A AFETIVIDADE NA CONSTRUÇÃO DO CONHECIMENTO LINGUÍSTICO NAS SÉRIES INICIAIS1
Ângela Brito Ferreira2
Juliane Karoline Senna dos Santos3
Wyldna Florêncio Viana Câmara4
RESUMO
O conhecimento linguístico possui muitas vertentes em estudo sobre do que trata a construção deste conhecimento: métodos, estratégias, recursos, etc. Diante das inúmeras teorias que explicam tal procedimento, optou-se em relacionar este processo de aprendizagem com o aspecto da afetividade, que realiza abordagens em torno da postura docente, apresentando fatores de sucesso aos adeptos. Busca- se, por meio de três objetivos específicos norteia a pesquisa, a fim de confirmar a hipótese de que o envolvimento destas duas vertentes: afetividade e linguística pode proporcionar uma rica troca de experiências entre o docente e seu discente, levando ao progresso o conhecimento dos educandos de maneira prazerosa e ágil. Valoriza que as crianças possuem uma competência de adquirir informações linguísticas, sem a necessidade de padronização, ou seja, cada indivíduo possui sua individualidade na habilidade cognitiva. Necessitando do envolvimento do professor com a sua realidade para receber um impulso e pôr em prática o que já sabem. Wallon (2007) confirma que a valorização do aprendiz pelo professor gera uma relação de estreita confiança, favorecendo a relação ensino-aprendizagem e motivando para um melhor desenvolvimento social, familiar e escolar. Ferreiro (2007) traça estratégias de como conduzir o processo de construção do conhecimento linguístico com o educando.
Palavras-chave: linguagem, afetividade, cognição, séries iniciais.
1 INTRODUÇÃO
Este estudo surgiu com a finalidade em investigar como a afetividade pode influenciar na aprendizagem dos alunos, principalmente na construção do conhecimento linguístico nas séries iniciais. Busca-se entender como o professor se coloca diante do contexto que o aluno vive, se se preocupa realmente com a condição que seu aluno apresenta ou de maneira alheia à realidade do educando tenta construir o conhecimento em sala de aula.
1 Artigo científico elaborado para conclusão de Especialização em Linguística Aplicada, na Faculdade de Tecnologia Apoena, em Macapá-AP, 2013.
2 Professora orientadora do Artigo Científico, no curso de Linguística Aplicada.
3 Pós-graduanda em Linguística Aplicada. Graduada em Biologia.
4 Pós-graduanda em Linguística Aplicada. Graduada em Pedagogia.
O tema Afetividade na construção do conhecimento linguístico nas séries iniciais possui relevância principalmente para os docentes, devido proporcionar uma reflexão em torno da prática, provocando o aprimoramento das ações. É importante ressaltar que a habilidade cognitiva5 também é destacada no artigo, uma vez que significa falar em seleção de conteúdos, adequados para cada nível escolar, não apenas na pura preparação do indivíduo para um mercado de trabalho.
O objetivo geral concentra-se em compreender a relação afetiva entre professor e aluno no processo de construção do conhecimento linguístico de crianças nas séries iniciais do ensino básico. Voltando-se para as especificidades de identificar estratégias e ações afetivas focadas na construção do conhecimento, verificar quais as ações que favorecem o desenvolvimento do conhecimento linguístico e entender estratégias motivadoras de sucesso.
Diante deste contexto, pergunta-se afetividade e conhecimento linguístico são mecanismos que, em culminância, são fatores significativos para o crescimento de uma escola? Eis que o problema de pesquisa foca-se em descobrir se há relação entre o trabalho do docente com afetividade e o conhecimento linguístico nas séries iniciais do Ensino Fundamental. Supõe-se que exista esta relação e que acontece de forma promissora para o aluno.
2. AFETIVIDADE, COGNIÇÃO E APRENDIZAGEM
O termo afetividade é lembrado como a ação de acarinhar, acalentar, no entanto é muito mais abrangente do que atitudes de carinho. Ultrapassa abraços, afagos e beijos como é ingenuamente reportado por alguns indivíduos, como se o significado da afetividade no ensino-aprendizagem fosse exclusivamente este.
