UNIDADE DE ENSINO SUPERIOR DOM BOSCO - UNDB CURSO DE GRADUAÇÃO EM DIREITO

 

 

POLIANA COQUEIRO GOUVEIA

 

 

 

 

 

 

 

A AUTONOMIA DAS AGÊNCIAS REGULADORAS E AS DISPOSIÇÕES PROTETIVAS DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR:

uma abordagem acerca da importância das resoluções das agências reguladoras na relação consumerista

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

São Luís                                                                      2015

                           POLIANA COQUEIRO GOUVEIA

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

A AUTONOMIA DAS AGÊNCIAS REGULADORAS E AS DISPOSIÇÕES PROTETIVAS DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR:

 uma abordagem acerca da importância das resoluções das agências reguladoras na relação consumerista

 

Monografia apresentada ao Curso de Graduação em Direito da Unidade de Ensino Superior Dom Bosco – UNDB, como requisito parcial a obtenção do grau de Bacharel em Direito. 

 

Orientador: Prof. Esp. Diego Menezes Soares

 

                                                                               

 

 

 

 

 

 

 

 

São Luís

2015

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Gouveia, Poliana Coqueiro 

     

    A autonomía das agências reguladoras e as disposições       protetivas do código de defesa do consumidor: uma abordagem acerca da importancia das resoluções  das agências reguladoras na relação consumerista. /    Poliana Coqueiro Gouveia.__ São

Luís, 2015.                                       

    79f.  

    Orientador (a): Diego Menezes Soares           

    Monografia (Graduação em Direito)  - Curso de Direito - Unidade de Ensino Superior Dom Bosco.

     

    l. Direito do consumidor 2. ANATEL 3. ANEEL 3. ANS 4.  Código de Defesa do

Consumidor I. Título                       

     

                                                                                    CDU 347.451.031

 

POLIANA COQUEIRO GOUVEIA

 

 

 

A AUTONOMIA DAS AGÊNCIAS REGULADORAS E AS DISPOSIÇÕES

PROTETIVAS DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR: uma abordagem acerca

da importância das resoluções das agências reguladoras na relação consumerista

 

Monografia apresentada ao Curso de Graduação em Direito da Unidade de Ensino Superior Dom Bosco – UNDB, como requisito parcial a obtenção do grau de Bacharel em Direito.

 

 

Aprovada em______/_______/_______

 

 

 

 

BANCA EXAMINADORA

 

 

_____________________________________________________________ Prof. Esp. Diego Menezes Soares (Orientador)

 

 

_____________________________________________________________ 1º Examinador

 

_____________________________________________________________ 2º Examinador

 

 

 

 

 

AGRADECIMENTOS

 

Ao primeiro referencial de Fé, Compaixão e Amor que jamais existiu no mundo;

Jesus, o qual, concedeu-me o maior bem de todos− à vida, e que a partir de seus ensinamentos me tornei a pessoa que eu sou hoje, depositando nele todos os desafios aos quais me submeto.

Aos meus queridos e graciosos pais, Carlos Alberto Moraes Gouveia e Maria Raimunda Coqueiro Gouveia por serem meus verdadeiros amigos, os quais sempre pude e poderei contar, e que sempre torceram pelo meu sucesso; ensinando-me o caminho do bem e apoiando-me em minhas escolhas. À minha formação pessoal e profissional devo aos Senhores!

Ao meu amado e adorável irmão, Bruno Leonardo Coqueiro Gouveia, meu

verdadeiro amigo e um homem honrado, que sempre esteve ao meu lado; apoiando-me e protegendo-me em minhas escolhas, em especial, no ingresso e conclusão deste curso de graduação. Meu anjo protetor!

Ao meu noivo e eterno Amor, Edimilson Amaral Santos, que além de companheiro

de vida, sempre respeitou às minhas escolhas, estando ao meu lado, nos melhores e piores momentos; um presente de Deus em minha vida.

À todas as amizades que construí ao longo do curso na faculdade, em destaque: Laíse Lima de Oliveira Souza; Renata Orlando de Deus; Sandra Collins; Ana Cássia Rodrigues da Silva; Dermison Cunha Monteiro; Isabella Cristina da Silva Veloso; Isabelle Christine Pinho Pereira; Márcia Regina Mourão da Silva e Gabriel Afonso Carvalho Fonseca.

Às minhas amigas (irmãs) de coração Edna da Silva dos Santos e Klevia Rosênia Carvalho Marques, pela amizade e companheirismo eternos!

Ao meu orientador Diego Menezes Soares, pela confiança, amizade, e empenho

para que eu pudesse concluir este trabalho.

À todos aqueles que direta ou indiretamente contribuíram para que este importante

momento chegasse.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Aquele que habita no esconderijo do Altíssimo, à sombra do

Onipotente descansará. Direi do Senhor: Ele é o meu Deus, o meu refúgio, a minha fortaleza, e nele confiarei. (SALMO 91; 1-2)

 

 

 

 

RESUMO

 

O presente trabalho monográfico consiste em apresentar de que modo a autonomia das decisões tomadas pelas agências reguladoras, considerando os atos regulatórios emanados por elas, é tratada no ordenamento jurídico pátrio, uma vez que a própria Constituição Federal legitimou a criação destas autarquias de regime especial, considerando a importância que as mesmas tiveram para a reformulação da Administração Pública do país. Neste sentido, o que se observa na realidade é a constante incidência do controle judiciário, através do Código de Defesa do Consumidor, nas questões que envolvem conflitos entre os usuários de serviços públicos e as empresas que prestam estes serviços. Deste modo, para a viabilização desta discussão é apresentada, inicialmente, uma análise histórica sobre a Administração Pública do Brasil, a partir da adoção de mecanismos ou planos institucionais os quais, na década de 90 (noventa), foram pontuais para que o Estado se reerguesse econômica e politicamente através da criação de entidades com prerrogativas especiais capazes de regular as atividades exercidas por particulares; as agências reguladoras; levando-se em consideração o conceito, a natureza jurídica e as competências gerais e específicas. Em seguida se discutirá sobre a incidência do Código de Defesa do Consumidor nos serviços públicos tendo como ponto de análise as diferenças e semelhanças no trato entre consumidores e usuários de serviços públicos; considerados como aqueles prestados uti singuli, remunerados através de tarifas ou preço público. Para a efetivação da proposta lançada neste trabalho acadêmico, foram apresentadas três importantes agências reguladoras brasileiras; a Agência Nacional de Telecomunicações (ANATEL); a Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL) e a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), as quais foram escolhidos julgados específicos que explicam como a autonomia destas entidades são analisadas pelo Poder Judiciário.

 

Palavras-chave: Autonomia político-decisória das Agências Reguladoras (ANATEL/ANEEL/ANS).  Código de Defesa do Consumidor. Serviços Públicos.

 

 

 

 

 

 

 

ABSTRACT

 

This monograph is to present how the autonomy of decisions taken by regulatory agencies, considering the regulatory acts issued by them, is treated in the Brazilian legal system, since the Federal Constitution itself legitimized the creation of these special autarchies, considering the importance that they had for the reformulation of public administration in the country. In this field, what is observed in reality is the constant judiciary control, by the Consumer Protection Code, on issues involving conflicts between users of public services and companies providing these services. Thus, for the viability of this discussion is presented initially a historical analysis of the Public Administration of Brazil, from the adoption of mechanisms and institutional arrangements which, in the nineties, were important to the economic and political rise of the State, by creating entities with special prerogatives able to regulate the activities carried out by private individuals; regulatory agencies; taking into consideration the concept, legal nature and general and specific skills. Then it will be discussed the impact of the Consumer Protection Code on public services, analyzing the differences and similarities in dealing with consumers and users of public services; considered as those provided uti singuli, paid through tariffs or public price. For the realization of the proposal launched in this academic work, it were presented three important Brazilian regulatory agencies; the National Telecommunications Agency (ANATEL); the National Electric Energy Agency (ANEEL) and the National Health Agency (ANS), which were chosen by specific judiciary decisions that explain how the autonomy of these entities are analyzed by the Judiciary.

 

Keywords: Political-Operative Autonomy Regulatory Agencies (ANATEL/ANEEL/ANS).

Consumer Protection Code. Public Services.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

 

AGU                Advocacia Geral da União

ANATEL         Agência Nacional de Telecomunicações

ANEEL            Agência Nacional de Energia Elétrica

ANS                 Agência Nacional de Saúde Suplementar

ANP                 Agência Nacional do Petróleo

ANTAQ           Agência Nacional de Transportes Aquaviários

BACEN            Banco Central do Brasil

CADE               Conselho Administrativo de Defesa Econômica

CDC                  Código de Defesa do Consumidor

CNEN               Comissão Nacional de Energia Nuclear

CF                     Constituição Federal 

EC                     Emenda Constitucional

ICC                    Interstate Commerce Comission 

FTC                   Federal Trade Comission

IBC                    Instituto de Defesa Permanente do Café

IAA                    Instituto do Álcool e do Açúcar

LGT                   Lei Geral de Telecomunicações

LINDB               Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro

PDRE                 Plano Diretor da Reforma do Estado

PL                       Projeto de Lei

PND                   Plano Nacional de Desestatização

PROCON           Órgão de Proteção e Defesa do Consumidor

SDE                    Secretaria de Direito Econômico

STJ                      Superior Tribunal de Justiça

STF                      Supremo Tribunal Federal

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

SUMÁRIO

 

1 INTRODUÇÃO....................................................................................................................... 9

2 REGULAÇÃO ADMINISTRATIVA NO BRASIL......................................................... 11

2.1 Organização da Administração Pública Brasileira: centralização, desconcentração e descentralização das atividades públicas............................................................................................................... 16

2.2 Conceito e natureza jurídica das autarquias.................................................................... 18

2.2.1 Autarquias sob regime especial.......................................................................................... 20

2.3 Agências Reguladoras no Brasil........................................................................................ 21

2.3.1 Conceito e Natureza Jurídica das agências reguladoras.................................................... 23

2.3.2 Os atos regulatórios das agências reguladoras à luz da CF/88.......................................... 26

3  SUJEIÇÃO  DO  SERVIÇO  PÚBLICO  AO  CÓDIGO  DE  DEFESA  DO ............. 31

CONSUMIDOR: Discussões acerca da possibilidade da aplicação do CDC ao Serviço Público 31

3.1 Sobre os serviços públicos: algumas considerações............................................................ 32

3.1.1 A incidência dos princípios consumeristas, administrativos e constitucionais nas atividades reguladas.................................................................................................................................................... 34

3.1.2 Aplicação do Código de Defesa do Consumidor aos serviços públicos........................... 36

3.2 O consumidor segundo a ótica do Código de Defesa do Consumidor............................ 38

4 AS RESOLUÇÕES SOBRE OS SERVIÇOS PÚBLICOS E AS DISPOSIÇÕES PROTETIVAS DO CDC À LUZ DA CF/88........................................................................................................... 47

4.1 A relação entre o Poder Judiciário e os serviços regulados pelas agências reguladoras 50

4.1.1 O posicionamento do STF acerca dos atos normativos das agências reguladoras............. 53

4.2 Decisões jurídicas tomadas sob a influência do CDC e das disposições normativas das agências reguladoras: estudos de casos específicos................................................................................ 56

4.2.1 O setor de telecomunicações (ANATEL).......................................................................... 57

4.2.2 O setor de energia elétrica (ANEEL)................................................................................ 62

4.2.3 O setor de saúde suplementar (ANS)................................................................................ 68

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS............................................................................................... 70

REFERÊNCIAS....................................................................................................................... 72

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

1 INTRODUÇÃO

 

A relevância do tema escolhido se concentra na discussão sobre a segurança dos

atos normativos das agências reguladoras, os quais foram legitimados no ordenamento jurídico pátrio, visto que estas entidades, enquanto autarquias de regime espacial, integrantes da Administração Indireta, apresentam certas particularidades diferentes das demais. 

Isso porque elas são responsáveis, em regra, pela fiscalização dos serviços públicos

realizados pelas prestadoras de serviços, e devido a esta função, foi necessário, por parte do Poder Público, estabelecer a segurança devida àqueles que dirigem tais entidades, sendo que o modo de investidura e destituição do cargo se dá mediante critérios rígidos que asseguram a estabilidade provisória daqueles que estão à frente destas autarquias de regime especial; o que reflete à própria mudança na ordenação da máquina administrativa pela qual o Brasil iniciara na década de 90 (noventa).

O Estado passa a apresentar uma nova roupagem a partir de então; de caráter

interventor passa então a ser do tipo regulador das atividades econômicas outrora prestadas por ele. Disto resultou a transferência do monopólio dos serviços públicos ao setor privado por meio de concessões, permissões ou autorizações, o que foi de fundamental importância para o surgimento destas autarquias em regime especial na conjuntura do ordenamento jurídico nacional.

Mais precisamente, com o advento da Lei nº 8987/95, a qual estabeleceu o regime

jurídico das concessões e permissões dos serviços públicos, dispõe no artigo 30, parágrafo único que “a fiscalização do serviço será feita por intermédio de órgão técnico do poder concedente ou com entidade por ele conveniada e, periodicamente por membro do poder concedente, da concessionária e dos usuários”. 

A partir de tais alterações políticas as agências reguladoras passam a apresentar uma

estrutura diferenciada se comparada a outras autarquias, sendo responsáveis pela fiscalização da operacionalização dos serviços prestados pelas empresas prestadoras de serviços públicos. No entanto, os conflitos que por ventura possam existir entre os usuários dos serviços das empresas fiscalizadas por estas agências também podem ser tutelados na justiça consumerista, tendo como respaldo o artigo 5º, XXXV, da Constituição Federal. 

É neste ponto que insurge a principal questão a ser analisada nesta pesquisa; a qual

envolve a discussão sobre a autonomia das agências reguladoras em relação a validação dos atos administrativos tomados com base em suas resoluções, uma vez que a própria Carta Constitucional no artigo 21 dispõe acerca da competência da União em regular determinados setores econômicos, relacionados à prestação de serviços públicos, através de órgãos reguladores específicos, muito embora o que se assiste no mundo real é o controle do Poder

Judiciário− muitas vezes desconsiderando àquelas decisões através do Código de Defesa do Consumidor (CDC).

A defesa ao direito do consumidor é considerada como um dos princípios

constitucionais da ordem econômica brasileira, cabendo ao Estado, enquanto agente normativo e regulador da atividade econômica exercer legalmente as funções de fiscalização, incentivo e planejamento. No entanto, o que também se irá discutir nesta pesquisa são os limites do controle judiciário nas decisões tomadas em respeito aos atos regulatórios das agências reguladoras, por vez que a participação do Poder Judiciário deve levar em consideração a discricionariedade dos atos emanados pelas agências reguladoras para que não haja o comprometimento da harmonia estrutural daquele setor que foi regulado.

Levando em consideração estas abreviações, esta dissertação acadêmica foi

organizada e estruturada da seguinte maneira: inicia o estudo a partir da análise histórica acerca do surgimento das agências reguladoras no Brasil, em especial no ordenamento jurídico, tendo como marco temporal a década de 90, a qual o país passou por um processo de reformulação da máquina administrativa estatal, através de mecanismos que proporcionaram ao Estado a sua transformação de Estado Interventor para Regulador das atividades econômicas. Em seguida tratou-se em apresentar o conceito, a natureza jurídica das agências reguladoras brasileiras, incluindo a discussão sobre os atos regulatórios à luz da Constituição Federal de 1988.

Em seguida, se abordou a respeito da sujeição dos serviços públicos ao Código de Defesa do Consumidor, considerando àquela atividade como todo serviço prestado por particular, remunerado através de tarifa ou preço público e que seja possível a discriminação daquele que se utiliza deste serviço; ou seja, do tipo uti singuli

E por último, a pesquisa foi desenvolvida a partir de estudos de casos envolvendo

a problemática lançada, e para isto, se escolheu como objeto de estudo 3 (três) importantes agências reguladoras que atuam em diferentes ramos no Brasil; a Agência Nacional de Telecomunicações (ANATEL); a Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL) e a Agência de Saúde Suplementar (ANS), para que se visualize de forma mais concreta a proposta temática sugerida na pesquisa. 

Tal abordagem implicou na apresentação de importantes julgados dos Tribunais

brasileiros, em destaque ao Supremo Tribunal Federal e ao Superior Tribunal de Justiça, assim como demais Tribunais de Justiça, a respeito do modo como tais órgãos jurídicos têm interpretado a relevância dos atos regulatórios frente uma demanda judicial. Assim, foram pontuadas as principais considerações sobre cada agência reguladora escolhida; leis criadoras, competências, novidades e alguns estudos de casos que remetem ao objeto proposto neste trabalho. 

No tocante à técnica de pesquisa a ser utilizada neste trabalho, destaca-se a do tipo

bibliográfica, ou seja, se utilizou acerca das principais teses que discutem a respeito da relevância do poder normativo das agências reguladoras na relação consumerista e de que modo o Poder Judiciário tem tratado essas questões a partir de determinados julgados, considerando as disposições protetivas do Código de Defesa do Consumidor (CDC). 

No tocante ao método de abordagem, destaca-se o método fenomenológico, no

tocante à apresentação e o esclarecimento do modo como se assiste a relação entre a autonomia das decisões das agências reguladoras, em respeito aos atos normativos produzidos por elas, e o reflexo dos mesmos na relação consumerista. 

Sabe-se que a fenomenologia visa somente mostrar aquilo que é dado; não havendo

a preocupação em se valer de leis ou princípios ao que se pretende estudar; ou seja, o que de fato interessa ao pesquisador é o modo como o conhecimento se mostra; ou seja, para este método de abordagem o objeto de conhecimento é o próprio mundo vivenciado pelo sujeito (GIL, 2008).  

No tocante às considerações finais, se reafirma novamente acerca da relevância em

se estabelecer limites de atuação do Poder Judiciário, através da elaboração de uma lei específica que atenda somente aos interesses dos usuários de serviços públicos, o que balizaria a incidência do controle judiciário nas questões que dizem respeito à obediência ao Princípio da Legalidade, muito embora ainda se discute sobre a segurança que àquela lei, uma vez criada, poderia garantir às agências reguladoras no que se refere à autonomia das decisões tomadas pelas suas concessionárias ou permissionárias. 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

2 REGULAÇÃO ADMINISTRATIVA NO BRASIL

 

Para fins deste estudo é oportuno conceituar o que se entende por regulação, mas

antes disto é necessário se apresentar as principais formas de intervenção adotadas pelo Estado Brasileiro e o que se deve entender por Poder Regulamentar[1], como marco teórico para análise do objeto do estudo proposto. 

Conforme Guerra (2012) à luz do que se apresenta no texto constitucional de 1988

é possível se identificar diversos modos de como o Estado intervém no domínio econômico e, que de certo modo, orientam as escolhas políticas nas mais variadas situações. Entre elas, vale destacar “a intervenção normativa, repressiva, tributária, regulatória e exploratória direta da atividade econômica” (SOUTO, 2001 apud GUERRA, 2012, p.94).

Muito embora outros autores, tais como Celso Antônio Bandeira de Mello (2002)

apresenta uma classificação diferenciada, ou seja, para ele haveria três formas de intervenção do Estado na ordem econômica à saber: o poder de polícia, incentivos e atuação direta empresarial (MELLO, 2002, p.619). 

Segundo o administrativista, no que tange ao poder de polícia, corresponde na

atuação do Poder Público na esfera particular dos indivíduos, através de leis e atos administrativos os quais são criados para serem executados, transformando o Estado em um agente capaz de elaborar leis e de regular a economia, e que por isso exercerá funções de cunho fiscal e planejador tanto para o setor público quanto para o privado. 

Enquanto que a segunda sempre ocorrerá, para ele, quando o Estado por meio de

incentivos à iniciativa privada corrobora para o seu desenvolvimento, através de ajudas de caráter fiscal ou também a partir de financiamentos. E por fim, Mello (2002), destaca que a atuação direta empresarial ocorrerá em situações excepcionais através das quais o Estado ao criar pessoas específicas para o exercício de tal função intervém na ordem econômica. Independente de qual melhor classificação a adotar é fato que o Estado ao delegar a ingerência de certas atividades econômicas a iniciativa privada por meio de concessões, permissões ou autorizações, está se valendo do mecanismo de interferência para a regulação da própria máquina estatal; tais como os serviços de telecomunicações, distribuição de energia elétrica e transporte público exercida pelas Agências Reguladoras (GUERRA, 2012).

É oportuno antes de adentrar na questão da própria regulação de determinados

serviços públicos entender a própria estruturação administrativa do ordenamento jurídico pátrio, isso porque conforme leciona Kelsen (2009) as espécies normativas obedecem a uma escala hierárquica, a qual no ápice encontra-se a Constituição, sendo que os demais atos normativos se localizam abaixo dela, numa ordem pré-determinada. Assim, por decorrerem diretamente dela, as leis são consideradas atos normativos primários das quais decorrem direitos e obrigações aos que se submetem às determinações destes atos normativos.

As leis são criadas para estabelecer obrigações, muito embora tais atos normativos

no sistema constitucional brasileiro, se infra legais, não podem estabelecer deveres não previstos em lei; é o que se denomina princípio da reserva legal disposto no artigo 5º, II, da Constituição Federal Brasileira[2], além disso e não menos importante é oportuno destacar o princípio da separação de poderes, artigo 2º do referido texto constitucional[3], o qual em se tratando do Poder Legislativo, cabe a este a competência em elaborar leis, sendo em regra esta atribuição absoluta e indelegável (MARTINS, 2011).

O Poder Executivo também, segundo Martins (2011), dispõe da prerrogativa em

editar atos normativos, como função atípica, contudo de natureza abstrata, com o fito de complementar o conteúdo das leis, para que estas possam serem cumpridas; o que é vedado é que tais atos provenientes deste poder inovem no ordenamento jurídico, com o objetivo de criar ou extinguir deveres previamente previstos em leis, ou modificar as hipóteses de incidência. 

Conforme está disposto no artigo 84, IV, da Constituição Federal[4], o poder

regulamentar é exercido de forma exclusiva através de decretos e regulamentos, ou seja, tratase de um ato normativo secundário que retira sua validade a partir de leis já preexistentes (MARTINS, 2011). 

Retomando a análise sobre “regulação” e “regulamentação”, vale destacar, a

explanação de Moreira Neto (2003, p.132-133), o qual assim aduz sobre a “regulamentação”:

[...] sob o aspecto material, a regulamentação é uma função política, no exercício de uma prerrogativa do poder político de impor regras secundárias, em complemento às normas legais, com o objetivo de explicitá-las e de dar-lhes execução, sem que possa definir quaisquer interesses públicos específicos nem, tampouco, criar, modificar ou extinguir direitos subjetivos. De resto, sob o aspecto formal, é uma atribuição de estritíssima previsão constitucional, por isso mesmo, geralmente cometida a chefes de estado ou de governo.

