obstáculos” para a concretização desse função na Defensoria do Estado do Maranhão; Conclusão; Referências.

 

 

 

 

 

RESUMO

A CF/88 da República Federativa do Brasil assegura como um dos direitos e garantias fundamentais em seu artigo 5º, LXXIV a assistência jurídica integral e gratuita a todos os cidadãos que comprovarem insuficiência de recursos. No entanto esse dispositivo constitucional, apesar de sua importância na medida em que permiti a igualdade de direito no que se refere ao acesso á justiça, pode ser considerado sem aplicabilidade ou na melhor das hipóteses aplicado de maneira insatisfatória e ineficiente assim como outros dispositivos constitucionais os quais têm como objetivo resguardar os diretos dos cidadãos menos favorecidos da sociedade. Esse descaso com os direitos da classe menos favorecida é histórico e amplo na sociedade brasileira e a Defensoria Pública do Estado do Maranhão, infelizmente, pode ser citada como exemplo desse descaso.

 

 

PALAVRAS-CHAVE

Assistência Jurídica. Direitos e Garantias Fundamentais. Defensoria Pública. Cidadão.

 

Introdução

 

O efetivo acesso à justiça com o objetivo de garantir ou adquirir direitos resguardados pela Constituição Federal e demais leis, devido às desigualdades, principalmente, educacionais e econômicas presentes na sociedade brasileira, torna-se expressivamente limitado a uma pequena parcela de cidadãos privilegiados os quais além de serem conhecedores de seus direitos, têm condições de contratar um advogado e arcar com os custos judiciais e extrajudiciais do processo.

No entanto, a população carente constituída por inúmeros brasileiros não tem condições econômicas de contratar um advogado para acionar a justiça e, é desconhecedora dos direitos e deveres que possui ficando assim, a mercê da própria sorte.

Esses dois fatores, econômicos e educacionais, são obstáculos para o acesso á justiça e conseqüentemente ao pleno exercício da cidadania, uma vez que o cidadão somente poderá exercer seus demais direitos garantidos por lei, se o pleno direito de acesso a justiça presente no Art. 5º, LXXIV da CF/88 que proclama: “O Estado prestará assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos” for efetivado.

A efetivação desse direito permite, assim, o cumprimento do princípio da isonomia descrito no caput do artigo 5º na medida em que permite a igualdade de acesso, independentemente da condição econômica, aos meios disponíveis de proteção dos direitos do cidadão.

 

O acesso à Justiça pode, portanto, ser encarado como o requisito fundamental – o mais básico dos direitos humanos – de um sistema jurídico moderno e igualitário que pretende garantir, e não apenas proclamar os direitos de todos”.1

Foi como o objetivo de permitir o acesso á justiça e pleno exercício da cidadania, em especial dos menos favorecidos, que o Estado instituiu a Defensoria Pública definida no Art. 134 da Carta Constitucional de 1988: “A Defensoria Pública é instituição essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a orientação jurídica e a defesa, em todos os graus, dos necessitados, na forma do art. 5º, LXXIV”.

Pela definição presente na Constituição, a Defensoria é detentora do poder de se fazer efetivo o exercício em amplo sentido da cidadania na medida em que não somente atua na defesa dos direitos como também exerce a função de orientação jurídica do cidadão. Tal orientação é relevante uma vez que permite o conhecimento de seus direitos por parte da maioria dos cidadãos brasileiros desassistidos e desorientados.

Apesar da importância dessa instituição na concretização do acesso à justiça, a Defensoria assim como várias outras instituições que têm como público alvo o cidadão menos favorecido, inerte e desconhecedor de seus direitos, é negligenciada pelo descaso do governo.

Essa negligência pode ser comprovada, freqüentemente, quando observamos as condições estruturais da maioria das Defensorias, em especial a Defensoria Pública do Estado do Maranhão, a qual oferece condições de atendimento não satisfatório e não digno aos cidadãos que procuram o serviço do Defensor Público.

Sendo assim, não basta proclamar na Constituição e em demais leis a garantia do acesso à justiça a todos os cidadãos na tentativa de assegurar o principio da isonomia no âmbito da justiça, se não for respeitado e efetivado de fato esse direito de maneira satisfatória aos cidadãos os quais esse serviço de assistência integral e gratuita for destinado.

