KERLEY JOSÉ FREITAS DA SILVA[1]

RESUMO

O rigor científico tornou-se uma das tarefas fundamentais na academia para o conhecimento histórico. A história hoje reconhecida como ciência, passou por vários processos para a conquista de seu método científico que consiste em uma análise adequada de seu objeto. Utilizou-se como instrumentos para a realização deste artigo, as concepções de diferentes autores que discutem a cientificidade da história e o conhecimento da realidade científica em reconhecer as mais variadas áreas do conhecimento humano como ciência.

Palavras- chaves: ciência, cientificidade, história.

1.Introdução

"[...] A ciência era antes baseada no senso comum e fazia o senso comum menos comum; mas agora é ciência tornada comum" (MOSCOVICI, Serge. Representações sociais: investigação em psicologia social. 3ª Ed. Petrópolis: Vozes, 2003, p. 60).

Através dos tempos, a necessidade de educar as novas gerações sempre teve que lidar com o aparente paradoxo entre formar e informar. Em face do desafio de assumir prioridades diversos modelos de ensino acabavam por priorizar uma ou outra vertente, sem que necessariamente se tivesse clareza das implicações para o processo de formação humana ou para a constituição da sociedade.

Sobre as diversas áreas do conhecimento humano, ainda há quem insista em ensinar nas escolas e faculdades, que os conteúdos dos cursos (Fundamental, Médio e acadêmico) têm procedência de uma pesquisa científica e que para tal procedimento é necessário um método de investigação. Assim acontece com a Matemática, com a Biologia, a Física, a Química e certamente com a História. Todavia, a História sofre críticas pesadas quanto a sua validade científica.

Muitos estudiosos, acadêmicos, ou até mesmo curiosos, discutem a posição da história quanto ciência ou não; alguns tratam a história como um método, embasado na teoria de que toda ciência utiliza métodos para desenvolver sua teses e teorias, muitas vezes não deixam claro o que é científico e o que é tecnológico, e até mesmo, o que na é científico. Hoje sabemos que existem vária áreas de conhecimentos, algumas são ciências, outras não.

2.A fronteira entre a Ciência e a História

Ciro Flamarion Cardoso[2], como historiador de renome mundial, cria sempre discussões e debates historiográficos, pois tem produzido livros e artigos que facilitam essas discussões. Em seu texto "Será a História uma Ciência?", começa uma discussão que envolve a História, suas teorias e seus métodos, expondo de uma forma clara o questionamento sobre o problema da cientificidade da História, e apontando exemplos interessantes como o da Matemática, que é uma ciência, onde se pode provar tudo com absoluta certeza, enquanto que as outras ciências, chamadas factuais, podem ser falsificadas.

Neste contexto sempre vale destinar um olhar mais atencioso para sua produção teórica e refletir a luz de suas conclusões. Não perdendo de vista a complexidade do tema, uma vez que a cientificidade da História é contestada por muitos.

A intenção aqui não é realizar uma discussão mais profunda sobre o tema em questão, esta abordagem tem por limite a seguinte finalidade: caracterizar brevemente alguns aspectos que na perspectiva do estudante de História, a pergunta "Será a História uma ciência?", e apontar as conclusões mais atuais.

Fazendo comparações entre o biólogo e o historiador, podemos observar o seguinte: o historiador não pode predizer o futuro, não pode explicar o passado, mas só interpretá-lo. E não há uma forma decisiva de pôr à prova as suas interpretações alternativas, enquanto que o biólogo, porém embora não possa prever a evolução futura e explicar a passada (só pode interpretar), tem certas vantagens sobre o historiador, como por exemplo: pôr a prova suas descobertas. Todavia, Ciro Flamarion Cardoso mostra a sua conclusão, "A pesar de tais vantagens para o especialista em evolução biológica, continua sendo verdade que não existem leis da evolução comparáveis às leis da Física, exatamente como não há leis da História. A teoria da evolução, portanto, nem é completamente científica como, por exemplo, a Física, nem não científica como a História."

Ainda completa, "Nada mais claro! Aprendermos, assim, que para certos cientistas naturais, e sobretudo para certas correntes da Filosofia da ciência, como no caso o Neopositivismo, a História não é e nem pode ser ciência."

