A BANALIZAÇÃO DO DANO MORAL

 

José Camilo Neto ¹

 

RESUMO

 

O Dano Moral trata-se da ofensa ao patrimônio imaterial de determinada pessoa, ou seja, a ofensa recai sob direitos de personalidade, desta forma o dano deverá causar lesão à honra, crenças, paz interior, a dignidade, em fim, aquele que ofende a dignidade do ser humano. Nas varas cíveis do Brasil, encontram-se uma enorme quantidade de ações, tal situação provoca uma morosidade na resolução destas ações que pode ser atribuído ao Estado e aos postulantes de tais ações, que indevidamente buscam no judiciário um enriquecimento, em muitas vezes, sem causa. Trata-se de uma pesquisa de revisão bibliográfica com caráter exploratório fundamentado em base de dados, como: Literatura Latino-Americana, Legislação Brasileira e artigos disponibilizados na Internet.

 

1 INTRODUÇÃO

 

Pode-se conceituar o dano moral como, a lesão causada a um bem personalíssimo de determinada pessoa, onde o prejuízo não adentre a esfera material, e sim, atinja o seu caráter subjetivo, trazendo conseqüências negativas para a vítima, pois seu bem-estar social e pessoal será abalado.

O dano que afetar os direitos e garantias fundamentais dos indivíduos, os quais estão elencados na Constituição Federal de 1988, sendo mais preciso, a intimidade, a honra, a imagem social do indivíduo, em fim, todo e qualquer prejuízo ao bem-estar da vitima, deve ser considerado como dano moral.

2 A BANALIZAÇÃO DO DANO MORAL

Atualmente as varas cíveis de todo o Brasil, encontram-se em uma situação preocupante, pois em virtude da enorme quantidade de ações, a morosidade já é uma realidade nos processos brasileiros. Tal situação pode ser atribuída tanto para o Estado, que não fornece uma estrutura adequada para o devido andamento dos processos, como também aos postulantes de tais ações, que indevidamente buscam no judiciário um enriquecimento sem causa.

Ao que tange aos indivíduos que buscam o enriquecimento sem causa, temos as ações infundadas, que muitas vezes tem por objeto meros caprichos de seus postulantes, servindo apenas como elemento agravante para a morosidade dos processos no judiciário brasileiro.

Para agravar ainda mais a situação, as ações por danos morais vem sendo propostas de maneira inconseqüente, pois os fundamentos apresentados pelos requerentes, não passam de meros aborrecimentos. Como já foi tratando, o Dano Moral se caracteriza pelo abalo psicológico que sofre a vitima, não podendo se confundir meros aborrecimentos do dia-a-dia, com o dano moral.

Em entrevista dada ao jornal “O POTI”, em 18 de Setembro de 2011, a juíza da 1ª Vara Cível do Juizado Especial do Rio Grande do Norte, a juíza Ana Cristina Maia, não é possível chegar a um número exato das ações que buscam a indenização por danos morais, uma vez que não existe um setor de estatística em sua jurisdição, mas pode afirmar com toda convicção que tais ações predominam nas varas cíveis daquele estado.

Seguindo o entendimento de Fadul (2008), o Dano Moral já chegou ao ponto da banalização, basta analisar os incalculáveis pedidos de indenização sem nenhum sentido jurídico. Complementa ainda a referida autora citando como exemplo, de uma consumidora que acredita que foi enganada por determinada empresa, pois adquiriu durante oito meses um determinado produto, o qual apresentava em seu rótulo a expressão “ligth”, e por ter ganhado peso neste período, achou que a empresa em questão havia lhe enganado, obviamente a requerente não obteve sucesso. A mencionada ação tramitou no Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, processo de numero 051/1.03. 0002561-1, publicada no Diário de Justiça em 04 de agosto 2004.

Observa-se no exemplo acima, que a requerente não tinha fundamento lógico para pleitear uma indenização, pois um dos requisitos para a reparação civil é a comprovação do nexo da casualidade, entre o dano e a causa, assim, o fato da autora consumir o produto ligth, não significa que o seu sucesso para o emagrecimento depende exclusivamente daquele produto.