 

Continuando na mesma linha de raciocínio aduz Meirelles (2004) que o poder

regulamentar pode ser definido como um ato que hierarquicamente está abaixo da lei, ou seja, o regulamento não pode contrariar o que a lei define, sob o risco de se tornar nulo. No mesmo sentido Di Pietro (2003) expõe os limites do poder regulamentar:

Ele não pode inovar na ordem jurídica, criando direito, obrigações, proibições, medidas punitivas, até porque ninguém é obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei, conforme o artigo 5°, II, da Constituição; ele tem que se limitar a estabelecer normas sobre a forma como a lei vai ser cumprida pela Administração (DI PIETRO, 2003, p.88).

 

Denota-se que o regulamento apresenta, portanto, uma função complementar ao que

está especificado em lei, não podendo de modo algum inovar ou contrariar o que o ordenamento jurídico previamente determina. Além disso, é importante frisar que existem duas espécies de regulamentos no ordenamento jurídico pátrio; o executivo e o autônomo ou independente (CARVALHO FILHO, 2011).

Enquanto o primeiro, segundo o autor acima citado, complementa a lei, garantindo

que a mesma seja fielmente obedecida, conforme está disposto no próprio artigo 84, IV, CF; o segundo, a priori, não admitido no ordenamento jurídico nacional em função da reserva legal, por vez que inova a ordem jurídica, ao disciplinar acerca de assuntos não contemplados em leis específicas, teve sua validade a partir da EC nº 32, a qual disciplinou duas espécies de regulamentos autônomos[5] ( CARVALHO FILHO, 2011). Deste modo e conforme dispõe o artigo 84, VI, da Carta Constitucional tem-se:

Art. 84. Compete privativamente ao Presidente da República:

VI – Dispor, mediante decreto, sobre: (Redação dada pela Emenda Constitucional nº

32, de 2001)

a)              organização e funcionamento da administração federal, quando não implicar aumento de despesa nem criação ou extinção de órgãos públicos; (Incluída pela

Emenda Constitucional nº 32,de 2001);

b)              extinção de funções ou cargos públicos, quando vagos; (Incluída pela EmendaConstitucional nº 32, de 2001).

 

Não obstante, segundo a administrativista Di Pietro (2005, p. 203), o termo

regulação deve ser compreendido da seguinte forma:

Regulação é vocábulo equívoco, porque tem diferentes significados. Nasceu nas ciências físicas e biológicas, com duplo aspecto: a ideia de regularidade e a ideia de mudança. Ao mesmo tempo que, pela regulação, se procura assegurar um certo grau de estabilidade no objeto da regulação, também se deixam as portas abertas para mudanças que sejam necessárias em benefício da própria estabilidade. O objeto da regulação pode ser a sociedade, algumas de suas dimensões, como a econômica, ou uma área de atividades sociais.

 

 Para a alusiva autora o termo regulação é “[...] gênero de que a regulamentação é

espécie, ou seja, regulação abrange, inclusive, a regulamentação, como ato normativo de competência do Chefe do Executivo”. (DI PIETRO, 2005, p. 203-204). Complementa afirmando que este termo também pode ser entendido como a criação de obrigações ou regras sem qualquer dependência com o poder ou autoridade que a elabore.  

Outra observação elencada pela autora e fundamental para esta pesquisa está em

considerar que a função regulatória além de estar atrelada a alguma atividade do setor econômico, àquela também pode estar vinculada à realização de serviços públicos, cuja incumbência na prestação pode ser ou não da alçada do Estado. 

Neste sentido, é pontual que se deva considerar a tentativa de conceituar o termo

regulação a partir da ótica jurídica, ou seja, deve-se entender por regulação de serviços públicos como “[...] conjunto de regras de conduta e de controle da atividade econômica pública e privada e das atividades sociais não exclusivas do Estado, com a finalidade de proteger o interesse público” (DI PIETRO, 2005, p. 204-205).

Oportuno considerar que a função reguladora do Estado tem previsão legal na

própria Constituição Federal no artigo 174, caput, o qual assim dispõe que aquele pode ser entendido: “como agente normativo e regulador da atividade econômica, o Estado exercerá, na forma da lei, as funções de fiscalização, incentivo e planejamento, sendo este determinante para o setor público e indicativo para o setor privado”.

Em relação às considerações feitas acima, nota-se que são pontuais para a própria

direção a ser perquirida nesta pesquisa, ou seja, atribuir-se-á um sentido mais amplificado ao conceito de regulação, por vez que o contexto histórico da regulação no Brasil envolve um fenômeno maior, ou melhor, da desestatização das atividades econômicas; momento em que foram criadas as agências reguladoras (autarquias sob regime especial), as quais passaram a controlar de forma descentralizada as atividades econômicas(MARTINS, 2011).

No entanto, para que se possa entender a relevância destas entidades é necessário

que se visualize a forma de organização administrativa existente no Brasil; isso porque somente a partir do conhecimento das formas de descentralização adotadas por este país é que de fato se poderá construir um marco teórico sólido para os objetivos da proposta temática deste trabalho.

 

2.1 Organização da Administração Pública Brasileira: centralização, desconcentração e descentralização das atividades públicas.

 

Acerca da organização administrativa brasileira deve-se observar, a priori, a

importância que os princípios da Administração Pública apresentam, em especial o da Eficiência para atuação das entidades da administração brasileira; muito embora, este princípio tenha sido introduzido na Carta Constitucional Brasileira a partir da reforma administrativa de 1988, boa parte da doutrina considera que aquele princípio já fazia parte do ordenamento jurídico, mas de forma implícita (JUSTEN FILHO, 2011).

A consagração deste princípio pela doutrina e jurisprudência brasileira vincula-se à

ideia de economicidade, ou seja, à relação custo/ benefício na ação estatal. Conforme Bento (2013), as políticas públicas devem auferir o máximo de resultados, no que tange à realização do interesse público, utilizando, para isso, o mínimo de recurso possível e daí prestando um serviço público de forma rápida e eficaz.

Observa-se, desta forma, que o princípio da eficiência vincula-se à ideia de que a Administração Pública deva atuar de forma célere e de modo menos oneroso ao erário público

(PEREZ, [201-?]). Isso significa que o Estado Brasileiro para agir de forma eficiente − no trato com a máquina pública− teve que adotar uma estratégia de organização de suas atividades para que fosse possível a conjugação da relação custo/ benefício, daí a adoção da desconcentração e da descentralização administrativa para melhor administração das atividades realizadas no país.

Consoante observação de Bento (2013, p. 16), deve-se entender que: 

Desconcentrar a administração significa justamente distribuir as competências de modo que os órgãos de direção façam somente aquilo que só eles podem fazer (...). Todas as atividades de execução de tarefas ou rotinas devem ser delegadas (desconcentradas) para a base da organização-órgãos inferiores. Descentralização, por sua vez, consiste na transferência de competência de uma pessoa jurídica para outra.

 

É neste contexto que, finalmente, é possível compreender a relevância que as

autarquias apresentam no cenário nacional. Isso porque ao se considerar as diversas formas de descentralização administrativa, em especial, a descentralização entre entidades da Administração Indireta, é que se encontra e se justifica a criação das autarquias (DI PIETRO, 2003).

Isso porque a Administração Direta, representada pelas pessoas políticas da União, Estados, DF e Municípios, passa a criar outras pessoas jurídicas, ou por lei, ou por autorização legislativa, incumbindo a elas a realização de algum serviço ou atividade que para a entidade criadora considere sendo melhor executada por àquela entidade de forma descentralizada (JUSTEN FILHO, 2011). Diferentemente da centralização administrativa, a qual, segundo o autor, cabe ao Estado a realização de suas próprias tarefas de forma direta através de órgãos ou agentes da própria Administração Direta; a saber União, DF, Estados ou Municípios.

Conforme lições de Meirelles (2004) a descentralização pressupõe uma pessoa

distinta a do Estado; ou seja, de um lado está ele e do outro a entidade que executará o serviço, o qual foi entregue pelo Estado, ou seja, o ente descentralizado. Segundo o renomado estudioso, a doutrina administrativa aponta duas maneiras em que o Estado possa efetivar a descentralização administrativa; ou por outorga ou por delegação. De acordo com o autor supracitado:

A descentralização administrativa pressupõe, portanto, a existência de uma pessoa, distinta da do Estado, a qual, investida dos necessários poderes de administração, exercita atividade pública ou de utilidade pública. O ente descentralizado age por outorga do serviço ou atividade, ou por delegação de sua execução, mas sempre em nome próprio. Diversa da descentralização é a desconcentração administrativa, que significa repartição de funções entre os vários órgãos (despersonalizados) de uma mesma Administração sem quebra de hierarquia. Na descentralização a execução de atividades ou a prestação de serviços pelo Estado é indireta e mediata na desconcentração é direta e imediata (MEIRELLES, 2004, p.714-715).

 

A delegação, por conseguinte, é normalmente efetivada por prazo determinado;

ocorrendo em contratos de concessão ou nos atos de permissão, onde o poder estatal transfere aos concessionários e permissionários somente a execução, porém temporária, de um certo serviço (MEIRELLES, 2004).

A título de abordagem teórica se priorizará a descentralização, enquanto forma de

organização administrativa das atividades públicas, por vez que na desconcentração, enquanto técnica administrativa pode ser tanto aplicada na Administração Direta quanto na Indireta, e se caracteriza, como já adiantado, na distribuição de competências dentro de uma mesma pessoa jurídica (JUSTEN FILHO, 2011).

Por esse motivo, é de suma importância a análise das agências reguladoras, pois

estas, conforme Guerra (2012), estão enquadradas no âmbito da descentralização administrativa, à título de autarquias, de forma que será possível entender no próximo tópico, o modo em que elas surgiram no Brasil, considerando o conceito atribuído pela doutrina e a natureza jurídica delas a fim de se compreender a relevância que estas entidades apresentam para a organização administrativa nacional.

A seguir se explanará as principais características destas entidades para que seja

possível visualizar com melhor clareza a temática proposta nesta pesquisa.

 

2.2 Conceito e natureza jurídica das autarquias  

 

As autarquias, enquanto entidades da Administração Pública, conforme Mello (2002) fazem parte da descentralização administrativa do tipo indireta, cuja criação se dá mediante lei específica, tal como a sua extinção; elas surgiram no Direito Positivo brasileiro com a edição do Decreto-Lei nº 6016 de 22 de novembro de 1943. 

No entanto, devido as alterações realizadas ao longo do tempo, a partir da edição

de outros decretos, em especial o Decreto-Lei nº 200 de 25 de fevereiro de 1967 acabou definindo as autarquias como sendo “o serviço autônomo criado por lei, com personalidade jurídica, patrimônio e receita próprios, para executar atividades típicas da Administração Pública que requeiram, para seu melhor funcionamento, gestão administrativa e financeira descentralizada” (GUERRA, 2012, p. 63).

Ou ainda, segundo lições de Di Pietro (2003, p. 380): “[...] pode-se conceituar a

autarquia como a pessoa jurídica de direito público, criado por lei, com capacidade de autoadministração, para o desempenho de serviço público descentralizado, mediante controle administrativo exercido nos limites da lei”.

Disto resulta, segundo Mello (2002), que por serem pessoas de Direito Público elas

podem ser titulares de interesses também públicos, diferentemente de outras entidades da Administração Indireta, tais como as empresas públicas e as sociedades de economia mista, uma vez estas sendo pessoas de Direito Privado, limitam-se, se for o caso, a exercerem atividades públicas, vedada a titularização das atividades públicas.

No que concerne à natureza jurídica das autarquias, a partir da edição da Emenda Constitucional nº 19/98 tais entidades passam a ter personalidade jurídica de direito público com regime jurídico público, sendo que às demais entidades − empresas públicas e sociedades de economia mista e as suas subsidiárias que explorem atividades econômicas − a natureza é do tipo privada (MELLO, 2002).

A principal característica de uma autarquia é a sua personalidade de direito público,

com o objetivo de executar atividades próprias da Administração Pública. O ato de criar estas entidades deve ser da iniciativa do Chefe do Poder Executivo, mediante lei aprovada pelo

Congresso Nacional, conforme disposto no artigo 61 da Constituição Federal[6] de 1988 (GUERRA, 2012).  É oportuno ressaltar as diferenças conceituais e jurídicas entre autarquias e autonomias, isso porque:

Autarquias são entes administrativos autônomos, criados por lei específica, com responsabilidade jurídica de Direito Público Interno, patrimônio e atribuições estatais específicas. São entes autônomos, mas não são autonomias. Inconfundível é autonomia com autarquia: aquela legisla para si; esta administra-se a si própria, segundo leis editadas pela entidade que a criou. O conceito de autarquia é meramente administrativo; o de autonomia é precipuamente político. Daí estarem as autarquias sujeitas ao controle da entidade estatal a que pertencem, enquanto autonomias permanecem livres desse controle e só adstritas à atuação política das entidades maiores a que se vinculam, como ocorre com os Municípios brasileiros (autonomias) em relação aos Estados- Membros e à União (MEIRELLES, 2004, p.308).

 

No tocante às características estipuladas pela lei às autarquias, o que confere a elas

certo diferencial se comparadas com outras entidades da Administração Indireta, merecem destaque, entre outras, conforme dispõe Ferreira (2009, p.2):

[...] sua criação por lei específica, conforme previsão do art. 37, XIX da Constituição Federal, mas a organização se opera por decreto, que aprova o regulamento ou estatuto da entidade, e daí por diante sua implantação se completa por atos da diretoria, na forma regulamentar ou estatutária, independentemente de quaisquer registros públicos. O patrimônio inicial das autarquias é formado com a transferência de bens móveis e imóveis da entidade matriz, os quais se incorporam ao ativo da nova pessoa jurídica [...] Os bens e rendas das autarquias são considerados patrimônio público, mas com destinação especial e administração própria da entidade a que foram incorporados [...] Os dirigentes das autarquias são investidos nos respectivos cargos na forma que a lei ou seu estatuto estabelecer.[...]Os contratos das autarquias estão sujeitos a licitação por expressa determinação do art. 1º da Lei nº. 8666/1993 e do art. 37, XXI, da CF, sendo nulos os que não a realizarem ou fraudarem o procedimento licitatório, conforme a Lei nº 4.717/65. O pessoal das autarquias está sujeito ao regime jurídico único da entidade-matriz, como dispõe o art. 39, caput, da CF.

 

Assim é justo concluir a partir dos elementos expostos que as autarquias apresentam

a natureza jurídica de Direito Público, sendo que sua criação é justificada através do objetivo que as mesmas apresentam, ou seja, em executar atividades típicas da Administração Pública, as quais são, em regra, funções exclusivas de Estado (GUERRA, 2012). Dentro deste quadro teórico há que se destacar as autarquias que apresentam certas qualidades, como as agências reguladoras- autarquias sob regime especial, eis que a seguir serão apresentadas suas principais prerrogativas e de que modo atuam.

 

2.2.1 Autarquias sob regime especial

 

Considerando a necessidade em se dinamizar cada vez as atividades prestadas pelo

setor público foram criadas autarquias diferenciadas, ou sob regime especial dotadas de maiores privilégios, as quais exercem suas atividades com maior autonomia, sendo responsáveis pela fiscalização dos serviços públicos. A respeito destas entidades aduz Meirelles (2004, p.298):

 A autarquia não age por delegação, age por direito próprio e com autoridade pública, na medida do jus imperi que lhe foi outorgado pela lei que a criou. Como pessoa jurídica de Direito Público interno, a autarquia traz ínsita, para a consecução de seus fins, uma parcela do poder estatal que lhe deu vida. Sendo um ente autônomo, não há subordinação hierárquica da autarquia para com a entidade estatal a que pertence, porque, se isto ocorresse, anularia seu caráter autárquico. Há mera vinculação à entidade matriz que, por isso, passa a exercer um controle legal, expresso no poder de correção finalística do serviço autárquico.

 

A partir desta definição denota-se que as autarquias, enquanto entidades da

administração indireta de regime jurídico de direito público, apresentam certas qualidades as quais conferem a elas certa autonomia gerencial ou administrativa de suas atividades. 

Considerando a necessidade em se dinamizar cada vez as atividades prestadas pelo

setor público foram criadas autarquias diferenciadas, ou sob regime especial, dotadas de maiores privilégios, as quais exercem suas atividades com maior autonomia, sendo responsáveis pela fiscalização dos serviços públicos; as intituladas agências reguladoras (GASPARINI, 2011).

O que denota este diferencial à estas entidades, nas palavras de Meirelles (2004, p.333) diz respeito à seguinte análise:

O que posiciona a autarquia como de regime especial são as regalias que a lei criadora lhe confere para o pleno desempenho de suas finalidades específicas, observadas as restrições constitucionais. Assim, são consideradas autarquias de regime especial o Banco Central do Brasil (Lei 4.595/64), a Comissão Nacional de Energia Nuclear (Lei 4.118/62), a Universidade de São Paulo (Dec.-lei 13.855/44 e Decs. 52.326/69 e 52.906/72), dentre outras que ostentam características próprias na sua organização, direção, operacionalidade e gestão de seus bens e serviços.

 

Desta maneira, conforme expôs o administrativista acima, passaram a ser

consideradas autarquias sob regime especial o Banco Central do Brasil (BACEN); a Comissão Nacional de Energia Nuclear (CNEN); a Universidade de São Paulo (USP); dentre outras. 

Além destas, há que se ressaltar que as atuais agências reguladoras: ANATEL, ANEEL, ANS, por exemplo, também foram instituídas sob a forma de autarquias em regime especial, por vez que a intenção do legislador ao cria-las foi, justamente, em proporcionar a elas certa autonomia perante ao Poder Executivo se comparadas as demais autarquias consideradas comuns, as quais estão sujeitas ao Decreto-Lei nº 200/1967 (GUERRA, 2012).  A seguir serão explanadas estas prerrogativas diferenciadas atribuídas pela lei às agências reguladoras incluindo a contextualização histórica de sua criação no Brasil.

 

 

 

2.3 Agências Reguladoras no Brasil

 

Considerando que além da primeira forma de descentralização administrativa já

mencionada, ou seja, entre entidades da Administração Direta e da Administração Indireta, há que se ressalvar a que ocorre entre a Administração Pública e entidades privadas contratadas. Neste caso a Administração Pública, conforme Bento (2013) ao invés de executar um serviço público acaba contratando empresas privadas para prestá-lo.

 Neste caso, segundo o autor acima citado, haverá a chamada concessão de serviços

públicos a uma empresa, a qual irá assumir a gestão de um serviço público, como por exemplo o transporte público, ou a distribuição de energia elétrica e a contratação de serviços, entre outros; a fiscalização destes serviços, por sua vez fica à cargo das agências reguladoras.

 De acordo Grotti (2006) as agências reguladoras no Brasil, assim como em outros

países, são entendidas como órgãos autônomos os quais estão inseridos numa dada estrutura administrativa, encontra precedentes no contexto do direito comparado. A primeira forma de atuação destes entes autônomos− encarregados de efetivar medidas legalmente previstas− se deu na Inglaterra a partir de 1834, onde o Parlamento visando a concretização de leis e obter a resolução de controvérsias passou a criar um ente específico para a realização de tais objetivos (GROTTI, 2006).

Os Estados Unidos – referência para a criação de tais entes no Brasil- também

sofreram forte influência inglesa, segundo a autora, no ano de 1887 foi criado a ICC− Interstate Commerce Comission, com competência regulatória do transporte ferroviário interestaduale posteriormente a FTC − Federal Trade Comission, com o objetivo em controlar ações consideradas anticompetitivas de empresas e corporações capitalistas neste país, o que foi fundamental para a concretização destas entidades (GROTTI, 2006).

Outra importante instituição criada nos Estados Unidos é Independent Regulatory Commission, o qual corresponde a um ente estatal autônomo tendo à frente de suas decisões um colegiado composto por Commissioners, os quais são eleitos pelo Chefe do Poder Executivo tendo a incumbência de exercer a atividade pública por meio de mandato fixo, ou seja, a exoneração desses dirigentes somente irá ocorrer em decorrência de falta grave (GUERRA, 2012). Diante destas características, segundo o autor, do ponto de vista estrutural o modelo adotado pelas agências reguladoras brasileiras é a Independent Regulatory Commission norteamericana.

No que diz respeito ao Brasil, a ideia de regulação não é considerada desconhecida,

por vez que ao longo do tempo já se fazia existir determinados órgãos e entidades reguladoras, no entanto, sem a classificação de agências como se conhece atualmente; entre eles destacaramse: o Comissariado de Alimentação Pública (1918), o Instituto de Defesa Permanente do Café

– IBC (1923), o Instituto do Álcool e do Açúcar − IAA (1933), o Instituto Nacional do Mate (1938), o Instituto Nacional do Sal (1840) e o Instituto Nacional do Pinho (1941) (FERREIRA FILHO, 2001, p. 257 apud GROTTI, 2006, p.4).

Já na segunda metade da década de noventa são criadas as chamadas agências

setoriais de regulação tendo como influência o direito norte americano[7], todas possuindo certas características, tais como autonomia e especialização apresentando a natureza jurídica de autarquias de regime especial, e tendo como principal marca a autonomia política sobre regulação e independência em suas atuações (GROTTI, 2006). 

Conforme a autora, o termo autarquia em regime especial foi pela primeira vez

empregado a partir da edição da Lei nº 5.540 de 28-11-1968, em especial ao artigo 15[8], o qual tratou durante a sua vigência em dar uma conotação especial às universidades públicas, por vez que as mesmas apresentam um grau considerável de autonomia administrativa relativamente superior se comparadas às demais autarquias sob regime comum.

A criação destas agências no Brasil foi respaldada a partir da criação anterior do Plano Diretor da Reforma do Estado (PDRE) no governo de Fernando Henrique Cardoso e pelo Plano Nacional de Desestatização (PND) no governo de Fernando Collor de Mello (GUERRA, 2012).

Tais planos foram pontuais para a reforma estrutural do Estado Brasileiro,

considerando a dificuldade em regular os serviços essenciais à sociedade somado ao dispêndio em infraestrutura destes serviços, conferindo estas prerrogativas aos atores privados, sendo que a competência da fiscalização ficou à cargo das agências reguladoras (JAEGER JUNIOR; FREITAS NETO, 2009).

No que concerne às agências reguladoras estabelecidas pelo governo federal tem-

se as seguintes entidades em ordem cronológica de criação, conforme lições de Batista Júnior (2013, p.2):

 

a)        Agência Nacional de Energia Elétrica – ANEEL, Lei 9.427 de 1996; 

b)        Agência Nacional de Telecomunicações – ANATEL, Lei 9.472 de 1997; 

c)         Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis – ANP, Lei

9.478/97; 

d)        Agência Nacional de Vigilância Sanitária, Lei 9.782 de 1999;

e)         Agência Nacional de Saúde Suplementar – ANS, Lei 9.961 de 2000; 

f)         Agência Nacional de Águas – ANA, Lei 9.984 de 1999; 

g)         Agência Nacional de Transportes Terrestres – ANTT e a Agência Nacional de

Transportes Aquaviários – ANTAQ, Lei 10.233/01; 

h)        Agência Nacional do Cinema – ANCINE, criada pela Medida Provisória 2.228-

1 de 6 de setembro de 2001; 

i)          Agência Nacional da Aviação Civil – ANAC, através da Lei 11.182 de 2005.