A afetividade que se faz necessária em sala de aula é aquela em que o professor preocupa-se com o estado de seu aluno, oferecendo-lhe todo o suporte necessário para avançar com qualidade em seus estudos. Um professor afetivo direciona seu aluno para a vida, ajudando-lhe, aconselhando, preocupando-se com o educando como um todo, não somente como um objeto receptor de conhecimento, sim em como aquele sujeito participante esta recebendo as informações, se está em boas condições estruturais adequadas para refletir sobre os assuntos da aula. Paulo
5 Conforme Chalita (2004) explica, habilidade cognitiva é a habilidade de absorver o conhecimento e de trabalhá-lo de forma eficiente e significativa. Não se trata de um “cognitivismo” que ignora outras dimensões da aprendizagem como a social e a emotiva.
Freire, grande sábio, justifica com determinação e clareza a importância do cuidado do docente com o educando:
Não sendo superior nem inferior a outra prática profissional, a minha, que é a prática docente, exige de mim um alto nível de responsabilidade ética de que a minha própria capacitação cientifica faz parte. É que lido com gente. Lido, por isso mesmo, independentemente do discurso ideológico negador dos sonhos e das utopias, com os sonhos, as esperanças tímidas, às vezes, mas às vezes, fortes dos educandos. Se não posso, de um lado, estimular os sonhos impossíveis, não devo, de outro, negar a quem sonha o direito de sonhar. Lido com gente e não com coisas. E porque lido com gente, não posso, por mais que, inclusive, me dê prazer entregar-me à reflexão teórica e crítica em torno da própria prática docente e discente, recusar a minha atenção dedicada e amorosa a problemática mais pessoal deste ou daquele aluno ou aluna. Desde que não prejudique o tempo normal da docência, não posso fechar-me a seu sofrimento ou a sua inquietação porque não sou terapeuta ou assistente social. Mas sou gente. (FREIRE, 1996, p.144)
Diante do exposto, confirmamos a necessidade da afetividade na relação ensino-aprendizagem, uma vez que o cuidado e a atenção são qualidades que estimulam reações positivas nos indivíduos.
Autores americanos construíram uma teoria baseada na abordagem cognitiva da emoção, que explica a origem das emoções descrevendo os processos cognitivos que ativam cada uma delas. Um exemplo citado pelos autores é que a esperança aparece quando uma pessoa desenvolve a expectativa de que algum evento bom irá acontecer no futuro. Esta teoria resulta em um modelo psicológico que explica a origem de 22 tipos de emoções. Este modelo é chamado de OCC devido às letras inicias dos sobrenomes dos criadores. (ORTONY, CLORE e COLLINS 1988)
O modelo OCC adota que as emoções podem surgir a partir da avaliação de três aspectos: eventos, agentes e objetos. A cognição deve ser considerada pela escola, procurando compreender os comportamentos e capacidades predominantes em cada etapa da ação educativa. Assim como, é preciso considerar as necessidades afetivas da criança, a fim de garantir que os conhecimentos apresentados sejam assimilados e válidos posteriormente.
Cabe à educação, dessa forma, formar indivíduos autônomos, pensantes, ativos, capazes de participar da construção de uma sociedade contextualizada. A função da educação é integrar a formação da pessoa e sua inserção na sociedade e, assim, assegurar sua plena realização. (WALLON, 1986, P.70)
Sua teoria era contrária à compreensão do humano de forma fragmentada. Na teoria walloniana, o domínio funcional cognitivo oferece uma gama de função que permite “identificar e definir” significações, classificá-las, dissociá-las, reuni-las, confrontar suas relações lógica e experimentais, tentar reconstruir por meio delas qual pode ser a estruturas das coisas” (WALLON, 2007,p.177).
Wallon (2007, p.42) situa a concepção de pessoa como um conjunto eficiente que resulta da união de suas dimensões, cujo processo desenvolvimento acontece por meio da integração do orgânico com o meio social.
O desenvolvimento de pessoa como um ser completo não ocorre de forma linear e contínua, mas apresenta movimentos que implicam integração, conflitos e alternâncias na predominância dos conjuntos funcionais. Ou seja, afetividade e cognição são conjuntos que revezam-se, em termos de prevalência, ao longo dos estágios e desenvolvimento.
