UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA "JÚLIO DE MESQUITA FILHO" - UNESP












A CIÊNCIA E O MÉTODO:
PERCORRENDO A HISTÓRIA


LEONARDO CAIEIRO GEYER






ARARAQUARA, 22 DE JUNHO DE 2010
1. INTRODUÇÃO

Pretendo, no presente trabalho, desenvolver, em termos gerais, o desenvolvimento da noção de ciência e o caminho que ela vem percorrendo durante a história, ressaltando seus principais autores, os principais contribuidores de sua vigência como perspectiva predominante na nossa sociedade. Digo "em termos gerais", por se tratar de um assunto extremamente amplo e complexo, e seria inviável desenvolvê-lo em sua totalidade neste trabalho acadêmico, devendo ser uma questão cabível a uma obra inteira. Dito isso, descreverei o processo de redução da ciência ao método, fenômeno no qual transformou totalmente a maneira de como a ciência trabalha com seu objeto, uma vez o que método, grosso modo, é a espinha da coluna vertebral da ciência. Para isso, utilizarei de textos acadêmicos escritos pelo Prof. Dr. José dos Reis Santos Filho, nos quais há o levantamento de questões acerca deste tema. Por último, tratarei da redução do método à técnica, mais precisamente posta no séc.XX, em que o processo se deu de forma mais enfática.
Espero, com este trabalho, contribuir com descrições e levamentos a respeito da ciência como viés predominante, no sentido de apontar os pontos principais com os quais fez dela mais que um meio para se chegar à verdade, mas sim se tornar a própria verdade do mundo.



