Todavia o presente texto busca elucidar exatamente a cientificidade da História. Sua discussão envolve a ciência histórica em nível da História e do historiador. Portanto, ao falar sobre cientificidade da História, não se pode deixar de fora o papel do historiador e seu objeto de pesquisa.

Hoje, a ciência histórica procura explicar cada passo do homem, sua evolução em seus ramos Econômicos, Demográficos, Político, Social e Cultural. Assim, podemos afirmar que a História não é ciência por tentar abranger todas as áreas do conhecimento? Como explicar que "a História da mulher, História da criança, História do Direito, do negro, do índio, história das Mentalidades, história ambiental, etc", são temas discutidos pela ciência histórica, sabendo que existem outras ciências envolvidas com esses temas especificamente? Na verdade, a história como ciência, procura entender e explicar a historicidade da condição humana.

Como já foi discutido por muitos pesquisadores da área de História, o historiador, para reconstruir o conhecimento histórico, lança mão da sua principal ferramenta, o objeto de estudo da história, ou seja, o homem no tempo.

As discussões sobre a ciência histórica nos mostram que o objeto da História é o homem no tempo, e que esse objeto é o fato humano acontecido. O fato histórico serve como compreensão de um processo vivido por uma sociedade, e o método da História é a interpretação desse fato através das análises das mais variadas fontes. (Exemplo: escritas, orais, arqueológicas, etc.).

Por outro lado, não basta para nós, frente ao desafio, apenas descrever e explicar as especificidades e as dissonâncias representadas pelas concepções desafiantes como uma resposta plausível. Temos aqui também um problema epistemológico a ser enfrentado. Deve-se examinar, primeiramente, quais são os instrumentos teórico-metodológicos de que se utilizou para a determinação da cientificidade da História.

Se também chamamos de ciência a soma dos conhecimentos científicos disponíveis num dado momento, podemos também afirmar que tem um conteúdo próprio e método para estabelecimento dos fatos. O método cientifico é que vai determinar as maneiras de obter tal conhecimento, e as características desse conhecimento é ser verdadeiro. Qual a fronteira que separa a História da ciência, se a História tem método próprio, busca a verdade, não a verdade absoluta e eterna, mas que pode ser discutida?

A ciência é a parte do conhecimento que utiliza métodos racionais e que busca comprovação experimental, procurando ver à realidade como ela é.

HAYDEW WRITE relata que a História é uma arte literária de menor valor, portanto não é uma ciência. Porém, LUCIEN FEBVRE e MARC BLOCH, afirmam que a História é uma ciência humana que trabalha as verdades possíveis de outro olhar, com métodos e objetivos próprios, usa métodos racionais que buscam a lógica para comprovar o que fala.

O conceito que se tornou muito utilizado na academia de que História é uma ciência que estuda o homem e as sociedades humanas no tempo, hoje já pode está precisando de um complemento ou uma ampliação, haja vista que existem tantos caminhos que são utilizados pelos historiadores para a pesquisa histórica, pois o homem está envolvido em vários contextos da ação e da experiência humana[3].

Não só ao poeta, mas também ao historiador incumbem recuperar lágrimas e risos, desilusões e esperanças, fracassos e vitórias fruto de como os sujeitos viveram e pensaram sua própria existência, forjando saídas na sobrevivência, gozando as alegrias da solidariedade ou sucumbindo ao peso de forças adversas[4].

Para a historiadora Vavy Pacheco Borges, a história é um termo com o qual vivemos diariamente desde nossa infância, que não podemos concebê-la como um passado distante e morto, mas de uma forma que possamos acreditar que o conhecimento histórico possa ajudar a explicar a realidade e transformar as ações humanas que estão presentes em nossas vidas hoje. Segundo a visão dessa historiadora, para melhor compreensão da ciência histórica, precisamos partir da história da História, ou seja, as primeiras concepções que envolvem o misticismo, a religião, que coloca o homem em segundo plano e passivo das ações dos deuses que estão em primeiro plano, uma história não científica, pois ainda não estavam estabelecidos os métodos de análise, etc. História baseada em mitos era concebida como um passado tão distante, tão remoto e por ser delimitado um tempo cronológico e o espaço territorial onde ocorreu o processo histórico, não havia cientificidade, pois não sabiam quando se deu o fato. Eram fatos mitológicos e não históricos.