A afetividade em parceria com o cognitivismo facilita a aprendizagem do educando, pois nos momentos informais, o educando aproxima-se do educador, trocando experiências, expressando e fazendo questionamento, sendo tais atitudes significantes na construção do conhecimento. Dessa forma, o educador deve sempre estar aberto ao diálogo favorecendo um bom relacionamento.
Quando o aluno consegue entender e relacionar o conhecimento repassado, falando e escrevendo sobre o assunto, a possibilidade de absorvê-lo permanece para toda a vida. (CHALITA, 2004)
Acredita-se que a aprendizagem é um processo social que acontece por meio das relações humanas, proporcionando a troca de conhecimento, o amadurecimento de ideias por meio da interação entre os sujeitos e com o ambiente. Vygotsky (1982, p.117 apud Hedegaard, 2002, p.200) esclarece:
A criança é capaz de imitar uma série de ações que ultrapassam suas próprias competências, mas somente dentro de limites. Por meio da imitação, a criança é capaz de desempenhar muito melhor quando acompanhada, e pode fazer isso com entendimento e independência. A diferença entre o nível de tarefas resolvidas que podem ser desempenhadas com orientação e auxílio de adultos e o nível de tarefas resolvidas de modo independente é a zona de desenvolvimento proximal – ZDP.
Vygotsky confirmou que diante do diagnóstico do que a criança já aprendeu e com o planejamento do que é preciso ensinar, devemos trabalhar na ZDP e
proporcionar aprendizagem, estabelecendo estratégias contextualizadas com a realidade de nossos alunos.
E reafirma:
[...] o ensino não pode ser identificado como desenvolvimento, mas o ensino adequadamente organizado resultará no desenvolvimento intelectual da criança, fará surgir toda uma série desses processos de desenvolvimento, que não seriam possíveis de modo algum sem o ensino. Assim o ensino é um fator necessário e geral no processo de desenvolvimento da criança – não dos traços naturais, mas dos traços históricos do ser humano. (VYGOTSKY, 1982, p.121 apud HEDEGAARD, 2002, p.200)
Ao mesmo tempo essa relação descreve a vinculação entre aprendizagem e desenvolvimento.
Além das mediações bem planejadas para uma aprendizagem eficaz, Vygotsky destaca para a importância da formação com o desenvolvimento de motivos para o envolvimento social e de métodos para o domínio das relações pessoais bem como das exigências do trabalho e da sociedade. Estes fatores manifestam-se no fim da escolarização, onde o jovem necessita exercer sua cidadania e assumir uma postura diante da sociedade. (HEDEGAARD, 2002, p.203)
Para trabalhar melhor a habilidade cognitiva, à caráter de exemplificação, há o poder de organizar a seguinte ação: algumas matérias que poderiam ser introduzidas à grade curricular e alguns temas que poderiam ser tratados de forma transversal (ou interdisciplinar, como é comumente dito), isto é, passando por todas as matérias. O ideal, na verdade, seria inter-relacionar todas as áreas, abordando um determinado conteúdo por meio de temas geradores. Entretanto como se sabe da dificuldade das escolas (como instituição) para proceder dessa forma, a sugestão de algumas novas matérias pode contribuir para atingir o objetivo de formação do cidadão. (CHALITA, 2004)
Neste caso, fala-se do acréscimo de matérias como Filosofia,
A Filosofia não é uma disciplina nova, mas é a mãe de todas as outras disciplinas. De um tempo para cá, no entanto, por motivos políticos, deixou de ser oferecida na grade curricular das escolas. A importância da filosofia reside no fato de que a capacidade de reflexão conferida pelo aprendizado dessa ciência aproxima o aluno do conhecimento do mundo e do conhecimento de si mesmo. Não se trata de estudar a filosofia como uma abstração. Filosofia é vida. É pragmática. O amor pelo saber pode ser um instrumental de transformação do aluno e do professor. (CHALITA, 2004, p. 197)
Assim, temas como ética, amor, vida, morte, política, democracia, senso crítico, entre outros poderão ser contextualizados em cada período histórico, com grande proveito da interdisciplinaridade, facilitando ainda o desenvolvimento do ser nas áreas emocional, social e cognitiva.