 

Considerando as principais informações acerca das autarquias sob regime especial

no que tange à evolução histórica e aos modelos que inspiraram à estruturação destas entidades no Brasil passar-se-á a partir de agora a analisa-las de forma interna, entendendo suas principais peculiaridades legais (conceito, natureza jurídica) a forma de atuação, em especial a autonomia legiferante no que concerne aos atos regulatórios. Eis a seguir as seguintes pontuações.

 

2.3.1 Conceito e Natureza Jurídica das agências reguladoras.

 

Consoante lições de Di Pietro (2003, p.402) deve-se entender, por agência

reguladora, em sentido amplo, como “qualquer órgão da Administração Direta ou entidade da Administração Indireta com função de regular a matéria específica que lhe está afeta”. Diante disto destaca a autora que a finalidade de uma agência está ligada à fiscalização da prestação de serviços públicos prestada por entidades do setor privado as quais através do regime de concessões recebem a incumbência para a prestação daqueles serviços.

Conforme denota Mello (2002, p.174), “agências reguladoras são autarquias sob

regime especial, ultimamente criadas com a finalidade de disciplinar e controlar certas atividades”.  Este modo de atuação das agências tem como utilidade a preservação dos objetivos da Administração Pública, do mesmo modo, estabelecer a harmonia e o atendimento dos interesses em comum da coletividade como modo de atender as necessidades da sociedade(MELO, 2013).

Diante desta conceituação tem-se que destacar acerca da própria finalidade da sua

criação, ou melhor, tais autarquias, respondem à própria situação em que o Estado Brasileiro se encontrava em meados da década de 90; a necessidade de se delegar ao setor privado a incumbência na prestação de determinados serviços que, em regra, deveriam ser prestados pelo Estado, com o objetivo de que este interviesse nas relações econômicas de forma mais profunda, mas reservando ao papel de regulador destas atividades a estas entidades, deste modo garantindo a autoridade e autonomia administrativa estatal(BARROSO, 2002).

Por serem autarquias sob regime especial estas agências são dotadas de certos

privilégios, concedidos por lei, para que elas realizem a execução de suas atividades de forma autônoma e eficaz, como exemplo, em se tratando de agências de âmbito federal, estas prerrogativas estão relacionadas à independência administrativa, técnica e financeira (GUERRA, 2012). 

Muito embora, segundo Mello (2002), a independência administrativa, assim como

a autonomia técnica, financeira, administrativa, são elementos inerentes à qualquer autarquia; porém o que se denota de peculiar numa agência reguladora se refere ao modo como se dá a investidura de seus dirigentes e a estabilidade de seus mandatos.

Considerando, então, o primeiro enfoque − autonomia administrativa − é

importante ressaltar que em se tratando desta prerrogativa os dirigentes das agências reguladoras são investidos para exercerem o cargo por tempo certo, isso significa que eles somente poderão deixar de exercer suas funções, antes do vencimento do prazo, uma vez cometendo falta grave, a qual será apurada em processo administrativo ou judicial, observados o contraditório e a ampla defesa (JUSTEN FILHO, 2011). Assim, conforme leciona Araújo (2002, p.50):

Característica das agências reguladoras que as diferencia das demais autarquias seria o fato de seus dirigentes serem detentores de mandato. Isso significa que não são exoneráveis ad nutum pelo Chefe do executivo, o que configura certa independência “política” em relação ao governante, pois só poderiam deixar tais cargos voluntariamente, ou ao final do mandato, ou por destituição, nos termos da lei e de seus estatutos, como nas empresas públicas, sociedade de economia mista e fundações.

 

A destituição, portanto, somente ocorrerá pela decisão do Conselho Diretor, o qual

é composto pelo Diretor-Presidente e demais diretores, com quórum de maioria absoluta. Deste modo não se admite qualquer exoneração ad nutum dos seus dirigentes, configurando sua independência decisória (GUERRA, 2012).

Segundo Guerra (2012), a investidura para os cargos de dirigentes destas autarquias

se dará através de um ato composto, onde o chefe do Poder Executivo indicará o nome daquele que ele deseja assumir a diretoria da agência reguladora para ser analisado pelo Senado Federal, que aprovará ou não. Daí que, uma vez aprovado o nome indicado este retornará ao chefe do Poder Executivo para que aquele seja nomeado e empossado do cargo (SILVA, 2006).

Esse mandato fixo atribuído a estes dirigentes, confere aos mesmos, autonomia no

exercício de suas funções, livre de qualquer mudança de governo que poderia causar a interferência na condução de suas atividades, deste modo oferecendo à administração destas autarquias sob regime especial certa segurança na consecução de suas atividades típicas (SILVA, 2006).

Outra forma que externaria a autonomia administrativa das agências reguladoras

está no que se refere às leis instituidoras destas autarquias ao período da quarentena, ou seja, conforme o artigo 8º da Lei nº 9986/00, com redação dada pela MP 2.216-37de 31-08-01 dispõe acerca da proibição do ex- dirigente de uma agência reguladora exercer atividade ou prestar qualquer serviço no setor regulado pela respectiva agência (GUERRA, 2012).

Deste modo, conforme os dispositivos legais acima, ele (o ex- dirigente) estaria

impedido durante um lapso temporal de 4 meses computados a partir da exoneração ou do término do mandato de executar qualquer trabalho em empresa regulada pela agência reguladora a qual ele administrava. Muito embora, durante este período de quarentena ele continue a receber a remuneração equivalente àquela correspondente ao cargo de direção durante sua gestão (GUERRA, 2012).

No que concerne à autonomia financeira e orçamentária é importante ressaltar que

a mesma está assegurada nas próprias leis instituidoras de cada agência reguladora e efetivada através das dotações orçamentárias e pela própria arrecadação de rendas advindas das taxas de fiscalização ou regulação, as quais são devidas por aqueles que exercem as atividades reguladas, ou através de contratos e convênios estabelecidos (GUERRA, 2012). 

Estas mesmas leis proporcionam que estas entidades estabeleçam taxas de

fiscalização a serem devidas dentro do prazo onde vige o contrato de concessão com os agentes regulados ou também de uma parcela das participações do governo ocorridas em alguns setores, da mesma forma dispõe como será dada esta forma de arrecadação (BATISTA JÚNIOR, 2013). 

Conforme leciona Menezello (2002, p.84) sobre a autonomia do tipo financeira,

esta se evidencia “pela cobrança da taxa de fiscalização dos agentes fiscalizados, ou seja, as empresas concessionárias, permissionárias ou autorizadas e, no caso da ANP, pelo recebimento de parcela das participações governamentais”.

Além disto, vale ponderar que estas entidades uma vez apresentando a forma de

jurídica de direito público os bens de suas agências também apresentarão a mesma categoria, ou seja, também serão públicos, e que a responsabilidade jurídica pelos possíveis prejuízos realizados por terceiros se dá na esfera objetiva (MENEZELLO, 2002). Prova disto está no §6º do artigo 37 da Constituição Federal de 1988:

Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:

§ 6º - As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa.

 

E finalmente, quanto a autonomia técnica das agências reguladoras decorre da

própria especialização e particularidade de cada segmento (setor ou serviço) da economia uma vez regulado por estas autarquias; isso é justificado pela própria exigência na admissão em cargo de direção das agências reguladoras, ou seja, o profundo conhecimento técnico na área de atuação de seus serviços. Consoante lição de Cuéllar (2001, p.117):

A especificidade de cada agência está traçada na lei que a cria e decorre das previsões legais “especiais” que a adornam. Não se podem estabelecer os mesmos elementos encontrados em relação a uma entidade para a(s) outra(s), pois isto consistiria inclusive em agressão, desconsideração da própria noção de especialidade. Assim, haverá graus diferentes de especialidade para cada autarquia a que se confere natureza especial.

 

A especialização técnica das agências reguladoras vincula-se à própria autonomia

normativa as quais elas possuem, simbolizando um elemento essencial para que estas autarquias sejam legitimadas, por vez que apresentam conhecimentos técnicos para a operacionalização do setor a ser regulado (CUÉLLAR, 2001). Esta autonomia deve ser uma bandeira a ser continuamente alçada por estas entidades visto que a própria dinamização dos serviços prestados pelos entes regulados e pelos seus funcionários corroboram para a prestação de um serviço mais célere e eficaz para a sociedade.

 

2.3.2 Os atos regulatórios das agências reguladoras à luz da CF/88.

 

O poder normativo das agências reguladoras é o reflexo de duas operacionalizações,

as quais são provenientes de uma releitura do princípio da separação dos poderes, os quais destacam-se: a centralização governamental e a descentralização administrativa, conforme denota Lehfeld (2006, p.286):

O primeiro refere-se à conditio sinequa non dos Poderes Políticos – Executivo e Legislativo – em fixar preceitos básicos, metas e finalidades da Administração Pública, que para cumpri-los exige maior flexibilidade na sua estrutura organizacional, com a atribuição de autonomia e de poderes normativos a entidades reguladoras (agências).

 

Disto ressai que a centralização governamental ocorre no âmbito dos Poderes Políticos – Executivo e Legislativo- os quais estão incumbidos de estabelecer políticas, metas e finalidades para a Administração Pública utilizando-se, para isso, de conceitos genéricos ou standards normativos (LEHFELD, 2006). Deste modo, para que haja a realização destes objetivos há que se ocorrer a transferência das atividades decisórias, regulatórias e fiscalizatórias às agências, por meio da descentralização administrativa.

Do mesmo modo, no Brasil não há uma delegação legiferante, como ocorre na

tradição norte americana, mas sim a descentralização de um segmento das atividades administrativas do Poder Executivo (LEHFELD, 2006). Seguindo esse pensamento dispõe Miragem (2014) que os atos normativos editados pelas agências reguladoras, quais sejam, resoluções, portarias, instruções, não inovam no mundo jurídico, visto que exercem atividade normativa secundária, de regulamentação das leis.

Alguns doutrinadores mais tradicionais como Mello (2002) defendem que os atos

editados pelas agências reguladoras apresentam um caráter estritamente técnico, não violando de forma alguma as leis e os princípios constitucionais. Para este teórico, as agências normalmente acabam violando os limites estabelecidos pela lei, incorrendo na elaboração de atos inconstitucionais.

Para outros, tais como Di Pietro (2003) as agências reguladoras estariam

exclusivamente incumbidas em editar atos normativos terciários, tais como resoluções e portarias subordinando-se aos regulamentos sendo que os efeitos de seus atos se limitariam ao âmbito interno das agências; inexistiria, portanto, qualquer poder do tipo legiferante delegado às agências, não possuindo seus atos qualquer prerrogativa de obrigação a serem seguidos.

Enquanto para outros estudiosos a exemplo Garcia (2002) somente as agências

reguladoras ANATEL e a ANP apresentariam a competência em editar atos normativos com força de lei em virtude da teoria dos poderes implícitos[9]. De acordo com Garcia (2004, p.228):

De acordo com o sistema jurídico vigente no Brasil [...] constituindo-se as agências reguladoras, ainda que ditas de ‘regime especial’, sua função reguladora deveria ser limitada à expedição de atos estabelecendo regras gerais e abstratas de conduta, sempre de alcance limitado ao âmbito de atuação do órgão expedidor, exceção podendo ser feita à ANP e à ANATEL, cuja previsão constitucional poderia ser interpretada como autorizadora da expedição de normas inovadoras do ordenamento jurídico 

 

Não obstante, as correntes doutrinárias que negam a autonomia legiferante plena

aos atos editados por estas autarquias sob regime especial, defende-se nesta pesquisa a autonomia normativa das agências reguladoras, considerando a relevância de seus atos e a própria finalidade a qual justificou a criação destas entidades; qual seja a dinamização na consecução dos serviços públicos prestados por entes privados e regulados por elas submetidos ao controle finalístico estatal (GUERRA, 2012). Contudo para se adentrar a esta discussão é imperiosa trazer novamente a diferenciação entre os termos regulação de regulamentação, disto importa o conhecimento do que se convencionou a chamar de teoria da deslegalização[10]

A natureza do poder normativo destas autarquias, portanto, é do tipo regulamentar,

sendo o próprio reflexo da própria atividade delegatória da competência legislativa através da deslegalização (JUSTEN FILHO, 2002). Desta maneira é oportuno considerar como marco teórico o pensamento deste administrativista, o qual determina, a priori, a necessidade em se diferenciar poder normativo de poder legislativo para a compreensão desta tese acerca da autonomia do poder normativo das agências reguladoras.

Dentro desta ótica, a competência normativa estaria ligada ao próprio poder em

elaborar normas de conduta que acabam gerando obrigações com a finalidade em regular uma conduta intersubjetiva ao passo que a competência legislativa “é o poder de elaborar normas jurídicas de cunho legislativo” (JUSTEN FILHO, 2002, p.485).

Ou seja, a competência legislativa, se refere a um ato típico estatal na produção de

lei estrito sensu enquanto que a competência normativa seria a produção de normas jurídicas que tem como objetivo o direcionamento da conduta humana, e em alguns casos também geram normas do tipo jurídicas; portanto, segundo Justen Filho (2002) as agências reguladoras são dotadas sim de competência normativa sendo que a natureza desta é do tipo regulamentar sendo, deste modo, o efeito da delegação de competência legislativa através da deslegalização.

Em conformidade com a tese elencada Enterría e Fernandez (1990, p.296)

entendem que a deslegalização seria entendida então como a “operação que efetua uma lei que, sem entrar na regulação material de um tema, até então regulado por lei anterior, abre tal tema à disponibilidade da potestade regulamentar da administração”.  Essas premissas possibilitam entender que a competência normativa seria, então, a própria produção de normas (gerais e abstratas e infralegais) transmitidas através de regulamentos. (ENTERRÍA; FERNANDEZ 1990).

Compartilhando desta tese segue o pensamento Aragão (2006, p.286-287), o qual

defende a seguinte opinião acerca da autonomia do poder normativo das agências reguladoras:

As leis atributivas de poder normativo às entidades reguladoras independentes possuem baixa densidade normativa, a fim de propiciar o desenvolvimento de normas setoriais aptas a, com autonomia e generalidade, regular a complexa e dinâmica realidade social subjacente. Ademais, recomenda-se que propiciem à Administração a possibilidade de medida do possível, atuar consensualmente, com alguma margem de negociação junto aos agentes econômicos e sociais implicados. [...] As leis com essas características não dão maiores elementos pelos quais o administrador deva pautar sua atuação concreta ou regulamentar, referindo-se genericamente a valores morais, políticos e econômicos existentes no seio da sociedade [...] Assim, confere à Administração Pública um grande poder de integração do conteúdo da vontade do legislador. O objetivo das leis assim formuladas é “introduzir uma vagueza que permita o trato dos fenômenos sociais, muito fugazes para se prestarem ao aprisionamento em uma regra precisa.

 

Diante disto, a atividade normativa das agências reguladoras, consiste, sob a ótica

desta corrente, em produzir atos infralegais, os quais objetivam a regulação do setor econômico, porém não a regulamentação da lei da deslegalização. Assim, embora produzam atos normativos aparentemente autônomos, estes, conforme esta corrente, se limitam ao enquadramento que à própria lei de deslegalização estabeleceu a partir de outras leis; estas ao mesmo tempo que criam este poder normativo a ser exercido pelas agências reguladoras fixaram os limites e os parâmetros para o seu exercício, assim como as metas e as políticas a serem alçadas (ARAGÃO, 2006).

Contribuindo com este pensamento mister apontar as considerações de Marcos Juruena Vilela Souto (2004) acerca da diferenciação entre regulação de regulamentação para se compreender a tese do poder normativo das agências reguladoras. Dispõe o autor supracitado que:

A regulação não se confunde com a regulamentação privativa do Chefe do Poder Executivo; primeiro, porque a regulação não se limita à produção de normas (envolvendo a regulação executiva e a regulação judicante); depois, porque é técnica e não política e deve ser destinada a uma coletividade e não à sociedade em geral. Mais importante, é fruto de uma decisão colegiada que pondera entre os vários interesses em jogo (e não apenas à luz de uma orientação política majoritária) (SOUTO, 2004, P.251).

 

Entende-se a partir deste pensamento que a atividade normativa das agências

reguladoras consiste em produzir atos infralegais com o objetivo em regular o setor econômico em específico e não inovar no mundo jurídico ou regulamentar a lei de deslegalização. Neste sentido então não se pode confundir este poder normativo com a competência regulamentadora do Poder Executivo, tão pouco com a função legiferante do mesmo; prova disso dispõe Edmir Netto Araújo (2002, p.41):

O Poder Normativo das agências reguladoras (não regulamentadoras) vincula-se às normas gerais pertinentes, sem inovar na ordem jurídica, e não é o de regulamentar leis e muito menos situações jurídicas autônomas (leis em sentido material) que criem direitos, deveres ou penalidades. [...]. Assim, suas normatizações deverão ser operacionais apenas, regras que, às vezes aparentemente autônomas, prendem-se a disposições legais efetivamente existentes.

 

As agências reguladoras produzem, portanto, atos aparentemente autônomos, isso

porque estão limitados pelas leis que conferiram a elas tal prerrogativa, ou seja, à lei de deslegalização, a qual no momento em que conferem a estas entidades tais poderes também estabelecem marcos para o seu exercício incluindo as metas e os objetivos a serem alcançados (ARAÚJO, 2002). 

Deste modo, o poder normativo conferido às agências reguladoras se compatibiliza

com o princípio da separação dos poderes por vez que se trata de uma função do tipo executiva, ou seja, em realizar atos administrativos objetivando a execução da lei – seria a concretização, portanto (TOSTA, 2004).

Deste modo, se pode denotar que o poder normativo das agências reguladoras visa

concretizar àquilo que já outrora fora estabelecido em lei; assim como em expedir atos normativos que sujeitam as atividades econômicas conexas às regulamentações destas autarquias, objetivando o funcionamento do setor regulado de forma tanto eficiente quanto equilibrado.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

3    SUJEIÇÃO    DO    SERVIÇO    PÚBLICO    AO    CÓDIGO    DE    DEFESA       DO

CONSUMIDOR: Discussões acerca da possibilidade da aplicação do CDC ao Serviço Público

 

Feitas as devidas explanações acerca do poder dos atos normativos produzidos pelas

agências reguladoras, e considerando que a natureza deste poder normativo é regulamentar, conforme denota Marçal Justen Filho (2002), sendo o reflexo da delegação de competência legislativa pela via da deslegalização, cumpre analisar de que modo tais atos são analisados sob a ótica consumerista, considerando a autonomia administrativa e financeira destas autarquias e as disposições protetivas estabelecidas pelo Código de Defesa do Consumidor.

É neste esteio que se explanará a relevância dos atos regulatórios na relação

consumerista em face da intervenção do Poder Judiciário, enquanto órgão de controle da legalidade dos atos emanados pelas agências reguladoras nos serviços públicos realizados pelas empresas reguladas por estas entidades. 

 Para isso, é importante saber acerca do que se entende segundo a doutrina

administrativista sobre serviços públicos, por vez que a eles – em certos casos – o Estado acaba conferindo ao setor privado a incumbência de prestá-los mediante a fiscalização por parte das agências reguladoras (GUERRA, 2012).  

Além disso, é imprescindível conhecer e entender sobre os principais dispositivos

protetivos calcados no Código de Defesa do Consumidor que regem uma relação consumerista, e que para alguns teóricos, podem ser estendidos aos serviços públicos, para que seja possível, a partir de casos específicos a serem apresentados, realizar uma análise crítica acerca do controle judiciário aos atos reguladores emanados por estas agências. Eis o que será adiante apresentado nesta pesquisa.

 

3.1 Sobre os serviços públicos: algumas considerações

 

Inicialmente, no que concerne ao conceito de serviços públicos, como se verá

adiante, é incontroverso, segundo a doutrina, a existência de um dissenso a respeito do que se deva entender unicamente a respeito de serviços públicos; isso porque a compreensão acerca do tema não aparece de forma unânime, por vez que muitos estudiosos a partir de um dado enfoque acabam por eleger um dado elemento para atribuição desta atividade. 

Neste sentido, conforme Maria Sylvia Zanella Di Pietro (2003) a compreensão

acerca do conceito de serviço público deve ser pautada a partir de dois aspectos a se considerar: o serviço público em sentido amplo e o serviço público em sentido restrito. Isso significa que em se tratando do primeiro aspecto, segundo a autora, os serviços públicos seriam aqueles prestados pela Administração Pública e que contemplariam todas as atividades por ela prestada.

Em conformidade com esta linha de pensamento, destacam-se as ponderações do

renomado administrativista Hely Lopes Meirelles (2004, p. 374), o qual entende por serviço público "aquele prestado pela Administração ou por seus delegados, sob normas e controles estatais, para satisfazer necessidades essenciais ou secundárias da coletividade, ou simples conveniências do Estado”. Muito embora o estudioso defenda esta tese, há que se ponderar acerca das falhas presentes nesta abordagem. 

Isso porque a denominação apresentada acaba generalizando por demais o conceito

ao abarcar todas as atividades da Administração Pública como inseridas na categoria de serviços públicos, o que de acordo com a perspectiva mais restritiva, citada por Di Pietro (2003), se mostra de forma contrária, ou seja, é necessário, a priori, realizar a diferenciação entre atividade jurídica e atividade social exercida pelo Estado, para daí determinar o conceito de serviço público.

Assim, para esta última corrente− restritiva− entende-se por serviço público todo

aquele intrinsicamente ligado a uma atividade social abarcada pelo Estado, o qual teria como um dos seus deveres a satisfação do atendimento dos interesses sociais coletivos voltados para o bem-estar da sociedade através do fornecimento de bens e serviços essenciais aos indivíduos (DI PIETRO, 2003).

Dentro desta ótica é oportuna as considerações de Celso Antônio Bandeira de Mello (2002, p.687), o qual denomina como serviço público:

Toda atividade de oferecimento de utilidade ou comodidade material destinada à satisfação da coletividade em geral, mas fruível singularmente pelos administrados, que o Estado assume como pertinente a seus deveres e presta por si mesmo ou por quem lhe faça as vezes, sob um regime de Direito Público.

 

Deste modo, para o autor o que se deve entender acerca de serviço público deve

estar pautado nas atividades ligadas ao atendimento de necessidades do tipo sociais aos particulares realizadas pelo Poder Público haja vista que nem todas as prestações realizadas pelo Estado apresentam cunho social, mas também podem ter natureza econômica.