2. A CIÊNCIA E O MÉTODO: PERCORRENDO A HISTÓRIA

A ciência hoje, na Modernidade ? ou na pós-Modernidade, como querem alguns ? atua como um modo de ver o mundo de forma predominante, em que seus preceitos, regras e leis ditam as verdades perante à sociedade, compreendendo o senso comum, a mídia e a academia, em pontos gerais. Porém, para que isso ocorresse, a ciência passou por um longo processo na história ocidental, se iniciando, de forma primária, com os pré-socráticos, depois com Platão e Aristóteles, passando por um período de dúvida e descrença durante a Idade Média, fase na qual a Igreja católica ditava as verdades absolutas do mundo; entretanto, mais tarde, retoma sua força com Descartes, Bacon, Galileu e Newton, os quais vivenciavam um novo período da história da humanidade, onde grandes mudanças e transformações estavam acontecendo; a ciência desenvolve-se, então, no caso das ciências humanas, sistematicamente com Marx, Durkheim e Weber, gênios modernos que trataram de assuntos importantes da nossa sociedade, desenvolvendo cada um, a seu modo, perspectivas e ideologias. Desse modo, para que se entenda realmente o que É a ciência hoje, devemos começar pela Idade Antiga, palco de outros gênios, como Platão.
Com os pré-socráticos, temos as primeiras questões acerca das coisas que rodeavam os homens, como o ar, a água, a terra, as estrelas, os fenômenos naturais, enfim, o mundo. Nesse sentido, filósofos como Tales de Mileto, Heráclito, Parmênides, Arquimedes, entre outros, dão nome aos que buscavam respostas para os vários fenômenos presentes no mundo. Em suma, cada um na sua perspectiva, procurava estudar a constituição das coisas, tentando levantar indícios que comprovassem suas teorias. Isto é, buscavam provas que os ligassem aos fatos verídicos. Em outras palavras, estavam em busca da verdade.
E é com Platão que essa tendência vai se desenvolver. Em Platão, a ciência, de forma embrionária ainda, começa a dar seus passos no que concerne à sua existência: tem por objetivo fazer a mediação do filósofo com os fatos mundanos. Nesses termos, a maior prova disso, em Platão, vem com o Mito da Caverna, ou Alegoria da Caverna. Esta metáfora descreve diversas pessoas acorrentadas em uma caverna olhando para uma sombra na parede desta caverna, com o formato de chamas de uma fogueira, segurada por outros homens que se encontram na entrada da caverna. Atrás das pessoas acorrentadas, há um grande morro, cheio de elevações e obstáculos, e lá no alto deste morro está a verdadeira fogueira, a qual projetava sua sombra naquela parede, vista pelos acorrentados. Nesse sentido, podemos interpretar essa metáfora como o processo no qual a verdade absoluta deve ser buscada pelos filósofos, e depois expandida e divulgada por estes, para que se chegue à essência das coisas. Assim, citando uma ideia presente no texto "O método como parte de um campo epistêmico", podemos dizer que, em comparação com a ciência na época de Platão e a ciência como se encontra hoje, podemos perceber que em ambos os casos "o objetivo é um só: reduzir a horizontalidade dos acontecimentos à verticalidade do conhecimento" (Garcia-Roza, 1983, p. 10).
Com essa frase, podemos inferir que o objetivo da ciência é pegar os fenômenos da natureza, na sua vastidão de indefinições, variáveis e desarticulações, e transformá-los em uma leitura na qual a interpretação seja universal, inconfundível e, sobretudo, verídica. Assim, a "verticalidade do conhecimento" consiste em um conjunto de leis e regras necessárias para se processar um acontecimento da natureza ou, no caso das ciências sociais, da sociedade, ao nível do conhecimento ciêntífico, para que essa "passagem" seja feita de forma segura e na preservação da verdade. Sendo assim, esta questão se desenvolverá no salto metodológico e histórico de análise, na passagem da Idade Antiga para a Idade Moderna, com Descartes e Bacon.
Na Idade Moderna, o mundo que estava se formando era totalmente diferente daquele de Platão, com novas questões, novos fatos, novas formulações, mas com uma semelhança: a ciência, salvo suas diferenças singulares de autor pra autor, estava sempre em busca de leis e regras que interpretariam os acontecimentos de forma verossímel. Nesses termos, seguindo uma passagem do texto "O método como questão na pesquisa com intencionalidade científica", podemos ver que "Bacon e Descartes são responsáveis por aproximações que buscam dar conta de toda uma nova pré-disposição do homem em relação à natureza, a si mesmo e ao social" (Reis). Essa nova disposição da qual se fala refere-se as transformações dos fenômenos sociais no novo mundo, e o objetivo do homem de apreender tudo isso de forma sistemática. Em outras palavras, na ideia de Bacon, transmitida através de sua frase "Conhecer é poder", é a máxima necessidade do homem em conhecer a natureza para poder manipulá-la; ou seja, a práxis humana já é colocada em Bacon, e o sujeito está totalmente posto para compreender e interpretar o mundo, dominando a natureza, e surgindo como o ser racional, capaz de imperar sobre o mundo.
E são nesses parâmetros que a ideia do método aparecerá com maior força, visto que a necessidade de se estabelecer leis gerais e corretamente interpretáveis na ciência para que se chegue às verdades dos fatos de forma correta estão totalmente presentes e atuam de formas vitais. Mais ainda, "o método aparece aqui como a diferenciação entre o conhecimento científico e qualquer outro tipo de conhecimento" (Reis).
Seguindo uma importante ideia no texto "As ciências sociais e a tradição", para Bacon, tendo na sua cabeça as tranformações do mundo, "o método de Aristóteles já se fazia limitado, não seria adequados à busca da verdade. A contraposição é um novo método que signifique uma nova ordem, um novo processo para continuar a promover a experiência" (Reis). Numa palavra, podemos destacar que o método se torna questão fundamental na ciência moderna, não sendo forçoso falar que a ciência acaba sendo definida como método. Assim, a ciência só é definida de acordo com suas leis, regras e metodologias para se chegar a um objetivo final: resultados.
Mais que isso, podemos ver esse processo de redução da ciência ao método nas obras de Marx, Durkheim e Weber, como também o método se tornar objeto de ideologias e objetivos políticos.