Hedegard (2002, p.210) esclarece quando expõe sobre a importância do “movimento duplo no ensino”, explicando que o planejamento do professor deve partir do geral para o concreto e a criança deve aprender partindo da “simbolização do conhecimento” para a investigação concreta, afinal é por meio da experimentação, da prática ou mesmo com desenhos e modelos que a criança solidifica seu saber.
A autora pauta em três tipos de ação a base para este processo:
a base para o ensino é a divisão da atividade de aprendizagem em três diferentes tipos de ação: (1) delineamento do problema; (2) solução e construção do problema, o que implica a aquisição de capacidades; e (3) avaliação e controle. (HEDEGARD, 2002, p.211)
É importante ressaltar que a aprendizagem precede o ensino, no cotidiano o indivíduo aprende constantemente, sem necessariamente haver o propósito de ensinar, no entanto para a efetividade deste procedimento, há de acontecer a reciprocidade entre estas ações. Freire (1996, p.24) ratifica esta questão, ao dizer que
ensinar inexiste sem aprender e vice-versa e foi aprendendo socialmente que homens e mulheres descobriram que era possível ensinar. Foi assim, socialmente aprendendo [...] que perceberam que era possível – depois, preciso – trabalhar maneiras, caminhos, métodos de ensinar. Aprender precedeu ensinar, [...] inexiste validade no ensino de que não resulta um aprendizado [...].
Diante deste esclarecimento, obtêm-se mais um ponto fantástico deste processo: o dinamismo, onde é despertado o interesse em aperfeiçoar a aprendizagem, que por conseguinte afina o ensino, Freire é sábio ao afirmar que “com relação a aprender, é um processo que pode deflagrar no aprendiz uma curiosidade crescente, que pode torná-lo mais e mais criador” (1996, p.24). Isto é possível por causa da boa relação entre ensinante e aprendiz, onde estas funções não são impostas e podem ser trocadas durante o processo, favorecendo o
crescimento e progresso de qualquer assunto estudado, e havendo a valorização dos seres pensantes envolvidos, este é o verdadeiro aprendizado.
Destarte, o professor também é um ser que vive emoções. Não há como separar o ser humano profissional do ser humano pessoal, há como equilibrar. Com certeza o professor terá seus problemas pessoais, chegará à escola, às vezes mais sisudo que o habitual e terá mais dificuldades em desempenhar seu trabalho em sala de aula. Neste momento é que acontece a reciprocidade: o aluno notará a diferença e oferecerá o apoio ao docente, pois assim como tratares os alunos, eles tratar-te-ão e à terceiros da mesma maneira, conforme cada situação vivida.
Ao enfrentar problemas de ordem pessoal o professor deve procurar o melhor meio para sair do estado de espírito sombrio e poder desempenhar seu trabalho com serenidade. [...] Ninguém é mau em essência, mas um professor descontrolado deve rever seu comportamento sob pena de ser mal interpretado por seus alunos. (CHALITA, 2004, p.163)
É justamente por isso que se faz necessário cuidar, evitando que contrariedades pessoais não apareçam à tona, causando mágoas, ressentimentos e deixando más impressões. As crianças consideram seus pais e professores como espelhos. Portanto, o mestre deve transbordar afeto, cumplicidade, participação no sucesso, comemorar as conquistas com seus educandos. Enfim, o professor na sala de aula é o líder e precisa ter auto-controle para que possa auxiliar o aluno em seus sonhos e projetos. (CHALITA, 2004, p. 162)
2.1. A CONSTRUÇÃO DO CONHECIMENTO LINGUÍSTICO
A atuação linguística do indivíduo decorre do desempenho social do sujeito, como é enfatizado na teoria chomskiana que afirma que todo conhecimento interior que o ser humano possui de sua língua é construído pela interferência de fatores inatos e ambientais. (BRENNER, 1986)
Diante disso, devemos considerar que durante as séries iniciais, quando o sujeito está em processo de aprimoramento da linguagem, a aprendizagem acontece pela assimilação das estruturas mais simples às mais complexas. Assim compete à escola o ensino da codificação e decodificação da língua escrita, pois a falada a criança apresentará conforme o contexto vivido. Brenner (1986, p. 17) reafirma este pensamento:
Interprete-se a língua como estrutura viva, dinâmica e criativa que funciona obedecendo um sistema de regras peculiares e definidas. Consequentemente o ensino não pode se efetivar de forma desordenada e ocasional. Desde a aprendizagem da leitura e da escrita, no decorrer da alfabetização, deve haver uma organicidade no ensino condizente com a natureza da língua. Significa que a criança deve vivenciar a aquisição do código escrito, no seu processo de codificação e decodificação, para isso a aprendizagem se realizará em ciclos.
