A Confiabilidade das Decisões Judiciais

   Escrito por Elisangela Crsitina Aparecida Pereira

   Resumo

   A Justiça, como a própria palavra sugere, foi criada para tomar decisões justas sobre impasses, envolvendo duas ou mais partes. No entanto, na prática, as decisões judiciais não são um processo simples, onde a verdade sempre é facilmente alcançada, pois envolve uma análise de diferentes ângulos do mesmo evento. Portanto, este estudo vai avaliar as características que podem afetar a confiabilidade das decisões judiciais e o papel da ciência na busca pela verdade.

   Palavras-chave: confiabilidade, justiça, decisões judiciais, ciência, Lei.

   Introdução

  Com o propósito de viver em sociedade os seres humanos primeiro tiveram que aceitar que alguns instintos humanos, tais como o desejo de coisas que pertencem à outra pessoa, têm que ser controlados. É relativamente fácil imaginar um mundo sem regras, onde as pessoas podiam fazer o que quisessem, sem qualquer punição. Nas sociedades primitivas, os membros podiam resolver os problemas com os outros por conta própria, o que na maioria das vezes significava matar outros membros do grupo. No entanto, no mundo moderno em que vivemos, foi criado um sistema de regras acordadas pela comunidade com o propósito de garantir uma vida pacífica em sociedade.

   Portanto, a Lei pode ser definida como um acordo em sociedade, onde um grupo de pessoas, que normalmente representam a comunidade, é responsável por garantir que as regras sejam respeitadas por todos. Assim sendo, quando alguns dos membros da comunidade quebram esse acordo, as pessoas esperam que a Justiça puna-os, como uma forma de mostrar aos infratores e também a outros membros da sociedade que "maus" comportamentos têm consequências ruins. De acordo com Stephenson (1992), quando denunciam um crime, as vítimas esperam que o tribunal e a polícia persigam, acusem e punam o individuo ou grupo de acordo com o crime cometido.

  Para definir “crime”, dois aspectos importantes devem ser considerados: a intenção e a execução do ato. De acordo com Jamel (2008), para um comportamento ser considerado crime dois fatores precisam estar presentes: mensrea, o que significa que o indivíduo tem a intenção de cometer o crime, e actusreus, onde o acusado deverá ser o responsável pelo ato voluntariamente, sem qualquer tipo de coação. Contudo, um argumento consistente contra esta definição é que alguns criminosos podem usar este fato para mentir e manipular a justiça, minimizando a sua sentença ou até mesmo sendo absolvido das acusações. Por exemplo, um homicida poderia alegar que o crime fora cometido sob o efeito de falta temporária de controle causada por uma situação extremamente estressante ou por efeito de substâncias tóxicas.

   Além disso, para lidar com crimes diferentes e “fazer” justiça de acordo com o que é esperado pela sociedade, não só o grau da ofensa precisa ser considerado, mas também o sistema de justiça específico da comunidade envolvida, tendo em vista o fato de que a definição de crime, e a punição variam consideravelmente entre as sociedades. Por exemplo, a idade em que os jovens podem ser considerados criminalmente responsáveis ​​variam de 7 na Irlanda e 8 no Reino Unido a 16, na Espanha. (McGuire, 2004)

   Características Envolvidas nas Decisões Judiciais

  Como o sistema de justiça foi criado e é gerido por seres humanos, este é suscetível a erros. É necessário levar em consideração, por exemplo, que as testemunhas e, por vezes, até mesmo as vítimas podem mentir, deliberadamente ou por erro. A busca da verdade é um processo complexo que envolve muitos obstáculos, como a confiabilidade das provas, a precisão da memória das vítimas e testemunhas, a influência de advogados ou até mesmo a falta de treinamento das pessoas responsáveis ​​para condução da justiça (tais como a polícia).

   Por conseguinte, é necessário levar em consideração que os erros podem acontecer mesmo no início do processo, onde, por exemplo, o policial pede a uma determinada testemunha para reconhecer um delinquente. A forma como este processo é conduzido, a forma como a polícia interroga a testemunha, pode facilmente influenciar a identificação do acusado.  Portanto, mesmo sendo muitas vezes as testemunhas a única chave para descobrir a verdade, é essencial considerar o fato de que elas podem mentir, ou cometer erros devido a influências externas ou até mesmo baseados em falsas memórias. 