 Ademais é importante ressaltar que além do conceito ainda não unânime na

doutrina que, como visto, acaba contemplando ou uma perspectiva ampla ou uma mais restritiva para a definição do que se deva entender por serviço público, também é primordial considerar o conceito a partir do paradigma constitucional.

De acordo com esta linha de raciocínio, segue o pensamento de Marçal Justen Filho (2011), o qual partindo da concepção em que se deve haver a referência entre a atividade realizada e a satisfação dos direitos fundamentais− a partir de um enfoque material− isso porque, a Constituição ao enumerar os serviços a serem prestados pela União não delimitou a respeito de quais elementos deveriam ser atendidos para que assim os serviços prestados pelo poder público fossem assim considerados como serviços públicos.

Logo, segundo o administrativista, todo o serviço público surge como instrumento

para a promoção das necessidades do cidadão, as quais estão diretamente relacionadas com a satisfação dos direitos fundamentais, muito embora isto só ocorra quando for impossível à livre iniciativa cumprir este atendimento. Assim, para Justen Filho (2011, p.688) deve-se entender por serviço público como:

Uma atividade pública administrativa de satisfação concreta de necessidades individuais ou transindividuais, materiais ou imateriais, vinculadas diretamente a um direito fundamental, insusceptíveis de satisfação adequada mediante os mecanismos da livre iniciativa privada, destinada a pessoas indeterminadas, qualificada legislativamente e executada sob regime de direito público. 

 

Cumpre inferir, além da denominação, a existência de determinados elementos

identificadores dos serviços públicos e que são importantes para o presente estudo. Entre eles vale ressaltar o sujeito que presta o serviço, a finalidade e o regime jurídico que rege esta atividade em específico. 

A esse respeito, conforme José dos Santos Carvalho Filho (2011) a criação,

regulamentação e fiscalização dos serviços públicos deva estar à cargo do Estado, e que embora em certas situações o ente público delegue a responsabilidade na consecução deste serviço aos particulares, ainda sim essa transferência de forma alguma retira a característica de público inerente a este serviço, por vez que é da incumbência do poder público a prestação, em regra, destes serviços. 

Além disso, quanto à finalidade deste tipo de serviço ela está em atender, conforme Carvalho Filho (2011), às necessidades e interesses da coletividade, sendo que por ter o sujeito ativo o ente estatal a realização daquele submete-se ao regime jurídico de direito público. Deste modo, conforme o autor, irão incidir sobre estes serviços os postulados do regime jurídico administrativo, ou seja, aplicar-se-ão os princípios e regras do Direito Administrativo, os quais para Mello (2002) seriam em síntese; a supremacia do interesse público sobre o privado e a indisponibilidade do interesse público. 

3.1.1 A incidência dos princípios consumeristas, administrativos e constitucionais nas atividades reguladas.  

 

 A influência principiológica do CDC na relação consumerista é percebida, a partir de determinados dispositivos do próprio código que reconhecem, por exemplo, a vulnerabilidade do consumidor, uma vez que há uma desigualdade entre quem presta um serviço e quem é servido por ele (MIRAGEM, 2014).  De acordo com o alusivo autor, o princípio da vulnerabilidade, presente no artigo 4º, I, do alusivo código[11], é considerado como um princípio formador e que justifica a própria existência do diploma legal nas relações de consumo.

Este princípio é entendido como a presunção de uma situação de desequilíbrio entre

os agentes econômicos – Consumidor e Fornecedor – a qual não pode ser confundida com hipossuficiência, presente no artigo 6º, VIII, do CDC[12], da qual necessariamente passará pela avaliação do juiz (MIRAGEM, 2014). Conforme o autor, o reconhecimento de uma presunção absoluta da vulnerabilidade à todos os consumidores se justifica pelo próprio descompasso existente entre aqueles que têm o poder de direção com os que estão expostos à práticas comerciais, o que impele, portanto, uma proteção maior a estes últimos.

Alguns posicionamentos doutrinários entendem que essa disposição protetiva não

pode ser estendida aos usuários de serviços públicos, conforme denota o professor Antônio Carlos Cintra do Amaral (2002), visto que o artigo 27 da Emenda Constitucional nº 19/98 disciplinou ao Congresso Nacional o dever de elaborar uma lei específica em defesa do usuários de serviços públicos à semelhança do CDC na relação consumerista, e que portanto não há sentido de que uma outra norma venha regular preceitos de outra ainda a existir.

No entanto, àqueles que entendem que pode sim haver a aplicação do CDC nas

atividades reguladas, como Odete Medauar (2012) e Diógenes Gasparini (2011), por exemplo, defendem que a própria lei das concessões – Lei nº 8987/95− em seu artigo 7º, prevê tanto os direitos quanto os deveres dos usuários de serviços públicos13 e que não há qualquer hipótese para a não aplicação subsidiária do CDC nesta seara. Esta discussão ainda será retomada nesta pesquisa, porém a priori é mister entender de que modo os princípios administrativos e constitucionais incidem numa relação entre sujeitos à semelhança entre consumidores e fornecedores.

No tocante à incidência dos princípios administrativos nas atividades regulatórias

vale destacar o princípio da supremacia do interesse público, visto que tal pressuposto visa garantir o interesse público nas atividades exercidas direta e indiretamente pela Administração

Pública, incluindo os próprios atos e decisões tomadas pelas agências reguladoras (AGÊNCIAS

REGULADORAS E TUTELA DOS CONSUMIDORES, 2010).

Segundo lições de Justen Filho (2011) a supremacia do interesse público disciplina

que os interesses privados jamais poderão se sobrepor aos interesses da coletividade (público); daí a relevância em saber que toda decisão tomada no âmbito da Administração Pública− na figura de suas entidades, devem ser pautadas, levando-se como prioridade o interesse público, o qual de acordo com o administrativista é considerado como algo indisponível14

Neste sentido, tal princípio ao priorizar o interesse da coletividade como

fundamento para a própria atuação da Administração Pública acaba estabelecendo uma relação intrínseca com princípios constitucionais, em especial aos princípios da atividade econômica, visto que na prestação de um serviço público é mais perceptível a ideia de interesse coletivo e de justiça distributiva, diferente do que ocorre numa relação consumerista a qual se pauta na relação individual entre consumidor e fornecedor (GUERRA, 2012). Dentro desta ótica aduz Justen Filho (2003, p.131):

 

                                                          

13 Art. 7º. Sem prejuízo do disposto na Lei no 8.078, de 11 de setembro de 1990, são direitos e obrigações dos usuários:

I  - Receber serviço adequado;

II                   - Receber do poder concedente e da concessionária informações para a defesa de interesses individuais ou     coletivos;

III                - obter e utilizar o serviço, com liberdade de escolha entre vários prestadores de serviços, quando for o caso, observadas as normas do poder concedente. (Redação dada pela Lei nº 9.648, de 1998)

IV                 - Levar ao conhecimento do poder público e da concessionária as irregularidades de que tenham conhecimento, referentes ao serviço prestado;

V                   - Comunicar às autoridades competentes os atos ilícitos praticados pela concessionária na prestação do serviço;  VI - Contribuir para a permanência das boas condições dos bens públicos através dos quais lhes são prestados os serviços.

 

14Dentro desta ótica destaca o autor que entender acerca do princípio da supremacia do interesse público como a própria diminuição dos direitos subjetivos privados acaba gerando problemas considerados insuperáveis. Neste sentido o autor cita as lições de Diógenes Gaspari (2011, p.20), o qual alerta acerca que a aplicabilidade daquele princípio “não significa o total desrespeito ao interesse privado, já que a Administração deve obediência ao direito adquirido, à coisa julgada e ao ato jurídico perfeito”.

O prestador de serviço privado estrutura sua operação econômica com finalidade diversa da satisfação do interesse público. Ele busca obter o maio lucro possível, tendo em vista os princípios da atividade econômica em sentido estrito (CF/88, art. 170). Já o prestador do serviço público desempenha atividade disciplinada pelos princípios de direito público e apenas pode intentar a satisfação egoística de seu interesse na medida em que se realize o interesse público.

 

Neste sentido perfilha Alexandre Santos Aragão (2006, p. 153-154) que os serviços

públicos:

[...] têm uma conotação coletiva muito mais ampla que as atividades econômicas privadas. Visam à coesão social, sendo muitas vezes um instrumento técnico de distribuição de renda e realização da dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, CF), com o financiamento, através das tarifas dos usuários que já têm o serviço, da sua expansão aos que ainda não têm acesso a ele. Se fosse apenas pelo sistema privatista do CDC, essas tarifas teriam que ser consideradas abusivas (artigos 39, V; e art. 51,

IV, CDC), eis que superam o valor que seria decorrente apenas da utilidade individualmente fruída.

 

Conforme apresentada nesta sessão, é notória a relevância dos princípios

consumeristas, administrativos e constitucionais nas atividades reguladas, por vez que, segundo Guerra (2012), são serviços executados por entidades cujas prerrogativas são dotadas de certa especialidade, e que devido a sua natureza jurídica peculiar impele que vários pressupostos jurídicos trabalhem conjuntamente para que a realização de suas atividades esteja em harmonia com a ordem jurídica estatal vigente.

 

3.1.2 Aplicação do Código de Defesa do Consumidor aos serviços públicos.

 

Como já antecipado no início deste trabalho, e relevante agora para este tópico, tem-

se que o Código de Defesa do Consumidor, enquanto lei de cunho social, ou melhor, de ordem pública e econômica de origem constitucional, apresenta como principal finalidade, segundo Cláudia Lima Marques (2011) a proteção de um grupo específico de indivíduos, os quais são considerados a parte mais frágil dentro de uma relação consumerista, em virtude das práticas abusivas do livre mercado, ou seja, os consumidores.

Daí que este código intervém de forma imperativa nestas relações jurídicas de

direito privado, antes, conforme dispõe a autora, denominadas pelo dogma da autonomia da vontade. No que concerne ao objetivo deste estudo é imperiosa, preliminarmente, apresentar a classificação dos serviços públicos para que se possa de fato definir em que espaço de atuação pode incidir ou não o CDC nestes serviços, para que se possa realizar uma análise específica acerca da proposta temática desta sessão.

Assim, consoante Meirelles (2004) os serviços públicos denominados de uti

universi abrangem os serviços oferecidos pela Administração Pública a uma coletividade indeterminada, daí, portanto, serem considerados como indivisíveis, não passíveis de identificar os usuários dos mesmos; tais serviços, via de regra são remunerados mediante imposto− tributo geral.   

Em contrapartida os serviços considerados do tipo uti singuli, conforme lição de

Cavalieri Filho (2011, p.78) são os “serviços públicos que preordenam-se a destinatários individuais, cujos usuários são determináveis, os quais permitem a aferição do quantum utilizado por cada consumidor, o que ocorre com os serviços de telefone, água e energia elétrica”.  Tais serviços por serem de utilização individual− ou seja, os usuários podem ser especificados − são remunerados a partir de taxas (tributo) ou tarifas (preço público) (MEIRELLES, 2004).  

 Não obstante, é importante ressaltar que a doutrina consumerista também não é

pacífica em relação ao tipo de serviço a ser tutelado pelo CDC; dividindo os posicionamentos em três importantes correntes: a primeira, defendida por Antônio Herman Benjamim (2014) o qual defende a aplicação extensiva do CDC− mais precisamente do artigo 22, ou seja, “nas hipóteses em que estiver caracterizada a existência de uma relação de consumo e seus respectivos elementos” (BENJAMIM, 2014, P.764).

 Enquanto que a segunda, intitulada de extensiva mitigada, defende que a referida

lei tutelaria somente o direito dos consumidores que utilizassem serviços específicos e divisíveis remunerados por taxas ou preço público (tarifas), excluindo os custeados através de impostos (COSTA, 1997),

 E por último, a terceira corrente, denominada de restritiva, dispõe que o CDC

somente incidiria apenas em serviços remunerados por tarifa ou preço público, cuja prestação tenha um caráter uti singuli, ou seja, passíveis de identificar os usuários não incluindo, portanto, os serviços públicos gerais remunerados por taxa ou imposto (MACEDO JUNIOR, 2002).

                                 Diante destas considerações, denota-se que as duas últimas correntes partem de

uma mesma linha de raciocínio, ou seja, inviabilizam a incidência do CDC aos serviços públicos prestados a uma coletividade indeterminada; sendo ainda mais restritiva a última corrente, por vez que esta exclui entre aqueles serviços os remunerados por taxas.

 Feitos tais apontamentos, é pontual destacar a terceira corrente como parâmetro de

análise nesta pesquisa, ou seja, a possibilidade de incidência do CDC aos serviços prestados de forma uti singuli, ou seja, de forma divisível e remunerados mediante tarifa ou preço público, por vez que, seja mais fácil identificar os usuários que escolheram estes serviços, condição necessária para identifica-los como consumidores, conforme denota Macedo Júnior (2002).

Isso porque os serviços públicos custeados mediante impostos e prestados pelo Estado, como bem explica Roberto Augusto Castellanos Pfeiffer (2008), não podem ser tutelados pelo CDC, por conta de que o Estado nesta condição não ser considerado fornecedor. De acordo com o autor, o pagamento deste tributo ocorre independentemente do indivíduo ter ou não se utilizado do serviço, daí que se estabelece, portanto, uma relação do tipo tributária, a qual impele o pagamento de forma compulsória por parte daquele e independe de contraprestação pelo Estado.

A incidência do CDC nos serviços públicos regulados pelas agências reguladoras

corresponde ao próprio poder de polícia que a Administração Pública se utiliza para a proteção e garantia dos direitos fundamentais no âmbito da atividade do sujeito privado que impele a determinação de medidas coercitivas aos que não respeitarem tais princípios (MELLO, 2002).

Sobre esse assunto, é importante ressaltar que o sentido atribuído ao poder de

polícia que justifica a atuação da Administração Pública- externada pelo CDC- às relações consumeristas é o restrito, ou seja, “espécie de intervenção genérica ou específica do Poder Executivo, destinada a alcançar o mesmo fim de interferir nas atividades de particulares tendo em vista os interesses sociais” (MELLO 2002, p.559).

Deste modo, a defesa do direito do consumidor tem como fundamento o poder de

polícia administrativo que adota o sentido restrito, isso porque o interesse público a ser efetivado se justifica pelo próprio artigo 5º, XXXII, da Constituição Federal, o qual assim dispõe: “o Estado promoverá, na forma da lei, a defesa do consumidor” (MIRAGEM, 2014, p.732). Visto posto, as considerações abordadas neste tópico são pontuais para se entender de que modo o CDC enxerga o consumidor, numa dada relação consumerista, garantido a ele a tutela jurídica exigida e possível no ordenamento jurídico brasileiro. 

 

3.2 O consumidor segundo a ótica do Código de Defesa do Consumidor

 

No que se refere ao conceito de consumidor segundo está disposto literalmente no

artigo 2º da lei 8078/90 (Código de Defesa do Consumidor) aquele se refere a “toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final”. Pode-se inferir que este dispositivo externa uma concepção acerca de quem deve ser considerado consumidor a partir de um determinado ponto de vista.

Dentro desta ótica é imperioso apresentar e explanar acerca das três correntes de

interpretação da definição jurídica de consumidor, as quais norteiam esse modo diferenciado de se enxergar este destinatário, enquanto sujeito de direitos, protegido pelo CDC, as quais são denominadas de Finalista; Maximalista e Finalista Mitigada.

Segundo lições de Cláudia Lima Marques (2013) a corrente jurídica do tipo finalista

é àquela dos pioneiros do consumerismo brasileiro, à qual defende que o conceito de consumidor deve estar adstrito ao que está disposto no artigo 2º do CDC; ou seja, “consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final”. De acordo com esta interpretação, deve-se considerar como consumidor como aquele que adquire ou utiliza um produto para a satisfação de suas necessidades ou de sua família, na qualidade de destinatário final e que sua natureza não seja profissional (MIRAGEM, 2014).

Deste modo, para os defensores desta corrente, quanto mais se limitar o campo de

incidência do CDC− aos que realmente dele necessitam, melhor será a eficácia desta lei, a qual tutelará aos que se encontrarem numa situação consumerista mais desvantajosa, o que não incluiria os profissionais-consumidores que não se inserem nesta situação, visto que estes poderiam se aproveitar de benefícios, os quais já são oferecidos pelo direito comercial (MARQUES, 2013).

O consumidor segundo esta percepção seria, portanto, aquele que uma vez

necessitando em satisfazer suas necessidades ou de sua família, sem qualquer interesse no estabelecimento de uma relação profissional de mercado, adquire um produto ou se utiliza de um serviço para tais finalidades, ou seja, até que se esgote qualquer tipo de função econômica dos mesmos. Tem-se como elemento estrutural deste conceito a não possibilidade em auferir qualquer espécie de lucro numa dada relação jurídica (MIRAGEM, 2014). 

De acordo com Miragem (2014) a linha de defesa que respalda esta corrente parte

do ponto de vista de que o CDC se trata de uma lei especial que tutela os direitos dos consumidores, assim deve ser aplicada de forma restrita ao que dispõe a lei. Neste sentido, mas a partir de uma visão mais radical do conceito tem-se que a interpretação finalista deixa à margem qualquer intenção em se atribuir à pessoa jurídica a qualidade de consumidor.

No que concerne aos maximalistas, estes acreditam que o consumidor seria o

destinatário fático do produto ou serviço − neste ponto semelhante à concepção da corrente finalista− porém, defendem que mesmo que aquele não seja necessariamente seu destinatário econômico ainda sim deverá ser qualificado como consumidor (MIRAGEM, 2014).

Segundo Miragem (2014) eles se valem de alguns dispositivos legais do próprio CDC mais necessariamente ao parágrafo único do artigo 2º e aos artigos 17 e 2915.   Neste sentido para se configurar como consumidor, segundo Miragem (2014), basta que a pessoa (física ou jurídica) adquira ou se utilize tanto do produto quanto do serviço não necessariamente exigindo-se que a estes sejam exauridos em suas qualidades ou que não sejam empregados numa atividade econômica. 

Neste sentido, Jorge Alberto Quadros de Carvalho Silva (2008, p.8) ao tratar desta

corrente jurídica de pensamento assim tece algumas considerações:

Consumidor é quem adquire no mercado de consumo o produto ou serviço; aquele em razão de quem é interrompida a cadeia de produção e circulação de certos bens e serviços, para usufruir ele mesmo, ou terceiro a quem os ceda, das respectivas funções – ainda que esses bens e serviços possam ser empregados, indiretamente, no exercício de sua empresa ou profissão, isto é , ainda que venham a ser interligados, acessoriamente, à sua atividade produtiva ou profissional, coletiva ou individual, voltada ou não para o lucro ( destinatário final fático).

 

Como bem explana Marques (2013) as duas primeiras correntes interpretativas − Finalista e Maximalista− apresentam uma bipolarização, o que impele a necessidade em se haver uma reflexão mais aprofundada acerca do tema, ou seja, conforme a doutrinadora, não basta se valer única e exclusivamente da repetição do que está disposto no artigo 2º do Código de Defesa do Consumidor para se definir o que se considera como consumidor; deste modo é imprescindível que se crie outra forma de analisa-lo.

Dentro desta ótica, surge uma nova linha interpretativa intitulada de finalista

aprofundada, a qual se utiliza de dois critérios basilares para a definição de consumidor; ou seja, destaca, primeiramente, que o consumidor por equiparação seria uma exceção de acordo com o CDC, enquanto que o reconhecimento da vulnerabilidade deve ser o elemento essencial para se denominar consumidor por equiparação, conforme está disposto no artigo 29 do CDC (MIRAGEM, 2014).

 O conceito de consumidor a partir desta última corrente interpretativa passou a ser

utilizado pelo Superior Tribunal de Justiça, conforme explana Marques (2013), a partir da análise de um conjunto de decisões entre os anos de 2003 à 2005, nas quais o Egrégio Tribunal se valeu daqueles critérios hermenêuticos − consumidor por equiparação como exceção do

                                                          

15 Art. 2° Consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final.

        Parágrafo único. Equipara-se a consumidor a coletividade de pessoas, ainda que indetermináveis, que haja intervindo nas relações de consumo.

Art. 17. Para os efeitos desta Seção, equiparam-se aos consumidores todas as vítimas do evento.

Art. 29. Para os fins deste Capítulo e do seguinte, equiparam-se aos consumidores todas as pessoas determináveis ou não, expostas às práticas nele previstas.

 

CDC e a vulnerabilidade − para a definição de quem deve ser considerado consumidor e receber a tutela judicial. Entre estes julgados, segundo Miragem (2014), destaca-se o julgamento do Recurso Especial nº 684.613/SP, tendo como relatora a Ministra Fátima Nancy Andrighi: 

DIREITO DO CONSUMIDOR. RECURSO ESPECIAL. CONCEITO DE CONSUMIDOR. PESSOA JURÍDICA. EXCEPCIONALIDADE. NÃO CONSTATAÇÃO NA HIPÓTESE DOS AUTOS. FORO DE ELEIÇÃO. EXCEÇÃO DE INCOMPETÊNCIA. REJEIÇÃO.

 

A jurisprudência do STJ tem evoluído no sentido de somente admitir a aplicação doCDCà pessoa jurídica empresária excepcionalmente, quando evidenciada a sua vulnerabilidade no caso concreto; ou por equiparação, nas situações previstas pelos arts.17e29doCDC.

 Mesmo nas hipóteses de aplicação imediata doCDC, a jurisprudência do STJ entende que deve prevalecer o foro de eleição quando verificado o expressivo porte financeiro ou econômico da pessoa tida por consumidora ou do contrato celebrado entre as partes.

É lícita a cláusula de eleição de foro, seja pela ausência de vulnerabilidade, seja porque o contrato cumpre sua função social e não ofende à boa-fé objetiva das partes, nem tampouco dele resulte inviabilidade ou especial dificuldade de acesso à Justiça. Recurso especial não conhecido. (STJ, Resp 684.613/SP, rel. Min. Fátima Nancy Andrighi, j. 21.06.2005, DJU 01.07. 2005, p.530).

 

Neste sentido, o critério da vulnerabilidade, além de justificar a incidência da tutela

consumerista numa dada situação, também é considerado como elemento interpretativo que a jurisprudência lança mão para enfatizar quando a norma não poderá ser aplicada (MIRAGEM,

2014). Ou seja, nas palavras de Marques (2013, p.228), “a vulnerabilidade é mais um estado da pessoa, um estado inerente de risco ou um sinal de confrontação excessiva de interesses identificado no mercado”. Este critério, segundo a estudiosa, abrange três formas de vulnerabilidade; a técnica, a jurídica e a fática[13].

Superada esta etapa há que se ressaltar quanto aos direitos do consumidor com base

na Lei nº 8078/90 (Código de Defesa do Consumidor), ou seja, do ponto de vista formal toda pessoa (física ou jurídica) que adquire, por exemplo, algum produto que esteja deteriorado, por exemplo, tem o direito em exigir de quem o forneceu a obrigação em repará-lo.  Neste sentido é importante pontuar, primeiramente, com base no CDC, quem é considerado fornecedor de produtos ou serviços. 

