"ABEL E NORMINHA" NA RELAÇÃO DE

HISTÓRIA E MEMÓRIA

Edevânio Francisconi Arceno

Prof. Diego Finder Machado

Literatura, Memória e Sociedade.

Curso de Pós-Graduação em História Cultural – AUPEX

29/09/09

Atualmente quando ouvimos a música que diz: "Você não vale nada, mas eu gosto de você", automaticamente vem à nossa memória o casal Norminha e Abel, personagens da novela global Caminho das Índias. Aproveitando à popularidade deste casal fictício, que conquistou o Brasil, mencionaremos seu relacionamento contraditório com a relação intensa e conflituosa entre História e Memória.

Primeiramente vamos desmistificar o discurso de que falar sobre a relação entre História e Memória, é complexo, pois não sabemos ao certo o conceito de cada uma. Isto não é verdade, pois a expressão latina "Memória" deriva de menor e oris, significando: "O que lembra" e está ligado ao passado. Apesar dos vários significados ao longo da História, sempre manteve sua essência, ou seja, Memória é algo que lembra o passado. Quanto ao conceito de História, você como historiador deve estar careca de saber, se ainda não sabe, propomos rever sua opção, que tal engenharia eletrônica? A empresa Tupy tem ótimas ofertas para estes profissionais!

Conhecendo seus respectivos conceitos, vamos analisá-los separadamente usando como referencia aquele casal, "Você não vale nada, mas eu gosto de você", lembrou da Norminha e Abel, não foi? Isto é Memória!Vamos começar pelo Abel, personagem do ator Anderson Muller, ele é um homem responsável, cumpridor de seus deveres e sabe fazer uso de sua autoridade. Seu trabalho é seguir regras e fazer com que outros também as sigam. Quer desapontá-lo? É só atravessar a rua fora da faixa. Da mesma forma a História tem uma reputação a zelar, ela é definida tradicionalmente como uma reconstrução científica que se faz através de um método, devendo sempre questionar a "integridade" de suas fontes, sejam elas escritas ou orais. O dever tradicional da história está em estabelecer os fatos como realmente ocorreram, pois só assim o passado é recuperado pelo presente. Para a História a compreensão do passado, não está simplesmente ligada a um ato esporádico, mas é composta de uma rede bem mais complexa. Na História a "faixa" são as fontes, quer ser um historiador, ande na faixa.

Enquanto Abel permanece vigilante com sua tradicional reputação sempre de olho na faixa, ela surge como um lapso. Seu caminhar é curvilíneo e sedutor, seus dedos sempre em movimentos circulares moldando a franjinha do cabelo. Seu olhar atento a todos a sua volta procura avidamente por sua propriedade, Abel. O vestido modelo "tomara que caia" parece cair a cada batida do coração, deixando quase livre seus fartos seios, que são retidos pelas rendas de seu sutiã, sempre amostra nas mais variadas cores. Seu vestido também protege o corpo de uma tradicional mulher brasileira, com bumbum grande e uma barriguinha saliente presa dentro da cinta elástica disfarçadamente escondida debaixo do vestido, e tudo isto em cima de um lindo sapato de salto alto comprado em doze vezes sem juros. Esta mistura de realidade e ficção que caminha em direção do tradicional Abel, é Norminha, personagem da atriz Dirá Paes.

Para os gregos a Memória é a geradora das artes, porém não obedece a regras, não combina sapatos e bolsa, mesmo assim se populariza e ganha autonomia e destaque em relação aos membros de um grupo. Isto não significa que a memória seja individual ou que cada um tenha uma memória própria, mas ela está situada num universo mais amplo, pois segundo Halbwach, toda memória se constrói com intermédio de outrem, através de trocas de experiências coletivas. Diante disto, a memória além de individual pode ser coletiva porque nem sempre é verdadeira, infalível e principalmente fiel. Esta falta de fidelidade desestabiliza a relação apaixonada entre Norminha e Abel, ou Memória e História.

Mesmo com tantas contradições, ambos são eternamente apaixonados e dependentes do passado, apesar de tratarem dele de forma diferente. Abel não tira os olhos da faixa, por acreditar que pode contribuir através de seus conhecimentos parao tira o olho dansformação, elatem pelo seu Abele ou atficosHist Mempato de salto alto comprado em doze vezes sem juros.ament que novos eventos não ocorram, bem como a História que estuda e analisa o Passado com objetivos específicos e às vezes refletindo em ações. Para Huyssen, a olhada para o passado viria para compensar a perda de estabilidade que o indivíduo tem com seu presente. Norminha busca no passado fatos sem se importar se foram tristes ou alegres, se aconteceram na faixa ou não, pois não tem pretensão ou desejo de evitar outros acontecimentos, apesar de todo amor e respeito por seu Abel. Claro que além das memórias estáticas como Norminha, existem também as não estáticas, pois a memória muda sempre de acordo com o presente, e por ser intensa tende a perpetuar sentimentos.

Concluiremos dizendo que esta relação intensa e conflituosa entre História e Memória, está longe de terminar, talvez seja isto que a deixe tão apaixonante. Assim como na novela Caminho das Índias, o desconfiado Abel vai continuar sendo vítima das armações e infidelidades de Norminha durante muito tempo, a História também conviverá com a frágil veracidade da Memória. Pois assim como Abel não vive sem sua Norminha, a História sem a Memória não existe.

REFERÊNCIAS

HALBWACHS, Maurice. A memória coletiva. São Paulo: Vértice, 1990.

HUYSSEN, Andreas. Seduzidos pela memória: arquitetura, monumentos, mídia. Rio de Janeiro: 2000.

SARLO, Beatriz. Tempo passado. Cultura da Memória e Guinada Subjetiva. São Paulo: Companhia das Letras, 2007.