A história só recebeu o estatuto de ciência quando os pesquisadores passaram a empregar a palavra (história) no sentido de investigação e a utilizar como fontes de pesquisas os registros documentais escritos. Porém, isso só aconteceu entre o final do século XVIII e início do XIX.

(...) os critérios e procedimentos de crítica e análise das fontes, entre o fim do século XVIII e inicio do XIX, que a História ganhou autonomia diante da Filosofia e das ciências humanas e, em relação a estas ultimas, reivindicou semelhante estatuto de cientificidade[5].

O historiador Jorge Grespam[6] escreveu que foi no final do século XVIII é que começou a ser discutido e desenvolvido os critérios e procedimentos de críticas e análise das fontes é que a história passou a ser ciência. Foi o método, portanto, que deu a história o caráter cientifico e ao historiador, a condição de cientista.

Mas a pesar de ter recebido o estatuto de ciência, o que se deu com a escola Positivista em fins do século XIX, como afirma as historiadoras Maria do Pilar de Araújo Vieira, a História recebeu duras criticas no século XX com afirma Jorge Grespam.

3.Considerações finais

As mudanças por que passaram as abordagens interpretativas do passado a partir do século XIX, sobretudo com uma valorização da arqueologia para explicações das raízes da humanidade, ensejaram uma formatação mais palpável e duradoura do tempo histórico e da noção contemporânea de resultado de experiências acumuladas, ao menos em setores mais progressistas do meio acadêmico.

Essa percepção no trato das questões acerca de tudo o que o homem conhece na natureza para a aplicação na vida cotidiana tanto na corrente cultural ou nas demais correntes como, por exemplo: social, política, econômica, etc, com afirmações de serem conhecimentos científicos ou não, abre um grande leque de discussões não só no meio acadêmico, mas nos debates ideológicos dos meios sociais.

A cada dia que passa o tempo, o conhecimento histórico se firma como um conhecimento cientifico e dialogando com as outras áreas do conhecimento, constrói-se um conhecimento verdade em uma perspectiva interdisciplinar.

Na academia, a história é vista muito mais como uma questão do presente do que do passado. Compreender aquilo que somos hoje, como indivíduos ou sociedade olhando para o nosso passado, para o ontem, parece ser a busca da compreensão de onde viemos e para onde vamos. Isso pode parecer um paradoxo, afinal a própria etimologia da palavra história vem de uma raiz grega que significa "SABER", e embora nossa imaginação não conheça fronteiras, não podemos saber o que o futuro nos reserva. Mas se tivermos em mente que os objetivos da ciência são o de expandir as fronteiras do conhecimento, então a ciência histórica pode contribuir muito para atingirmos este objetivo.

Para que serve a história? Afinal nas ciências queremos entender o porquê das coisas: Porquê o céu é azul na Terra e amarelo em Marte? Porquê a água molha? O que nos leva a fazer estas perguntas e estudar este ou aquele assunto?

É através da história que podemos explicar como as sociedades que viveram no passado cometeram erros que hoje não se comete mais devido as informações deixadas por esses ancestrais que registraram suas experiências boas e ruins. Assim a ciência é um esforço continuado que sempre requer novas cabeças e novas idéias que nos ajudem a enxergar novas direções. As nossas decisões enquanto homens e cientistas podem influenciar toda uma sociedade e nem sempre de maneira positiva.

Os grandes momentos da história da humanidade quer nas áreas das Ciências Sociais, quer na Física, na Matemática, na Biologia, na Química, etc, estão registrados em documentos que retratam a ação do homem no tempo. A ciência histórica é tudo isso porque registra o fato humano acontecido seja ele em qualquer área da ação humana.

Para concluir,Ciro Flamarion Cardoso, diante de todas as discussões travadas por muitos teóricos nas diversas áreas da Filosofia e das ciências humanas, conclui que "a História é uma ciência em construção, pois não busca verdades absolutas e eternas, que a conquista de seu método cientifico ainda não é completa e que os historiadores ainda estão descobrindo os meios de análise adequados ao seu objeto".

