d EFICIÊNCIA ESTÁ EM NOSSAS MÃOS

BARONAS, Leisa Mara

Escola Estadual Carlos Hugueney

                                                                                             [email protected]

 

 

No mês de janeiro de 2002, estava em Campos do Jordão - SP participando da Especialização de Educação Social pelo Centro Universitário Salesiano de São Paulo – UNISAL, na oportunidade tive a grata satisfação de receber um telefonema do Dr. Eduardo Ribeiro da Silva na época presidente da APAE de Nova Xavantina – MT, convidando-me para assumir o cargo de coordenadora da instituição, ate presente momento minha convivência com os “deficientes mentais” era praticamente atos isolados.

Estive em contato direto com eles durante 2002 a 2005 na instituição, com essa oportunidade que me foi legada, percebi que meu olhar estava estrábico, e faltava-me aprendizado.  Partindo dessa nova etapa profissional, fui convivendo e experienciando com os deficientes intelectuais num constante aprendizado, o apreender aconteceu através do cotidiano.

Posso afirmar com veemência, que foram os anos que fizeram refletir sobre a prática da educação inclusiva.  Ainda me falta muito aprendizado, pois estou engatinhando. Neste artigo abordaremos a educação inclusiva através do olhar de quem somente observa e traz a tona uma gama de conhecimentos e aprendizados dos mais variados protagonistas que atuam com a Educação Inclusiva.

Iniciei minha vida profissional como professora em 1981, na zona rural em Indianópolis (Pindaíba) Barra do Garças - MT como professora de sala multisseriada, em 1983 reinicio a carreira profissional na cidade de Nova Xavantina- MT na educação infantil Escola Adventista, CNEC e Prefeitura Municipal de Nova Xavantina , no ensino fundamental Prefeitura Municipal de Nova Xavantina, médio no EJA/SEDUC e superior instituições IAP/UNEMAT e com alunos com deficiência APAE NX, estive como tutora do Proformação, coordenadora, diretora e assessora de gabinete da Educação e Assistência e Promoção Social, técnica de políticas publicas no Lar dos Idosos de Santa Rita do Araguaia - GO, desenvolvi alguns projetos com drogadição e deficiência como: “Oficinas Permanentes”, “Inclusão Social”, “O deficiente e a carta”, “ O tango e a deficiência”, “Cuidador dos idosos de deficientes” entre outros. Nos anos de 2009 a 2012 desenvolvemos parceria através da Prefeitura Municipal de Santa Rita do Araguaia com a APAE de Alto Araguaia – MT. E, atualmente desenvolvo atividades de tutoria do Profuncionário do Polo de Alto Araguaia IFMT/SEDUC/CEFAPRO, Escola Estadual Carlos Hugueney  e sou escritora com alguns trabalhos lançados no Banco Itaú – São Paulo, texto de Reflexão – “Aprendizagem” (2008), conto “O comandante e a comandada” (2010), poesias “ A uma anja” e “Desculpe-me”(2011), na Bienal – São Paulo, um conto “Uma suave brisa”(2012) e  no Museu da Língua Portuguesa– São Paulo dois contos “Mulher em fios de algodão”, “ Um presente” e um texto de reflexão “Aprendizagem”(2013).

Após a biografia profissional, onde retrata que estou arraigada através do meu trabalho com os deficientes, abordaremos o nosso aprendizado em relação ao tema deficiência intelectual.

Contextualizando os termos “deficiência mental” e “deficiência intelectual”, a partir da década de 80, o vocábulo utilizado era "deficiência mental".

 Mas através de modificações de documentos (Declaração de Salamanca) e nomes de associações influentes (American Association of Mental Retardation (AAMR) para American Asoociation on Intellectual and Developmental Disabilities (AAIDD), na contemporaneidade o vocábulo utilizado é “pessoa com deficiência”, para qualquer deficiência, e no caso da deficiência cognitiva o termo correto a ser utilizado é “pessoa com deficiência intelectual”.

Termo com o qual SASSAKI (dez/2004), tem afinidade: - é apropriado o termo "intelectual" por mencionar-se ao funcionamento do intelecto especificamente e não ao funcionamento da mente como um todo.

A deficiência intelectual não é considerada uma doença. Ela não pode ser contraída a partir do contágio com outros indivíduos. Exemplificando não é uma doença mental como a depressão e a esquizofrenia. Portanto, não sendo uma doença, também não faz sentido procurar ou esperar uma cura para a deficiência intelectual.

A maioria das crianças com deficiência intelectual consegue aprender algo para sua utilidade e bem-estar da comunidade em que esta inserida. Para isso precisam, em regra, de mais tempo e de apoios para obterem o sucesso, as limitações do D.I. passam a não ser definitivas e imutáveis à medida em que houver os apoios necessários a cada caso.