 

1 Defensoria Publica Estadual : Acesso à justiça e o pleno exercício da cidadania.

 

O acesso á justiça e o exercício pleno da cidadania estão estritamente relacionados no Estado Democrático de Direito, na medida em que somente com o efetivo acesso à justiça podemos ter a plenitude da cidadania.

A Constituição Federal de 1988 consagrou o primeiro, o acesso à justiça, como garantia constitucional dos direitos fundamentais indispensáveis ao cidadão, ou seja, o meio pelo qual poderá exercer seus direitos concretizando dessa forma a cidadania que está presente no texto constitucional, Art.1º, II, como princípio fundamental do ordenamento jurídico.

Ao proclamar que todos são iguais em direitos e obrigações, a Carta Constitucional considera o exercício pleno da cidadania por todos aqueles que fizerem parte da sociedade independentemente de condições culturais, religiosas e principalmente econômicas.

No entanto, a sociedade em que vivemos parte da população não tem atendidas ás necessidades básicas do indivíduo, nem acesso aos direitos mínimos de cidadania, pois essa sociedade é marcada pelo alto grau de desigualdade socioeconômica e pela segregação e, infelizmente o critério financeiro/econômico tem importância fundamental quando nos referimos ao acesso á justiça e à garantia do exercício da cidadania.

O formalismo presente no Poder judiciário serve como mais um obstáculo de acesso á justiça ao cidadão carente, pois exigi-se para adentrar aos prédios do judiciário determinado tipo de vestimentas, pré-requisito que não deveria ser exigido de um cidadão destituído de condições básicas de sobrevivência.

Com o objetivo de facilitar o exercício da cidadania por todos, sem obstáculo no que diz respeito à condição financeira é que existem a Defensoria Pública do Estado com a função nobre de fazer valer o preceito constituição de igualdade de todos perante a lei, uma vez que faz valer os direitos dos cidadãos pertencentes à classe menos favorecida.

 

2 Defensoria Pública do Estado do Maranhão: estrutura, organização e atuação na defesa dos direitos dos necessitados.

 

A Defensoria Pública do Estado do Maranhão foi instalada em 2001, com a realização do primeiro concurso público para provimento de 30 cargos Defensor Público de 1ª classe. No entanto, o funcionamento da Defensoria já se encontrava regulado desde 1994 com a Lei Complementar Estadual nº19 que dispõe sobre normas gerais de organização e funcionamento da Defensoria Pública do Estado e dá providências correlatas de acordo com o estabelecido no Art. 134, §1º da CF/88: Lei Complementar organizará a Defensoria Pública da União e dos Territórios e prescreverá normas gerais para sua organização nos Estados, em cargos de carreira, providos, na classe inicial, mediante concurso público de provas e títulos, assegurada a seus integrantes a garantia da inamovibilidade e vedado o exercício da advocacia fora das atribuições institucionais.

A instituição é composta atualmente pelo numerário de 36 Defensores Públicos distribuído da seguinte forma: 30 Defensores lotados na Capital, São Luís, os quais atuam nas áreas criminal, família, cível, infância e adolescência, defesa do idoso e da mulher vítima de violência, tribunal do júri e execução penal; 1 lotado em Caxias, 1 lotado em Timon; 1 lotado em Paço do Lumiar e 3 desempenhando função nos Órgãos de Administração Superior os quais são a Defensoria Geral, Sub-Defensoria Geral e a Corregedoria.

As atividades da Defensoria consistem na orientação da população em relação a seus direitos, além de propor ações judiciais, sendo seus serviços destinados de acordo com o regulamento manifesto na Constituição Federal, Art. 5º, LXXIV, aos cidadãos que comprovarem insuficiência de recurso, sendo assim considerados necessitados de assistência jurídica gratuita.

A Lei Complementar Estadual nº 19 traz em seu Art.1º, §1º que: considera-se necessitado o brasileiro ou estrangeiro, residente ou em trânsito, no Estado, cuja ineficiência de recursos, comprovadamente, não lhe permita pagar as custas processuais e os honorários advocatícios sem prejuízo de seu sustento pessoal e de sua família, ou seja, os serviços da Defensoria são destinados aqueles que atestarem seu enquadramento no estado de pobreza judicial, que segundo Hilton Mendonça2 significa:

 

Pobreza judicial é o estado de hipossuficiência econômica da parte que acessa o Judiciário, sem condições de pagar -á vista- as custas processuais, sem prejudicar o sustento próprio, ou familiar.”3

 

Em relação ao campo geográfico de atuação da Defensoria Pública do Estado do Maranhão, podemos considerá-lo reduzido uma vez que apresenta somente 9 locais de atendimento em todo o Estado, sendo eles: na capital, São Luís; Caxias, Bacabal; Timon; Paço do Lumiar; Pedreiras; São José de Ribamar e ainda um Centro Integrado de Apoio e Prevenção à Violência contra a Pessoa Idosa e o Núcleo da Defensoria Pública no Fórum Desembargador Sarney Costa, ambos localizados na Capital.