Ao enfatizar a necessidade de organização no processo, é preciso esclarecer que não se defende executar um planejamento fechado e intacto, mas sim um planejamento contextualizado, condizente com as necessidade de seus educandos, com a etapa em que estão passando, e realçando pontos necessários para alcançar a zona de potencial que a criança oferece.
Ferreiro (2007) destaca que devemos ter cuidado com o preconceito linguístico, que vem sendo um dos mecanismos de discriminação no interior da escola. Devido não haver nenhuma prova empírica de que é necessário certo tipo de pronúncia para ter acesso à língua escrita. A escrita representa a língua, e não a fala, portanto
Qualquer intenção de justificar a ortografia a partir da pronúncia leva a desprezar as variantes de fala das crianças das populações socialmente marginalizadas, e a dificultar sua aprendizagem. Esta é uma das razões fundamentais por que a correção ortográfica não pode ser exigida nas primeiras etapas da alfabetização, com risco de se distorcer o processo desde o início. (p.27)
No passado, era comum a prática da correção pelo professor na pronúncia da criança e na escrita. Esperava-se que tal correção resultasse numa melhor aprendizagem da leitura e escrita. Esta prática tornou-se artificial, devido ninguém falar a norma culta perfeitamente, que é idealizada. (NUNES, 2007)
Ademais, ficou explícito que este tipo de intervenção possui efeitos nocivos sobre a aprendizagem, pois desvaloriza o dialeto falado pela criança, desvalorizando em alguns momentos, a cultura vivida pela criança. É válido ressaltar que leitura e escrita não são atividades-fim, mas sim complementares e uma não acontece separada da outra.
As crianças leem para praticar a leitura e escrevem para praticar a escrita, desperdiçando-se, assim, as oportunidades de colocar o aluno em contato direto com os mais variados usos que a língua escrita oferece. Se a leitura e escrita fossem pensadas na escola como atividades-meio, os professores
se utilizariam de uma enorme gama de situações de uso da língua escrita em sala de aula desde o início da alfabetização. [...] A comunicação pessoal e a linguagem oficial têm alguma formas diferentes. Muitas outras considerações sobre a relação entre finalidade e forma da linguagem precisam ser incluídas na escola, as quais não se restringem às primeiras fases da alfabetização e ao sucesso inicial. (NUNES, 2007, p.100-101)
Nota-se que defende-se não a substituição pela variedade lingüística a língua culta, mas o acréscimo, a valorização desta modalidade à sua fala, de tal forma que ele possa produzir discursos adequados aos diferentes contextos sociais. Deste modo, é relevante examinar como este conhecimento tem sido assimilado pelas professoras alfabetizadoras em sua prática docente. (BARRERA E MALUF, 2003) Um ponto importante sobre a construção deste conhecimento que está relacionado à afetividade trata-se do constrangimento diante de uma correção. Neste momento, o professor deve ter o cuidado ao aperfeiçoar seu aluno,
É importante ressaltarmos que as dificuldades linguísticas não acarretam apenas comprometimentos na fala ou na leitura em si, as consequências colaboram para que essa criança se dissocie integralmente da realidade social em que vive, uma vez ridicularizada pelo modo de falar, ela desencadeia sentimentos de rejeição, insegurança, medo e, em alguns casos de revolta, frustrando sua vida adulta. (CRUZ, 2010, p.2)