Assim, conforme está disposto no artigo 3º entende-se por fornecedor:

Art. 3° Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividade de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços.

§ 1° Produto é qualquer bem, móvel ou imóvel, material ou imaterial.

§2° Serviço é qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração, inclusive as de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária, salvo as decorrentes das relações de caráter trabalhista.

 

Deste modo, segundo Márcio Lopes Toledo (2010), é imprescindível tanto o

conhecimento de quem é considerado consumidor, quanto fornecedor, conforme estabelece a lei nº 8078/90, para que haja a tutela do Poder Judiciário, visto que segundo o estudioso existem diferenças conceituais entre os próprios consumidores, principalmente antes e depois do ato de consumir. Isso porque, conforme o autor:

Antes, porque para consumir o produto – até mesmo o deteriorado – a pessoa deve estar incluída num sistema de produção que lhe confira meios para fazê-lo. Sem tais meios, especialmente o dinheiro, é mais difícil estabelecer relação de consumo.

Depois, porque a pessoa que tem dificuldade de se tornar “consumidor”, ou seja, conta com pouco ou com nenhum acesso monetário, também sofre com uma espécie de barreira para o reclame da proteção legal [...] Essa barreira é expressa por diversos fatores que se manifestam, dentre outras formas, no desconhecimento do próprio direito (TOLEDO, 2010, p.77).

 

Entendendo por consumidor, portanto, aquele (pessoa física ou jurídica) que

adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final; é importante visualizar a respeito dos direitos reconhecidos mundialmente a eles pela “Consumers International”[14], entre eles destacam-se:

1-O direito à satisfação das necessidades básicas - Para ter acesso a bens básicos, essenciais e serviços:alimentaçãoadequada, vestuário, abrigo, cuidados de saúde, educação, serviços públicos, água e saneamento.

2-O direito à segurança - Para estar protegido contra produtos, processos de produção e serviços que são perigosos para a saúde ou a vida.

3-O direito de ser informado - Para ser dados osfatos necessáriospara fazer uma escolha informada, e deve ser protegido contra a publicidade e rotulagem desonesta ou enganosa.

4-O direito de escolher - Para ser capaz de selecionar a partir de uma gama de produtos e serviços, oferecidos a preços competitivos com a garantia de qualidade satisfatória.

5-O direito de ser ouvido - Ter interesses dos consumidores representados na formulação e execução da política do governo, e no desenvolvimento de produtos e serviços.

6-O direito à reparação - Para receber uma solução justa de justas reivindicações, incluindo compensação por falsas declarações, mercadorias de má qualidade ou serviços insatisfatórios.

7-O direito à educação do consumidor - Para adquirir conhecimentos e habilidades necessários para fazer escolhas informadas, confiantes sobre bens e serviços, embora tendo conhecimento de direitos básicos dos consumidores e responsabilidades e como agir sobre eles.

8-O direito a um ambiente saudável -Para viver e trabalhar em umambienteque não é ameaçador para o bem-estar das gerações presentes e futuras (CONSUMERS

INTERNATIONAL).

 

É oportuno considerar, conforme Toledo (2010), que certas leis criadoras de

algumas agências reguladoras acabam apresentando de forma diversa quem seria considerado consumidor e quem seria intitulado de usuário de serviço público, à título da incidência da tutela consumerista; neste sentido destaca-se a Lei nº 9472/97 a qual se refere à lei instituidora da

ANATEL.

Como dispõe o autor, o §2º do artigo 21 deste diploma legal dispõe

simultaneamente das palavras “consumidores” e “usuários” de forma diversa o que denota de antemão que aos dois seres deve-se atribuir tratamento diferente. Assim apresenta o referido artigo:

Art. 21.As sessões do Conselho Diretor serão registradas em atas, que ficarão arquivadas na Biblioteca, disponíveis para conhecimento geral.

 

§2º As sessões deliberativas do Conselho Diretor que se destinem a resolver pendências entre agentes econômicos e entre estes e consumidores e usuários de bens e serviços de telecomunicações serão públicas, permitida a sua gravação por meios eletrônicos e assegurado aos interessados o direito de delas obter transcrições.

 

Dentro desta ótica analítica é importante ponderar a respeito da discussão que trata

da incidência do CDC aos usuários de serviços públicos, visto ser necessário pontuar de que modo alguns doutrinadores se manifestam sobre o assunto para fins de entendimento desta pesquisa. 

Considerando o primeiro deles destacam-se as lições de Odete Medauar (2012),

importante administrativista que defende acerca da possibilidade em que se possa incidir a tutela do CDC aos usuários de serviços públicos, por vez que citando a Lei nº 8987/95 (Lei das concessões) assevera que este diploma dispõe acerca dos direitos e deveres dos usuários de serviços públicos, e que mesmo se tratando destas pessoas, isso não implica a exclusão da tutela consumerista a estes atores. Consoante o artigo 7º, da alusiva lei são direitos e obrigações dos usuários de serviços públicos: 

I  - Receber serviço adequado;

II              - Receber do poder concedente e da concessionária informações para a defesa de interesses individuais ou coletivos;

III            - Obter e utilizar o serviço, com liberdade de escolha entre vários prestadores de serviços, quando for o caso, observadas as normas do poder concedente. (Redação dada pela Lei nº 9.648, de 1998):

IV            - Levar ao conhecimento do poder público e da concessionária as irregularidades de que tenham conhecimento, referentes ao serviço prestado;

V               - Comunicar às autoridades competentes os atos ilícitos praticados pela concessionária na prestação do serviço;

VI            - Contribuir para a permanência das boas condições dos bens públicos através dos quais lhes são prestados os serviços.

 

Neste sentido, compartilhando do posicionamento da estudiosa supracitada,

destaca-se o pensamento de Fernando Costa de Azevedo (2002), o qual dispõe de forma mais ampla a concepção entre consumidores e usuários do serviço público, levando-se em consideração a generalidade do que se deva entender por relação de consumo; ou seja, parte-se da concepção de que uma vez o usuário se valendo da prestação de um serviço público mediante o pagamento de alguma contraprestação está, portanto, inserido numa relação de consumo e desta forma é legítima a incidência do CDC neste contexto, assim:

Sendo todo e qualquer serviço uma atividade econômica cuja contraprestação se dá mediante remuneração direta pelo usuário (art. 3º, §2º, do CDC), os serviços de titularidade estatal (serviços públicos), prestados pela pessoa jurídica da Administração Indireta (a chamada execução direta), ou submetida esta prestação ao processo de delegação à iniciativa privada (execução indireta), serão sempre objeto de relação de consumo. A consequência lógica desta afirmação é a de que todo e qualquer usuário de serviço público será sempre consumidor (AZEVEDO, 2002, p.157).

 

Em contrapartida, outros teóricos discordam desta amplitude e defendem que

usuários e consumidores merecem tratamentos diferentes, isso porque não se pode confundir a prestação de um serviço público com a prestação de um serviço privado (AMARAL,2002). As relações jurídicas aí estabelecidas, segundo o autor, são díspares não possibilitando que diplomas legais que tutelam interesses específicos possam ser estendidos a outros completamente diversos; em outras palavras:

A relação jurídica entre a concessionária e usuário não pode ser equiparada à existente entre duas pessoas privadas, que atuam na defesa de seus interesses específicos [...] Ressalte-se que o tratamento dado ao usuário de serviço público pela Constituição e pela lei é diverso do dispensado ao consumidor [...] (AMARAL, 2002, p.2-3).

 

Além disso, o autor destaca que na própria Carta Constitucional do Brasil estão

presentes determinados dispositivos que disciplinam tanto o consumidor quanto ao usuário de maneira diversa, ou seja, conforme o artigo 175 da CF/88 este versa a respeito das concessões de serviços públicos, ao passo que o artigo 5º, XXXII, e artigo 170, V, da CF[15] dispõem sobre a tutela consumerista (para consumidores). Assim, continua o teórico a versar sobre o assunto:

Já o artigo 27 da Emenda Constitucional nº 19/98 determinou que o Congresso

Nacional deverá elaborar “lei de defesa do usuário de serviços públicos”. Isso

equivale ao reconhecimento implícito de que essa defesa é juridicamente diversa da “defesa do consumidor”, já regulada pela Lei nº 8078/90. Saliente-se que essa lei devia ter sido elaborada pelo Congresso Nacional no prazo de 120 (cento e vinte) dias, a partir de junho de 1988. Até hoje não o foi. Há vários projetos tramitando no Congresso Nacional. Alguns determinam, a meu ver equivocadamente, a aplicação subsidiária das normas da Lei 8078 à defesa do usuário de serviço público. Penso que isso servirá para perpetuar a confusão atual entre as duas relações jurídicas, a de serviço público e a de consumo. Cabe ao Congresso, que já aprovou em 1990 o Código de Defesa do Consumidor, aprovar agora um outro código, diferente daquele, qual seja, o Código de Defesa do Usuário de Serviço Público (AMARAL, 2002, p.4).

 

Denota-se do exposto, preliminarmente, que a defesa do usuário de serviço público

não poderia ser estendida como dever a ser garantido pelos órgãos de defesa do consumidor, mas sim às próprias agências reguladoras que apresentando autonomia normativa e administrativa deverão lidar com esta situação. 

Considerando que a lei prevista no próprio artigo 27 da Emenda Constitucional nº 19 ainda não fora criada acaba, então, sendo aplicado de forma subsidiária o CDC a uma relação jurídica de prestação de serviço público, ao passo que deveria tão somente incidir sobre as relações jurídicas privadas de consumo (AMARAL, 2002).

Compartilhando deste posicionamento acerca da inviabilidade da submissão do

serviço público ao Código de Defesa do Consumidor destacam-se as lições de Marçal Justen Filho (2011, p.705), o qual assim versa: 

O regime de direito público, que se traduz em competências estatais anômalas, é indispensável para assegurar a continuidade, a generalidade, a adequação do serviço público. Se cada usuário pretendesse invocar o maior benefício individual possível, por meio das regras do direito do consumidor, os efeitos maléficos recairiam sobre outros consumidores. Em suma, o direito do consumidor não pode ser aplicado integralmente no âmbito do serviço público por uma espécie de solidariedade entre os usuários, em virtude da qual nenhum deles pode exigir vantagens especiais cuja fruição acarretaria a inviabilização de oferta do serviço público em favor de outros sujeitos. Aliás e não por acaso, o art. 27 da Emenda Constitucional nº 19/98 previra que seria elaborado, no prazo de 120 dias, uma lei de defesa do usuário de serviços públicos. A regra reconhece, então, a inviabilidade de aplicação automática e indiferenciada do Código de Defesa do Consumidor ao âmbito dos serviços públicos.

 

Assim, conforme está disciplinado no § 3º do artigo 37 da CF/88, instituído em

virtude da Emenda Constitucional nº 19/98 −  que autoriza a criação da lei de defesa dos usuários de serviço público a ser realizada pelo Congresso Nacional− uma vez ainda não instituída àquela lei não implica à incidência imediata ou subsidiária do CDC nas relações entre usuários com os delegatários de serviços públicos, visto que a aplicação da legislação consumerista aos usuários prejudicaria a própria coletividade (KRÜGER, 2013 ). 

Em discordância deste posicionamento têm-se as ponderações de Diógenes Gasparini (2011, p. 365), o qual defende a viabilidade de incidência do Código de Defesa do Consumidor no contexto da prestação de serviços públicos:

O art. 3º do Código do Consumidor (Lei federal n. 8078, de 11-9-1990, que dispõe sobre a proteção do consumidor), estabelece que fornecedor é “toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividades de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços”. Vê-se que a Administração Pública, em qualquer de suas manifestações (federal, estadual, distrital, municipal), sempre que, em razão de seu comportamento puder ser havida como fornecedor, subsume-se integralmente às disposições desse Código. Assim é se o Município, por exemplo, for o prestador de serviços de transporte de passageiros ou o executor dos serviços de captação, tratamento e distribuição de água domiciliar ou explorador dos serviços funerários. Nesse aspecto, a Administração Pública equipara-se ao fornecedor particular.

 

Neste sentido, coaduna-se de modo semelhante Alexandre Santos de Aragão (2013,

p. 502; 519) quanto a possibilidade da aplicação do CDC aos serviços públicos:

[...] A aplicação do Direito dos Consumidores aos serviços públicos é uma decorrência fundamental do movimento de liberalização econômica da década de oitenta e seguintes. Apenas um serviço liberalizado, sujeito à lógica econômica da concorrência, haver-se-ia de cogitar da aplicação, em maior ou menor escala, do direito comum de proteção dos consumidores.

[...] Não há dúvida quanto à aplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor- CDC aos serviços públicos, em razão de dispositivos expressos nesse sentido: por um lado, o art. 7º, caput, da Lei das Concessões e Permissões de Serviços Públicos – Lei nº 8.987/95− faz remissão genérica à aplicação do CDC aos usuários de serviços públicos; por outro lado, o CDC os contempla expressamente nos arts. 4º, II (referência à melhoria dos serviços públicos como Princípio da Política Nacional das Relações de Consumo); 6º, X, (prestação adequada dos serviços públicos como direito dos consumidores); e 22 (obrigação do Estado e de seus delegatários pela prestação de serviços adequados). 

 

Denota-se das abreviações feitas, que ainda há uma profunda discussão a respeito

da equivalência jurídica entre usuários e consumidores, para justificar ou invalidar a incidência do CDC aos serviços públicos, por vez ainda não ter sido elaborada uma lei específica para o tratamento daqueles cidadãos que se utilizam de serviços públicos e que necessitam de uma tutela efetiva do Estado, conforme dispôs Amaral (2002) e Justen Filho (2011).

 Neste ponto, abre-se caminho para outro importante debate a ser analisado; ou seja,

sobre até que ponto as decisões tomadas de acordo com a discricionariedade do poder administrativo das agências reguladoras podem ser invalidadas pelo Poder Judiciário, considerando como parâmetro o Código de Defesa do Consumidor. Eis a questão primordial a ser apresentada no capítulo a seguir.

 

4- AS RESOLUÇÕES SOBRE OS SERVIÇOS PÚBLICOS E AS DISPOSIÇÕES PROTETIVAS DO CDC À LUZ DA CF/88

 

Após apresentação dos principais fatos históricos que justificaram a criação das

agências reguladoras no Brasil, assim como os elementos característicos que compõem e diferenciam estas entidades autárquicas de outras entidades da administração indireta, principalmente no que se refere a autonomia política, administrativa e financeira de suas decisões, é oportuna a análise sobre o conflito entre as leis que regulamentam as agências reguladoras e as que estão dispostas pelo CDC.

Para que se possa compreender este assunto é necessária uma breve apresentação

acerca do funcionamento do ordenamento jurídico e de que modo as normas contidas no mesmo se relacionam. Segundo observações de Norberto Bobbio (2014) as normas jurídicas apresentam uma relação de interação umas com as outras não se encontrando de forma estanque no Direito; este contexto espacial onde estas normas se encontram é denominado de ordenamento jurídico.

Contudo, para que este ordenamento seja considerado uma unidade sistemática é

necessário, segundo o estudioso, que além das normas se organizarem de acordo com uma obediência a uma escala hierárquica, que as mesmas estejam distribuídas numa ordem coerente, ou seja, “que os entes que as constituem não estejam somente em relacionamento com o todo, mas também num relacionamento de coerência entre si” (BOBBIO, 2014, P.71).

 Para o autor, a coerência que se visa é àquela a qual uma vez havendo conflitos

entre as normas, consideradas incompatíveis entre si, por algum critério pré-estabelecido, que haja a eliminação de uma delas, por vez que tal conflito acaba acarretando um desequilíbrio naquilo que deve ser ordenado, e não simplesmente entender a coerência simplesmente como a interação de normas consideradas compatíveis entre si.

A incompatibilidade de normas, também intitulada de antinomias, não pode fazer

parte do ordenamento jurídico, visto que: 

Um ordenamento jurídico constitui um sistema porque não podem coexistir nele normas incompatíveis. Aqui, “sistema” equivale à validade do princípio que exclui a incompatibilidade das normas. Se num ordenamento vêm a existir normas incompatíveis, uma das duas ou ambas devem ser eliminadas. [...] as normas de um ordenamento têm um certo relacionamento entre si, e esse relacionamento é o relacionamento de compatibilidade, que implica a exclusão da incompatibilidade (BOBBIO, 2014, P. 80).

 

  

Muito embora, o mesmo autor afirma que é plenamente possível a existência de

antinomias por vez que em um ordenamento jurídico possa existir valores diferentes que se embatam, mesmo que tenham surgido de diversas fontes criadoras de leis, ou seja:

Num ordenamento jurídico complexo, [...], parece não haver dúvida de que possam existir normas produzidas por uma fonte em contraste com normas produzidas por outra. [...] deve-se concluir que num sistema dinâmico duas normas em oposição são perfeitamente legítimas. E de fato, para julgar a oposição de duas normas é necessário examinar o seu conteúdo; não basta referir-se à autoridade da qual emanaram. (BOBBIO, 2014, p. 74).

 

Essa possibilidade de conflitos normativos como bem observa o alusivo autor,

também é explicada por Hans Kelsen (2009, p.228-229) o qual assim dispõe acerca desta temática: “uma norma determina uma certa conduta como devida e outra norma determina também como devida uma outra conduta, inconciliável com aquela”. 

Feitas tais abreviações é imperioso ressaltar a qualidade destas incompatibilidades,

ou seja, de que modo se pode apresentar uma antinomia e o modo de solução para a inexistência dela de acordo com o ordenamento jurídico brasileiro. Há que se entender a priori, segundo observações da administrativista Maria Helena Diniz (2003), que as antinomias são classificadas, de acordo com a doutrina clássica, em antinomias do tipo aparentes e do tipo reais (lacunas de conflito, neste último caso). 

De acordo com a doutrinadora, o primeiro tipo corresponde aos conflitos de normas

que ocorrem durante o processo de interpretação e que podem ser resolvidos a partir da aplicação de critérios específicos (hierárquico, cronológico e da especialidade), enquanto que o segundo tipo somente poderá ser resolvido quando da utilização de outros critérios a saber; analogia, costumes e dos princípios gerais do Direito e da doutrina conforme está disposto no artigo 4º da Lei de Introdução das Normas do Direito Brasileiro (LINDB)[16].

Neste momento, cumpre apresentar de que modo esta norma dispõe acerca dos

critérios de solução dos conflitos normativos (antinomias). De acordo com artigo 2º da Lei de Introdução das Normas do Direito Brasileiro (LINDB) dispõe que: Art. 2o Não se destinando à vigência temporária, a lei terá vigor até que outra a modifique ou revogue.   

§ 1o A lei posterior revoga a anterior quando expressamente o declare, quando seja com ela incompatível ou quando regule inteiramente a matéria de que tratava a lei anterior.

§ 2o A lei nova, que estabeleça disposições gerais ou especiais a par das já existentes, não revoga nem modifica a lei anterior.

§ 3o Salvo disposição em contrário, a lei revogada não se restaura por ter a lei revogadora perdido a vigência.

Assim, feitas estas ponderações, se irá perceber que as normas em conflito a serem

estudadas neste capítulo são àquelas emanadas das agências reguladoras e as dispostas no Código de Defesa do Consumidor (Lei nº 8078/90), sendo que em se tratando das primeiras, segundo Tânia Regina Sanches Telles (2008) se referem à leis em caráter especial, enquanto que a última se trata de uma norma geral; a primeira é hierarquicamente superior à segunda, visto que não houve qualquer revogação de lei anterior, constatando em dispositivo específico[17] o caráter subsidiário do CDC em certas matérias.

Dentro desta ótica é ainda Maria Helena Diniz (2003) que apresenta as regras para

solução de conflitos normativos, assim dispõe a estudiosa:

Na análise das antinomias, três critérios devem ser levados em conta para a solução dos conflitos:

a)  critério cronológico: norma posterior prevalece sobre norma anterior;

b)  critério da especialidade: norma especial prevalece sobre norma geral;

c)   critério hierárquico: norma superior prevalece sobre norma inferior.

 

Neste sentido, de acordo com Telles (2008), dos três critérios acima elencados

presentes no artigo 2º da LINDB o cronológico é considerado o menos potencialmente ofensivo, vindo a ser deixado de lado frente aos dois subsequentes; enquanto que o critério da especialidade se encontra numa posição mediana e o hierárquico é o mais forte dentre os anteriores, considerando a relevância da Constituição neste caso. Segundo Diniz (2003), no que se refere ao critério da especialidade dispõe a administrativista, In Verbis:

No conflito entre o critério hierárquico e o de especialidade, havendo uma norma superior-geral e outra norma inferior especial, não será possível estabelecer uma meta-regra geral, preferindo o critério hierárquico ao da especialidade ou vice-versa, sem contrariar a adaptabilidade do direito. Poderse-á, então, preferir qualquer um dos critérios, não existindo, portanto, qualquer prevalência. Todavia, segundo Bobbio, dever-se-á optar, teoricamente, pelo hierárquico; uma lei constitucional geral deverá prevalecer sobre uma lei ordinária especial, pois se se admitisse o princípio de que uma lei ordinária especial pudesse derrogar normas constitucionais, os princípios fundamentais do ordenamento jurídico estariam destinados a esvaziar-se, rapidamente, de seu conteúdo. Mas, na prática, a exigência de se adotarem as normas gerais de uma Constituição a situações novas levaria, às vezes, à aplicação de uma lei especial, ainda que ordinária, sobre a Constituição. A supremacia do critério da especialidade só se justificaria, nessa hipótese, a partir do mais alto princípio da justiça: suum cuique tribuere, baseado na interpretação de que ‘o que é igual deve ser tratado como igual e o que é diferente, de maneira diferente’. Esse princípio serviria numa certa medida para solucionar antinomia, tratando igualmente o que é igual e desigualmente o que é desigual, fazendo as diferenciações exigidas fática e valorativamente. (DINIZ, 2003, P.50)

 

Dessa forma, no que se refere a antinomia entre as normas dispostas pelas agências

reguladoras e as que estão dispostas pelo CDC o melhor caminho a se adotar, de acordo com as explanações da estudiosa acima é a adoção do princípio máximo de justiça, ou seja, é facultado ao juiz da causa em se tratando do caso concreto avaliar a situação com base nos artigos 4º e 5º da Lei de Introdução das Normas do Direito Brasileiro (LINDB), ou seja, o melhor para os envolvidos na lide (TELLES, 2008).

Denota-se, a partir das considerações elencadas, que a depender de uma lei

específica que regulamente um serviço público, àquela estará numa posição superior à do CDC, considerando os critérios apresentados pelos doutrinadores outrora citados. Feitas estas ressalvas, quanto ao método de solução de conflitos entre as disposições normativas das agências reguladoras e o CDC, se passa adiante ao estudo do papel do Poder Judiciário no que se refere aos serviços prestados pelas agências reguladoras.

