O dia 20 de junho de 2009, na cidade de Barra Mansa, não poderia ter terminado de forma tão repugnante. O espaço, que deveria ser de interação entre sociedade civil e governo, para elaboração conjunta de propostas de educação para o Sistema Nacional Articulado de Educação, transformou-se num espaço de discriminação, justamente no eixo temático específico que tratou da Justiça Social, Educação e Trabalho: Inclusão, Diversidade e Igualdade. A discriminação e o preconceito racial ficaram evidentes em duas explícitas e indignantes ações:


Primeiramente foi constatado uma aversão ao sistema de cotas raciais, por parte de alguns delegados presentes na COMUE, sem ao menos conhecerem e reconhecerem o histórico da construção do Brasil-Nação e seus distintos atores, que ocuparam e ocupam papéis divergentes nos segmentos étnicos. De fato o termo "cota social" poderá ser incorporado ao Estatuto da Igualdade Racial, mas é preciso observar o quantitativo populacional de cada segmento étnico (cotas raciais). Assim, mais do que garantir as cotas sociais, é necessário reduzir a disparidade entre as etnias eliminando o racismo em todas as suas facetas, principalmente os ocorrido dentro das repartições públicas ? Racismo Institucional - que impedem avanços significativos como o da implantação das Leis: 10.639/03 e 11.645/08 e até mesmo a aprovação do texto original do Estatuto da Igualdade Racial.


Em seguida, ocorreu uma grave acusação de caráter leviano, conotando o furto de um Notbook pela própria dona do aparelho, tratando-se da Professora Clarice, uma das colaboradoras da comissão organizadora da COMUE e também funcionária da rede pública que atuava como coordenadora do grupo que discutiu o eixo VI, justamente o eixo que tratava dos seguintes temas: Justiça Social, Educação e Trabalho: Inclusão, Diversidade e Igualdade.


O fato se deu quando a mesma já distante do local da conferência, em minha companhia, recebeu uma ligação no seu telefone celular, da Secretária Municipal de Educação - Srª Silvia Victória Coutinho, irmã da então vice-prefeita ? Ruth Coutinho (segundo a minha limitada sabedoria ? configuração de nepotismo).


No diálogo, a Srª Secretária comunicou à Professora Clarice que um dos notbooks utilizado durante a Conferência havia desaparecido e que este estava na sala 12 ? sala esta, que a Professora coordenava. A Clarice afirmou que o notbook desta mesma sala lhe pertencia e que estava em seu poder. Em seguida a Srª Silvia desligou o telefone.


Logo em seguida, a Professora Clarice recebeu uma outra ligação, agora da Srª Fátima Lima, que coordenou e presidiu a COMUE. Em um estado de pleno nervosismo, mal pode falar, dizendo apenas que havia acontecido um problema e que depois comunicaria à professora.


Já em minha residência, a Clarice recebeu outra ligação, agora da Srª Beatriz - diretora da Escola Municipal 9 de Abril e membro da comissão organizadora da COMUE que esclareceu todo o ocorrido. A mesma trabalhou o tempo todo comigo e com a Professora Clarice na sala 12 durante o período da Conferência e que também foi vítima da acusação que segue:
Ficou previamente estabelecido que todos os coordenadores de grupo que dispunham de notbook o levariam para auxiliar na visualização, via datashow das propostas. Prontamente a Clarice atendeu levando seu aparelho, que lhe foi cedido pela própria Secretaria Municipal de Educação.


Após o recebimento as ligações citadas, entendeu-se que: a Professora Elizabeth - coordenadora da sala de leitura deste município ? que possui característica de práticas racistas, havia informado à Secretária de Educação que tinha avistado a Profª Clarice e mais dois indivíduos negros, saindo do espaço da conferência com um notbook. Estes dois indivíduos éramos eu, Helbson - Coordenador Estadual de Formação dos Agentes e Pastoral Negros - e o Srº Marcio - metalúrgico há 27 anos e esposo da Diretora Beatriz, já citada.


Indignados fizemos as seguintes reflexões:


1) Não havia possibilidade de sumir nenhum notbook, pois:


a. Cada coordenador levou o seu e por conseguinte o retiraram do espaço da conferência ao final do trabalho, não havendo a necessidade de controle desses aparelhos por parte da Secretária, o que também não seria tão difícil visto que haviam apenas doze destes sendo utilizados;


b. Fomos o último grupo a deixar as salas onde se reuniu a equipe de trabalho em direção ao espaço da plenária final portando de forma visível o aparelho.


2) Houve a real intenção da discriminação racial uma vez que:


a. Ao sairmos do espaço da COMUE, cumprimos todo o protocolo de saudações, inclusive nos despedindo da Secretária de Educação que nos agradeceu pelo sucesso da Conferência;


b. Não houve o esclarecimento dos fatos de forma prévia antes que fizessem as tais ligações do suposto furto.


c. Éramos a sala com o maior contingente de delegados negros e com interesses afins;

3) Com base nestes fatos relatados, decidimos que:


a. Responderemos a esta real intenção de discriminação racial, conhecida como Racismo Institucional, por meio de um processo junto ao Ministério Público;


b. Ofereceremos a denúncia ao Ministério Público contra a Instituição organizadora ? SME.


c. Faremos a denúncia em nome das Instituições as quais representamos.


É inadmissível que, aos fins da primeira década do século XXI ainda presenciamos práticas racistas que nada contribuem para o desenvolvimento democrático e superação das desigualdades historicamente constatadas em nossa sociedade.


Acompanharemos com afinco cada passo desse processo e exigiremos justiça e o pleno cumprimento das Leis: 10.639/03 e 11.645/08 como também a aprovação do Estatuto da Igualdade Racial.


Pleiteamos uma nova geração, estamos lutando para que num futuro bem próximo não tenhamos mais que falar sobre tais temas e onde todos ? branco e negros - possam desfrutar de uma sociedade mais justa e igualitária sem preconceito e/ou discriminação.



Helbson de Avila
Economista
Coordenador Estadual de Formação
dos Agentes de Pastorais Negros/RJ
Militante do Movimento de Economia Solidária
P.S.: Com o implícito, porém claro, objetivo de preservar seus cargos junto à administração pública, as três citadas funcionárias optaram por não apresentarem a denúcia e buscarão reparação por meio de projetos então engavetados que segunda as mesma beneficiaram diversos estudantes da rede municipal de ensino. Discordando da então decisão seguirei, na medida em que a justiça permite, uma vez que trata-se de acordo políticos "de cavalheiros" visando manter sempre os mesmo racistas nestas posições e esferas de poder constituido ao custo tricentenário de nossas dores.