O exercício feito por Marx, no que diz respeito à sua metodologia, pode ser considerado engenhoso e muito bem trabalhado. Nesses termos, Marx parte de uma fator mínimo presente no capitalismo ? a mercadoria ?, analisando a sua constituição ? valor de uso e valor de troca ? para um exercício total de indução, ao ir explicando, passo a passo, cada parte e tentando relacioná-la com uma parte maior; em melhores palavras, Marx passa da teoria do valor à mercadoria, para relacioná-la ao fator trabalho humano, que é levado à análise do trabalho humano abstrato, onde Marx o analisa e, por meio de induções e observações, chega ao termo mais-valia, na qual constitui o lucro explorado do trabalhor pelo capitalismo. Ou seja, vemos um pleno exercício de indução e de relação de partículas menores presentes no capitalismo até uma questão maior, que é o da exploração do trabalhador. E esse exerício não se limita a essa parte, mas cabe considerar apenas aqui o modelo usado por ele. Assim, vemos presente claramente um método por ele empregado, totalmente necessário para se chegar às suas conclusões que, sem ele, com certeza não se chegaria ao objetivo atingido.
Em Durkheim, agora, podemos analisar sua preocupação em tratar a Sociologia ? uma ciência nascente naquele momento ? como uma ciência digna de seu nome, com suas regras, leis, métodos, objetivos, hipóteses, etc. Desse modo, em diálogo com as ciências da natureza, Durkheim faz uso de conceitos como "função" (indicando uma fisiologia) e "estruturas" (indicando uma morfologia), para se referir ao estudo sociológico. Isto é, Durkheim vê a sociedade como um todo constituído de suas partes, onde estas são responsáveis por determinadas funções. É uma analogia ao corpo humano, no qual o cérebro detém uma função principal, mas não viveria sem o coração, os rins, o fígado, o pulmão, etc. É nesse sentido que se dá a construção da estrutura do pensamento de Durkheim. Porém, com isso, podemos ver que há também um método empregado por Durkheim aqui, ao fazer sua análise a partir de funções, inserindo-as em uma estrutura maior ? a sociedade.
À luz de Weber, temos agora a preocupação de delimitar um modo de agir do sujeito da pesquisa com relação ao seu objeto, ao trabalhar com a ideia de "neutralidade axiológica"; ou seja, para Weber, o pesquisador não deve inserir julgamento de valor algum no seu estudo, e trabalhar com a maior objetividade possível. Nesse sentido, os únicos momentos em que o pesquisador pode fazer uso de sua subjetividade é na escolha dos seus objetos e de suas hipóteses, mas depois comprová-las sistematicamente e com toda a objetividade.
Em se tratando de sua metodologia, em pesquisa realizada com trabalhadores rurais em determinando momento do séc. XIX, Weber trabalha com 3 silogismos:
1) É da natureza humana não viver só de pão;
2) O trabalhador rural é um ser humano;
3) O trabalhador rural não vive só de pão.
Nesse simples exercício de lógica, Weber realiza um processo metodológico de indução, na construção de subcategorias, que estão inseridas em categorias, que se inserem em categorias maiores, levando a crer um ambiente concreto.
Podemos concluir aqui, na análise desses autores clássicos, que todos eles trabalham com questões diferentes, perspectivas diferentes e também métodos diferentes, mas todos têm como princípio a busca por respostas verídicas para as questões mundanas, levando em conta seus contextos e suas ideias. Porém, tomando em vista seus métodos e suas distintas perspectivas, veremos uma disputa acadêmica e até política e ideológica, uma vez que seus preceitos atuam de forma excludentes na procura de verdadeiras respostas, ao tentar interpretar a realidade concreta e responder de forma verídica ao que isso lhes proporciona; mas, ao admitirmos essas teorias inseridas em contextos políticos, muitas vezes há uma má interpretação de suas ideias, levando diversas pessoas a deixar o cientificismo de lado, em prol de batalhas estritamente ideológicas, prejudicando o trabalho do verdadeiro cientista, na análise dos fatos e na procura de respostas objetivas.
Assim, portanto, devemos entender o método dentro de campos epistêmicos das ciências humanas, pois nele estão inseridos preceitos ontológicos (com suas concepções sobre a essência do sujeito e do objeto); antropológicos (levando em conta a história do homem e a relação existente entre eles); epistemológicos (no sentido de se discutir uma teoria do conhecimento); e gnosiológicos (ao buscar a validade do conhecimento atingido).
Passando a discussão para o desenrolar do séc. XX, refletiremos sobre a redução do método à ciência, ocasionado por contextos mercadológicos, sociais e humanos. Nesses termos, como visto em "O método como questão na pesquisa com intencionalidade científica", "a rapidez com que a ciência empírica apresenta resultados seria maior que a agilidade de uma reflexão em profundidade sobre as condições em que o conhecimento se realiza" (Reis). Tratando-se desta passagem, refletiremos acerca da velocidade com que a necessidade de resultados de pesquisas está posta diante de nós, muitas vezes para atender exigências do mercado, mas que, numa palavra, leva à ciência, em especial à ciência humana, a uma tecnificação, fazendo com quê o pesquisador seja levado a utilizar de um sistema meramente operativo de análise, para que se chegue a resultados precisos e rápidos. Assim, o método, tido como fator fundamental à experimentação e à observação, é reduzido à técnica, que visa a resultados imediatos. Esse processo muitas vezes se dá de forma rápida e ofuscada aos olhos dos pesquisadores, visto que, como posto em "O método como parte de um campo epistêmico", "a velocidade da apresentação de resultados e a rapidez com que são manufaturadas tecnologias ? no caso da Sociologia, entre outre outras, tecnologias de controle social ?, deles provenientes é maior que a agilidade de uma reflexão de profundidade sobre as condições em que o conhecimento se realiza" (Reis).
Nesse caso, podemos ver que a ciência, passando por um processo histórico de redução ao método, agora também reduzida à técnica, encontra-se em estágio de operações, tecnificações e numa busca por resultados precisos e rápidos, com a necessidade de se criar um mecanismo que ligue essas técnicas a determinados resultados.





