Se a base de toda ciência são as provas, podemos provar nossas teses e teorias utilizando as concepções dos pesquisadores que vieram antes de nós. Na História cientifica, utilizamos as fontes históricas e o método de análise das fontes para só depois construir o texto historiográfico. Os historiadores não podem testar um fato humano do passado ou do presente, mas pode analisá-lo e interpretá-lo através do Método da História.

Os grandes intelectuais do século XIX e XX tais como: Albert Einstein que recebeu o Nobel de Física em 1921, por desenvolver a teoria da relatividade. Karl Marx fundador da doutrina Comunista, como pensador influenciou várias áreas como a Filosofia, História, Sociologia, Antropologia, Ciência Política, etc. Em uma pesquisa da rádio BBC de Londres em 2005, foi eleito o maior filósofo de todos os tempos. Max Weber, considerado um dos fundadores da Sociologia. Émile Durkheim, fundador da escola francesa de sociologia, conhecido com um dos melhores teóricos do conceito de coesão social. Nelson Mandela, Stive Biko, Jonh Kennedy, Mahatma Gandhi, Jonh Lennon, Adolf Hitler entre outros fizeram história e mudaram o mundo.

Baixar uma lista de nomes precisaria de vários quilômetros de papel. Todos esses homens atuaram nas mais variadas áreas e influenciaram gerações por décadas a até hoje continuam e influenciar. Foram homens que com suas ações no tempo, deixaram um legado para a geração presente e para as outras que ainda viram. Um legado que pode ser utilizado pelas diversas áreas seguindo algumas regras e normas para se tornar ciência.

Seja como for, as ciências humanas não testa em um laboratório o fato humano acontecido como ocorre em outras áreas, mas se utiliza de métodos que podem comprovar o que falam. A metodologia utilizada pela história tem mostrado que com o avanço da ciência a da tecnologia que não param de surpreender com as novas descobertas, que a História é uma ciência humana.

4.Referências

BORGES, Vavy Pacheco. O que é história. São Paulo; Brasiliense, 2005.

BLOCH, Marc. História e historiadores. Lisboa, Teorema, 1998

CARDOSO, Ciro Flamarion. Uma introdução a História. São Paulo: Ed. Brasiliense, 1984.

GRESPAM, Jorge. Considerações sobre o método. In: PINSKY, Carla Bassanezi (org.). Fontes históricas. São Paulo: Contexto, 2005.

MOSCOVICI, Serge. Representações Sociais: investigação em psicologia social. 3ª Ed. Petrópolis: Vozes, 2003, p. 60.

VIEIRA, Maria do Pilar de Araújo; PEIXOTO, Maria do Rosário da Cunha; KHOURY, Yara Maria Aun. A pesquisa em História. São Paulo: Ática, 2005.



[1]Graduado (licenciatura e bacharelado) em História pela Faculdade de Macapá (2007). Atualmente encontra-se em fase de conclusão da Pós-Graduação (Lato Sensu) em História do Amapá pelo Instituto de Pós-Graduação e Extesão - IBPEX. Tem experiência na área de História com ênfase em História Cultural, atuando principalmente nos seguintes temas: Identidade Cultural, Tradições Orais e populações tradicionais (Parteiras e comunidade remanescentes de Quilombo).

[2] CARDOSO, Ciro Flamarion.Uma introdução a História. São Paulo: Ed. Brasiliense, 1984.

[3] Os vários caminhos ( ou vieses como já se convencionou chamar na academia) envolve os processos históricos na História política, na História Econômica, na História Cultural, na História Social, na História das Mentalidades, etc. Existem ainda as chamadas "áreas de concentração" que envolve a História das relações de gênero, do cotidiano e da vida privada, da educação, da arte, da ciência, etc.

[4] VIEIRA, Maria do Pilar de Araújo; PEIXOTO, Maria do Rosário da Cunha; KHOURY, Yara Maria Aun. A pesquisa em História. São Paulo: Ática, 2005.

[5] GRESPAM, Jorge. Considerações sobre o método. In: PINSKY, Carla Bassanezi (org.).Fonte históricas. São Paulo: Contexto, 2005. P. 29.

[6] GRESPAM, Jorge. Considerações sobre o método. Op Cit.