Dessa forma, temos um grande desafio lançado, diga-se: mais um desafio! Onde o aluno seja conduzido a “ler” criticamente o mundo contemporâneo para perceber que dentro dele acontece uma rápida explosão de conhecimentos. Assim, surge a necessidade de encontrar outra visão de leitura, que permita a seleção daquilo que é relevante, construindo um novo saber, aperfeiçoando o que já conhece, este processo exige uma reformulação da postura docente, e talvez até mesmo outra concepção de aprendizagem. (SILVA, 2004)
Ferreiro (2007) aborda sobre a importância dos objetivos estarem em consonância com a prática, pois o caminho para a construção deste conhecimento perpassa pela linguística, ou seja, pela variedade de conhecimento que o aluno possui sobre a fala diante do social, sendo necessária a aliança entre o formal e informal. Pois,
as práticas convencionais levam, todavia, a que a expressão escrita se confunda com a possibilidade de repetir fórmulas estereotipadas, a que se pratique uma escrita fora de contexto, sem nenhuma função comunicativa real e nem sequer com a função de preservar uma informação. (FERREIRO, 2007, p.18)
Outro fator determinante é que as crianças sejam esclarecidas sobre a função da língua escrita na sociedade, e mais: que esta função seja compreendida e exercitada pelos alunos.
Por meio de atividades simples e corriqueiras este fator pode ser trabalhado, dentro e fora do ambiente escolar, sendo facilmente compreendido. Ferreiro (2007) cita um exemplo de quando a criança participa de atos sociais onde a língua escrita cumpre funções sociais concisas, no caso da mãe quando vai ao supermercado e faz uma lista de compras, durante a estadia no mercado, constantemente esta lista será consultada, a criança que acompanha a sua mãe perceberá uma das funções da língua escrita: serve para ampliar a memória ou mesmo como um lembrete para aliviar a memória. (FERREIRO, 2007)
A escola deve ter o cuidado de não discriminar as crianças que não possuem a oportunidade de crescer em um ambiente alfabetizado, pois este aluno não conseguirá ver a mãe escrever uma lista de compras ou mesmo consultar uma lista telefônica em busca de algum endereço ou telefone, por não saber ler. A escola não pode ignorar este fato, pelo contrário precisa agir diante desta descoberta e proporcionar outras oportunidades para a compreensão deste indivíduo.
É imperioso restabelecer, no nível das práticas escolares, uma verdade elementar: a escrita é importante na escola, porque é importante fora da escola, e não o inverso. A escola (como instituição) se converteu em guardiã desse objeto social que é a língua escrita e solicita do sujeito em processo de aprendizagem uma atitude de respeito cego diante desse objeto, que não se propõe como um objeto sobre o qual se pode atuar, mas como um objeto para ser contemplado e reproduzido fielmente, sem modificá-lo. Essa atitude de respeito cego manifesta-se nos mínimos detalhes. O aprendiz deve respeitar cuidadosamente a forma das letras e reproduzi-las seguindo um traçado imposto. Oculta-se-lhe, assim, que as formas das letras não são fixas, mas que, como as unidades da língua, não se definem isoladamente se não em função de todas as outras, e que cada uma tem uma definição diferente nos diferentes “tipos” de letras (de imprensa, cursiva, ornamentais, etc.). [...] O aluno deve respeitar cuidadosamente a ortografia desde o início, como se “a roupagem gráfica” de cada palavra fosse eterna, oculta-se assim a evolução destes objetos. [...] Toda essa prática transmite certas mensagens, frequentemente contraditórias. (FERREIRO, 2007, p.20-22)
Nas séries iniciais, o trabalho é facilmente construído desde que seja considerado o contexto social da criança. É por meio da relação com a realidade que a criança consegue estabelecer importância no significado do que escreve ou ler, sem essa relação o processo tende a se torna sacrificante e insignificante.
