ARTIGO CIENTÍFICO II

A CRISE DO SISTEMA PENITENCIÁRIO E SEUS PROBLEMAS

 

WANDEMBERG BEZERRA AMORIM

         A crise que o sistema penitenciário vem atravessando no Brasil é histórica, pública e notória. O caos e a precariedade das instituições carcerárias traduzem as condições miseráveis e até subumanas vividas pelos presos.

            As emissoras, os jornais impressos, as revistas jurídicas abordam o tema, o qual parece ser assimilado pelo Estado como surreal, ou seja, parece ser assunto tirado de filmes de ficção científica e quando o programa termina, a leitura acaba o debate finaliza, tem- se uma falsa compreensão que tudo não passou de um grande pesadelo, que passará. E aí, cada um retoma sua vida, sua profissão, seus afazeres, seu lazer, enquanto o pesadelo segue na realidade mais cruel com os presos e com seus familiares mais próximos. Pois esses se sentem importantes para ajudar os que estão renegados da sociedade, do Estado, no cárcere sem a menor possibilidade de dignidade dentro do presídio.

            Vários são os problemas que os detentos enfrentam, dentre os mais gritantes podemos destacar: excesso de lotação dos presídios e até mesmo nas delegacias; doenças como: tuberculose, pneumonia, AIDS, hanseníase, distúrbios mentais, câncer, saúde bucal; entrada de drogas e aparelhos telefônicos constantemente apreendidos nos presídios; a supervalorização da cultura do mais forte fisicamente como psicologicamente e financeiramente sobre os mais fracos e ainda se identifica mensagens levadas por familiares e advogados das quadrilhas dos quais fazem parte.

            Além dessas problemáticas acima citadas, existem ainda os problemas de cunho meramente institucional, que é o caso do número insignificante de agentes penitenciários para cuidar de um número significativo de presos, além de baixos salários, corrupção e até subserviência promovida pelo medo provocado por poderes transversalizados dentro e fora dos presídios que o preso de alta periculosidade tem e usa em seu favorecimento.

            Todavia, apesar de toda essa problemática que é de maior responsabilidade do Estado, pois nele figura a obrigação maior com aqueles que o Estado, de uma forma ou de outra, ajudou a colocar dentro da penitenciária quando negou educação, saúde, moradia, trabalho.

            É nesse sentido que entendemos que o preso condenado passa por tripla condenação, a primeira quando é negada ao cidadão homem livre que está desprovido de todas as necessidades básicas, as quais já foram acima abordadas, a segunda quando o homem é condenado à pena de prisão e a terceira quando no presídio lhe é tirada a saúde física, mental e alimentação condizente com a que um ser humano precisa ter. E diante dessas questões narradas é que observamos o descumprimento da Lei de Execução Penal, a qual reza o inciso VII do art. 40, o direito á saúde por parte do preso como uma obrigação do Estado.

            E para reforçar mais essa idéia, foi aprovada pela Assembléia Geral das Nações unidas em dez de Dezembro de 1948, a Declaração Universal dos Direitos Humanos, em cujo preâmbulo inscreve- se: “O réu deve ser tratado como pessoa humana.”

            Além da Declaração Universal dos Direitos Humanos, a lei nº 7.210, de 11 de Dezembro de 1984, lei de execuções penais diz que:

                                                    Art. 1º. A execução penal tem por objetivo efetivar as disposições de sentença ou decisão judicial e proporcionar condição para a harmonia e integração social do condenado e do internado.

              O sujeito que comete crime natural deve ser julgado de acordo com o devido processo legal e, se condenado for, deve se submeter a sistema que tenha como objetivo maior sua resocialização. No entanto, quem conhece a realidade das prisões brasileiras deve saber que impera nos presídios o abandono total à saúde física e mental, a corrupção e a violência. O grande teórico Beccaria( 1996, pg. 28) argumenta:

                                        Toda pena, que derive da absoluta necessidade,diz o grande Montesquieu, é tirânica, profissão esta que pode ser assim generalizada: Todo ato de autoridade de homem para homem que não derive da absoluta necessidade é tirânica.

