Spinoza, que a meu ver é um homem de uma ética exemplar, no Tratado Teológico Político página oito trata da questão ética e moral intrinsecamente e de muitas outras como a liberdade, o utilitarismo, a hipocrisia e politicagem a qual também abordarei nesta reflexão quando escreve: "Se, efetivamente, o grande segredo do regime monárquico é aquilo que acima de tudo lhe interessa é manter os homens enganados e disfarçar, sob o especioso nome de religião; o medo em que devem ser contidos para que combatam pela servidão como se fosse pela salvação e acreditem que não é vergonhoso, mas sumamente honroso, derramar o sangue e a vida pela vaidade de um só homem...".

Diante tantos problemas que não são de hoje e até anteriores ao tempo de Spinoza nos parece que o caos ético que vivemos hoje nada mais nada menos é uma conseqüência natural da história das ações humanas não só dentro da política, como dentro da religião, ou melhor, na própria vida. A dicotomia religião e vida corrente, por exemplo, dentro do meio religioso e político, na época de Spinoza consideravam os cargos eclesiais mais pelo seu título do que pela sua real função e ele até mesmo em seu texto coloca a questão da avareza e ambição na quais os religiosos queriam ser adorados e que a religião virou mais um culto de "adulação" a Deus do que um real proposta de amor. Hoje em dia isso não é diferente basta observar algumas igrejas protestantes pentecostais a qual se importam com o dízimo e suas posições sociais. Há até mesmo avareza, ambição e dicotomia dentro da Igreja Católica e outras que enchem nossas páginas de jornal nesta disputa de poder.

Será que a lei hoje em dia visa manter o poder vigente ou visa o real bem do cidadão? A própria política possui uma ética própria na qual nós cidadãos somos obrigados a engolir e ao mesmo tempo percebemos que os que estão lá dentro da política se não adentrarem neste "esquema maluco" nada poderá fazer. Onde há liberdade nisso tudo?

O que espantava Spinoza e ao mesmo tempo nos espanta é justamente essa contradição que beira a loucura, isto é, viver dentro de uma Monarquia já se espera certo tipo de comportamento entre seus governantes políticos, agora dentro de uma República e que as autoridades ainda se aproveitam da religião, da ignorância da maioria para assim continuar tudo igual!

A religião virou um grande teatro segundo Spinoza e perdeu seu sentido de existência e digo que o mesmo pode dizer hoje. Há uma carência de sentido no ser humano, mas ao mesmo tempo a incredulidade devido um passado cheio de manchas no que concerne não só a religião, até mesmo a política. A religião se tornou sinal de

preconceito e o homem religioso é visto como um ser que não pensa apenas segue e que suas opiniões devem ser seguidas ou não terão "piedade", isto é, todos os conceitos foram e estão deturpados na qual foi onde acredito a palavra "moral" ter um peso muito maior do que realmente possui e estar totalmente desvinculada do conceito de ética.

Particularmente hoje estou em um retiro espiritual. Sei que não deveria estar fazendo um trabalho de faculdade, porém não consigo e não quero desvincular jamais a filosofia e o filosofar de todas as minhas esferas vivenciais, além de que, Spinoza exercer muita influencia sobre mim justamente por eu almejar a mesma liberdade e ética que ele viveu. Digo isso porque hoje o sacerdote falou: "O olfato não sente se não recebermos estímulo, assim é nosso espírito que necessita desta ascese, luta e exercício diário... E a santidade não se consegue sem a ascese e principalmente sem o conflito, afinal ela é fruto do conflito, pois por maiores que sejam nossas contradições, paradoxos e limitações é de grandes conflitos que surgem as maiores soluções.".

Ainda percebo que estamos longe de viver em um mundo ideal, porém a felicidade é agora com os conflitos, pois é o preâmbulo da felicidade no céu. Quem consegue ser feliz com Deus aqui na terra com certeza será feliz com Ele lá também ou senão não vai se acostumar lá não (risos) e se Deus nos deu a liberdade é porque Ele não nos quer escravos.

Ao mesmo tempo percebo que todos e até mesmo a história, as instituições precisam de um "kairos", isto é, precisam de seu próprio tempo para amadurecer e que a ética e a moral no mundo de alguma forma funciona desta maneira observada cuidadosamente não por um Senhor de escravos lá em cima, mas por um pai que ama seus filhos e que se não fosse assim sabe onde estaríamos...

E concluindo digo que o texto de Spinoza de certa forma me faz ter a certeza de que o real problema não está na religião, no dogma, na lei positiva, na política, na lei natural ou em Deus, o real problema está no próprio homem, isto é, em nós mesmos.

Bibliografia

SPINOZA, Baruch. Tratado Teológico Político. São Paulo:Martins Fontes, 2003.