Arrecadar méritos e transferir responsabilidade faz parte da natureza humana. Cada vez que alguma coisa sai errada em nossas vidas, corremos em busca de um culpado, o qual, é claro, nunca residirá em nossa casa.

 

Uma das formas mais atuais de transferirmos responsabilidades ocorre com a mania nacional de colocarmos a culpa de todas as nossa mazelas neste ou naquele governo. O que eu mais escuto e leio nos meios de comunicação é aquela alegação de que a culpa disso ou daquilo é do governo de fulano ou de cicrano. Transformamos os chefes do executivo dos diferentes níveis estatais em uma espécie de Judas que ficamos malhando o tempo todo. Afinal, é bem mais fácil utilizarmos aquela velha e surrada frase de que “isso é culpa do governo”, do que raciocinarmos e buscarmos a verdadeira origem de algumas de nossas desditas. Por exemplo, ouço aposentados se queixando do fator previdenciário que foi criado durante o governo de Fernando Henrique Cardoso. Queixam-se também dos aumentos diferenciados que ocorrem entre os valores das aposentadorias e pensões e o salário mínimo. Embora tal diferenciação exista em virtude de uma lei elaborada pelo Congresso Nacional em 1.991, durante o governo Collor, todos acabam culpando o atual Presidente Lula.

 

Ora, se aquilo que é motivo de queixa unânime por parte de da sociedade advém da lei, eu pergunto: será que não está havendo uma confusão a respeito das funções de cada um dos poderes da república? Naturalmente, se o que nos fustiga advém de uma lei, é evidente que, em princípio, não podemos culpar o chefe do executivo ou o membro do poder judiciário que aplica referida lei. A função precípua do executivo é governar e administrar sempre obedecendo ao princípio da legalidade, ou seja, pautado pelas leis vigentes. Ao poder judiciário, apesar de respirarmos ares de pós-positivismo, cabe aplicar as leis aos casos concretos. E o poder legislativo? Este sim tem a função de elaborar as leis que irão servir de balizamento aos outros dois poderes.

 

Assim sendo, sempre que nos sentirmos oprimidos e sufocados por aquilo que é conseqüência de um diploma legislativo qualquer (caso atual da farra das passagens aéreas para os congressistas), devemos direcionar nosso descontentamento àquele poder que o elaborou. Não esqueçamos que nós, na condição de eleitores, somos os responsáveis pelos membros que ocupam as cadeiras do poder legislativo nas três esferas governamentais. Assim sendo, somos também responsáveis. Não podemos nos eximir de nossas culpas e ficarmos sempre apregoando que “a culpa é do governo”.

 

Bem, está se aproximando uma das mais importantes eleições, justamente a de presidente da República e para o Congresso Nacional. É claro que devemos ser criteriosos para com a escolha do primeiro mandatário da nação mas, muito mais cuidado devemos ter na escolha daquele que, com o nosso voto, estaremos escolhendo para nos representar no poder legislativo, justamente aquele sobre o qual muitas vezes deveria recair a nossa crítica mais veemente. Afinal, nem tudo é culpa do governo; ao escolhermos mal, nós também passamos a ter nossa parcela de responsabilidade.

 

Jorge André Irion Jobim. Advogado de Santa Maria, RS