 

4.1 A relação entre o Poder Judiciário e os serviços regulados pelas agências reguladoras 

 

Sabe-se que o artigo 5º, XXXV, da Constituição Federal dispõe que a “a lei não

excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”. Assim é possível a priori considerar que é dever deste poder garantir a pretensão a certos direitos os quais uma vez ameaçados ou violados necessitem de uma tutela específica. A exemplo se pode citar os casos de interrupção de serviços públicos executados pelas empresas concessionárias, as quais realizam tais atos em virtude de inadimplementos e demais descumprimentos legais.

O que se questiona, então, é até que ponto o Poder Judiciário pode interferir na

autonomia das decisões tomadas pelas agências reguladoras, no que se refere à autonomia destas entidades frente as disposições do Código de Defesa do Consumidor. Neste sentido é relevante ressaltar, segundo Marcio Roberto Montenegro Batista Junior (2013), que o Poder Judiciário ao realizar o controle sobre atos realizados por estas autarquias, em regime especial, está enfatizando o sistema de tripartição de poderes previstos na Carta Constitucional, enquanto poder que representa a garantia da segurança jurídica.

Do mesmo modo, conforme o estudioso, ao realizar o controle judicial dos atos das

agências reguladoras, que estão em desconformidade com o próprio ordenamento jurídico pátrio, o Poder Judiciário tem como objetivo expurgar qualquer tipo de lesão ou ameaça a direito a fim de resolver as demandas apresentadas em sede de jurisdição ordinária comum e também em especial. Por sua vez serão avaliados os aspectos legais e morais dos atos emanados por estas agências, assim como “na apreciação das decisões advindas da competência das agências de dirimir conflitos existentes entre os agentes regulados, entre estes e os usuários e/ou poder público” (BATISTA JUNIOR, 2013, P.01).

Do mesmo modo se posiciona Alexandre Mazza (2005, p.204) acerca do papel do Poder Judiciário no controle dos atos realizados pelas agências reguladoras:

Ao Poder Judiciário compete controlar as atividades das agências reguladoras e de seus agentes públicos quando questionadas, mediante provocação dos interessados, por meio de ação popular, ação civil pública, mandado de segurança, habeas data, ação de improbidade administrativa, ou qualquer outra ação judicial visando a prevenir ou reprimir atos e omissões atentatórias às normas e princípios pertencentes ao ordenamento jurídico pátrio.

 

Dentro desta ótica apresentada pelo estudioso acima, se denota que não é condição

exigida para o acesso ao Poder Judiciário o esgotamento das vias administrativas para que o usuário possa ingressar com uma demanda no referido poder. Isso porque, de acordo com Batista Júnior (2013), não é mais necessário a revisão administrativa, ou instância administrativa de curso forçado, ou de outro modo, não é mais exigido que o acesso às portas do judiciário exija preliminarmente do usuário de um serviço público uma decisão desfavorável ao caso em específico.

Segundo João Aurino de Melo Filho (2009), o controle judicial aos atos emanados

por estas agências limitar-se-ão ao aspecto da legalidade, não obstante que a depender do caso concreto é possível que o Poder Judiciário possa avaliar o mérito destes atos. Neste sentido dispõe o estudioso:

Quando provocado, o Judiciário poderá analisar não só os requisitos vinculados dos atos de regulação, já que realizará uma análise mais profunda, adentrando no próprio mérito do ato, não para que o juiz imponha suas convicções sobre a conveniência e oportunidade do ato, mas para analisar a subsunção do ato às normas superiores e aos princípios administrativos. O Judiciário, se provocado, poderá fiscalizar, inclusive, o processo que antecede a emanação de um ato de regulação, exigindo informações sobre as opções adotadas e suas correlatas justificativas técnico-científicas. O Judiciário poderá analisar se o órgão regulador adotou todas as providências necessárias para um profícuo e satisfatório desempenho da sua competência discricionária. E um ato de regulação que ignore ou desrespeite as cautelas necessárias, impostas pelo conhecimento técnico ou científico, pode ser analisado e, se for o caso, invalidado pelo Poder Judiciário. É esse controle amplo do Judiciário, pelo menos potencial, que concederá legitimidade à atividade normativa das agências, que não poderão editar atos arbitrários ou desarrazoados, já que estão sujeitas ao controle jurisdicional. Há, então, uma discricionariedade vigiada (MELO FILHO, 2009, P. 03)

 

Dessa forma, em relação ao Poder Judiciário, os atos das agências reguladoras,

assim como de todos emanados pela Administração Pública não estão isentos de controle daquele poder, isso porque − já adiantado, a Carta Constitucional Brasileira consagrou no artigo 5º, XXXV, o Princípio da Inafastabilidade Jurisdicional, o qual justifica a atuação daquele poder no controle da legalidade dos atos emanados pela Administração Pública e de suas entidades. 

Assim, consoante anotações de Hely Lopes Meirelles (2004, p. 605):

Controle judiciário ou judicial é o exercido privativamente pelos órgãos do Poder

Judiciário sobre os atos administrativos do Executivo, do Legislativo e do próprio Judiciário quando realiza atividade administrativa. É um controle a posteirori, unicamente de legalidade, por restrito à verificação da conformidade do ato com a norma legal que o rege. Mas é sobretudo um meio de preservação de direitos individuais, porque visa a impor a observâncias da lei em cada caso concreto, quando reclamada por seus beneficiários. Esses direitos podem ser públicos ou privados – não importa – mas sempre subjetivos e próprios de quem pede a correção judicial do ato administrativo, salvo ação popular, em que o autor defende o patrimônio da comunidade lesado pela administração

 

 Neste sentido, o controle exercido pelo Poder Judiciário em relação aos atos emanados das agências reguladoras devem se limitar via de regra à verificação e fiscalização do caráter legal daquelas disposições considerando ser a função típica daquele poder. De acordo com Batista Junior (2013) a atuação do Poder Judiciário pode desencadear três possíveis resultados; a suspensão, anulação e a imposição de obrigação[18] dos atos realizados pelas agências reguladoras, visando proteger os interesses dos usuários dos serviços públicos, o que abrange tanto a tutela do patrimônio público quanto a responsabilização daqueles que executaram os atos que estão passíveis de verificação, consagrando acima de tudo os direitos e garantias individuais e coletivas assegurados no diploma constitucional pátrio.

 

4.1.1 O posicionamento do STF acerca dos atos normativos das agências reguladoras.     

 

Cumpre ressaltar, a partir de agora, de que modo os Tribunais Superiores se

posicionam a respeito do poder normativo das agências reguladoras no que concerne a autonomia em editar atos e em resolver conflitos gerados no contexto da prestação de algum serviço público. 

Considerando em primeiro plano sobre o posicionamento do Supremo Tribunal Federal (STF) é oportuno destacar que este egrégio tribunal já se manifestou quanto a autonomia do poder normativo das agências reguladoras, no que concerne, segundo Sérgio Guerra (2012), no julgamento da medida cautelar de Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 1668-DF, em 1997.

Nesta demanda a Suprema Corte julgou procedente em parte medida cautelar para

alguns dispositivos da Lei nº 9472/97− Lei Geral de Telecomunicações− como por exemplo, os incisos IV e X do artigo 19 da alusiva lei22[19], os quais dispõem acerca da competência normativa da Agência Nacional de Telecomunicações (ANATEL) (GUERRA, 2012).

 De acordo com a decisão tomada pelos ministros do STF, os alusivos incisos do

artigo supracitado devem ser interpretados conforme a Constituição Federal, e assim fixando a exegese:

Segundo a qual a competência normativa da Agência Nacional de Telecomunicações para expedir normas subordina-se aos preceitos legais e regulamentares que regem a outorga, prestação e fruição dos serviços de telecomunicações no regime público e no regime privado, vencido o Ministro Moreira Alves, que o indeferia (BRASIL, SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. ACÓRDÃO NA ADI Nº 1668-DF. MINISTRO RELATOR: MARCO AURÉLIO).

 

Nota-se que o entendimento deste tribunal foi em considerar constitucional o poder

normativo da ANATEL, uma vez exercido conforme os limites estabelecidos tanto pela Constituição, quanto pelos regulamentos e pelas leis que tratam especificamente da questão (MARTINS, 2011).

Um importante fundamento, segundo Martins (2011), que inspirou os votos dos

ministros para a elaboração do acórdão foi o voto do então Ministro Sepúlveda Pertence, que assim se posicionou quanto ao poder normativo da ANATEL; In Verbis

[...] nada impede que a Agência tenha funções normativas, desde, porém, que absolutamente subordinadas à legislação, e, eventualmente, às normas de segundo grau, de caráter regulamentar, que o Presidente da República entenda baixar. Assim, [...] entendo que nada pode subtrair da responsabilidade do agente político, que é o Chefe do Poder Executivo, a ampla competência reguladora da lei das telecomunicações.

Dou interpretação conforme para enfatizar que os incisos IV e X referem-se a normas subordinadas à lei e, se for o caso, aos regulamentos do Poder Executivo (BRASIL. SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. ADin-MC n° 1.668-DF... TRECHO DO VOTO DO MINISTRO SEPÚLVEDA PERTENCE).

 

Deste modo, o alusivo voto do ministro perfilha com o entendimento compartilhado

nesta pesquisa, ao considerar válido e pertinente a autonomia do poder normativo das agências reguladoras, visto que a interpretação atribuída aos atos emanados pela ANATEL pode também ser estendida a outras agências reguladoras.     

  Muito embora, o Supremo Tribunal Federal, conforme Martins (2011), mesmo afirmando que os atos normativos destas entidades possam ter efeitos externos, deixou de se posicionar quanto a obrigatoriedade ou não “de submissão ao regime de sujeição especial, não tendo analisado tal ponto, deixando para a doutrina o desenvolvimento desta questão” (MARTINS, 2011, P. 16). 

Nesse sentir é indubitável – como já comentado nos primeiros capítulos desta

pesquisa − que seja criado no Brasil um sistema formal para a elaboração de leis de caráter regulatório o que facilitaria a atuação do Poder Judiciário no controle e na tomada de decisões, sem, contudo, violar ou tomar para si a competência do agente regulador (GUERRA, 2012). 

Sob esse fundamento é lídimo concluir, conforme lições de Guerra (2012), que o Poder Judiciário somente deverá invalidar uma decisão de uma agência reguladora quando aquilo que ela determinou não for razoavelmente, moralmente e ineficazmente com os ditames legais do ordenamento jurídico pátrio. Acrescente-se ainda segundo Marcos Juruena Villela Souto (2002, p.359) acerca desta participação do Poder judiciário no controle dos atos normativos das agências reguladoras:

A solução justa de um conflito entre partes é da essência da função judicial, mas o juiz não pode reduzir todas as variáveis a uma solução justa, pois a Administração não está obrigada a reduzir seu leque de opções às regras de interpretação jurídica, até porque, como dito, voltada para o impacto futuro da regulação.

 

Nesses moldes, Alexandre Santos de Aragão (2003) também perfilha em igual

sentido; ou seja, para ele deverá prevalecer, mesmo que duvidosa, mas razoável, a decisão tomada no âmbito da Administração Pública, ou seja, a decisão executiva, visto que “pela natureza da matéria, ela acabaria deixando de ser decidida pela agência para, na prática, passar a ser decidida pelo perito técnico do judiciário” (ARAGÃO, 2003, P.350-351).

Assim, a partir das observações acima elencadas pelos estudiosos, tem-se que a

ausência de um sistema formal ainda é um importante fator a ser discutido na seara tanto do Poder Executivo quanto dos Poderes Legislativo e Judiciário. Isso porque, algumas decisões judiciais, como por exemplo as emanadas pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) acabam tendo uma repercussão considerável a partir de uma visão institucionalista[20] acerca do paradigma da regulação adotada no Brasil (GUERRA, 2012).

No que concerne ao âmbito de atuação do Poder Executivo, conforme Martins (2011), prevalece a visão de que a competência regulatória das agências reguladoras provém do que é determinado na lei de criação de cada uma delas, sendo que àquela competência vincula-se tanto aos condicionamentos legais quanto as presentes no regulamento. Assim, conforme o autor, prevalece de modo predominante o entendimento em que as normas editadas por estas autarquias são consideradas como atos normativos terciários que se subordinam aos regulamentos e aplicados consoante o regime de sujeição especial.

Este posicionamento foi concretizado a partir da elaboração do Parecer da Advocacia Geral da União (AGU) nº AC- 51, de 12 de junho de 2006, sendo que este documento24 apresenta um caráter normativo que correlaciona toda a Administração Federal (MARTINS, 2011). 

Este parecer tratou em discutir acerca da sujeição das agências à supervisão

ministerial entre outros assuntos; a obediência aos atos normativos das agências, limites impostos pela lei e no regulamento, assim como a observância das políticas regulatórias às políticas setoriais elaboradas pelos Ministérios, o que representa um diferencial, visto que tais políticas setoriais servem de paradigma para a atuação normativa destas agências (MARTINS, 2011).

A partir das explanações apresentadas, denota-se que a autonomia da decisões

tomadas em sede das agências reguladoras ainda conjuga posicionamentos teóricos divergentes,                                                          

muito embora é fato que tais atos devam obedecer a limites estabelecidos nas próprias leis que as criaram (as agências), sendo que a atuação do Poder Judiciário deva estar condicionada ao princípio da legalidade não ultrapassando essa margem delimitadora. 

 

 

4.2 Decisões jurídicas tomadas sob a influência do CDC e das disposições normativas das agências reguladoras: estudos de casos específicos

 

Feitas as devidas ponderações acerca da legitimidade de atuação do Poder Judiciário em demandas ligadas à prestação de serviços públicos − com base no Código de Defesa do Consumidor − e a relevância e obediência das disposições das agências reguladoras tomadas com base em regulamentos próprios, é o momento em se conhecer alguns casos específicos os quais foram alvo do controle judiciário, assim como aqueles em que foram respeitadas as decisões tomadas em âmbito interno de cada agência reguladora.

Tal abordagem é de suma importância para a pesquisa, visto que representa o ponto

nevrálgico deste debate, ou seja, quais seriam os limites a serem respeitados pelo Poder Judiciário nas questões decididas por uma agência reguladora, em respeito aos atos regulatórios destas autarquias. Isso implica em afirmar que àquilo que é decidido pela agência reguladora não deixa de ser alvo de análise pelo Poder Judiciário, mas limitado àquilo que não for da alçada discricionária de tal entidade (DUARTE, 2015).

Para que se alcance este objetivo é primordial rememorar o entendimento já

apresentado nesta pesquisa acerca do que se entende por serviço público, ou seja, de acordo com a doutrina majoritária defendida por Macedo Junior (2002), seria todo serviço prestado de forma uti singuli, de forma divisível, cuja remuneração se dá através do pagamento de tarifa ou preço público.

Deste modo, se conseguirá compreender a relevância da atuação das agências

reguladoras enquanto entidades responsáveis, dentre outras funções pela fiscalização de serviços públicos prestados no mercado de consumo por órgãos específicos, considerando 3 (três) importantes agências escolhidas para este trabalho, são elas: 

a)        Agência Nacional de Telecomunicações (ANATEL);

b)        Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL);

c)        Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS).

 A partir de estudos de casos nos quais cada uma destas agências tenha alguma participação em especial, visualizar-se-á como o Poder Judiciário atua em demandas específicas considerando o Código de Defesa do Consumidor como parâmetro de análise; de outro modo vinculando as decisões tomadas em âmbito administrativo em respeito a autonomia administrativa destas autarquias. Assim será possível alcançar os objetivos desta pesquisa ao analisar a relação dicotômica entre CDC e agências reguladoras considerando o contexto atual em que se encontra a prestação dos serviços públicos no Brasil.

 

4.2.1 O setor de telecomunicações (ANATEL).

 

A lei nº 9472 de 16 de julho de 1997 determinou a criação da ANATEL,

considerada como uma entidade que faz parte da Administração Pública Federal Indireta submetida ao regime de autarquia em especial e vinculada ao Ministério das Comunicações (GUERRA, 2012). Uma vez pertencente ao ordenamento jurídico brasileiro esta autarquia passa a usufruir de determinadas prerrogativas já apresentadas nesta pesquisa, mais precisamente no primeiro capítulo[21].

Em se tratando das competências assumidas pela ANATEL destaca-se o que está

previsto no caput do artigo 19 da Lei nº 9472/1997 (Lei Geral de Telecomunicações- LGT), o qual prevê a incumbência desta agência de forma geral e em seguida destrincha em seus demais incisos, mais precisamente 31 (trinta e uma) atribuições as quais ela é competente neste setor em específico (COSCIONE, 2012).

Considerando de forma geral, a esta agência compete, conforme o caput do artigo 19; “adotar as medidas necessárias para o atendimento do interesse público e para o desenvolvimento   das telecomunicações       brasileiras,       atuando           com     independência, imparcialidade, legalidade, impessoalidade           e publicidade”. Dentre estas medidas, preliminarmente se destaca a competência em expedir normas de caráter geral, mas que tais atos não contrariem às disposições legais (GUERRA, 2012).

Essa prerrogativa, implica na implementação da política nacional de

telecomunicações, assim como na criação de normas e padrões que deverão ser seguidos pelas prestadoras de serviços de telecomunicações em sua atuação, assim como na utilização correta de equipamentos (GUERRA, 2012).

Em termos específicos, compete a ANATEL, dentre outras atribuições, conforme o

artigo 19 da Lei nº 9472/1997 em alguns de seus incisos: implementar, em sua esfera de atribuições, a política nacional de telecomunicações; expedir normas quanto à outorga, prestação e fruição dos serviços de telecomunicações no regime público; editar atos de outorga e extinção de direito de exploração do serviço no regime público;  celebrar e gerenciar contratos de concessão e fiscalizar a prestação do serviço no regime público, aplicando sanções e realizando intervenções; expedir normas sobre prestação de serviços de telecomunicações no regime privado; expedir normas e padrões a serem cumpridos pelas prestadoras de serviços de telecomunicações quanto aos equipamentos que utilizarem; deliberar na esfera administrativa quanto à interpretação da legislação de telecomunicações e sobre os casos omissos; compor administrativamente conflitos de interesses entre prestadoras de serviço de telecomunicações; reprimir infrações dos direitos dos usuários.

Consoante observações de Milene Louise Renée Coscione (2012, p. 75) “a grande

diversidade das competências atribuídas por lei à ANATEL não é sem razão. Com efeito, a multiplicidade de funções e competências é própria da atividade regulatória”. Destaca a estudiosa que a partir do momento em que o Estado decide intervir no domínio econômico enquanto agente regulador acaba abraçando a missão em utilizar das mais variadas formas de planejamento, operação e execução necessários para que no setor de telefonia aufira as finalidades imperiais da regulação.

 Ressalta-se ainda, conforme Guerra (2012) que está agência reguladora apresenta como órgão máximo um Conselho Diretor, que caracteriza-se como uma autoridade administrativa independente, o que envolve, segundo o autor, tanto a “independência administrativa, ausência de subordinação hierárquica, mandato fixo e estabilidade de seus dirigentes (não podem ser demitidos ad nutum) e autonomia financeira” (GUERRA, 2012, p.142).

É importante inferir, conforme observações de Coscione (2012), que em

decorrência destas prerrogativas a ANATEL apresenta o poder discricionário no que tange a atuação do sistema de telecomunicações no Brasil. Essa margem de liberdade de atuação é explicada, segundo a autora, em parte pela complexidade e especialidade as quais são dotadas a realização na prestação de serviços regulados por este setor da economia, o que impele a adoção de um instrumentário específico para a consecução de suas atividades.

Além disto, é intrínseco à toda atividade reguladora alçar o equilíbrio dos interesses

internos da própria agência reguladora, que envolve tanto a participação de agentes públicos quanto privados, o que implica na composição de litígios relacionados à prestação de serviços executados por empresas fiscalizadas por aquelas agências. (MARQUES NETO, 2008). 

A ANATEL enquanto entidade pertencente à Administração Pública Federal

Indireta segue às regras estabelecidas na Lei de Processo Administrativo Federal− Lei nº 9784/1999, no tocante aos controles aos quais as autarquias devam se submeter, o que inclui de certa forma o controle judicial (COSCIONE, 2012). 

Neste sentir, consoante dispõe o artigo 48 da alusiva lei é dever da Administração

emitir decisões em processos administrativos, assim como em solicitações e reclamações, em matéria de sua competência. Desse modo as autarquias sob regime especial deverão obedecer às regras determinadas nesta lei, o que inclui a ANATEL (COSCIONE, 2012).

Para vislumbrar o que se impele neste capítulo passar-se-á a exemplificar de que

modo o Poder Judiciário tem discutido acerca da autonomia desta agência reguladora no trato de questões que envolvam conflitos de interesses entre a agência e os seus usuários. Vale destacar que no item 4.2 deste trabalho já havia sido adiantado a primeira manifestação do Supremo Tribunal Federal acerca da expedição de normas pela ANATEL na ADI nº 1668, em sede de liminar, em que alguns partidos questionavam acerca de determinados artigos da Lei instituidora desta agência reguladora.

Passando-se para outras manifestações do Poder Judiciário, mas em sede de outros tribunais é imperioso mencionar alguns julgamentos que também coadunam com a discricionariedade dos atos decisórios da ANATEL e também com àquelas que justificam a legitimidade do controle judicial daqueles mesmos atos. 

No que concerne ao tema da discricionariedade em relação a competência da ANATEL vale destacar, conforme Guerra (2012), o acórdão publicado em 14 de junho de 2004 que teve decisão unânime proferida pela 2ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, tendo como relator o então Ministro Otávio de Noronha. Eis o teor da ementa:

ADMINISTRATIVO. TELECOMUNICAÇÕES. TELEFONIA FIXA. LEI N. 9.472/97. COBRANÇA DE TARIFA INTERURBANA. SUSPENSÃO. ÁREA LOCAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. 1.

A regulamentação do setor de telecomunicações, nos termos da Lei n. 9.472/97 e demais disposições correlatas, visa a favorecer o aprimoramento dos serviços de telefonia, em prol do conjunto da população brasileira. Para o atingimento desse objetivo, é imprescindível que se privilegie a ação das Agências Reguladoras, pautada em regras claras e objetivas, sem o que não se cria um ambiente favorável ao desenvolvimento do setor, sobretudo em face da notória e reconhecida incapacidade do Estado em arcar com os eventuais custos inerentes ao processo. 2. A delimitação da chamada "área local" para fins de configuração do serviço local de telefonia e cobrança da tarifa respectiva leva em conta critérios de natureza predominantemente técnica, não necessariamente vinculados à divisão político-geográfica do município. Previamente estipulados, esses critérios têm o efeito de propiciar aos eventuais interessados na prestação do serviço a análise da relação custo-benefício que irá determinar as bases do contrato de concessão. 3. Ao adentrar no mérito das normas e procedimentos regulatórios que inspiraram a atual configuração das "áreas locais" estará o Poder Judiciário invadindo seara alheia na qual não deve se imiscuir[22]. 4. Se a prestadora de serviços deixa de ser devidamente ressarcida dos custos e despesas decorrentes de sua atividade, não há, pelo menos no contexto das economias de mercado, artifício jurídico que faça com que esses serviços permaneçam sendo fornecidos com o mesmo padrão de qualidade. O desequilíbrio, uma vez instaurado, vai refletir, diretamente, na impossibilidade prática de observância do princípio expresso no art. 22, caput, do Código de Defesa do Consumidor, que obriga a concessionária, além da prestação contínua, a fornecer serviços adequados, eficientes e seguros aos usuários. 4. Recurso especial conhecido e provido. (STJ. REsp 572070/PR Relator Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA DJ 14.06.2004). 