Cagliari (2010) destaca o motivo da importância desta relação, pois
Qualquer criança que ingressa na escola aprendeu a falar e a entender a linguagem sem necessitar de treinamentos específicos ou de prontidão para isso. Ninguém precisou arranjar a linguagem em ordem de dificuldades crescentes para facilitar o aprendizado da criança. Ninguém disse que ela devia fazer exercícios de discriminação auditiva para aprender a reconhecer a fala ou para falar. Ela simplesmente se encontrou no meio de pessoas que falavam e aprendeu (CLAGIARI, 2010, p.157)
O autor realça a necessidade de considerar-se que a criança ao chegar na escola já é um falante nativo da língua. Mesmo que informalmente, possui conhecimentos a serem afinados, não se deve ignorar o que este indivíduo em formação apresenta.
3 METODOLOGIA
A pesquisa é de cunho qualitativo, com caráter exclusivamente bibliográfico, pautando-se na pesquisa e análise de referencial bibliográfico dos principais autores que tratam sobre a afetividade como facilitadora da aprendizagem e, por conseguinte, da construção linguística. A pesquisa bibliográfica abrange todas as bibliografias encontradas em domínio público, como livros, revistas, monografias, teses e artigos de internet. (LAKATOS, 2009)
Quanto aos objetivos da pesquisa possuem a finalidade exploratória, devido avaliar a possibilidade de desenvolver uma pesquisa sobre determinado assunto, visando oferecer informações sobre o mesmo. (ARAÚJO, 2012).
Os autores pesquisados que tratam sobre o tema em foco, são: Henri Wallon e Emilia Ferreiro são os principais que embasam a pesquisa. Outros autores foram utilizados, com a finalidade secundária e sempre fazendo alusão às teorias dos principais, como Vygotsky, Clagiari e Brenner. Foram utilizados ainda, alguns artigos científicos da internet de doutores e pesquisadores na área da Linguística.
Na elaboração do capítulo 2 sobre afetividade, cognição e aprendizagem, serviu de embasamento teórico: Chalita (2004), Freire (1996), Hedegaard (2002), Wallon (2007) e Ortony, Clore e Collins (1986).
Embasaram teoricamente o capítulo 3 sobre a construção do conhecimento linguístico nas séries iniciais: Barrera e Maluf (2003), Brenner (1986), Cagliari (2010), Cruz (2010), Ferreiro (2007), Nunes (2007) e Silva (2004).
4 RESULTADOS E DISCUSSÃO
Os autores consultados são unânimes em resgatar a valorização do conhecimento que a criança apresenta socialmente, para dentro da escola. Não se pode simplesmente ignorar e acomodar-se em oferecer livros e influenciar a cópia de textos sem entendimento ou mesmo para treinar uma letra e obter uma caligrafia perfeita. Esta postura docente não cabe mais no espaço escolar e há muito tempo é criticada.
O educador deve ter a disposição de mudar estratégias e costumes, se preciso, para garantir o aprendizado de seus alunos. Principalmente, os professores que trabalham nas séries iniciais, onde é a base da construção de qualquer conhecimento, detendo-se aqui ao linguístico, tema deste artigo.
Ao tratar sobre a afetividade, frequentemente, são abordadas ideias em torno do comportamento docente frente aos alunos. Onde há preocupação com a situação emocional de cada indivíduo dentro do ambiente escolar. É ressignificado o tema afetividade, quando Wallon (2007) esclarece que não se trata somente de gestos, mas também do suporte oferecido ao aluno. O carinho está presente, claro. Pois é por meio deste sentimento que todas as outras ações docentes são desencadeadas, mas o afeto não é o único objetivo desta teoria. Caso contrário, o carinho seria distribuído sem objetivo educacional, e não é o almejado.
Diante da pesquisa realizada, confirma-se que o deseja é de alcançar a motivação do aluno para a verdadeira compreensão em torno da leitura e da escrita que o mesmo pratica. A alfabetização é o primeiro momento em que o aluno tem contato com textos para ler, compreender, transcrever, etc., se não houver um entusiasmo por parte do educador, o aluno não se motivará e o processo de aprendizagem perderá importância. É neste momento que o educando passa a “detestar” ler e escrever.
Eis que Ferreiro (2007) traça estratégias e exemplos das situações que podem ocasionar o desinteresse por parte do alunado, sempre realçando a importância de contextualizar a leitura e escrita para o sujeito. Cagliari (2010) vem ressaltar esta questão, acrescentando sobre a especificidade que cada indivíduo ao
entrar na escola traz consigo, que por sua vez, também deve ser respeitada e considerada no processo de aprendizagem.