Na contemporaneidade temos o diagnostico que 87% das crianças com deficiência intelectual terão um processo de aprendizado e aquisição de novas competências mais lento que a maioria das outras crianças. Muitas vezes é mesmo difícil distingui-las de outras crianças com problemas de aprendizagem sem deficiência intelectual, sobretudo nos primeiros anos escolares.

A Constituição Federal garante a todos os indivíduos o direito a aprendizagem e o desenvolvimento da cidadania, poucas vezes esse direito é respeitado tratando se deficientes intelectuais. Muito tem sido falado dos direitos e das necessidades do deficiente intelectual, as circunstancias que envolvem têm ajudado somente para colocá-los a margem de suas potencialidades. Nota-se que os estigmas demonstram o processo de exclusão onde os deficientes estão sendo acometidos, como:  preconceito, despreparo, falta de conscientização e o descaso.

Debruçados nos Parâmetros Curriculares Nacionais (2001), a política Nacional de Educação Especial faz alusão a prioridades no atendimento especializado, que está sendo ofertado na escola para os deficientes.

Portanto esta embasada em leis, mas a deficiência torna-se uma barreira para a escola de ensino regular, por que ao receber um educando com deficiência significa receber um educando fora dos padrões da “normalidade”, para aquela modalidade de ensino, pois a instituição e seus educadores não estão e não foram preparados para atendê-lo. Ao educando a instituição escolar expressa um espaço discriminatório, vivenciando situações que lhe estabelecem obstáculos, dificultando assim o seu desenvolvimento. A American Asoociation on Intellectual and Developmental Disabilities (AAIDD, 2002), apresenta as cinco dimensões para o diagnóstico do Deficiente Intelectual (D.I.): bio-psico-social-espiritual-ambiental.

A dimensão biológica menciona  os fatores físicos do corpo: anatomia, a fisiologia, os sistemas muscular, digestivo, ósseo, hormonal, respiratório, as funções e disfunções dos diversos órgãos, e a inter-relação desses sistemas entre si.

A dimensão psicológica menciona os aspectos ligados à personalidade do ser humano, o comportamento determinado por instâncias conscientes, pré-conscientes e inconscientes. Compreendem o pensamento, a memória, os raciocínios o contato e a demonstração de sentimentos, emoções, desejos, vontades, necessidades de segurança, de autoestima e de realização no todo.

A dimensão social refere-se aos aspectos ligados à vida em grupo, os aspectos econômicos, políticos, ideológicos e culturais. Esta dimensão inclui a interação e, todos os fenômenos que acontecem entre pessoas e grupos. As necessidades de associação, de uma vida social estão aqui incluídas.

A dimensão espiritual correlaciona-se ao sentimento de pertencer ao mundo, de ser uma parte do Universo, à noção da existência de forças maiores que o entendimento não pode ou tem dificuldade de apreender. É uma noção interna de transformação da forma de vida, espiritualidade pode ser desenvolvida através de alguns caminhos entre os quais a religião, a meditação, a reflexão, o esoterismo, a ação.

A dimensão ambiental menciona à abordagem ecológica do desenvolvimento, privilegiando os aspectos saudáveis, que são estudados em ambientes naturais. A análise deve estender - se ao maior número possível de ambientes dos quais o indivíduo participa e às relações que ele mantém. As condições em que o deficiente intelectual esta inserido, as quais estão relacionadas com qualidade de vida. São as práticas e os valores culturais que devem ser considerados, bem como as oportunidades educacionais, de trabalho e lazer, as condições contextuais de desenvolvimento e às condições ambientais relacionadas ao seu bem estar, à saúde, à segurança pessoal, ao conforto material, ao estímulo ao desenvolvimento e às condições de estabilidade.

Isso nos oportuniza e nos instiga enquanto educadores de como devemos trabalhar com D.I., e como devemos tratá-lo, pois se constitui em um inesgotável objeto de questionamentos, estudos e investigações na busca de bibliografia adequada, palestras, seminários, rodas de conversas, bibliotecas, internet, laboratórios vivenciais, etc..  Bourdieu (1979) complementa, portanto, que a multiplicidade das competências dos indivíduos é apontada pelo sistema escolar e o predomínio das técnicas empregadas são competências escolares, mas cadê a preparação do educador?

Creio que a maior dificuldade da inclusão de crianças com deficiência intelectual na rede de ensino regular é a falta de planejamento por parte dos nossos governantes, pois se criam leis de gabinete, não parte da realidade e sim do subjetivo.

Não buscam realmente o contexto que esta inserida a criança com deficiência e a rede escolar que necessita recebê-la. Pegam uma realidade aleatória e a transformam em via única para todo país.