 

Denota-se do referido acórdão que a Corte respeitou a decisão tomada pela

ANATEL no que concerne à definição de “áreas locais”, isso porque tal conceito exige conhecimentos técnicos e especializados, os quais somente àquela agência pode determinar por vez que conta com profissionais gabaritados para este trabalho assim como recursos técnicos específicos (GUERRA, 2012).

Conforme Guerra (2005) aqueles conceitos estão inseridos no âmbito de atuação da

discricionariedade administrativa, visto que nada impede que existam diferentes decisões consideradas justas a depender da situação em questão; ou seja, no ato da configuração dos atos normativos o binômio oportunidade e conveniência se faz presente, o que implica uma atuação mais comedida do Poder Judiciário em atos que contam, com essa carga de discricionariedade.

Em contrapartida, conforme Guerra (2012), vale destacar também outro julgamento

que debateu a questão controvertida entre a competência da ANATEL e a atuação dos órgãos de defesa do consumidor, a exemplo o PROCON; foi o julgamento realizado  pela 2ª turma do STJ, referente ao REsp nº 1.138.591/RJ, cujo Relator era o Ministro Castro Meira, o qual reconheceu e manteve a competência do PROCON em vista da atuação das concessionárias de telefonia, as quais são reguladas pela ANATEL no contexto da relação consumerista. Eis parte do teor deste julgado:

PROCESSO CIVIL. CONSUMIDOR. EMBARGOS À EXECUÇAO FISCAL. MULTA APLICADA PELO PROCON. DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL. AUSÊNCIA DE SIMILITUDE FÁTICA. NAO CONHECIMENTO. OMISSAO. INEXISTÊNCIA. DOSIMETRIA DA SANÇAO.

VALIDADE DA CDA. REEXAME DE MATÉRIA FÁTICA. SÚMULA 07/STJ. COMPETÊNCIA DO PROCON. ATUAÇAO DA ANATEL.

COMPATIBILIDADE.

[...]5. Sempre que condutas praticadas no mercado de consumo atingirem diretamente o interesse de consumidores, é legítima a atuação do Procon para aplicar as sanções administrativas previstas em lei, no regular exercício do poder de polícia que lhe foi conferido no âmbito do Sistema Nacional de Defesa do Consumidor. Tal atuação, no entanto, não exclui nem se confunde com o exercício da atividade regulatória setorial realizada pelas agências criadas por lei, cuja preocupação não se restringe à tutela particular do consumidor, mas abrange a execução do serviço público em seus vários aspectos, a exemplo, da continuidade e universalização do serviço, da preservação do equilíbrio econômico-financeiro do contrato de concessão e da modicidade tarifária [...] (SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. PLENO. RESP Nº 1.138.591/RJ RELATOR: MINISTRO CASTRO MEIRA).

 

Constata-se, a partir desta breve explanação que é possível o controle judiciário no

que concerne a observância aos critérios da legalidade, mas respeitando o poder discricionário dos atos emanados pelas agências reguladoras. Isso é importante se discutir por vez que se apresenta a hipótese de uma antinomia entre o poder normativo das agências reguladoras e o Código de Defesa do Consumidor. Em que pese ser ainda delicado se exigir um sistema de controle que consiga conjugar a tutela consumerista sem adentrar na autonomia destas autarquias, a exemplo a ANATEL. Passa-se adiante ao estudo de caso da Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL).

 

4.2.2 O setor de energia elétrica (ANEEL).   

 

A Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL) foi uma das primeiras agências

a serem implementadas no Brasil apresentando como objetivo a regulação e a fiscalização do setor elétrico nacional, visto que a prestação deste serviço público não ser mais da alçada direta do Estado (DUARTE, 2015). Neste sentido é relevante as ponderações de Nunes, Ribeiro e Peixoto (2007, p.12):

 

Antes das privatizações e liberalizações, os setores de energia e telecomunicações eram organizados através de empresas de economia mista, sendo o Estado detentor da maioria do capital votante. No setor de energia elétrica, estruturado através de sistemas interligados de geração, transmissão e distribuição de energia, a Eletrobrás era responsável por aproximadamente 25% da geração de energia e a maior parte da distribuição, cerca de 85%, era realizada por empresas estaduais.

 

O setor elétrico brasileiro apresenta quatro subsetores que estão distribuídos na

seguinte ordem: geração, transmissão, distribuição e comercialização, sendo que as fases de transmissão e distribuição constituem monopólios naturais, excetuando-se a geração e a comercialização; enquanto que os três primeiros subsetores ( geração, transmissão e a distribuição de energia elétrica) ficam sob a incumbência de pessoas jurídicas ou consórcios formados por empresas que a partir da concessão, permissão ou autorização tiveram a competência para o exercício desta atividade  (ALMEIDA, 2009). 

As fases de transmissão e distribuição são consideradas como serviço público de

competência da União Federal e que são submetidas à regulação da Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL), a qual tem a incumbência de controlar e fiscalizar os responsáveis destas atividades (GUERRA, 2012).

 Conforme dispõe Sérgio Guerra (2012), esta agência reguladora federal de serviços

públicos foi a primeira a surgir na conjuntura política do Estado regulador; sua lei de criação –

Lei nº 9427 de 26 de dezembro de 1996− permitia a ela, por exemplo, promover, diretamente as licitações e outras prerrogativas.

No entanto, devido a edição da Lei nº 10848 de 15 de Março de 2004 algumas

atribuições da ANEEL foram reduzidas, tais como à limitação do procedimento licitatório, realizado por ela, o qual restringe-se à contratação de concessionárias e permissionárias de serviço público com a incumbência em produzir, transmitir e distribuir energia elétrica, assim como na concessão por meio da delegação para o aproveitamento de potenciais hidráulicos, tendo como norte o plano de outorgas e diretrizes que foi aprovado pelo Poder que o concede[23] (GUERRA, 2012). 

Em síntese, conforme dispõe a Lei nº 9427/96 entre as prerrogativas a serem

exercidas pela ANEEL, enquanto autarquia sob regime especial, vinculada ao Ministério de Minas e Energia destacam-se entre outras:

Art. 2o A Agência Nacional de Energia Elétrica - ANEEL tem por finalidade regular e fiscalizar a produção, transmissão, distribuição e comercialização de energia elétrica, em conformidade com as políticas e diretrizes do governo federal.

 

Art. 3o  Além das atribuições previstas nosincisos II,III,V,VI,VII,X,XIeXII do art. 29e noart. 30 da Lei no8.987, de 13 de fevereiro de 1995, de outras incumbências expressamente previstas em lei e observado o disposto no § 1o, compete à ANEEL:(Redação dada pela Lei nº 10.848, de 2004)(Vide Decreto nº 6.802, de 2009).

I                 - Implementar as políticas e diretrizes do governo federal para a exploração da energia elétrica e o aproveitamento dos potenciais hidráulicos, expedindo os atos regulamentares necessários ao cumprimento das normas estabelecidas pela Lei no9.074, de 7 de julho de 1995;

 

II              - Promover, mediante delegação, com base no plano de outorgas e diretrizes aprovadas pelo Poder Concedente, os procedimentos licitatórios para a contratação de concessionárias e permissionárias de serviço público para produção, transmissão e distribuição de energia elétrica e para a outorga de concessão para aproveitamento de potenciais hidráulicos;(Redação dada pela Lei nº 10.848, de 2004);

 

III- Revogado pela Lei nº 10848 de 2004;

 

IV - Gerir os contratos de concessão ou de permissão de serviços públicos de energia elétrica, de concessão de uso de bem público, bem como fiscalizar, diretamente ou mediante convênios com órgãos estaduais, as concessões, as permissões e a prestação dos serviços de energia elétrica;(Redação dada pela Lei nº 10.848, de 2004);

 

IV            - Gerir os contratos de concessão ou de permissão de serviços públicos de energia elétrica, de concessão de uso de bem público, bem como fiscalizar, diretamente ou mediante convênios com órgãos estaduais, as concessões, as permissões e a prestação dos serviços de energia elétrica;(Redação dada pela Lei nº 10.848, de 2004)

 

V               - Dirimir, no âmbito administrativo, as divergências entre concessionárias, permissionárias, autorizadas, produtores independentes e autoprodutores, bem como entre esses agentes e seus consumidores [...]

 

Ao todo são 20 (vinte) incisos que tratam da incumbência desta agência reguladora,

dos quais merece destaque neste momento o inciso V que dispõe acerca do poder discricionário da ANEEL sobre os conflitos que possam ocorrer entre os agentes de suas concessionárias e permissionárias e seus consumidores (usuários).

Neste sentido, conforme lições de Ana Paula Cordeiro Duarte (2015) no âmbito do

processo administrativo a ANEEL pode proferir decisões as quais são observadas tanto pela respectiva agência reguladora, quanto pelas suas superintendências. Logo, segundo a autora, tais processos podem estar relacionados a sanções, fiscalizações ou demandas contra os próprios entes regulados, o que impele a ANEEL o dever de direcionamento do processo quanto a decisão numa conjuntura espacial administrativa.

Estas entidades (agências reguladoras), em virtude da lei instituidora, a qual dispõe

sobre certas particularidades de sua pessoa, acabam determinando, nas palavras de Marçal Justen Filho (2002, p. 343), “uma margem de autonomia jurídica que não se encontra na maior parte das entidades autárquicas”. Dentro desta ótica é oportuna as ponderações de Isabelle de Lima Lessa (2011, p. 26) acerca da visão dos juízes a respeito das decisões tomadas pela ANEEL:

Tais peculiaridades envolvem a competência regulatória de determinados setores, poderes de intervenção no domínio econômico, o que envolve poderes regulamentares, poderes de polícia para fiscalizar as atividades econômicas privadas dos setores regulados e ainda, para arbitrar litígios entre poder concedente ― o

Estado, a Administração Pública ― e empresas concessionárias ― empresas que detém a concessão do serviço público ―, bem como entre tais empresas e os consumidores ― ou usuários.

 

Diante disto, verifica-se que a ANEEL apresenta a competência para dirimir

conflitos que envolvam tanto os entes regulados quanto os que utilizam os serviços públicos de energia elétrica; no entanto não somente esta agência reguladora tem a incumbência para o exercício de tais funções, ou seja, esta atribuição dirigida a ANEEL, em solucionar impasses, também foi estendida ao Poder Judiciário (DUARTE, 2015).

E é neste ponto, mais uma vez, que se deve ressaltar a relevância do debate proposto

nesta pesquisa, considerando os limites do controle judiciário no que tange aos atos discricionários das agências reguladoras e, com relação a estas últimas, à observância ao princípio da legalidade.

Do mesmo modo o próprio Poder Judiciário analisa esta questão sobre os campos

de atuação deste poder com o que foi determinado pela Constituição e em leis específicas às agências reguladoras, assim destaca Lessa (2011, p. 29):

Hoje, como afirma Abramovay e Terrazas, é mais comum observar, por exemplo, o debate sobre a constitucionalidade das leis já promulgadas, do que a avaliação dos problemas de um projeto de lei que poderiam contrariar o texto constitucional caso fosse aprovado. Essa cultura demonstra uma falta de reconhecimento do Parlamento como instância legítima para o debate jurídico e transfere para o momento no qual a norma é analisada pelo Judiciário todo o debate público sobre a formação legislativa. Do mesmo modo, vem ocorrendo com as decisões expedidas pelas Agências Reguladoras brasileiras que cada dia mais são alvos de debate no Judiciário, guardando a este último, sempre a decisão final. Nesse sentido, Abramovay e Terrazas apontam – remontando os ensinamentos de Robert Alexy - o grande papel que vem sendo entregue ao Judiciário hoje.

 

 De todo o modo, conforme expõe Duarte (2015), é importante ressaltar que ao Poder Judiciário não é permitida a reanalise de todas as questões relacionadas à ANEEL, por conta que “a Administração direta ou indireta possuir um núcleo de competências discricionárias, sobre as quais pode exercer um juízo de conveniência e oportunidade, e sobre o qual o Poder Judiciário não possui competência revisora” (LESSA, 2011, P.35). Igualmente neste sentido expõe Marçal Justen Filho (2002, p.590):

O Judiciário pode verificar se a autoridade administrativa adotou todas as providências necessárias ao desempenho satisfatório de uma competência discricionária. É possível invalidar a decisão administrativa quando se evidencie ter sido adotada sem as cautelas necessárias, impostas pelo conhecimento técnicocientífico.

 

Sabe-se que o poder discricionário de uma decisão tomada no âmbito do Administração Pública está atrelado à combinação de dois fatores; conveniência e oportunidade, sendo que o agente que representa tal poder deve sempre considerar o interesse público como princípio norteador de suas condutas, sendo que as condutas não enquadradas naquela margem de liberdade deverão ter motivação e serem legais (DUARTE, 2015).

 Neste sentido, segundo Lessa (2011, p.35): 

Sendo assim, Poder Judiciário não tem competência revisora sobre o exercício da competência discricionária da Administração, isto é, conforme lembra Sérgio Guerra, “desde que exercida nos limites da atribuição que lhe tenha sido legalmente atribuída e respeitados os princípios constitucionais regedores da atividade administrativa”. Segundo ele, essa a diferença intrínseca no papel desempenhado pelo Judiciário, o qual considera, em suas razões de decidir, unicamente questões jurídicas, de legalidade, constitucionalidade. 

 

Como o cerne desta pesquisa está em avaliar a respeito da força normativa dos atos

emanados pelas agências reguladoras frente a atuação do Poder Judiciário, no que tange à tutela consumerista e seus limites, a apresentação de alguns julgados possibilitam a visualização mais clara de como esta discussão está sendo trabalhada pelo Direito Brasileiro em se tratando da ANEEL nesta sessão.

Entre estes julgados destaca-se, no âmbito de atuação do Tribunal Regional Federação da 4ª Região, processo nº 5004436-89.2011.404.7110; Relator João Pedro Gebran Neto a seguinte decisão:

Ementa: INTERRUPÇÃO DE SERVIÇO PÚBLICO. CORTE DE ENERGIA ELÉTRICA. FRAUDE DO CONSUMIDOR. POSSIBILIDADE. 

A interrupção na prestação do serviço público - in casu energia elétrica - pressupõe o inadimplemento de conta relativa ao mês do consumo, sendo inviável a suspensão de sua prestação em razão de débitos antigos. Todavia, se constatado por equipe técnica irregularidade no medidor de energia elétrica e apurado o débito pretérito por recuperação de consumo, entendo possível a suspensão do fornecimento da energia elétrica, pois se trata de uma relação de prestação do serviço pela concessionária e de contraprestação, ou seja, pagamento, pelo consumidor, por sua utilização.

Decisão: Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 4a. Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, dar provimento à remessa oficial, nos termos do relatório, votos e notas taquigráficas que ficam fazendo parte integrante do presente julgado (ANEEL, VOTO. Processo nº 5004436-89.2011.404.7110. Relator João Pedro Gebran Neto. 2012, p.9).

 

Nesta decisão percebe-se que a concessionária do fornecimento de energia pode, ao

perceber algum indício de fraudes no medidor de energia elétrica, tomar uma decisão de acordo com a sua conveniência e oportunidade da situação, justificando a suspensão do fornecimento de energia elétrica, visto que tal serviço é colocado à disponibilidade mediante uma contraprestação (tarifa) a ser realizada pelo usuário. 

Este julgado se coaduna com o que é discutido por Lessa (2011, p. 36) ao explicitar

acerca da tendência que se assiste na atualidade dos Tribunais brasileiros, vide pesquisa realizada pela Fundação Getúlio Vargas[24], em conformidade com as explanações de Ragazzo (2011), o qual assim dispõe:  

Os casos são complexos e, em geral, demandam uma atenção redobrada. Os juízes simplesmente não têm tempo para se debruçar sobre complexas questões regulatórias dirimidas por agências como a ANATEL, ANEEL e o CADE. A consequência disso acaba sendo um Judiciário focado principalmente em questões meramente procedimentais, como nulidades processuais, não cumprindo a função de controlar a qualidade das decisões regulatórias, já que não avaliam as consequências das suas decisões na política regulatória.

 

Neste sentido, o que se assiste em termos de decisões tomadas no âmbito do Poder Judiciário é o crescente número, em termos percentuais, da confirmação das determinações administrativas tomadas pelas agências reguladoras, em especial nos tribunais superiores (LESSA, 2011). Com efeito, segundo Ragazzo (2011), em conformidade com os dados fornecidos pela Fundação Getúlio Vargas; “o percentual de sucesso das agências nos litígios atinge uma média de 60%, com destaque para ANATEL, CADE, ANTT, ANTAQ e ANP, todas as autarquias com taxas de confirmação em processos transitados em julgado ultrapassando

70%”.

Corroborando ainda mais para esta tendência merece destaque o Enunciado – Turma de Uniformização de Jurisprudência nº 01/2014- U, Tribunal de Justiça do Maranhão, publicado em 23 de março de 2015:

 

SUSCITANTE: COMPANHIA ENERGÉTICA DO MARNHÃO

ADVOGADO: CLAUDIA BRANT DE C. FIGUEIREDO SUSCITADO: LUIZA ALENCAR MACEDO ADVOGADO:

 RELATOR: JUIZ CRISTIANO SIMAS DE SOUSA – PRESIDENTE DA TRCC CHAPADINHA

Feito o pregão pelo MM. Juiz Presidente da Turma de Uniformização, o advogado da suscitante, Dr. José Sobral Neto (OAB/MA 7445) fez sustentação oral, explanando sobre o “Programa Luz para Todos”, e os benefícios sociais e fundamentos jurídicos do mesmo. Em seguida, ainda dentro do prazo regimental para sustentação oral, o advogado Dr. Salvio Dino de Castro e Costa Junior (OAB/MA 5227) fez uso da palavra e defendeu a manutenção da decisão de Imperatriz, devendo ser observado o princípio da reserva do possível, reiterando, na oportunidade, o pedido já realizado na reclamação e que seja uniformizado o entendimento. O MM. Juiz Presidente da TRCC de São Luís, respondendo, pediu vista dos autos em epígrafe. Registre-se, que o MM. Desembargador Presidente desta Turma, determinou que não obstante o referido pedido de vista, que fosse aproveitada aquela Sessão para coleta dos votos dos demais Presidentes das TRCC do Maranhão. Após, o MM. Juiz Presidente da TRCC de Chapadinha fez o relatório do presente pedido, e começou a esboçar os fundamentos do seu voto, entendendo que o julgamento de Imperatriz seja referência para o julgamento nos juizados especiais. [...] Assim, o MM. Desembargador Presidente desta Turma proclamou o resultado abaixo:

Decisão: “ A Turma, por unanimidade, vencido, parcialmente, o MM. Juiz Presidente da TRCC de Balsas, conheceu do recurso e deu-lhe provimento, de acordo com o voto do relator, sendo decidido que o entendimento firmado pela Egrégia Turma Recursal de Imperatriz se afigura coerente e que melhor atende à solução da presente controvérsia, pelo que ficou decidido de que o mesmo seja dotado como parâmetro resolutivo nos processos em tramitação no Sistema dos Juizados Especiais do Estado do Maranhão que tratam desta matéria.”

Proposição de Súmula pelo Relator (Enunciado nº 6): “É vedado ao Poder Judiciário, no âmbito do Juizado Especial Cível, interferir, mediante provimento jurisdicional, no cronograma de instalação e implementação de novas unidades consumidoras de energia elétrica alcançadas pelo Programa Luz Para Todos - PLPT, do Governo Federal.” (MARANHÃO, 2015, p.127).

 

 

Do enunciado exposto, é possível inferir que o controle judiciário não pode se

estender para os atos que determinam a instalação e a implementação de novas unidades consumidoras de energia elétrica inseridas no Programa Luz Para Todos (PLPT), os quais são da incumbência do Governo Federal. 

Além disto, esta é uma decisão tomada pela agência reguladora juntamente com

suas concessionárias e permissionárias, em virtude de que a operacionalização técnica da distribuição de energia elétrica, por exemplo, exigir conhecimentos técnicos e especializados que somente uma autarquia sob regime especial como a ANEEL, apresenta (GUERRA, 2012).

Esgotadas as considerações propostas nesta sessão, passa-se a seguir em analisar os

elementos trabalhados até aqui, porém considerando outra importante agência reguladora; a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS).

 

4.2.3 O setor de saúde suplementar (ANS).   

 

A Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) foi implantada no cenário

político brasileiro a partir da edição da Lei nº 9961 de 28 de janeiro de 2000, apresentando natureza de autarquia sob regime especial, vinculada ao Ministério da Saúde, tendo como incumbência a regulação, normatização, controle e fiscalização de todos os atos que direta ou indiretamente viabilizem a assistência suplementar à saúde (GUERRA, 2012).

Enquanto autarquia diferenciada, apresenta determinados elementos característicos

já abordados nesta pesquisa e suscitados pelo autor acima, tais como: “autonomia administrativa, financeira, patrimonial e de gestão de recursos humanos, autonomia nas suas decisões técnicas e mandato de seus dirigentes fixos” (GUERRA, 2012, p.156).

Sua estrutura se deveu a partir do Decreto nº 3327 de 05 de janeiro de 2000, a qual

é formada por 05 (cinco) Diretores, sendo que um deles será designado Diretor- Presidente da agência, e a indicação daqueles fica à cargo do Presidente da República e aprovados pelo

Senado Federal, para mandatos cuja duração seja de 3 (três) anos, os quais não podem coincidir (SANTOS, 2006).

A Diretoria colegiada, conforme dispõe o artigo 12 do Decreto nº 3327, apresenta 5 (cinco) Diretorias, a saber: Diretoria de Normas e Habilitação de Produtos (DIPRO); Diretoria de Normas e Habilitação de Operadoras (DIOPE); Diretoria de Fiscalização (DIFIS); Diretoria de Desenvolvimento Setorial (DIDES); e Diretoria de Gestão (DIGES). 

Além do mais, é importante ressaltar que a regulamentação do setor de saúde

suplementar se deveu a partir da aprovação da Lei nº 9656 de 03 de junho de 1998, assim como das demais medidas provisórias, as quais acabaram por modificar àquela lei e que foram criadas para viabilizar a operacionalização deste setor; consideradas estas últimas como um elemento causador da instabilidade do marco legal[25] deste setor social (SANTOS, 2006).