Essa estrutura física-organizacional da Defensoria maranhense é considerada ineficiente para atender o amplo número de cidadãos que solicitam os seus serviços, não somente na capital, mas também nos municípios onde o acesso á justiça pode ser considerado ainda mais restrito se consideramos o poder econômico de sua população.

 

3 A função da Defensoria Pública definida na CF/88 e os reais “obstáculos” para a concretização desse função na Defensoria do Estado do Maranhão

 

A Carta Constitucional de 1988 proclama no Art. 5º que todos são iguais perante a lei, ou seja, todos os cidadãos devem gozar dos mesmos benefícios (direitos) e observar as mesmas obrigações (deveres). Mas, para a concretização desse princípio constitucional de igualdade de todos perante a lei em direito e deveres, faz-se necessário que o direito de acesso à justiça seja facilitado e esteja ao alcance de todos. Pois a garantia desse direito é a “porta” para a materialização dos demais direito do cidadão, e permite independentemente da condição econômica do cidadão, a não exclusão da apreciação do Poder Judiciário de lesão ou ameaça a direito (Art. 5º, XXXV CF/88).

Foi com esse propósito de proporcionar o direito de acesso à justiça a todos, que a Constituição Federal de 1988 estabeleceu a criação de instituições visando garantir a efetividade desse direito. Essas instituições são as Defensorias Públicas Estaduais que deveriam ser instaladas em todos os Estados brasileiros tendo a função, conforme prevista no texto constitucional, de prestar assistência judiciária integral e gratuita a população economicamente carente desses Estados.

Dentre os Estados que já concretizaram essa medida constitucional de instalação de uma Defensoria Pública, temos o Maranhão que desde 2001 oferece a sua população carente os serviços dos Defensores Públicos. Mas, apesar de instalada a Defensoria Pública do Estado do Maranhão e realizado concurso para os cargos de Defensores de 1ª classe, conforme previsto na Lei Complementar Estadual nº 19, infelizmente, o Estado descumpre suas obrigações presentes na Carta Constitucional de prestar um serviço eficiente e satisfatório de assistência jurídica aos considerados judicialmente pobres.

Essa ineficiência, se comparada com a atualidade ainda foi pior, pois se materializava em aspectos básicos de estruturação da Defensoria do Estado do Maranhão, uma que a mesma não tinha nem prédio próprio para realizar das atividades dos Defensores.

Somente no ano de 2006, atendendo a reivindicação da administração superior do órgão, o governo estadual até então, inoperante e inerte as necessidades da Defensoria, decidiu instalar a Defensoria Pública do Estado do Maranhão em um prédio que oferecesse instalações melhores de atendimento diferentemente das “acanhadas” instalações onde antes o órgão funcionava. Sendo a partir desse ano a população carente da sociedade maranhense “agraciada” pelo governo como uma instituição com condições básicas em estrutura física de atendimento para a reivindicação de seus direitos garantidos pela CF/88.

No entanto, somente apresentar uma estrutura física razoável é apenas um requisito e o primeiro passo para a efetiva concretização da função da Defensoria estabelecida na Constituição Federal. Faz-se, pois necessário analisar a situação do agente responsável pela realização do papel da Defensoria que são os Defensores Públicos.

Apesar de seu importante papel para garantir aos desafortunados, os quais representam a maior parte da sociedade maranhense, o exercício pleno da cidadania, os Defensores não têm sua atividade valorizada e a comprovação dessa realidade é notória ao se comparar os subsídios destinados a esses Defensores em relação aos que são destinados aos membros do Ministério Público e da magistratura, sendo que os mesmos devem exercer o cargo com exclusividade e sofrem proibições semelhantes no que se refere ao exercício acumulativo de outra profissão.

