A tentativa de explicar de fato o epicentro da criminogênese passa por diversos saberes devido à complexidade do ser humano. Não se pode mais hodiernamente querer albergar conceitos que tentem entender o que motiva o ser humano na prática delitual, sem o auxílio de diversas disciplinas como: Psicanálise, Psicologia, Filosofia, Antropologia, Direito, Biologia, Endocrinologia e Sociologia.

Nós somos seres que nos assentamos sobre as mais amplas influências; somos resultado de processos biopsicosociológicos. É imperativo não ter um olhar reducionista sobre os fatores que conduzem ao crime. Os Operadores do Direito quer sejam, Advogados, Juízes e Promotores de Justiça, necessitam urgentemente ampliar suas formações a fim de que passem a obter uma visão mais densa sobre as origens da criminalidade trabalhando também no processo de prevenção e não apenas de punição; já dizia Cesar Beccaria: “é preferível evitar os crimes a puni-los”.

Edwin Sutherland afirmava que: “seria inútil tirar os indivíduos, um após outro, das situações que produzem criminosos e continuar permitindo que essas situações continuem”. A sociedade precisa se antecipar as situações delitivas com medidas eficazes que busquem uma compreensão mais abrangente do indivíduo em sua vida cotidiana de modo que através de soluções pontuais a curto, médio e longo prazo, seja possível a erradicação da criminalidade.

 Existem teorias sociológicas que por séculos tentaram convencer que o epicentro do crime estava apenas na pobreza material do indivíduo. Aristóteles, já postulava que existem crimes que são praticados por pessoas que têm uma vida abastada e por isso, está ideia, apesar de ter a aparência de possível viés solucionador do problema, não passaria de ideologia falaciosa que tem por finalidade precípua, culpar os descamisados na tentativa desastrosa para elucidar o epicentro da criminogênese.

Alguns poderiam tentar ainda bradar que uma simples visita as unidades prisionais, seria o suficiente para que se provasse a validade desta assertiva; que os três Ts, ainda ganham em número dentro do universo do crime. A criminologia vem na tentativa de cientificar o processo de conceber a formação pari passu do crime em suas imensas perspectivas. No viés psicanalítico, o desenvolvimento humano normal preconiza o estabelecimento de uma relação de apego entre a criança e outro ser humano, que marcará profundamente a sua vida na seara da criação de um referencial que se tornará o seu sustentáculo principalmente quando está assustada, cansada, doente, também a ajudando na compreensão dos valores sociais e os interiorizando.

A formação deste vínculo de conforto e segurança marcará a diferença posteriormente quando a criança estiver em situações de tensão, fazendo-a passar de modo apropriado na angustia que está anexa a todo processo humano do simples viver o cotidiano. Freud sempre pontuou a questão dos recalques para a sobrevivência da espécie. O processo de domesticação dos instintos se dá com a formação apropriada de um superego equilibrado.

Aos poucos somos obrigados a nos tornar seres produtivos, eficientes que cumpram normas de civilidade abrindo mão da autotutela. Estamos dentro de contextos sociais que se modificam na sucessividade do tempo e na simultaneidade dos espaços. As lides geralmente têm seu prelúdio em resistências às pretensões que são diuturnamente fomentadas por intermédio dos meios de comunicação nos incentivando cada vez mais pseudonecessidades que dependendo de fatores como a estrutura da personalidade, podem ou não se transformarem em transgressão das normas sociais.

A Psicologia afirma a perquirição científica da personalidade seria de grande ajuda uma vez as grandes diferenças de personalidade é que no final de tudo irão conduzir alguns indivíduos à criminalidade e outros não. A individualização da pena não pode mais não levar em consideração os traços da personalidade da pessoa que delinque. Nos EUA existe o que é chamado de Pre-sentence investigation, que seria analises da personalidade do acusado auxiliando a justiça penal a tomar uma decisão mais coerente em relação da natureza do delito, até à concessão de suspenção condicional.