1. CONCLUSÃO

Vimos que a ciência nasce de forma embrionária, apresentando questões gerais acerca do mundo e das coisas presentes nele, como o ar, a terra, o fogo, etc, mas que já apresentava o objetivo de se chegar a respostas proferidas pelos sujeitos. Depois, evolui de forma significativa com Platão, ao considerar a necessidade da fuga do senso comum para um saber científico, em que a busca pela essência das coisas deve se tornar presente; além disso, expandir o conhecimento e libertar as pessoas aprisionadas no mundo da caverna. Presentes agora na Idade Moderna, temos em Descartes e Bacon a maior preocupação na busca por um método totalmente válido para se conhecer a verdade das coisas e dos fatos, distinguindo-se, assim, o conhecimento científico de qualquer outro conhecimento. O método, dessa forma, passa a ser definido como ciência, pois a verdadeira ciência, seja ela natural ou humana, deveria seguir determinadas regras e leis necessárias para se atingir objetivos válidos e conclusivos. Assim, o método fica evidente também nos autores clássicos da Sociologia, como Marx, Durkheim e Weber, nos quais, apesar das diferentes preocupações e ideias referentes às reflexões sociais, apresentavam uma metodologia de pesquisa que os levavam às grandes ideias revolucionárias características desses autores. Entretanto, com o desenvolvimento do mercado e, por isso, da necessidade rápida de resultados em virtude da plena competição nele presente, o método passa por um processo de redução à técnica, ou seja, a processos operacionais e mecanismos que deveriam levar o pesquisador direto a resultados rápidos e precisos, apresentando, assim, leis e regras presentes na pesquisa.
Com isso, portanto, podemos concluir que as ciências sociais se inserem de forma plena nas tendências das ciências naturais, no que diz respeito à necessidade do estabelecimento de leis e regras a serem seguidas para que se atinja objetivos concretos e consoantes à realidade posta. Porém, fazendo uma reflexão acerca da ciência, vimos que seu objetivo de libertar o homem ficou esquecido com as duas grandes guerras mundiais, nas quais a racionalidade humana foi usada de forma questionável, na construção de armas de destruição em massa, como a bomba atômica. Ou seja, se a ciência, durante o Iluminismo, era vista como o resultado da racionalidade humana e de sua consequente libertação do homem, o séc.XX nos provou que, agora, a sua credibilidade e seus objetivos não são outros senão o de atender a interesses políticos, ideológicos e econômicos.






4. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

Reis, J. "O método como questão na pesquisa com intencionalidade científica".
Reis, J. "O método como parte de um campo epistêmico".
Reis, J. "As ciências sociais e a tradição".
*Anotações em sala de aula.