   Formação do Júri

  A formação do júri é outra parte importante do processo judicial. Os jurados precisam ser capazes de avaliar as provas apresentadas com justiça e imparcialidade, não sendo influenciados em suas decisões por aspectos externos, pré-julgamentos, preconceito, sentimentos pessoais etc. Além disso, os jurados devem ter certa familiaridade com a lei, sendo instruídos pelos advogados e o juiz. Por conseguinte, os jurados deverão ser capazes de considerar as evidências apresentadas de forma sistemática, baseando-se na lei para chegar a um veredito. (Ogloff & Rose, 2005)

   Além disso, os advogados experientes são excelentes "jogadores", pois eles têm a capacidade de usar as palavras corretas a favor do seu caso. Por vezes, eles podem até mesmo manipular as provas para convencer os jurados de que o que eles estão defendendo é o lado verdadeiro. Por exemplo, se a testemunha é a única evidência contra o seu cliente, provavelmente eles tentarão atacar a confiabilidade da testemunha ou usarão de alguma outra tática semelhante para desmerecer a declaração da testemunha.

   Portanto, para ser um jurado é necessário certo nível de instrução para compreender a lei e um elevado nível de neutralidade, características não muito fáceis de encontrar em pessoas comuns. Logo, o que pode ser visto na prática, é um júri constituído por pessoas sem o mínimo conhecimento sobre a lei e, por muitas vezes, sem nenhum interesse em ser um jurado. 

   Ciência, Psicologia e Direito

   A semelhança entre Psicologia e Direito é a preocupação com a descrição, análise, compreensão, explicação, previsão e, por vezes, a forma como o ser humano se comporta. Por outro lado, uma diferença importante é a visão defendida pela Lei de que os agressores têm livre-arbítrio, que eles escolhem cometer crimes, enquanto que para psicólogos as decisões dos infratores são controladas ou mesmo determinadas (Carson et al., 2007).

   No entanto, mesmo com pontos de vista diferentes, a Psicologia continua sendo uma importante ferramenta que pode ajudar a minimizar falhas na justiça, por exemplo, aplicando os resultados de pesquisas na análise de provas e confiabilidade das declarações de testemunhas. Portanto, ao invés de trabalhar em lados opostos, estas duas disciplinas deveriam trabalhar juntas, combinando conhecimentos para formar uma visão interdisciplinar da justiça, o que pode ajudar a conduzir julgamentos mais justos.

   Williamson (2004), afirma que, embora tenham sido criadas leis tentando minimizar falhas na Justiça, isso ainda ocorre em grande número. Portanto, conforme sugerido por este mesmo autor, a sociedade pode ajudar a garantir a imparcialidade da justiça, exigindo julgamentos mais justos, fazendo melhor uso de provas cientificas e pareceres de profissionais especializados, onde uma maior sensibilidade para entrevistar testemunhas vulneráveis ​​e vítimas pode permitir o melhor alcance de evidencias, ajudando os tribunais a evitar falhas nas decisões judiciais.

   Considerações Finais

   Crime não é apenas uma ofensa cometido contra alguém, é contra toda uma comunidade, é a quebra de uma regra que foi previamente acordada pela referida sociedade. Portanto, para a Lei ser respeitada e válida, a sociedade precisa confiar na justiça como um sistema justo, que trabalha em prol da comunidade.

   Para tanto, a ciência pode ajudar a justiça, em muitos aspectos, tais como a realização de pesquisas sobre os possíveis aspectos que podem influenciar testemunhas e vítimas, ou na comprovação de evidências, como por exemplo o exame de DNA e identificação de impressões digitais, que são altamente utilizados em decisões judiciais como forma de minimizar os erros.

   Referências

   Carson, D., Milne, B., Pakes, F., Shalev, K. & Shawyer, A. (Eds.) (2007). Aplicando Psicologia à Justiça Criminal. West Sussex: John Wiley & Sons Ltd.

   Jamel, J. (2008). "Crime e suas causas" no Davies, G., Hollin, C. & Bull, R. (Eds.) Psicologia Forense West Sussex:.. John Wiley & Sons Ltd.

  McGuire, J. (2004) Psicologia Compreensão e Crime:. Perspectivas sobre teoria e ação. Milton Keynes: Open University Press.

   Ogloff, J. & Rose, V. (2005). Psicologia "A compreensão das instruções judiciais" em Brewer, N. & Williams, K. (Eds.) e Direito:. Uma perspectiva empírica. New York: A imprensa Guilford.

   Stephenson, G. (1992). A Psicologia da Justiça Criminal. Oxford: Blackwell Publishers.

   Williamson, T. (2004). "As respostas dos EUA e do Reino Unido toMiscarriages da Justiça" em Adler, J. (Ed.) Psicologia Forense: Conceitos., Debates e Prática. Cullompton: Willan Publishing.