Compete a ANS, de acordo com as disposições do artigo 4º da Lei nº 9961/2000,

entre outras atribuições:

 

I - Propor políticas e diretrizes gerais ao Conselho Nacional de Saúde Suplementar -

Consu para a regulação do setor de saúde suplementar;

III - elaborar o rol de procedimentos e eventos em saúde, que constituirão referência básica para os fins do disposto naLei no9.656, de 3 de junho de 1998, e suas excepcionalidades;

V - Estabelecer parâmetros e indicadores de qualidade e de cobertura em assistência à saúde para os serviços próprios e de terceiros oferecidos pelas operadoras; VII - estabelecer normas relativas à adoção e utilização, pelas operadoras de planos de assistência à saúde, de mecanismos de regulação do uso dos serviços de saúde; X - Definir, para fins de aplicação daLei no9.656, de 1998, a segmentação das operadoras e administradoras de planos privados de assistência à saúde, observando as suas peculiaridades;

XI - estabelecer critérios, responsabilidades, obrigações e normas de procedimento para garantia dos direitos assegurados nosarts. 30e31 da Lei no9.656, de 1998; 

[...]

XVII - autorizar reajustes e revisões das contraprestações pecuniárias dos planos privados de assistência à saúde, ouvido o Ministério da Fazenda;(Redação dada pela Medida Provisória nº 2.177-44, de 2001);

XXVI - fiscalizar a atuação das operadoras e prestadores de serviços de saúde com relação à abrangência das coberturas de patologias e procedimentos;

XXX - aplicar as penalidades pelo descumprimento daLei no9.656, de 1998, e de sua regulamentação;

XXXVI - articular-se com os órgãos de defesa do consumidor visando a eficácia da proteção e defesa do consumidor de serviços privados de assistência à saúde, observado o disposto naLei no8.078, de 11 de setembro de 1990[...].

 

É possível inferir a partir da apresentação destes incisos específicos, sem prejuízo

aos demais, que a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) detém a competência para a determinação de disposições normativas acerca da prestação da assistência à saúde pelos entes privados, assim como em autorizar reajustes pecuniários em relação aos planos privados de assistência à saúde. 

Considerando esta última prerrogativa, vale destacar o posicionamento da Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça (STJ), o qual determinou às operadoras de planos de assistência privada de saúde complementar, em especial o Bradesco e a Sul América, que pudessem reajustar os contratos respectivamente em 25,8% e 26,1% para aqueles que foram estabelecidos antes do ano de 1999, da mesma forma poderiam aumentar em 11% o reajuste para os novos contratos de planos de saúde (GUERRA, 2012). Eis em parte o teor deste acórdão:

SUSPENSÃO DE LIMINAR E SENTENÇA. AGRAVO INTERNO. REAJUSTE DE CONTRATOS DE PLANOS DE SAÚDE FIRMADOS ANTERIORMENTE À LEI Nº9.656/98. FUNÇÃO INSTITUCIONAL DA AGÊNCIA NACIONAL DE SAÚDE ANS. :

Com os olhos postos no relevante interesse público envolvido, atento aos riscos e consequências que conclusões precipitadas poderiam ocasionar - desarmonia e desequilíbrio para o setor da saúde suplementar -, é que deferi o pedido para suspender a decisão da Quarta Turma do TRF/5ª Região no Agravo de Instrumento nº 63323-PE [...] tenho que a decisão liminar pode causar lesão grave à ordem pública administrativa, na medida em que interfere na legítima atividade regulatória desempenhada pela ANS, com respaldo na discricionariedade técnica, gerando, também, instabilidade no mercado de saúde suplementar. Não se trata de ato flagrantemente ilegal e, em assim sendo, ao Judiciário não é dado adentrar no mérito das normas e procedimentos regulatórios, sob pena de estar invadindo seara alheia. [...] “a Administração é livre para eleger, detentor do amplo espaço em que cada caso lhe permitem a lei e o Direito, as razões (jurídicas, econômicas, sociais, técnicas, ambientais), a curto, médio e longo prazo, que servem de suporte a suas decisões. Essas razões não podem ser utilizadas pelos Tribunais para justificar as suas, apenas de Direito” (a. op. cit., p. 275). Com isso em vista, atentando-se, principalmente, para os efeitos prospectivos da medida, o alto interesse público envolvido, ponderando-se, também, os riscos e os resultados que conclusões açodadas possam ocasionar - desarmonia e desequilíbrio para o setor da saúde suplementar -, é que defiro o pedido para suspender a decisão que concedeu o efeito modificativo ativo ao Agravo de Instrumento nº 63323-PE, em curso no Tribunal Regional Federal da 5ª Região, até o julgamento do mérito da Ação Civil Pública naquela Corte. Expeça-se comunicação. Intime-se. Publique-se” (fls. 249/254). (SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. AGRG NA SLS 16. SUSPENSÃO DE LIMINAR E DE SENTENÇA Nº 163 - PE (2005/0128970-7). RELATOR :MINISTRO EDSON VIDIGAL).

 

O entendimento do acórdão se coadunou, conforme dispõe Sérgio Guerra (2010, p.23), com “a assunção de atividades econômicas de relevante compromisso social (a exemplo a saúde suplementar) pelo setor privado impõe a regulação por meio de entidades estatais descentralizadas, com amplas funções e conhecimento técnico sobre os setores regulados”. Neste sentido, portanto, conforme o autor, as agências reguladoras, em virtude de apresentarem uma margem de autonomia técnica e administrativa e um corpo de especialistas capazes de atuar em setores específicos da sociedade, incide na respeitabilidade que o Poder Judiciário deva ter em relação às decisões tomadas por estas autarquias sob regime especial.

Muito embora, considerando os elementos abordados nesta pesquisa científica, é

necessário frisar que esta margem de autonomia estabelecida pelo ordenamento jurídico brasileiro às agências reguladoras apresenta limites e não implica, necessariamente na ausência de intervenção do controle judiciário, o qual, deve se limitar, conforme Guerra (2010) às disfunções dos atos administrativos que ultrapassem o que previamente foi determinado em lei.

Ou seja, entende-se que cabe ao Estado – na figura do Poder Judiciário −  o dever

em garantir o equilíbrio e a harmonia da sociedade, o que inclui, em se tratando da prestação de serviços públicos pelas agências reguladoras, na intervenção e controle de decisões que violem, portanto, os princípios da legalidade e da supremacia do interesse público.

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

 

A discussão acerca da autonomia dos atos produzidos pelas agências reguladoras

frente ao controle do Poder Judiciário, considerando os dispositivos previstos no Código de

Defesa do Consumidor (Lei nº 8078/90), apresenta como marco temporal a reforma da Administração Pública no Brasil, ocorrida na década de 90 (noventa), a partir da criação das agências setoriais de regulação, tendo forte influência norte-americana, em especial à Independent Regulatory Commission.

Mais precisamente, o surgimento destas autarquias (sob regime especial) se deu no Brasil a partir da elaboração, pelo Governo Federal, do Plano Diretor da Reforma do Aparelho Estatal, o qual concretizava o anseio pela dinamização do Estado, visto que naquele período não poder − de forma efetiva − organizar políticas públicas, por vez que, financeiramente, não apresentava instrumentos eficazes para tal objetivo.

No que concerne à sujeição dos serviços públicos à intervenção do Poder Judiciário,

via à utilização do Código de Defesa do Consumidor, é importante considerar que o entendimento acerca de serviços públicos deve estar pautado na tese à qual o considera como àquela atividade capaz de atender as necessidades de uma sociedade, onde se é possível individualizar os sujeitos que dele fazem uso e, principalmente, por serem remunerados através de tarifas ou preço público.

Por conseguinte, a aplicação do Código de Defesa do Consumidor na prestação de

serviços públicos se coaduna com a própria função do Estado disposta no artigo 5º, XXXII, da Constituição Federal, ou seja, é da incumbência do Estado garantir a defesa do consumidor. Muito embora, o que se discute é com relação ao sujeito a ser atendido pelo poder estatal, através da intervenção do Poder Judiciário, ou seja, ao intitulado de “consumidor”, como está disposto no artigo 2º da Lei nº 8078/90, e não expressamente o usuário de serviços públicos.  

Diante desta problemática, insurge diferentes posicionamentos acerca da validade

desta intervenção, sem limitações, isso porque de acordo com o artigo 27 da Emenda Constitucional nº 19/98 − a qual disciplina ao Congresso Nacional a incumbência em elaborar a lei de defesa do usuário de serviços públicos, a qual ainda hoje não foi criada− não permite que haja uma equivalência entre os dois sujeitos ora citados – consumidor e usuário – visto que, isto representaria a própria afronta à autonomia das agências reguladoras, enquanto entidades competentes em regular e fiscalizar os atos de suas concessionárias e permissionárias de serviços públicos.

Não obstante, há quem defenda àquela aproximação por considerar como parâmetro

de análise o conceito de fornecedor de serviços públicos, previsto no artigo 3º do Código de Defesa do Consumidor, visto que a Administração Pública ao ser investida na incumbência de fornecer alguma prestação de serviços se igualaria a um fornecedor de serviços, e que por isso a lei que defende os consumidores de produtos e serviços públicos também protegeria aos usuários de serviços públicos. 

Dentro desta discussão, há um importante debate que subjaz o estudo apresentado

nesta breve pesquisa; o qual remete à autonomia das normas editadas pelas agências reguladoras versus a tutela consumerista prevista na Lei nº 8078/90 através da intervenção do Poder Judiciário, o qual – a depender do caso concreto ou invalida as resoluções ou as reconhece. O que se evidencia, preliminarmente, é o caso de conflitos de normas que ainda não foi resolvido na seara do ordenamento jurídico pátrio.

A fim de compreender este debate se utilizou como parâmetro, nesta pesquisa,

alguns julgados, envolvendo 3 (três) importantes agências reguladoras, a saber; a Agência Nacional de Telecomunicações (ANATEL); a Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL) e a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS).

Deste modo, considerando o que foi exposto no desenvolvimento desta pesquisa,

fica ainda duvidosa a resposta acerca da autonomia das normas elaboradas pelas agências reguladoras frente ao controle do Poder Judiciário. Isso por conta de alguns motivos aparentes; 1) A ausência da Lei específica para os usuários de serviços públicos, a ser elaborada pelo Congresso Nacional, conforme o artigo 27 da EC/98; 2) O reconhecimento pelo próprio Poder Judiciário da força das decisões tomadas administrativamente pelas agências, de acordo com a conveniência e oportunidade daquelas, limitando-se àqueles atos ao controle do Judiciário em observância  ao Princípio da Legalidade e 3) a prerrogativa da Administração Pública, na figura do Poder Judiciário, em garantira a tutela legal daqueles que se vem ameaçados em seus direitos, conforme está disposto no artigo 5º, XXXV, da CF.

Então, caso àquela lei venha a ser criada, ainda não se sabe quais seriam, então, as

reais justificativas para que, ainda sim, o Poder Judiciário continuassem a intervir na autonomia das agências reguladoras, o que denota uma dicotomia entre as leis estudadas, em que pese tais autarquias terem sido criadas, justamente pelo Poder Público, para facilitar a participação do Estado no domínio econômico brasileiro a partir da regulação dos serviços públicos.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

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[1] De acordo com Almeida (2009) as diferenças entre os termos “regular” e “regulamentar” já foram abordadas por diversos autores; entre eles destacam-se, por exemplo, Di Pietro (2005), que define regulação como um conjunto de regras que visa a condução e o controle da atividade de caráter público ou privado, sociais e não exclusivas do Estado, enquanto regulamentar se relaciona ao ato de elaborar regras jurídicas, cuja alçada é exclusiva do Poder Executivo. Por conseguinte, para Justen Filho (2011) “regulamentar” implica em exercer uma função normativa infra-ordenada, o que exige o detalhamento do modo como a norma (abstrata e geral) será aplicada, enquanto que “regulação” seria a própria intervenção indireta do Estado nas ações de sujeitos públicos e privados, constantemente, visando única e exclusivamente à implementação das políticas de governo e a realização dos direitos fundamentais. Esta questão será retomada nas páginas seguintes.

[2] Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

II- Ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei.  

[3] Art. 2º São Poderes da União, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário.

[4] Art. 84. Compete privativamente ao Presidente da República:

IV - Sancionar, promulgar e fazer publicar as leis, bem como expedir decretos e regulamentos para sua fiel execução.

[5] De acordo com Carvalho Filho (2011), uma parte considerável da doutrina administrativista não admite que o dispositivo ora citado seja considerado como uma hipótese de regulamento do tipo autônomo, mas sim como uma espécie de ato interno criado pelo Poder Executivo a título de organização de seus atos, cujos efeitos são concretos, inviabilizando a criação de direitos ou qualquer obrigação que exorbitem da autonomia da Administração Pública. 

[6] Art. 61. A iniciativa das leis complementares e ordinárias cabe a qualquer membro ou Comissão da Câmara dos Deputados, do Senado Federal ou do Congresso Nacional, ao Presidente da República, ao Supremo Tribunal Federal, aos Tribunais Superiores, ao Procurador-Geral da República e aos cidadãos, na forma e nos casos previstos nesta Constituição. 

[7] Nos Estados Unidos a receita adotada para reduzir o tamanho do Estado foi a desregulação. Falar-se em

“desregulação” na doutrina norte- americana como sendo a tendência da postura estatal relativamente aos “serviços de utilidade pública” significa tratar da introdução da competição nesses serviços, eliminando-se a parte da regulação que, tendo sido criada para controlar os monopólios (controle das tarifas, p. ex.), passou a ser apontada como a principal responsável pela manutenção deles; mas essa “desregulação” não suprime, antes supõe, a intervenção estatal via “regulação”, só que agora com outras técnicas e novos objetivos, todos coerentes com o projeto de eliminação de monopólios. (SUNDFELD, 1999, p.161).

 

[8] Revogado pela Lei nº 9394 de 1996.

[9] Segundo Martins (2011), esta tese teve como ponto de partida o caso Mc Culloch v. Maryland presente no constitucionalismo dos Estados Unidos onde se entende que para cada poder conferido pela Constituição a um determinado órgão a este, implicitamente, são conferidos também amplos poderes para a própria execução do poder o qual foi outorgado com base na Constituição.

[10] “A deslegalização nasce do conceito desenvolvido na doutrina francesa da délégation de matères, utilizado na jurisprudência do Conselho de Estado em dezembro de 1907 segundo as conclusões do Comissário Tardieu no caso chemin de fer de l’ÉtatduMidi, duNord, d’Orléans, de lÓuest e de Paris-Lyon-Mediterranée, centralizado na ideia de que o titular de um determinado poder não tem dele à disposição, mas, tão somente, o exercício.” SOUTO, Marcos Juruena Villela. Direito Administrativo Regulatório..., p. 47. Assim, conforme o autor citado, o legislador constituinte tão somente excluiria do domínio da lei (domaine de laloi) matérias específicas, colocandoas, deste modo, sob o domínio dos regulamentos (domaine de l’ordonnance).

[11] Art. 4º A Política Nacional das Relações de Consumo tem por objetivo o atendimento das necessidades dos consumidores, o respeito à sua dignidade, saúde e segurança, a proteção de seus interesses econômicos, a melhoria da sua qualidade de vida, bem como a transparência e harmonia das relações de consumo, atendidos os seguintes princípios:(Redação dada pela Lei nº 9.008, de 21.3.1995)

I - reconhecimento da vulnerabilidade do consumidor no mercado de consumo;

 

[12] Art. 6º São direitos básicos do consumidor:

VIII - a facilitação da defesa de seus direitos, inclusive com a inversão do ônus da prova, a seu favor, no processo civil, quando, a critério do juiz, for verossímil a alegação ou quando for ele hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de experiências.

[13] De acordo com Marques (2013) entende-se por vulnerabilidade técnica àquela na qual o consumidor, pelo não conhecimento específico acerca do objeto no qual adquire, é mais fácil de ser ludibriado quanto as características do mesmo, o que abrange também os serviços; daí que esta vulnerabilidade é considerada presumida para o consumidor não profissional, muito embora também possa se estender ao consumidor profissional, mas de forma  excepcional; enquanto que a vulnerabilidade fática se caracteriza pela disparidade de forças intelectuais e econômicas que define a relação consumerista e por fim a vulnerabilidade jurídica ou científica diz respeito a ausência de conhecimentos jurídicos específicos, assim como de contabilidade ou também de economia; esta última também é presumida tanto para o consumidor não profissional quanto para àquele pessoa física.

[14] Criada em 1960, a International Organization of Consumers Union (IOCU) em 1996 passou a chamar-se Consumers International. Atualmente, conta com mais de 220 entidades de defesa do consumidor associadas provenientes de 115 países. Por meio de assembleias que acontecem a cada quatro anos, a entidade estabelece políticas gerais e temas a serem tratados (CONSUMERS INTERNATIONAL).

[15] Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

XXXII - o Estado promoverá, na forma da lei, a defesa do consumidor;

Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios: V - defesa do consumidor.

[16] Art. 4o Quando a lei for omissa, o juiz decidirá o caso de acordo com a analogia, os costumes e os princípios gerais de direito.

 

[17] Se refere ao artigo 7º-A da Lei nº 8987/95, o qual dispõe que “as concessionárias de serviços públicos, de direito público e privado, nos Estados e no Distrito Federal, são obrigadas a oferecer ao consumidor e ao usuário, dentro do mês de vencimento, o mínimo de seis datas opcionais para escolherem os dias de vencimento de seus débitos”. 

[18] Segundo Batista Júnior (2013) a suspensão ocorreria em sede de medidas liminares objetivando a eliminação dos efeitos dos atos administrativos; a anulação visa a própria invalidação do ato administrativo retrocedendo ao momento em que foi executado enquanto que a imposição de obrigação se estabelece a partir da determinação de uma ação ou omissão a ser realizada pela agência em respeito a um dever imposto pela autoridade judiciária.

 22 Art. 19. À Agência compete adotar as medidas necessárias para o atendimento do interesse público e para o desenvolvimento das telecomunicações brasileiras, atuando com independência, imparcialidade, legalidade, impessoalidade e publicidade, e especialmente: IV - expedir normas quanto à outorga, prestação e fruição dos serviços de telecomunicações no regime público; X - expedir normas sobre prestação de serviços de telecomunicações no regime privado;

 

 

 

[20] Segundo Marçal Justen Filho (2011) o elemento primordial para que se compreenda esta visão está em não reduzir o direito à lei; ou seja, o direito é mais abrangente do que a compilação de textos escritos e que refletem a visão daquele que os elaborou, em especial pelo Poder Legislativo (na figura do Parlamento) ou pelo Executivo (externado pela vontade do governante). Para o administrativista o direito envolve um conjunto de normas jurídicas elaboradas por instituições, as quais impõem condutas sociais a partir de mecanismos coercitivos que conjugam valores e resultados. 

24 DIVERGÊNCIA ESTABELECIDA ENTRE O MINISTÉRIO DOS TRANSPORTES E A ANTAQ. 

Art. 51-A. Fica atribuída à ANTAQ a competência de supervisão e de fiscalização das atividades desenvolvidas pelas Administrações Portuárias nos portos organizados, respeitados os termos da Lei nº 8.630, de 1993. (Incluído pela MP nº 2.217-3/2001)

68.          No caso concreto posto à apreciação da AGU, a ANTAQ deliberou que a cobrança da taxa denominada THC2 pelos operadores portuários do Porto de Salvador constitui indício de exploração abusiva de posição dominante no mercado, motivo pelo qual encaminhou a questão ao conhecimento do CADE.

69.          Ocorre que essa decisão não invade nenhuma prerrogativa de formulação de política para o setor portuário, cuja competência estaria realmente afeta à Administração direta, nos termos do artigo 20, inciso I da Lei nº 10.233/2001, mas, isto sim, está incluída nas competências conferidas expressamente à ANTAQ no artigo 27, incisos II, IV e XIV da mesma Lei, dentro de sua área de atuação regulatória. Diante disso, mostra-se ausente, excepcionalmente, a possibilidade de revisão ministerial da decisão da agência, e o recurso hierárquico impróprio interposto pela empresa[...] não poderia ser provido para os fins pretendidos pela recorrente, devendo ser mantida a decisão adotada pela ANTAQ, porque afeta à área de competência finalística da agência reguladora, autarquia constituída sob regime especial, conforme visto no tópico anterior

70.          Diante dessa constatação, infere-se ainda que todos os argumentos de forma ou de mérito apresentados pela empresa [...] em seu recurso hierárquico impróprio não podem ser apreciados pela Administração direta, porque já analisados pela ANTAQ, que, como visto, possuía competência para decidir a questão em última instância administrativa, não se podendo, de qualquer forma, aceitar os argumentos apresentados referentes a eventual violação às garantias constitucionais do devido processo legal, contraditório e ampla defesa da interessada, porque dois -recursos- apresentados pela empresa foram sucessivamente apreciados pela ANTAQ e desprovidos, não havendo nenhum dispositivo na Constituição ou em lei que lhe assegure o direito de revisão, no caso, da decisão da ANTAQ pelo Ministério dos Transportes, conforme amplamente fundamentado precedentemente (PARECER DA ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO (AGU) Nº AC- 51, DE 12 DE JUNHO DE 2006).

[21] Diferentemente de outras autarquias, conforme Celso Antônio Bandeira de Mello (2002), as reguladas sob regime especial, além de contar com autonomia administrativa, financeira, patrimonial, gestão de recursos humanos e técnica apresenta um diferencial; no que concerne ao modo de investidura e o mandato fixo dos seus dirigentes.

[22] Grifo Nosso.

[23] De acordo com o artigo 175 da CF “incumbe ao Poder Público, na forma da lei, diretamente ou sob regime de concessão ou permissão, sempre através de licitação, a prestação de serviços públicos”. Deste modo, se denota que tanto a União quanto os Estados o Distrito Federal e os Municípios podem conceder, ou permitir a prestação de serviços públicos delimitados à esfera de atuação que lhe são próprios.

[24] De acordo com Carlos Ragazzo (2011) em virtude deste fator há uma tendência a uma redução da interferência do Poder Judiciário em virtude de formas alternativas de solução de conflitos, sendo tenaz os esforços em investimentos e técnicas de negociação.

[25] De acordo com Fausto Pereira dos Santos (2006) atualmente o marco regulatório do setor de saúde suplementar é composto tanto pela Lei nº 9656/98 quanto pela última medida provisória de número 2177- 44 de 24 de Agosto de 2001, os quais tanto regulamentam o funcionamento de forma ampla daquele setor, quanto definem o plano de referência, oferecimento de garantias ao consumidor, o que inclui neste caso, por exemplo, a proibição do rompimento unilateral do contrato, proibição de suspensão de internações etc.