                          Sabe- se que não é negando os direitos dos presos que s resolverão os problemas do sistema carcerário brasileiro, os seus direitos, como também, os seus deveres estão bem definidos. No decreto de lei nº 2. 848 de 7 de Dezembro do ano de 1940, mais precisamente no art.38: “O preso conserva todos os direitos não atingidos pela perda da liberdade, impondo a todos as autoridades o respeito à sua integridade física e moral.”

              Entende- se que uma das soluções mais viáveis para as grandes problemáticas que envolvem o sistema penitenciário nacional, teriam relação com um maior do Estado perante o trabalho dos detentos, já prevista na lei nº 7.210 de 11 de Julho de 1984, lei de execução penal. Como reza os artigos abaixo:

Art.28: O trabalho do condenado, como dever social e condição de dignidade humana, terá finalidade educativa e preventiva.

Art.126: O condenado que cumpre a pena em regime fechado ou semi- aberto poderá remir pelo trabalho, parte do tempo de execução da pena.

Art.128: O tempo remido será computado para a concessão de livramento condicional do indulto.

              Para os presos que se encontram abalados psicologicamente, o trabalho fomentaria ocupação e, conseqüentemente, a reconquista da sua dignidade. Esse é um dos grandes méritos que o trabalho trouxe para o homem, desde que ele se tornou sapiens sapiens.

              Outra alternativa para amenizar um dos grandes problemas do sistema carcerário seria a aplicabilidade das penas alternativas para promover a condição de superlotação dos presídios. Sabe- se que as penas alternativas são para os criminosos que cometeram infrações de menor potencial ofensivo, visando substituir as penas delitivas de curta duração.

              Os crimes sujeitos a penas alternativas são os seguintes: pequeno furto, apropriação indébita, estelionato, acidente de trânsito, desacato à autoridade, lesão corporal leve e outras infrações de menor gravidade.

              Com o advento da lei nº 9.214/ 98 as penas alternativas são: prestação pecuniária, perda de bens e valores pertencentes ao condenado em favor do Fundo Penitenciário Nacional, prestação de serviço à comunidade ou à entidade pública, proibição do exercício do cargo, função ou atividade pública, bem como de mandato eletivo, proibição de exercício de profissão, atividade de ofício que dependa da habilitação oficial, de licença ou autorização do poder público, suspensão de autorização ou habilitação para dirigir veículos, proibição de freqüentar determinados lugares, limitação de fim de semana ou “prisão descontínua”, multa, prestação inominada.

              É sabido que no Brasil em 7% das penas são convertidas em penas alternativas.

              Essa percentagem de 7%( sete por cento), transformada em números reais, significa ainda um número insignificante quando a população pressionaria do país. À título desse pensamento, o Departamento Penitenciário Nacional que indica que quase 500 mil presos no país, em sistema que só tem capacidade para 260 mil detentos, desse modo, fazendo a porcentagem de 500 mil presos para 7% de penas convertidas em alternativas são exatamente 35.000 ( trinta e cinco mil) presos; prova- se nesse momento que o mínimo da ampliação das penas alternativas ainda é irrisório.

              Outra questão a ser apresentada como qualquer alternativa para o desaforamento da população carcerária, são os projetos realizados pelo fórum como a defensoria pública em parceria com as universidades locais, como é o caso do projeto “Reconstruindo a liberdade”, onde a Faculdade Paraíso do Ceará em Juazeiro do Norte tem com a Defensoria Pública do Estado do Ceará, esta modelo de projeto que deveria ser desenvolvido pelos demais estados do país, concomitantemente com as suas faculdades de direito.

              As perspectivas de melhoria desse projeto para o sistema penitenciário do Brasil são muito interessantes. No entanto, deve ser levado à sério pelo Estado que deve cuidar do preso com a dignidade e respeito que merece a pessoa humana.