   A Endocrinologia criminal tem ajudado e muito explicando que as secreções endócrinas influenciam diretamente os estados emocionais, alterando-os e destarte, fazendo com que a pessoa cometa crimes. As tendências criminosas de uma pessoa estão sujeitas as mais diversas variáveis que podem ser matematizadas com a seguinte fórmula:

 C = P + FSG/R

  Faz-se mister a explicação pormenorizada de tal equação:

a)    A letra C diz respeito à questão do vocábulo crime e foi colocada em maiúscula uma vez que abrange todo tipo de delito;

b)    A letra P está relacionada à personalidade do indivíduo que traz consigo os fatores endógenos, exógenos e a interação destes com o meio circundante;

c)    As três letras seguintes, tratam dos fatores sociais gerais que se inserem nas condições de nascimento, tratamento familiar e escolha de amizades;

d)    O R maiúsculo está albergado na resistência psíquica que este indivíduo construiu durante a sua vida e sua eficácia na prevenção dos crimes.

Depois de várias pesquisas realizadas em diversas Universidades Americanas, ainda não se conseguiu provar cientificamente ao inatismo de instintos sociais ou antissociais. Os seres humanos, não nascem prontos; tornamo-nos homens! Está a mais pura e hialina verdade; não seguimos programações instintivas como as formigas. Nós somos criaturas que nos adaptamos aos diversos ambientes e regras; somos seres dinâmicos e não criaturas rígidas; estamos em um eterno vir-a-ser. Freud insistia que o indivíduo sadio teria que ter interações entre o Ego, ID e Superego bem formadas. A psicanálise mostrou a importância do estudo das interações endócrinas no comportamento humano. A conduta humana é cambiante; ela se modifica nas mais diversas situações.

O senso comum diz que pau que nasce torto morre torto; isto é um equívoco. As pessoas podem sim mudar; isto irá depender da força de resiliência que foi criada na primeira infância que servirá como o ponto de mutação na vida de determinados indivíduos desde que tenham a orientação correta. Nenhum crime ocorre sem a junção entre motivadores internos somados a situações externas. No final será a personalidade do sujeito que definirá se a ação irá ser conduzida ou não.

Até a pessoa aparentemente sadia psicologicamente falando, pode ser conduzida a adentrar na criminalidade. O grande diferencial será a forma como este indivíduo aprendeu a lidar com as frustrações e a quantidade de limites que lhe foi introjetado; é claro que esta afirmação se refere a sujeitos que não têm nenhuma patologia mais densa. O Estado precisa buscar alternativas, não apenas punitivas, mas acima de tudo preventivas, se utilizando de estratégias que possam coibir sem a utilização do jus puniendi de forma ostensiva.

A violência não pode ser banalizada da forma como está sendo há muitos anos. As crianças são inseridas no mundo da violência pari passu, cada dia mais através das grandes mídias. Tudo é permitido em nome da diversão, do entretenimento; as drogas lícitas continuam a ter o seu espaço no horário nobre; os filmes violentos são cada vez produzidos e por sua vez os mais vistos; os jogos no computador que têm mais saída são os que fomentam a violência; nas festas lícitas como o carnaval  aonde se gasta absurdos e em qualquer lugar do país se pode ver com facilidade, o sexo escancarado, as drogas lícitas e ilícitas para quem puder pagar mais e outras nem tanto e como consequência a violência; mas ninguém fala nada uma vez que muita gente ganha dinheiro.

Os produtores de televisão gostam de afirmar que fazem a sua parte colocando no ar com o intuito de ajudar a combater a violência em pouquíssimos segundos, aquela indicação de idade permitida; ora, como é que aquilo vai funcionar se a maioria das pessoas, não têm cultura suficiente, para compreender o alcance daquela mensagem? Continuamos com a educação de péssima qualidade; que não trabalha a cidadania, que incentiva o ter e a individualidade em todos os setores; os exames dos concursos, privilegiam a decoreba e os professores não gostam de serem criticados e tolhem aqueles alunos que tem pensamento próprio; em grande parte das faculdades de direito as pessoas aprendem apenas a serem legalistas, a decorarem os artigos e falarem as leis de memória; estes é que são ovacionados pelos professores; e que tipo de profissionais serão? Evidentemente, não profissionais do direito de fato, mas, reprodutores de uma sociedade corrupta aonde quem deveria fiscalizar, corrompe e se deixar corromper.

SAPERE AUDE?