As regiões não são contempladas pelas suas diversidades, sejam elas culturais, sociais, políticas entre outros aspectos, somente o processo e visto por um olhar de gabinete.

Em aproximadamente 32 anos de exercício efetivo na educação, ficamos perplexos este ano, quando fomos agraciados com um valor simbólico para melhorarmos a infraestrutura da Escola Estadual Carlos Hugueney, resultado conseguimos colocar e adequar uma rampa para acessibilidade de um complexo ao outro, quando falo em valor simbólico e porque muito tem a se fazer e os recursos financeiros são parcos.

Essa melhoria na infraestrutura não deve se ativer apenas em termos físicos e materiais, mas também no quadro de profissionais e suas implicações profissionais. E necessário redimensionar o conteúdo com relação às formas de exposição, flexibilizar o tempo para a realização das atividades e usar estratégias diversificadas, como a ajuda dos educadores, o que também é um recurso que contribui para a integração, interação e inclusão para a socialização do educando D.I.

As escolas necessitam serem preparadas na diversidade, para que os princípios sejam efetivados tanto para os D.I., como para os educadores, tendo qualificações e embasamento de uma equipe multifuncional na escola.

A responsabilidade da educação inclusiva do deficiente intelectual não é somente da educação. A necessidade de uma rede de trabalho sob os três pilares: educação, saúde e assistência e promoção social, enquanto estamos tratando de inclusão na instituição escolar.

O D.I., os familiares e o educador necessitam desse acompanhamento e serem assistidos por uma cadeia de profissionais, como: fonoaudiólogo, psicólogo, psicoterapeuta, fisioterapeuta, neuropediatra, psiquiatra, assistente social, educador social, educador, educador físico, nutricionista, terapeuta ocupacional, etc..

Há necessidade de se criar um projeto de trabalho de vinculo familiar, pois nenhuma família espera ou estão preparados para ter uma criança deficiente, os pais passam por um momento de luto pela perda do filho idealizado, que acontece no choque inicial à aceitação da realidade.  Principalmente,  a mãe que experimenta sentimentos de tristeza, raiva e culpa.  As famílias gostariam de socialização para os filhos, demonstram receio das reações e do estigma ligado a um contato social.

Ponderando essas análises para o D.I., pode-se destacar que essa participação familiar não se torna apenas de suma importância para o aprendizado desses educandos, mas necessária para o crescimento intelectual e inserção social, participativo e capaz de intervir no meio no qual está inserido. O papel da família diante da inclusão é ser participativa, a escola tem sim seus deveres, mas a família também tem seus deveres, e não pode deixar de ser participativa na vida escolar do D.I.

Quando há a cooperação familiar, a evolução da aprendizagem que a criança apresenta é muito maior, no qual possamos garantir um trabalho de inclusão e não de exclusão do deficiente intelectual.

Portanto, o trabalho de inclusão escolar para o deficiente intelectual quando organizado com todo aparato necessário: o tripé educação, saúde e assistência e promoção social. Com equipe multifuncional, educadores, família, acessibilidade,  tecnologia assistiva, projetos e capacitações, entre outros,  facilita sua integração, interação e inclusão  na família, no trabalho, no grupo de amigos, com os animais, com a natureza, na vizinhança e nos padrões culturais, econômicos e sociopolíticos.

Não existe uma formula pronta ou uma bula para trabalharmos com D.I., cada um traz na bagagem suas potencialidades e capacidades, mas não podemos esquecer que necessitam além das intervenções, é que, nós acreditemos neles, fazendo-os sentir fazer parte de um todo e capaz de se entregar a conquista diária da vida.

Como podemos perceber nestes relatos de D.I., com os quais trabalhei em 2002, na APAE de Nova Xavantina - MT:

“Sou útil quando bordo ao lado do Otacílio, ele é mudo, mas através dos seus olhos  e dedos... contando e me mostrando aprendo todos dias”. Benvindo

 

“vou a “radia” todos os dias, pedir para tocar musica para os colegas da APAE e da Escola Estadual João Mallet. Hoje não tenho vergonha, limpo quintal, as pessoas não sentem medo de mim. Sou ator também, viajei para representar, trouxe varias medalhas não de participação e sim de premiação.”   Ricardo

 

“estudo na APAE e na Escola Estadual Coronel Vanique, aprendi fazer troco, comprar, andar na rua, pedir informações, ir comprar meu perfume para sair cheiroso, aprendi a dançar, não fico sentado em nenhuma festa.” Alex

 

Creio que a discussão escola inclusiva e deficiente intelectual continua, portanto, eis ai uma questão de usufruir a sua liberdade.

Leisa Mara Baronas

Escola Estadual Carlos Hugueney

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