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Por meio desta pesquisa, nota-se que a escola demonstra a necessidade de um envolvimento afetivo entre os participantes do processo de ensino-aprendizagem. É notável que em relações saudáveis, existindo confiança e garantindo a opinião de todos envolvidos no processo educativo há melhores resultados. A relação professor-aluno não é diferente: é de grande valia o profissional que orienta seu aluno com dedicação, acolhimento, cuidado e preocupação com a realidade de seu aprendiz, isto pode ser aceito como um diferencial na escola visto que, a preocupação com a qualidade do ensino perpassa pelo processo de construção do conhecimento de nossos alunos.
Ao pesquisar os elementos que influenciaram no bom desempenho do processo, resgatando a importância da afetividade e, por conseguinte à implicação no conhecimento linguístico buscou-se fazer um estudo minucioso de fontes bibliográficas, que serviram para compreender a influência desta postura afetiva do professor em sala de aula nas turmas das séries iniciais, confirmando que o desempenho no âmbito escolar do aluno melhora ao ser considerado em outros âmbitos de sua vida, como o social e familiar. Sabe-se que não se pode considerar apenas uma parte do todo, e a teoria da afetividade vem confirmar esta importância: da inquietação do professor em preocupar-se do seu aluno relevando por completo seus pontos fortes e trabalhando seus pontos fracos, atingindo a ZDP, como Vygotsky explica, e fortalecendo a cognição do educando.
Eis que a hipótese foi confirmada: há relação entre a docência com afetividade e o conhecimento linguístico nas séries iniciais do Ensino Fundamental. Os autores estudados afirmam que é possível de acontecer uma formação promissora para o aluno diante da união destes aspectos, mas há necessidade do treino, que passem a existir novos adeptos nesta área e comprometam-se na técnica deste procedimento e ações educativas.
Urge a necessidade de remodelar as atitudes docentes diante das novas gerações que surgem e trazem novos comportamentos e pensamentos, assim como renovar metodologias, buscar novos conhecimentos, aprimorar o que já se sabe. Uma certeza existe: a mudança acontece todos os dias, é necessária e existe para melhorar qualquer situação, lugar e pessoas.
REFERÊNCIAS
ARAÚJO, Herlígenas Corrêa; MAUÉS, Sheila Cristina; QUARESMA, Edilene. Manual para elaboração de artigos científicos FTA de acordo coom as normas de documentação da ABNT. Macapá, 2012.
BARRERA, Sylvia Domingos; MALUF, Maria Regina. Variação lingüística e alfabetização: um estudo com crianças da primeira série do ensino fundamental. Campinas, 2003. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S141385572004000100005&script=sci_arttext> Acesso em: 15 jul. 2013.
BRENNER, Teresinha de Moraes. Linguística aplicada ao manual de alfabetização. Florianópolis: Editora da UFSC, 1986.
CAGLIARI, Luiz Carlos. Alfabetização e Linguística. Campinas: Scipione, 2010.
CHALITA, Gabriel. Educação: a solução está no afeto. São Paulo: Editora Gente, 2004.
CRUZ, Karina Helena da. Dificuldades no processo de desenvolvimento linguístico infantil. Rio de Janeiro, 2010. Disponível em: <http://www.webartigos.com/artigos/dificuldades-no-processo-de-desenvolvimento-linguistico-infantil/33923> Acesso em 20 jul. 2013
FERREIRO, Emilia. Com todas as letras. São Paulo: Cortez, 2007.
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HEDEGAARD, Mariane. A Zona de Desenvolvimento Proximal como base para o ensino. In: DANIELS, Harry (org.). Uma introdução a Vygotsky. São Paulo: Edições Loyola, 2002.
LAKATOS, E.M.; MARCONI, M. de A. Fundamentos de metodologia cientifica. 6.ed. São Paulo: Atlas, 2009.
NUNES, Terezinha (org.). Dificuldades na aprendizagem da leitura: teoria e prática. 6.ed. São Paulo: Cortez, 2007
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