_ Continuaçã _ Sabe quem eu vejo quando olho para aquela pessoa que está lá embaixo do monte? – indaga Incógnita ao seu “médico” no início das discussões filosóficas. Ele tenta responder mas desiste. Pois logo ela procedeu seu relato. Ela lhe disse: não vamos falar nada a respeito disso. Quero, com você, mergulhar no seu sonho “Teoria do Quarto”...

Ao dizer isso seu médico espiritual percebeu que ali uma porta se abria e por ela passariam histórias que só tiveram vida no momento mesmo em que eram feitas, mas que o tempo e o medo da própria vida deu lugar ao esquecimento. Por vezes, não se deram ao esquecimento! Aquelas histórias foram como que sepultadas assim que ganharam vida. Nunca mais lhes teriam tocadas. Elas foram expulsas da vida de Incógnita como o medo foge ao feliz...

Entretanto, Atingo não quis mostrar veemente interesse pelo desejo de sua paciente para não lhe deixar inibida. Fez daquilo como que o início de um diálogo comum. Dentro de si galopavam milhões de ideias querendo saber qual seria o resultado de todo aquele sonho. Sentada ao longe de Atingo, Incógnita disse a ele... _ Fiquei pensando sobre outras coisas do seu “quarto”. Por exemplo: falei que aquela pessoa era uma mulher. Destarte, não tivesse dito nada. Oh! Queria ter dito tudo naquele dia. Fiquei insegura. Nem sabia como lhe dizer.

_ Mas agora realmente quer dizer-me? – disse Atingo. _ Quero sim. E, antes que tarde, é agora!! – fez a paciente... Então foi logo explicando: gostei de suas perguntas sobre o sonho. Se a pessoa... Era um homem ou uma mulher. _ Mas gostaria de dilatar nosso tempo aqui a respeito dos leões. E, consequentemente, das portas.

_ Mas Incógnita, disse Atingo, nem mesmo aprofundamos a primeira parte do sonho e já queres passar para a segunda!! _ Não creio que esteja acreditando que os fatos acontecem contínuos na vida de um vivente! Eles acontecem enquanto o homem vive. O que se torna retilíneo não são os fatos mas a vida sobre a qual os fatos deixam suas pegadas.

Um acontecimento que existiu somente poderá vir à tona em forma de pensamento histórico encarnado em uma pessoa, que o viveu. Deste modo, Atingo, os fatos do seu sonho podem dar-se desde o final ou, como queres, do início. _ Porque deveríamos começar nossos diálogos analisando a causa do sonho sem antes ver a realidade do próprio sonho, Incógnita? – quer aprofundar as questões periféricas Atingo. Que teve outra surpresa de sua paciente...

_ Quando falamos dos fatos já estamos dizendo a propósito dos leões, pois eles não estão dentro do cercado. Mesmo que eles queiram adentrar o cercado uma verdade vai sempre se colocar à frente: eles estão do lado de fora. Como eu mesma por tempos fiquei fora de mim mesma buscando encontrar-me comigo mesma, contudo, sempre em vão! Não deixava nem mesmo o meu próprio ser dialogar comigo mesma. Estava constantemente fechando a porta!

Não que eu gostaria que fosse assim! Meu maior medo... Posso lhe dizer Atingo: é de que as pessoas conheçam quem eu seja realmente. Tenho com isso um peso mascarado de grandes desgostos que já passei em minha infância. Perdi tudo. Desde muito cedo perdi o carinho materno e paterno. Meus pais morreram...

Com aquele fato parece que a minha vida me escondeu de mim. Sim, Atingo, creio que a minha vida me escondeu de mim... _ nada é mais forte que você mesma, Incógnita, disse Atingo. _ Sim, contudo ganho forças interiores a partir do exterior, insiste Incógnita. Que continuou...

Os leões nada significariam se não estivessem ali tentando adentrar no recinto. Eles estão. Então, significam. _ Significam o que, então, Incógnita? – quer saber Atingo. _ Significam... Olha, Atingo, eles são enquanto tais em si mesmos. Não são em outros. Cada um deles luta por um ingresso frágil para se colocarem dentro do ambiente.

Vejo que existem muitas coisas em mim que são frágeis, mas consigo transparecer forte, o bastante para impedir todo tipo de aproximação... Percebendo Incógnita que estava falando de si mesma se envergonhou e saiu correndo... Atingo anotou algumas coisas num pedaço de papel. E, em seguida, saiu andando...

Pe. Joacir S. d’Abadia, Pároco de Alto Paraíso-GO, autor de 5 livros, Bacharel em Filosofia, Pós graduado em Docência do Ensino Superior, Licenciando em Filosofia e membro do Conselho de “Pesquisas e Projetos ” da UnB Cerrado.