A conseqüência da banalização do dano moral ainda pode ser bem maior, como bem assevera Felipe Marins (2002, p.) artigo salientando que a crescente demanda pela reparação dos danos morais, reflete diretamente nos Juizados Especiais Cíveis, pois a maioria das ações de reparação é de “menor complexidade”, porém mesmo tendo como principal objetivo a praticidade e a celeridade, os juizados especiais não conseguem resolver a lide de maneira célere, pois o numero de demandas é imenso.

Em conclusão, destaca ainda, o supramencionado autor, a importância de se analisado a banalização do instituto da reparação moral, pois o judiciário, não pode ser usado de maneira desnecessária, e por fim, salienta o caráter constitucional do tema, pois não se pode agir com má-fé diante de um instituto constitucional.

Identifica-se assim, que o Dano Moral não pode ser visto como meio de enriquecimento sem causa, pois corre o risco de o instituto deixar de ter importância perante o judiciário, e até mesmo perante o ordenamento jurídico brasileiro. Desta forma as pessoas que realmente merecem uma compensação pelo dano, poderão não ser ressarcidas, devido a esta indústria dos danos morais, caindo naquele velho ditado popular, “devido a um, todos pagam”.

 

3 NATUREZA JURÍDICA DA REPARAÇÃO DO DANO MORAL

 

Diante do que já foi exposto, não resta duvidas que o ordenamento jurídico brasileiro reconhece a reparação ao Dano Moral, chegando ao ponto de se obter o reconhecimento o constitucional. O CF/88 em seu artigo 5º prevê o direito de reparação, conforme dicção do inciso V, do aludido artigo:

 

[...] é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem.

 

Em decorrência de seu caráter subjetivo, a indenização pode ser comprometida, ou seja, estar nas mãos do magistrado arbitrar o valor da indenização, pois conforme foi relatado anteriormente, não existe uma tarifação para se obter o valor indenizatório, cabendo ao juiz arbitrar a indenização, o que pode gerar um sentimento de injustiça para a vítima, pois o valor pode não atingir seu principal objetivo, o conforto da vitima. 

Neste contexto, chegamos à seguinte indagação: qual será a natureza jurídica da indenização do Dano Moral? Podemos encontrar três correntes doutrinarias, a primeira defende uma indenização com caráter meramente compensatório; a segunda corrente defende um caráter punitivo da indenização, e por fim a terceira corrente que defende uma indenização de duplo caráter, sendo compensatório-punitiva.

Neste contexto, Dantas (2010, p.), cita o respeitado advogado e professor Flavio Tarturce, que apresenta três correntes sobre o tema em tela, a primeira corrente defende uma indenização como caráter meramente reparatório ou compensatório, assim o autor do dano estaria obrigado a pagar uma mera indenização; já a segunda corrente, defende uma indenização revestida de um caráter punitivo, assim o valor da indenização deveria ter um caráter punitivo, desta forma o autor do dano deveria ser punido, para não mais praticar atos que ofendam a moral de outrem; por fim a terceira corrente defende uma indenização de natureza compensatório-punitiva, ou seja, a vítima do Dano terá em sua indenização a soma de dois valores, um direcionado a compensação do Dano, e outra direcionada a punir o ofensor, objetivando a não reincidência na pratica de danos morais.

O ordenamento jurídico brasileiro adotou acorrente que defendem uma indenização meramente compensatória para a reparação ao dano moral, é possível extrairmos da leitura do artigo 1.060 do Código Civil brasileiro, a opção do nosso legislador, sendo a seguinte:

 

Art. 1060 "Ainda que a inexecução resulte de dolo do devedor as perdas e danos, a indenização, não pode ir além daquilo que se efetivamente se perdeu".

 

Desta forma fica claro que a indenização não pode ir além do prejuízo da vitima, assim o juiz arbitrará o quantum indenizatório, observando apenas o dano experimentado pela vitima, não podemos esquecer para o dano moral é subjetivo, assim a indenização não pode extrapolar o limite compensatório, que no dano moral, deve ser baseado o bom-senso do magistrado, que observará o valor que compensará a vitima. 