Os baixos subsídios pagos a eles, aos Defensores, ocasionam conseqüências negativas que conseqüentemente influenciará no direito constitucional de acesso rápido e eficiente dos necessitados a justiça no Estado, pois os subsídios desproporcionais a real importância da atividade do Defensor para a sociedade, infelizmente, é um dos motivos que acarretam desistência da profissão, ocasionando assim evasão e rotatividade significativa no órgão, comprometendo o papel social da Defensoria de garantir o direito daqueles que buscam seu direito de acesso à justiça.

A falta de recurso suficiente para se ter uma Defensoria que atenda na plenitude a demanda da parcela da população em estado de pobreza judicial é sempre a resposta mestra dos sucessivos governantes do Estado quando são questionados sobre melhoras e ampliação do atendimento da Defensoria somente realizável por meio de instalação do órgão em todas as comarcas da Capital e da realização de concurso público.

Enquanto isso, a população maranhense destituída de recursos financeiros e também de conhecimento do direito de exigir do Estado que cumpra suas responsabilidades estabelecidas pela Carta Constitucional de 1988, fica desprovida do exercício pleno da cidadania. Exercício esse que deveria ser concretizado por intermédio dos Defensores prestando uma orientação e uma defesa qualificada do direito desses cidadãos, que pelo fato de pertencerem as classes menos favorecidas, sem educação e inertes na reivindicação de seus direitos, são desprezados e não assistidos pelo governo.

 

Conclusão

 

Ao analisarmos as condições de acesso á justiça da população carente do Estado, percebemos que os mandamentos constitucionais contidos nos artigos 5º, LXXIV e 134 da CF/88, Lei nº 1060/50 que estabelece normas para a concessão de assistência judiciária aos necessitados, e Leis especificas da Defensoria são relegadas a simples condição de peças decorativas e sem aplicabilidade.

A Defensoria Pública criada para garantir o acesso á justiça e a igualdade de direitos independente da classe social ou da condição econômica do cidadão são dotadas de uma estrutura física e humana ainda ineficazes para o atendimento da demanda.

O que podemos observar é a constante negligencia dos governantes com os direitos da classe menos favorecidas do Estado que infelizmente, na sua maioria, são pessoas inertes e não esclarecidas quanto a seus direitos de exigir dos dirigentes políticos uma Defensoria Pública com as reais funções e o efetivo funcionamento estabelecido pela lei.

Sendo assim, não se pode considerar que a Defensoria Pública do Estado exerce suas funções de forma eficiente e adequada, enquanto o governo do Estado não promover a realização de concurso público com o escopo de ter Defensores em todas as comarcas do Maranhão aumentando a quantidade de locais de atendimento e não forem valorizadas as relevantes funções exercidas pelos Defensores através do pagamento de subsídios condizentes com as mesmas.

 

REFERÊNCIAS

 

CAPELLETTI, Mauro; GARTH Bryant. Acesso à Justiça. Ellen Gracci Northfleet (trad.). Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 1988.

 

CAMPILONGO, Celso Fernandes; GIORGI, Beatriz Di; PIOVESAN, Flávia. Direito, cidadania e justiça: ensaios sobre lógica, interpretação, teoria, sociologia e filosofia jurídicas. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1995.

 

GONÇALVES, Cláudia Maria da Costa. Assistência Jurídica Pública: direitos humanos, políticos e sociais. 1ª Ed. 2ª tir. Curitiba: Juruá, 2008.

 

OLIVEIRA, Rafael; JR, Fredie Didier. Benefício da Justiça Gratuita. 3ª Ed. Salvador: Juspodivm, 2008.

 

 

 

 

 

 Paper apresentado à disciplina de Teoria Geral do Processo para obtenção da 2ª nota.

Graduanda do 3º período do curso de Direito da Unidade de Ensino Superior Dom Bosco (UNDB).

*** Graduanda do 3º período de Direito da Universidade de Ensino Superior Dom Bosco (UNDB). Graduada em Ciências Exatas com habilitação em Matemática pela Universidade Estadual do Maranhão- Uema.

 

1 CAPPELLETTI, Mauro; GARTH, Bryant. Acesso à justiça. Porto Alegre: Fabris, 1988, p. 9

2 Advogado (OAB-MA nº 5.099). Autor-organizador das obras: 1) Julgados das Turmas Recursais do Maranhão; 2) Julgados do Tribunal Trabalhista do Maranhão. Membro da Academia Arariense-Vitoriense de Letras.

3 MENDONÇA, Hilton. Justiça Gratuita. São Luís: Mendonça Livros, 2003, p.15