É possível identificarmos que alguns doutrinadores do direito brasileiro que apresentam uma tendência de preferirem a terceira corrente apresentada, podemos citar o entendimento de Caio Mario Pereira da Silva (2000, p 55), a qual acredita no caráter punitivo da reparação como forma de condenação ao ofensor, e um caráter compensatório que interessa a vitima, pois receberá uma indenização que proporcionara um conformo ao sofrimento do ofendido, em suas palavras: 

Quando se cuida do dano moral, o fulcro do conceito ressarcitório acha-se deslocado para a convergência de duas forças: “caráter punitivo" para que o causador do dano, pelo fato da condenação, se veja castigado pela ofensa que praticou; e o “caráter compensatório" para a vítima, que receberá uma soma que lhe proporcione prazeres como contrapartida do mal sofrido. 

Ainda neste mesmo sentido, Bodin de Moraes (2003, p. 31-32) apresenta seu ponto de vista sobre o tema:  

Vem atribuindo à reparação do dano moral duas funções muito diversas. [...] deve, como qualquer ressarcimento, compensar a vítima através da indenização pelos danos (rectius, dores) sofridos. É a chamada função compensatória. De outro lado, ao se propor que as condições econômicas das partes sejam consideradas, assim como o grau de culpa do ofensor, é estabelecida uma outra causa de ressarcimento, desta vez visando punir o ofensor [...]. É a chamada função punitiva, que alguns chamam de preventiva, pedagógica ou exemplar. 

Diante do exposto, apresenta-se uma grande questão do tema da reparabilidade do dano moral, se tal indenização possui caráter compensatório, punitivo ou compensatório-punitivo. Entre ás três corretores apresentadas, é possível concluir que atribuir à indenização um caráter compensatório-punitivo, é a melhor opção, pois ambas as partes, autor e vitima, sentem o efeito da sentença que determinará a indenização, uma vez que a vítima terá confortado o seu dano, e o autor sofrerá uma punição pelo citado dano.

Entretanto independente da sua natureza jurídica, a indenização deverá proporcionar a vítima uma satisfação, um conforto, pois como já vimos a vitima do dano moral, tem sua dignidade e o seu bem-estar abalado em decorrência de uma ação, ou até mesmo uma omissão do ofensor, assim o magistrado tem que atingir um grau justo de satisfação para a vítima. 

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS                                                              

Em virtude da extrema dificuldade de verificar se realmente determinado indivíduo, experimentou o Dano Moral, pois têm que se verificar se aquela ação do autor do dano, gerou um abalo psicológico para a vítima. Esta verificação é de suma importância, pois para evitar a banalização do Dano Moral, que atualmente já é uma realidade, em decorrência de inúmeras ações que adentram os tribunais cíveis brasileiros, embasadas em meros aborrecimentos do dia-a-dia, ou até mesmo com fundamentos de má-fé.

Porém, neste contexto abordou-se a responsabilidade do magistrado em verificar até que ponto aquela conduta do autor, afetou a vitima, chegando assim a caracterização do dano.  Caracterizado o Dano, cabe ao magistrado impor a indenização, objetivando reparar o dano sofrido pela vítima. 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

FADUL, T. C.; A indústria do dano moral. 2008. Rede de Ensino Luiz Flávio Gomes.  Disponível em < http://lfg.jusbrasil.com.br/noticias/122657/a-industria-do-dano-moral-tatiana-cavalcante-fadul>

MARINS, F. F.; Dano moral ou mero aborrecimento?. Jus Navigandi, Teresina, ano 7, n. 60, nov. 2002. Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/3540.> Acesso em: 17 de maio de 2011. 

DANTAS, L. C. S.; A indústria do dano moral: Atividade lucrativa para as grandes empresas. Conteudo Juridico. Brasilia, 2010. Disponivel em: <http://www.conteudojuridico.com.br/?artigos&ver=2.29148>.  Acesso em: 05 de novembro de 2011.

PEREIRA, C. M.S. Responsabilidade Civil, Rio de Janeiro: Forense, 9ªed.., 2000

MORAES, M. C. B.; Danos à Pessoa Humana – uma leitura civil-constitucional dos Danos Morais. Rio de Janeiro: Renovar, 2003.